ASSÉDIO MORAL NO SERVIÇO PÚBLICO – PODER JUDICIÁRIO

Por FERNANDO VIEIRA REIS | 13/12/2016 | Adm

INTRODUÇÃO 

Os servidores públicos principalmente o que trabalham no Poder Judiciário são geralmente invejados por se achar que os vencimentos são maiores e que ainda tem certo status trabalhar no serviço público e ter estabilidade, esse é o senso comum. Todavia, algumas perguntas se fazem necessárias, o servidor que auxilia na prestação de serviço jurisdicional, que ajuda pessoas que estão investidas de poder, que é o caso dos magistrados, sofrem algum tipo de pressão psicológica? Essa relação com o poder que está investido em alguns dessas autoridades sempre ocorre com respeito, dignidade e impessoalidade? E se ocorre algum fenômeno de coerção ou mesmo de humilhação nessa relação entre servidores e magistrados, isso afeta a sua saúde física e mental?

Doenças psicossomáticas como depressão, que não é mais advinda de uma melancolia sem motivo ou de lugares escuros, e sim, de onde se diz que não há espaço para se pensar bobagens: o ambiente de trabalho.

Essa depressão, assim como outros sintomas de doenças psicossomáticas, como síndromes do pânico se originam de um fenômeno jurídico que é objeto de estudo deste trabalho, o assédio moral.

Diversos casos de assédio moral se verificam presentes no ambiente de trabalho, atingindo inúmeros trabalhadores no mundo inteiro. As mudanças e contingências do século XXI trouxe o acirramento das disputas do capitalismo selvagem, do isolamento. Drásticas mudanças nas relações de trabalho ocorreram.

O Poder Judiciário acompanhou as mudanças sociais, adaptando-se as novas demandas. Porém, o capitalismo e o neoliberalismo, trouxeram repercussões questionáveis às relações de trabalho, e que conseqüências benéficas ou maléficas trouxeram as relações entre o Poder Judiciário e seus servidores públicos?

O homem muitas vezes é tratado apenas como uma ferramenta de produção do sistema e não o contrário. Assim, firmou se a ideia de uma ditadura de resultados, com metas irreais através do cumprimento de absurdas tarefas, o homem deixou de ser homem, tornou se apenas um elemento desse processo.

Cresceram as reclamações de agressões do gestor, do chefe, daquele que detém o poder ao servidor subordinado, aos poucos, o que era esporádico, se tornou ação contínua, e habitual. O assédio moral se consolida, saindo das empresas privadas e atingindo os diversos setores administrativos do Estado.

É objeto de estudo deste trabalho acadêmico, o fenômeno do assédio moral no serviço público, focando o Poder Judiciário, desta forma analisaremos a evolução dos conceitos sobre assédio moral, perfis de assediados e assediadores, causas do assédio moral e consequências tanto para as instituições, quantos para os que sofrem assédio moral, observando a legislação vigente, além de observar o posicionamento público do Sindicato dos Servidores do Judiciário e Também do Poder Judiciário Estadual.

2. ASSÉDIO MORAL NO SERVIÇO PÚBLICO 

2.1 Conceito de assédio moral 

Em alguns países, o fenômeno do Assédio Moral recebe outro nome, mas com a mesma conotação e gravidade que tem no Brasil: harcèlement moral (assédio moral), na França; bullying (tiranizar), na Inglaterra; mobbing (molestar), nos Estados Unidos e na Suécia; murahachibu, ijime (ostracismo social), no Japão; psicoterror laboral, acoso moral (psicoterror laboral, assédio moral), na Espanha.

Leymann, (2000) pesquisador da área de psicologia no trabalho, registra que em 1984 efetuou o primeiro estudo sobre o assunto, quando identificou o fenômeno e o nominou “mobbing”, o descreve da seguinte maneira: assédio moral é a deliberada degradação das condições de trabalho através do estabelecimento de comunicações não éticas (abusivas) que se caracterizam pela repetição por longo tempo de duração de um comportamento hostil que um superior ou colega (s) desenvolve (m) contra um indivíduo que apresenta, como reação, um quadro de miséria física, psicológica e social duradoura.

Cohen diz que:

 

O termo “assédio moral” (no ambiente de trabalho) surgiu em setembro de 1998, quando a psicanalista francesa Hirigoyen lançou, na França, um livro publicado, em 2000, no Brasil, sob o título “Assédio Moral: a violência perversa no cotidiano”. (COHEN Apud COLETA e MIRANDA, 2002) 

Segundo Barreto,

O assédio moral é explicitado por atos e comportamentos agressivos que visam a desqualificação e desmoralização profissional e a desestabilização emocional e moral do(s) assediado(s), tornando o ambiente de trabalho desagradável, insuportável e hostil. (BARRETO, 2000) 

Todavia, independentemente da definição, o importante é compreender que o assédio moral se caracteriza pelo abuso de poder de forma repetida e sistematizada.

Vale ressaltar que para este trabalho faz-se necessário também ver o tema sob o prisma jurídico, pois esta é uma das instâncias onde o assunto ganha maior conotação.

