ATIVIDADES RITMICAS E EXPRESSIVAS: SEGUNDO A PROPOSTA DOS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS DA EDUCAÇÃO FÍSICA NA EDUCAÇÃO BÁSICA.
Por Poliana Cordeiro | 03/04/2010 | EducaçãoATIVIDADES RITMICAS E EXPRESSIVAS: SEGUNDO A PROPOSTA DOS PARÂMETROS CURRICULARES NACIONAIS DA EDUCAÇÃO FÍSICA NA EDUCAÇÃO BÁSICA.
A educação vem sendo sucateada há várias décadas, a má formação dos profissionais em diversas áreas, associada a demais questões políticas podem ser citadas como algumas das causas do caos em que se encontra a educação brasileira. Resgatar a formação dos professores, através da revisão e reformulação dos currículos dos cursos de licenciatura foi uma das medidas encontradas para a busca de melhorias no ensino brasileiro, DEMO (1988).
Os parâmetros curriculares, como o próprio nome diz, propõem orientações gerais sobre o básico a ser ensinado e aprendido em cada etapa. Os professores devem adaptá-los à realidade de suas escolas e alunos, sendo desta forma um conteúdo de suma importância a ser apresentado e discutido dentro do espaço do Magistério Superior. Para os discentes do curso de Educação Física, o conhecimento, a discussão e as críticas sobre os PCNs devem permear toda a formação. De acordo com ARROYO (1994), “o ser humano é cultural; constrói-se como tal no seu processo de formação e humanização. Sermos sujeitos culturais não é algo acidental à nossa condição humana”.
Segundo o próprio Ministério da Educação, o processo de elaboração dos PCNs se deu da seguinte forma: Os documentos apresentados são resultados de longo trabalho, que contou com a participação de muitos educadores brasileiros tendo a marca de suas experiências e de seus estudos, e foram produzidos no contexto das discussões pedagógicas atuais. Inicialmente foram elaborados documentos, em versões preliminares, para ser analisados e debatidos por professores que atuam em diferentes graus de ensino, por especialistas da educação e de outras áreas, além de instituições governamentais e não-governamentais (Ministério da Educação).
Nos meios escolares, em 1997 chegaram às escolas os PCNs de 1ª à 4ª série e no ano seguinte os de 5ª à 8ª séries. Esses parâmetros, apesar da crítica tecida por inúmeros intelectuais brasileiros, de uma maneira geral, foram bem vistos pelos educadores atuantes na rede escolar. Discorrem sobre novos rumos da educação e sua adaptação às mudanças econômicas e sociais pelas quais passa o Brasil. Os PCNs relativos à Educação Física, referem-se aos blocos de conteúdos a serem ministrados que são: a) esportes, jogos, lutas e ginástica; b) atividades rítmicas e expressivas: c) conhecimento sobre o corpo. Os blocos de conteúdos definem as práticas corporais e os objetivos para cada uma delas.
O bloco de Atividades Ritmicas e Expressivas, sublinha a importância que todas as práticas da cultura corporal de movimento possuem expressividade e ritmo. Em relação à expressão, essas práticas se constituem em códigos simbólicos, por meio dos quais a vivência individual do ser humano, em interação com os valores e conceitos do ambiente sociocultural, produz a possibilidade de comunicação por gestos e posturas. Em relação ao ritmo, desde a respiração até a execução de movimentos mais complexos, se requer um ajuste com referência no espaço e no tempo, envolvendo, portanto, um ritmo ou uma pulsação(PCNs).
Este bloco de conteúdos inclui as manifestações da cultura corporal que tem como característica comum a intensão explícita de expressão e comunicação por meio dos gestos na presença de ritmos, sons e da música na construção da expressão corporal. Trata-se especificamente das danças, mímicas e brincadeiras cantadas. Num país em que pulsam a capoeira, o samba, o bumba-meu-boi, o maracatu, o frevo, o afoxé, a catira, o xote, o xaxado, entre muitas outras manifestações, é surpreendente o fato de a Educação Física, durante muito tempo, ter desconsiderado essas produções da cultura popular como objeto de ensino aprendizagem (PCNs).
Ainda sobre a discussão deste bloco de conteúdo, os PCNs discorrem sobre as manifestações rítmicas e expressivas que possuem toda cultura, danças trazidas pelos Africanos na colonização, danças relativas aos mais diversos rituais, danças que os imigrantes trouxeram em sua bagagem, danças que foram aprendidas com os vizinhosde fronteira, danças que se vêem pela televisão, as danças difundidas nos centro urbanos, como o funk, o rap, as danças de salão, dentre outras. Existem ainda as danças que estão desaparecendo, conhecê-las por meio de pessoas mais velhas da comunidade, é algo possível a se feito dentro deste bloco de conteúdos, segundo os parâmetros curriculares.
