ASSÉDIO MORAL E POLICIAIS MILITARES
Por JUAREZ VIEIRA RAMOS | 28/07/2009 | DireitoPor Juarez Vieira Ramos Bacharel em Direito pela Universidade Salgado de Oliveira – Campus Recife
I – INTRODUÇÃO
O objetivo deste artigo é comentar de forma hermenêutica a lei nº 13.340/07 e o Decreto Regulamentador nº 30.948/07 sobre assédio sexual, e verificar seu alcance de âmbito aplicativo entre os servidores civis e militares do Estado de Pernambuco.
II – COMENTÁRIOS
LEI Nº 13.314, DE 15 DE OUTUBRO DE 2007.
EMENTA: Dispõe sobre o assédio moral no âmbito da Administração Pública Estadual direta, indireta e Fundações Públicas.
Art. 1º Fica vedada a prática de assédio moral no âmbito da Administração Pública Estadual direta e indiretamente de qualquer de seus Poderes (Legislativo, executivo e Judiciário) e Fundações Públicas.
Comentário: No caso aqui, o legislador definiu amplitude, o alcance da norma, a qual seja, toda Administração Pública. Entendemos que, nenhum Servidor Público ficou fora do alcança na referida lei. Caso alguma categoria, por sua natureza – que é inconstitucional - se ache fora da contemplação, resolve-se pelo Principio da Subsidiariedade.
“O crime de assédio moral configura um crime formal, cuja consumação não exige a realização daquilo que é pretendido pelo agente e o resultado jurídico previsto no tipo ocorre em concomitância com o desenrolar da conduta delitiva, ou seja, independe de haver o resultado quisto pelo agente se produzido ou não, objetos, elementos e pessoas para testemunhar será importante. No caso do assédio moral, o "psico-terror" criado pelo agente é suficiente para caracterizar a conduta, sendo irrelevante o grau ou intensidade da reação psicológica produzida na vítima, salvo para poder-se esboçar a figura qualificada, onde a lei agrega circunstâncias ao tipo básico de modo a torná-lo mais grave, ou ainda, para apurarem-se valores indenizatórios, pois, na órbita civil, é pertinente falar-se em proporções do dano causado” (Suzana J. de Oliveira Carmo).
Art. 2º Para fins do disposto na presente Lei considera-se assédio moral toda ação repetitiva ou sistematizada praticada por agente e servidor de qualquer nível que, abusando da autoridade inerente às suas funções, venha causar danos à integridade psíquica ou física e à auto-estima do servidor, prejudicando também o serviço público prestado e a própria carreira do servidor público.
Comentário: Em tese, o conceito foi quase completo, faltaram alguns elementos tais como: 1) rigor excessivo; 2) confiar tarefas inúteis ou degradantes; 3) desqualificação ou críticas em público; 4) isolamento ou inatividade forçada; 5) ameaças explícitas ou veladas; 6) exploração de fragilidades psíquicas e físicas; 7) limitação ou proibição de qualquer inovação ou iniciativa do trabalhador; 8) impor obrigação de realizar autocríticas em reuniões públicas; 9) exposição ao ridículo (Por exemplo: impor o uso de fantasias, sem que isso guarde relação com sua função, e inclusão no rol de empregados com menor produtividade); 10) divulgação de doenças e problemas pessoais de forma direta ou pública; 11) agressões verbais ou através de gestos; 12) atribuição de tarefas estranhas à atividade profissional do empregado, para humilhar e expor a situações vexatórias, como lavar banheiros, fazer limpeza, levar sapatos para engraxar ou rebaixar de função (de médico para atendente de portaria, por exemplo); 13) trabalho superior às forças do empregado; 14) sugestão para pedido de demissão; 15) ausência de serviço ou atribuição de metas dificílimas ou impossíveis de serem cumpridas; 16) controle de tempo no banheiro; 17) divulgação pública de detalhes íntimos; 18) instruções confusas; 19) referência a erros imaginários; 20) solicitação de trabalhos urgentes para depois jogá-los no lixo ou na gaveta; 21) imposição de horários injustificados; 22) transferência de sala por mero capricho; 23) retirada de mesa de trabalho e pessoal de apoio; 24) boicote de material necessário à prestação dos serviços, além de instrumentos como telefone, fax e computador; e 25) supressão de funções ou tarefas.
É claro que no conceito textual da norma não seria necessário todo o rol apresentado, pois o direito é subjetivo.
