ATEMPORALIDADE EM “OS CORUMBAS”

Por Ivana Rodrigues Silveira | 24/01/2013 | Literatura

ATEMPORALIDADE EM “OS CORUMBAS” 

SILVEIRA, Ivana Rodrigues.[1]

nanarodsi@hotmail.com 

ORIENTADOR: Prof. Esp. José Luiz Andrade de Lima

   Este artigo vai analisar a obra Os Corumbas pelo seu cunho social de forma gradual. Construindo assim um discurso crítico sobre temas apresentados na obra como a emigração, o proletariado e o assédio moral comparando-os com o momento atual.

   Os Corumbas é um romance do escritor paulista Amando Fontes e foi publicado no ano de 1933. A obra conta a história de uma família interiorana a qual transfere a sua vida para capital, Aracaju, em busca de uma nova realidade com educação e trabalho, já que a seca junto à crise do açúcar havia chegado à Ribeira, cidade do interior de Sergipe em que eles viviam. A narrativa passeia por temas universais, o que faz com que a obra seja considerada atemporal.

 O romance é composto por personagens devidamente humanizados. A família do patriarca Geraldo, vive uma realidade sofrida desde os primeiros capítulos. Mas que ainda sonha com o melhor. O melhor para Josefa, esposa e mãe, seria tentar a vida na capital:

Foi Josefa quem aventou a idéia de se mudarem para a Aracaju.

E enumerava suas razões:

Na capital, havia emprego decente para as duas meninas mais velhas. Era nas fabricas de Tecidos... Estavam assim de moças, todas ganhando bom dinheiro... Pedro não custaria em conseguir um bom lugar, como ferreiro ou maquinista... Uma outra vida, enfim.

(FONTES, “Os Corumbas”, 1999, p. 10)

Percebe-se que a mãe, mesmo depois de ter vivido muitos sofrimentos continua a sonhar, pondo os seus filhos como foco principal desse sonho. É através deles que ela pretende garantir a renda familiar, visando para eles emprego com bons salários, já que ela e o seu marido estão velhos.

 Estudando a história de Sergipe e relacionado-a a esse fragmento dos Corumbas foi possível perceber que esse perfil de família ainda está presente na sociedade. Trabalhadores rurais, que cansados da vida dura e do trabalho escasso em épocas de seca emigram para capital, trazendo consigo a coragem e o sonho de uma vida melhor. Chegando aqui muitos por falta de qualificação, não conseguem empregar-se e retornam a sua cidade, outros fixam-se tornando – se parte do proletariado.

Na ficção, estando a família na capital, a narrativa descreve o crescimento de Aracaju no despertar do bairro Santo Antônio que corria pelas ruas de lama até chegar ao bairro Industrial em direção das fabricas. O realismo detalhista do narrador mostra um proletariado em sua maioria, mulheres, e até mesmo crianças, emigrados de São Cristóvão, Itaporanga, Vasa Barris, Itabaiana e tantas outras regiões, caminhando em direção das grandes fábricas que movimentavam a economia dessa região.  As fábricas que eram tidas como a solução, são despidas, e mostram-se cheias de problemas, com o destaque para o assédio moral contra a mulher proletária.

O autor discute esse problema social em um dos capítulos através da personagem Albertina. A operária da fábrica Sergipana é assediada por um dos seus superiores, mas por não condizer com a situação é demitida.

− Não! A senhora é boa operária, faz um trabalho limpo, não há dúvida. Mas não sabe tratar os superiores com respeito.

A rapariga ainda tentou justificar-se, começando a contar-lhe o verdadeiro motivo e contenda.

− Ele é o contramestre! - atalhou, seco e severo, Seu Joãozinho. − De nada adianta a sua explicação. É na palavra dele que eu tenho que acreditar. Senão adeus ordem e disciplina... A senhora mesma foi a culpada de tudo. Fez um bruto escândalo na hora do serviço. Agora não tem mais remédio. Seu nome já foi riscado da lista. Acabou-se.

(FONTES, “Os Corumbas”, 1999, p. 29)

              Sabe-se que o assédio moral é um dos problemas mais discutidos na atualidade, o qual o autor Amando Fontes colocou muito bem.  Albertina representa as mulheres diversas que sofrem com essa conduta abusiva. Podemos relacionar esse tema, também com o poder hierárquico entre as camadas sociais. No romance, Os Corumbas, o diálogo citado acima acontece entre o dono da fabrica, o qual representa a burguesia e a empregada, representante do proletariado.  

O que distingue nossa época – a época da burguesia – é ter            simplificado a oposição de classes. Cada vez mais, a sociedade inteira divide-se em dois grandes blocos inimigos, em duas grandes classes que se enfrentam diretamente: a burguesia e o proletariado.

(MARX & ENGELS, 1981, p. 24)                                                                                                                                

            Ao citar Karl Marx & Engels, é perceptível que essa é uma discussão presente na sociedade, mas que não avançou muito quanto às mudanças. A sociedade ainda venda os olhos para esse tipo de comportamento, mesmo com a existência das Consolidações das Leis do Trabalho (CLT). A burguesia ainda é quem comanda, pois são eles os, poucos, quem possuem a riqueza, fazendo dos muitos, seus subalternos.            

A mão de obra não qualificada em contra mão com a vontade de subir socialmente faz com que o empregado mantenha-se na empresa, mesmo sofrendo esse tipo de abuso. Ele acredita que não denunciar é uma forma de garantir-se empregado, mesmo já existindo a CLT, o proletário tem medo de perder a sua forma de sustento, o seu trabalho.

            Trazendo os temas emigração, proletariado e assédio moral para a atualidade, é possível relacioná-los, assim como o autor fez em seu romance. Por isso a obra pode ser considerada atemporal, mesmo com setenta e oito anos de publicação, ainda é atual.

O livro de Amando Fontes, escrito em 1933. Continua sendo lido e apreciado, por muitas pessoas. A sua narrativa naturalista/realista é composta por temas que podem e devem ser discutidos no cotidiano. A obra ainda possui como contexto a política, movimentos trabalhistas, o exilo e prostituição os quais completam o enredo da obra.

REFERÊNCIAS 

FONTES, Amando. Os Corumbas. 23. Ed. Rio de Janeiro: José Olympio, 1999.

MARX, K; ENGELS, F. Manifesto do Partido Comunista. São Paulo: Global, 1981 

SITES CONSULTADOS

www.assediomoral.org.br

http://pt.scribd.com/doc/36290645/Historia-Industrial-Sergipe



[1] Graduada em Letras-Português pela Universidade Tiradentes no ano 2009/2, pós-graduanda em Literaturas brasileira e portuguesa pela Faculdade Pio X.