Existe ainda a referência às lengalengas, as brincadeiras de roda e as cirandas, que são uma boa fonte para atividades rítmicas. Os conteúdos deste bloco são amplos, diversificados e podem variar muito de acordo com o local em que a escola estiver inserida, por meio das danças e brincadeiras os alunos poderão conhecer as qualidades do movimento expressivo como leve/pesado, forte/fraco, rápido/lento, fluido/interrompido e ainda perceber sua intensidade, duração, direção e analisá-lo a partir destes referenciais. Também o processo de harmonizar a criação livre e cópia de movimento faz parte da aplicação dos conteúdos. Este bloco conclui com a referência ao conhecimento de algumas técnicas de execução de movimentos e a utilização delas no exercício de seu potencial comunicativo, ser capaz de improvisar, de construir coreografias, podem contribuir na adoção de atitudes de valorização e apreciação dessas manifestações expressivas.
Os conteúdos de aprendizagem são apresentados dentro dos blocos, segundo sua categoria conceitual(fatos, princípios e conceitos), procedimental(ligados ao fazer) e atitudinal(normas, valores e atitudes), o que permite a identificação mais precisa das intenções educativas. Dentre as atitudes estão a valorização da cultura corporal de movimento como parte do patrimônio cultural, como instrumento de expressão de afetos, sentimentos e emoções, como linguagem e forma de comunicação. Entre os conceitos e procedimentos estão a compreensão dos aspectos histórico-sociais das danças, percepção do ritmo pessoal e grupal, noção espaço/tempo em relação a si e ao outro, exploração de gestos e códigos, percepção dos limites corporais e superação dos mesmos, vivências das danças folclóricas e regionais compreendendo seus contextos de manifestações, compreensão e construção de coreografias simples, vivência das danças urbanas mais emergentes e compreensão do seu contexto originário, bem como das danças regionais, nacionais e internacionais, compreendendo-as no seu contexto sociocultural, como podemos certificarmos pelos PCNs.
A proposta do PCNs foi alterar a visão paradigmática, objetivando não mais a busca da performance, (aptidão física) e sim uma concepção pedagógica críticosuperadora que se fundamenta na cultura corporal, formando um cidadão autônomo, crítico, participativo e reflexivo, estando pronto para os desafios de vida em sociedade.
Carranza e Bantulá apud Zabala(1999), citam que a expressão corporal encontra-se implícita em toda ação desenvolvida por nosso corpo. Sendo um meio de comunicação com o exterior e com a gente mesmo, deve-se aprender a linguagem corporal, que é a base da expressão e da comunicação verbal.
Concorda ainda Lleixá(2002) que nas atividades rítmicas, a criança configurará uma série de sensações temporais em sua ação, como forma de expressão do ritmo através do movimento.As atividades de expressão corporal para que sejam verdadeiramente expressivas, capazes de comunicar idéias e sentimentos, exigirão um desenvolvimento harmônico do movimento no qual deverá manifestar-se o ritmo interior da pessoa.
A presença do ecletismo pode ser identificada de forma mais expressiva na discussão que os parâmetros fazem sobre o objeto de estudo da educação física, afirmado como cultura corporal de movimento. Podemos deduzir que seria então a tentativa de aliar “cultura de movimento”, defendido pela perspectiva críticoemancipatória de Elenor Kunz , em sua obra Transformação didático-pedagógica do esporte, de 1994, ao conceito de cultura corporal, do Coletivo de Autores (1992).
A cultura do movimento, de acordo com Kunz, constitui-se através do “se movimentar”, capacidade inerente ao homem, em objeto da área da educação física. A cultura do movimento envolve todas as atividades do movimento humano, tanto no esporte como em atividades extra-esportes. De acordo com o Coletivo de Autores, o termo cultura corporal designa o amplo e rico campo da cultura que abrange a produção de práticas expressivo-comunicativas essencialmente subjetivas, que, como tal, externalizam-se pela expressão corporal, e por isso se constitui também como um tipo de linguagem. Os jogos, as danças, as ginásticas, as lutas, os esportes, as mímicas e malabarismos, entre outros, são considerados os elementos que caracterizam esta cultura.