O conceito de assédio moral segundo o sueco Heinz Leymann, psicólogo do trabalho,
“assédio moral é a deliberada degradação das condições de trabalho, por meio do estabelecimento de comunicações anti-éticas (abusivas), que se caracterizam pela repetição por longo tempo de duração de um comportamento hostil que um superior ou colega(s) desenvolve(m) contra um indivíduo que apresenta, com reação, um quadro de miséria física, psicológica e social duradoura”.
A principal implicação do terrorismo psicológico é a afetação da saúde mental e física da vítima, mais comumente acometida de doenças como depressão e stress, chegando, por vezes, ao suicídio. (Sônia A.C. Mascaro Nascimento, Consultora jurídico-trabalhista, Advogada)
O assédio moral no trabalho é definido como qualquer conduta abusiva [gesto, palavra, comportamento, atitude...] que atente, por sua repetição, contra a dignidade ou integridade psíquica ou física de uma pessoa, ameaçando seu emprego ou degradando o clima de trabalho (HIRIGOYEN, Marie-France).
No Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, a 6ª Turma, tendo como Relator Valdir Florindo e Revisor Francisco Antonio de Oliveira, julgando em 17 de fevereiro de 2004 o acórdão nº 20040071124, decidiram:
Assédio moral. Repercussões sociais. A questão da ofensa à moral conflagra um subjetivismo oriundo da própria condição de cada indivíduo. Não se sente menos constrangido o trabalhador que escolhe adotar uma postura conciliadora, preferindo não detonar uma crise no ambiente de trabalho que fatalmente o prejudicará, pois a questão aqui transcende a figura do ofendido, projetando as conseqüências pela supressão do seu posto de trabalho a quem dele eventualmente dependa economicamente.
O fantasma do desemprego assusta, pois ao contrário da figura indefinida e evanescente que povoa o imaginário popular, este pesadelo é real. É o receio de perder o emprego que alimenta a tirania de alguns maus empregadores, deixando marcas profundas e às vezes indeléveis nos trabalhadores que sofrem o assédio moral. Exposta a desumanidade da conduta do empregador, que de forma aética, criou para o trabalhador situações vexatórias e constrangedoras de forma continuada através das agressões verbais sofridas, incutindo na psique dos recorrentes pensamentos derrotistas originados de uma suposta incapacidade profissional.
O isolamento decretado pelo empregador acaba se expandindo para níveis hierárquicos inferiores, atingindo os próprios colegas de trabalho. Estes, também por medo de perderem o emprego e cientes da competitividade própria da função, passam a hostilizar o trabalhador, associando-se ao detrator na constância da crueldade imposta. A busca desenfreada por índices de produção elevados, alimentada pela competição sistemática incentivada pela empresa, relega à preterição a higidez mental do trabalhador que se vê vitimado por comportamentos agressivos aliado à indiferença ao seu sofrimento. A adoção de uma visão sistêmica sobre o assunto faz ver que o processo de globalização da economia cria para a sociedade um regime perverso, eivado de deslealdade e exploração, iniqüidade que não repercutem apenas no ambiente de trabalho, gerando grave desnível social.
Daí a corretíssima afirmação do Ilustre Aguiar Dias de que o prejuízo imposto ao particular afeta o equilíbrio social. Ao trabalhador assediado pelo constrangimento moral, sobra a depressão, a angústia e outros males psíquicos, causando sérios danos a sua qualidade de vida. Nesse sentido, configurada a violação do direito e o prejuízo moral derivante.
Parágrafo Único. Considera-se como flagrante ação de assédio moral, ações e determinações do superior hierárquico que impliquem para o servidor em:
I - cumprimento de atribuições incompatíveis com o cargo ocupado ou em condições adversas ou com prazos insuficientes;
II - exercício de funções triviais para quem exerce funções técnicas e especializadas;
II - reiteração de críticas e comentários improcedentes ou subestimação de esforços;
IV - sonegação de informações indispensáveis ao desempenho das suas funções;
V - submissão a efeitos físicos e mentais prejudiciais ao seu desenvolvimento pessoal e profissional.
Art. 3º Todo ato de assédio moral referido nesta Lei é nulo de pleno direito.
Art. 4º O assédio moral praticado por servidor de qualquer nível funcional deve ser punido, conforme os casos, na forma disciplinada na legislação aplicada aos servidores públicos civil ou nas Leis trabalhistas.