E devido à diversidade de sintomas não é tarefa fácil a elaboração do conceito jurídico do assédio moral no ambiente de trabalho, e assim é que alguns doutrinadores enfatizam no conceito o dano psíquico acarretado à vítima em face da violência psicológica já descrita; outros destacam mais a situação vexatória e o dano à imagem que o assédio moral provoca. Entretanto, há elementos em torno dos quais a doutrina e a jurisprudência estão em consonância como caracterizadores do assédio moral. São eles:

a) a intensidade da violência psicológica. É necessário que ela seja grave na concepção objetiva de uma pessoa normal. Não deve ser avaliada sob a percepção subjetiva e particular do afetado que poderá viver com muita ansiedade situações que objetivamente não possuem a gravidade capaz de justificar esse estado de alma. Nessas situações, a patologia estaria mais vinculada com a própria personalidade da vítima do que com a hostilidade no local de trabalho

b) o prolongamento no tempo, pois episódio esporádico não o caracteriza, mister o caráter permanente dos atos capazes de produzir o objetivo. (CALLEJO, 2003 Apud BARROS, 2004). 

O que caracteriza o assédio moral juridicamente é o tempo ser suficientemente longo para que cause um impacto real e de verdadeira perseguição pelo assediador.

Sedimentando esta afirmação, temos as observações de Nascimento: Um dos elementos essenciais para a caracterização do assédio moral no ambiente de trabalho é a reiteração da conduta ofensiva ou humilhante, uma vez que, sendo este fenômeno de natureza psicológica, não há de ser um ato esporádico capaz de trazer lesões psíquicas à vítima.

Como bem esclarece o acórdão proferido no TRT da 17ª Região, "a humilhação repetitiva e de longa duração interfere na vida do assediado de modo direto, comprometendo sua identidade, dignidade e relações afetivas e sociais, ocasionando graves danos à saúde física e mental, que podem evoluir para a incapacidade laborativa, desemprego ou mesmo a morte, constituindo um risco invisível, porém concreto, nas relações e condições de trabalho” 

c) a intenção de ocasionar um dano psíquico ou moral ao empregado para marginalizá-lo no seu ambiente de trabalho

d) a conversão, em patologia, em enfermidade que pressupõe diagnóstico clínico, dos danos psíquicos. (CALLEJO, 2003 Apud BARROS, 2004). 

O dano psíquico poderá ser permanente ou transitório. Ele se configura quando a personalidade da vítima é alterada e seu equilíbrio emocional sofre perturbações, que se exteriorizam por meio de depressão, bloqueio, inibições, etc. Estes estados devem guardar um nexo de causalidade com o fato danoso. Poderá ocorrer desse último não gerar o desequilíbrio emocional, mas agravá-lo. Nessa última hipótese, aplica-se a concausa e o responsável responde pelo agravamento (GHERSI 2002 Apud BARROS, 2004).

Segundo Resolução 1488/98 do Conselho Federal de Medicina, para o estabelecimento do nexo causal entre os transtornos de saúde e as atividades do trabalhador, além do exame clínico (físico e mental) e os exames complementares, quando necessários, deve o médico considerar a história clínica e ocupacional, decisiva em qualquer diagnóstico e/ou investigação de nexo causal; o estudo do local de trabalho; o estudo da organização do trabalho; os dados epidemiológicos; a literatura atualizada; a ocorrência de quadro clínico ou sub clínico em trabalhador exposto a condições agressivas; a identificação de riscos físicos, químicos, biológicos, mecânicos, estressantes, e outros; o depoimento e a experiência dos trabalhadores; os conhecimentos e as práticas de outras disciplinas e de seus profissionais sejam ou não da área de saúde (Artigo 2° da Resolução CFM 1488/98).

A questão da necessidade da existência do dano psíquico como caracterizador do assédio moral não é unanimidade entre autores que exploram o assunto na esfera do Direito. Duas correntes se dividem:

Já para Barros (2004), isso é dispensável, já que o conceito de assédio moral deverá ser definido pelo comportamento do assediador e não pelo resultado danoso. A se exigir o elemento alusivo ao dano psíquico como indispensável ao conceito de assédio moral, se teria um mesmo comportamento caracterizando ou não a figura ilícita, conforme o grau de resistência da vítima, ficando sem punição as agressões que não tenham conseguido dobrar psicologicamente a pessoa.

Nascimento concebe que: 

(e segundo ela também o entendimento da maioria dos estudos jurídicos atuais e das decisões da Justiça do Trabalho), o assédio moral no cenário laboral é visto pelo resultado que provoca, pelo dano que efetivamente venha a causar na vítima, no caso, a doença psíquico emocional. (NASCIMENTO, 2013) 

Para tanto, faz-se necessária perícia feita por psiquiatra ou outro especialista da área para que, por meio de um laudo técnico, informe ao magistrado (que não poderia chegar a tal conclusão sem uma opinião profissional) sobre a existência desse dano, inclusive fazendo a aferição do nexo causal.

[...]

 

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