A cultura corporal de movimento, considerada o objeto de estudo da educação física, é definida a partir da intencionalidade do praticante e pode, portanto, assumir um caráter lúdico ou utilitário. Nesse sentido, os jogos, as brincadeiras, os esportes, as danças, as ginásticas e as lutas são consideradas representações corporais de diversos aspectos da cultura humana, tendo sido incorporadas como objetos de ação e reflexão pela educação física.
Apesar de incorporar elementos da pedagogia crítico-emancipatória, não se percebe na explicação sobre cultura corporal de movimento a contraposição que KUNZ (1994) faz ao conceito de cultura corporal do Coletivo de Autores (1992), que envolve a discussão sobre a dualidade cultura intelectual e cultura corporal, ou seja, para KUNZ não existe cultura que não seja corporal, o se movimentar seria uma especificidade desta cultura.
Nesse sentido, o ensino rítmico na escola se apresenta como um conhecimento técnico importante para a ampliação da comunicação e apreensão do mundo por parte do aluno. Formas e sons passam gradativamente a compor o universo sensório-motor da criança ajudando assim a desenvolver a melhor percepção espaço-temporal e, paralelamente, a imagem corporal do educando.
Depreende-se daí que os documentos dos PCNs, mais do que qualquer outro livro ou periódico, encontram-se à disposição de muitos professores de Educação Física. Entretanto, isto não quer dizer que os professores conheçam ou apliquem tais conhecimentos no seu cotidiano escolar. É preciso esclarecer que apesar desses documentos estarem disponíveis na maioria das escolas públicas brasileiras, poucos professores os têm utilizado de maneira sistemática. Isto ocorre por razões diversas: documento de difícil leitura, compreensão e aplicação, poucos investimentos na formação inicial e continuada dos professores (pelo próprio MEC), além de outros.
Considero que os Parâmetros Curriculares Nacionais, analisados criticamente quanto à qualidade e contextualização da abordagem propositiva que representam, podem subsidiar avanços para a Educação Física escolar no Brasil. Entretanto, o documento não pode ser utilizado como um currículo mínimo obrigatório a ser seguido, o contrário disso, e como lembra Ferraz (2001), “ele pode vir a ser um subsídio importante para discussão e definição das propostas pedagógicas elaboradas pelas escolas no exercício de sua autonomia”(p.S77). Apesar desse avanço, no que se refere ao desencadeamento e favorecimento dessas discussões, entendemos que a política educacional vigente ainda não oferece condições propícias para a obtenção de tais intentos.
Desse modo, os PCNs parecem constituir-se em uma proposta isolada, sem respaldo suficiente das demais instituições sociais e esferas de poder. Dado o período entre a elaboração da proposta preliminar e a publicação dos documentos finais (entre 1996 e 1999), o projeto de educação continuada “PCNs em Ação” (iniciado em 2000) parece uma tentativa tímida de suprir algumas necessidades objetivas para a implementação da proposta, como a preparação dos professores. Esperamos que não seja também uma tentativa tardia, pois alguns problemas educacionais brasileiros parecem já ser estruturais e cada vez menos passíveis de interferências sistemáticas a médio prazo.
Várias críticas têm sido formuladas a esses PCN’s por profissionais que analisaram a proposta. Entre elas encontramos o desapontamento pelo documento ignorar os intensos debates existentes na área da educação, além de se apoiar em apenas uma linha de conhecimento, tendo esta como certa e única, no entanto, tratando-a com certa superficialidade. O termo “parâmetro” também é questionado por quem analisa o documento, ele é “... apenas um artifício usado para ocultar a tentativa de definir um currículo nacional para a área” (SOUSA et. alli, 1997, p. 65).
Outro ponto que acreditamos ser antagônico em relação às abordagens já vistas é o bloco referente ao conhecimento sobre o corpo. A respeito deste conteúdo, os PCN’s ressaltam uma visão biológica, considerando ser importante o estudo da biomecânica, anatomia e fisiologia. Partindo destas considerações feitas pelo próprio documento, questionamos que corpo é este que se propõe conhecer. Não nos parece ser um corpo carregado de significados interpretáveis culturalmente, na realidade não nos transmite a sensação de ir além do estudo de um corpo matéria, biologicamente constituído.
Sobre especificamente o conteúdo de atividades rítmicas e expressivas, saliento que cabe ao professor de educação física, quando trabalhar com o ensino dos mesmos na escola, criar condições para que seus alunos possam vivenciar os ritmos internos e externos de maneira criativa e desafiadora, pois seu trabalho na escola hoje tem um presssuposto intencional de formar cidadãos com autonomia, que cooperem e participem socialmente afirmando seus valores e princípios democráticos.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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