Comentário: Com alusão a assertiva “servidores público civis", não achamos, com base no art. 4º que os servidores militares foram excluídos da lei em arguição, apenas o legislador quis deixar claro que a forma para disciplinar seria a legislação pertinente, dependendo do caso. No caso dos militares, pode-se aplicar o código disciplinar ou qualquer legislação aplicável ao caso.
Art. 5º Por iniciativa do servidor ofendido ou pela ação da autoridade conhecedora da infração por assédio moral será promovida sua imediata apuração, por sindicância ou processo administrativo.
Comentário: Se no caso o processo administrativo não for aberto para apurar a ilicitude cometida, a Constituição Federal em seu art. 5º inciso XXXV – a lei não excluirá da apreciação do poder judiciário lesão ou ameaça de direito. Em principio, torna-se obvio protocolar ação por assedio moral no Judiciário.
§1º A autoridade conhecedora da infração deverá assegurar a proteção pessoal e funcional ao servidor por este ter testemunhado ações de assédio moral ou por tê-las relatado.
§2º Fica assegurado ao servidor acusado da prática de assédio moral o direito de plena defesa diante da acusação que lhe for imputada, nos termos das normas específicas de cada órgão da administração ou fundação, sob pena de nulidade.
Comentário: É o respeito ao Principio do Direito a Ampla Defesa e do Contraditório garantido a todos pela Constituição Federal.
Art. 6º Os órgãos da Administração Pública Estadual direta, indireta e Fundações Públicas Estaduais, na pessoa de seus representantes legais, ficam obrigados a tomar as medidas necessárias para prevenir o assédio moral, conforme definido na presente Lei.
Comentário: Se não for possível pela presente lei, podemos utilizar como crime
Art. 7º Esta Lei será regulamentada pelo Poder Executivo Estadual no prazo de 60 (sessenta) dias.
III - REGULAMENTAÇÃO
DECRETO Nº 30.948, DE 26 DE OUTUBRO DE 2007.
Comentário: O decreto não trouxe muitas novidades, mas fala em Subsidiariedade no uso da aplicação na norma; 0 § 1º do art.1º define a amplitude da norma (Poder Executivo, Legislativo e Judiciário); e no § 2º, art.1º- As normas do presente Decreto se aplicam ao servidor público em sentido amplo (servidores públicos civis, militares e etc.)
Regulamenta a Lei nº 13.314, de 15 de outubro de 2007, que dispõe sobre a Lei de Assédio Moral no âmbito da Administração Pública Estadual Direta, Indireta e Fundações Públicas.
O GOVERNADOR DO ESTADO, no uso das atribuições que lhe são conferidas pelo artigo 37, incisos II e IV, da Constituição Estadual,
CONSIDERANDO a promulgação da Lei nº 13.314, de 15 de outubro de 2007, que dispõe sobre o Assédio Moral no âmbito da Administração Pública Estadual Direta, Indireta e Fundações Públicas, cujo artigo 7º prevê a regulamentação, pelo Poder Executivo; e
CONSIDERANDO a necessidade de adequar os dispositivos da citada Lei nº 13.314, de 2007, relativamente ao procedimento para apuração e aplicação de penalidades nos casos de assédio moral no serviço público estadual, ao disposto na Lei nº 6.123, de 20 de julho de 1968, que instituiu o Estatuto dos Funcionários Públicos Civis do Estado de Pernambuco,
DECRETA:
Art. 1º A Lei nº 13.314, de 15 de outubro de 2007, que dispõe sobre o assédio moral no âmbito da Administração Pública Estadual direta, indireta e Fundações Públicas, é regulamentada nos termos deste Decreto.
§ 1º Considera-se Administração Pública Estadual os órgãos e entidades integrantes dos Poderes Executivo, Legislativo e Judiciário.
§ 2º As normas do presente Decreto se aplicam ao servidor público em sentido amplo, na condição de ofensor ou ofendido, abrangendo o titular de cargo efetivo ou comissionado e o empregado público.
Art. 2º Considera-se prática de assédio moral, no âmbito da administração pública, toda ação repetitiva ou sistematizada praticada por agente e servidor de qualquer nível que, abusando da autoridade inerente às suas funções, venha causar danos à integridade psíquica ou física e à auto-estima do servidor, prejudicando também o serviço público prestado e a própria carreira do servidor público.
Parágrafo único. Considera-se como flagrante ação de assédio moral, ações e determinações do superior hierárquico que impliquem para o servidor em:
I - cumprimento de atribuições incompatíveis com o cargo ocupado ou em condições adversas ou com prazos insuficientes;
II - exercício de funções triviais para quem exerce funções técnicas e especializadas;
III - reiteração de críticas e comentários improcedentes ou subestimação de esforços;
IV - sonegação de informações indispensáveis ao desempenho das suas funções;
V - submissão a efeitos físicos e mentais prejudiciais ao seu desenvolvimento pessoal e profissional.
Art. 3º Ocorrendo qualquer das hipóteses previstas no art. 2º, a parte ofendida deverá informar os fatos ocorridos por escrito, à sua chefia imediata ou ao superior hierárquico do ofensor, indicando, se houver, as testemunhas do ocorrido, para instauração do respectivo processo administrativo.
Parágrafo único. A autoridade que tiver conhecimento da infração deverá solicitar ao superior hierárquico do ofensor a instauração do processo administrativo, desde que haja expressa anuência do servidor ofendido.
Art. 4º O processo administrativo para apuração das condutas tipificadas como assédio moral seguirá o procedimento previsto na Lei nº 6.123, de 20 de julho de 1968, e alterações, que instituiu o Estatuto dos Funcionários Públicos Civis do Estado de Pernambuco.
Parágrafo único. Durante o processo administrativo, será assegurada proteção pessoal e funcional ao servidor que haja sofrido, denunciado ou testemunhado o assédio moral.
Art. 5º A prática do assédio moral será punida com as penas disciplinares previstas na Lei nº 6.123, de 1968, e alterações, a serem aplicadas após o regular processo administrativo, consideradas a natureza e a gravidade da infração, os danos que dela provierem para o ofendido e para o serviço público, assim como os antecedentes do ofensor.
Parágrafo único. A repreensão será aplicada por escrito nos casos que não justifique imposição de penalidade mais grave.
Art. 6º O procedimento de apuração do assédio moral e aplicação da penalidade cabível, nos termos da Lei nº 6.123, de 1968, e alterações, será adotado no âmbito dos órgãos e entidades previstos no art. 1º deste Decreto.
Parágrafo único. No caso de apuração envolvendo empregados públicos, aplicar-se-á a legislação pertinente ao seu regime jurídico, e, subsidiariamente, a Lei nº 6.123, de 1968, e alterações.
Art. 7º Ocorrendo o assédio moral por autoridade de mandato eletivo, a conclusão dos fatos apurados deve ser encaminhada para os respectivos órgãos fiscalizadores ou para o Poder Judiciário.
Art. 8º Este Decreto entra em vigor na data de sua publicação.
Art. 9º Revogam-se as disposições em contrário.
PALÁCIO DO CAMPO DAS PRINCESAS, em 26 de outubro de 2007.
EDUARDO HENRIQUE ACCIOLY CAMPOS Governador do Estado
IV - CONCLUSÃO
Em linhas conclusivas podemos aduzir que, não haverá necessidade de se editar uma nova lei, específica para policiais militares, na qual o alcance de aplicação é lato senso, isto é, para todos os servidores públicos sem distinção de sua natureza.
O código civil estabelece no art. 186 que “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito”.
E no art. 187 prescreve que “Também comete ato ilícito o titular de um direito que, ao exercê-lo, excede manifestamente os limites impostos pelo seu fim econômico ou social, pela boa-fé ou pelos bons costumes”. E a reparação pelos danos cometidos o art. 927 diz que “Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo”.
Em fim, não há pânico para cobrar respeito de quem tem o dever de respeitar, em matéria de conteúdo em normas, o texto constitucional é robusto na proteção da moral e dignidade da pessoa humana, sem falar nas normas infraconstitucionais.
Referencias Bibliografias
1. Decreto nº 30.948, DE 26 DE OUTUBRO DE 2007.
2. Lei nº 13.314, de 15 de outubro de 2007
3. Sônia A.C. Mascaro Nascimento. Consultora jurídico-trabalhista, Advogada
4. Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região, a 6ª Turma, tendo como Relator Valdir Florindo e Revisor Francisco Antonio de Oliveira, julgando em 17 de fevereiro de 2004 o acórdão nº 20040071124
5. HIRIGOYEN, Marie-France
6. Heinz Leymann. Sueco. Psicólogo do Trabalho
7. Suzana J. de Oliveira Carmo. suzanajm@hotmail.com