Aspectos polêmicos sobre a Lei de Duverger
Por Gabriela de Campos Sena | 04/03/2017 | Direito- Introdução
A lei de Duverger é um princípio que afirma que o sistema eleitoral majoritário conduz a um sistema bipartidário enquanto o de representação proporcional leva a um sistema multipartidário. A descoberta deste princípio é atribuída a Maurice Duverger, um cientista político e sociólogo francês que observou este efeito e deixou reflexões em diversos textos publicados.
Duverger não considerou o seu princípio como algo absoluto, apenas propôs a ideia de que o sistema majoritário atrasaria a aparição de novas forças política e aceleraria o desaparecimento de forças em declínio. Para ele, o sistema proporcional teria efeito oposto.
Efeito Mecânico de Duverger é a tendência que todos os sistemas eleitorais em prática nas democracias têm de sub representar os menores partidos e sobre representar os maiores.
Mesmo sistemas eleitorais com um único distrito nacional, ou que utilizam fórmulas altamente proporcionais como a "Sainte-Lague" e a de "Maiores Sobras", podem operar de maneira desproporcional, caso os partidos recebam votações abaixo do quociente eleitoral mínimo. Isso por si só fará com que os maiores parti dos recebam percentualmente mais cadeiras do que votos recebidos. O efeito mecânico pode ser observado simplesmente comparando-se o percentual de votos com o de cadeiras de cada partido. Tal efeito dos maiores partidos serem beneficiados com mais cadeiras e os menores serem penalizados opera mecanicamente e está livre de qualquer cálculo.
- Lei Durverger: uma análise no contexto brasileiro.
A Lei Durverger no contexto brasileiro remete a classificação dos sistemas partidários e suas relações com os sistemas eleitorais. Analisando o fator de governabilidade no perfil do sistema partidário brasileiro no qual tem um número excessivo de Partidos Políticos sem coesão interna, gerando uma crise representativa no Estado. A partir daí, avaliaremos a incidência das leis sociológicas de Maurice Duverger e Giovanni Sartori, no cenário político brasileiro.
- Tipologia dos sistemas partidários
Podemos apontar três leituras acerca das variáveis óticas tipológicas do sistema partidário brasileiro sob a leitura de Jairo Marconi Nicolau:
- Ideológica: a principal função dos partidos é expressar diversas opiniões da sociedade, de modo que o número de partidos decorre da diversidade de opiniões relevantes da sociedade.
- Sociológica: os partidos são canalizadores de interesses de determinados segmentos ou classes sociais.
- A Institucionalista: enfatiza o impacto da estrutura institucional sobre o sistema partidário. Assim, as instituições democráticas (sistema eleitoral, sistema de governo, estrutura de Estado) estabelecem o cenário para a atuação dos partidos políticos.
As primeiras tipologias referentes aos sistemas partidários nos países democráticos basearam-se na distinção entre bipartidarismo e multipartidarismo. Essa distinção encontra-se, por exemplo, na obra clássica de Maurice Duverger sobre os partidos políticos. Segundo ele, as opções políticas comumente apresentam-se sob a forma dualista, de forma que o movimento natural das sociedades orienta-se para o bipartidarismo. (OLIVEIRA; DUAILIBE. 2010)
As proposições de Duverger que ficaram conhecidas como “Leis de Duverge” são:
- O sistema majoritário de um só turno tende ao dualismo dos partidos.
- O sistema majoritário de dois turnos e a representação proporcional tende ao multipartidarismo.
Por isso, Durverger destaca três sistemas principais de partidos no Estado contemporâneo: unipartidarismo, o bipartidarismo e o multipartidarismo. Outros cientista e sociólogos analisaram a Lei Durverger em comparação com a realidade de 22 democracias, chegando se a conclusão de que só havia dois casos desviantes: o Canadá e a Áustria.
- Contexto brasileiro
No contexto brasileiro podemos observamos os dados referentes às eleições de 2002 e 2006 para deputado federal são indicativos de que as Leis de Duverger mantêm seu peso no caso brasileiro, isto é, a fórmula de representação proporcional tende a conduzir o sistema partidário para o multipartidarismo.
É importante ressaltar, ainda, que a maioria dos candidatos fazem suas campanhas de forma individual em relação ao partido. Em decorrência a população brasileira vota nos candidatos individualmente, não observando partidos e suas ideias, mas sim os políticos, já que, muitos Partidos Políticos e seus integrantes se organizam apenas para uma disputa eleitoral. No nosso sistema temos outro agravante, as coligações que na maioria das vezes e feita apenas para ganhar mais tempo de televisão ao em vez de unir seguimentos, ideologias e propostas.
Nesse contexto atinente ao estudo do sistema partidário brasileiro, é interessante ressaltar a distinção entre partidos eleitorais e partidos parlamentares. Partidos eleitorais são aqueles que apresentam candidatos em eleições. Já os partidos parlamentares são aqueles que conseguem obter representação no parlamento. (OLIVEIRA; DUAILIBE. 2010)
Em 2002, 30 (trinta) partidos disputaram as eleições parlamentares. Destes, quatro obtiveram 10% ou mais dos votos, vale dizer, Partido dos Trabalhadores (18,4%), Partido da Social Democracia Brasileira (14,3 %), Partido do Movimento Democrático Brasileiro e Partido da Frente Liberal (ambos com 13,4%). Significa isso que os quatro maiores partidos brasileiros saíram das urnas com 62,3% da representação parlamentar. Outros três partidos obtiveram entre cinco e dez por cento dos votos. Foi o caso do Partido Progressista (7,8%), do Partido Socialista Brasileiro (5,3%) e do Partido Democrático Trabalhista (5,1%). [1]
Nas eleições realizadas no ano de 2006, os quatro maiores partidos (Partidos dos Trabalhadores, Partido do Movimento Democrático Brasileiro, Partido da Social Democracia
Brasileira e Partido da Frente Liberal) mais uma vez obtiveram mais de 10% dos votos. Do total de 513 deputados, os quatro maiores partidos elegeram 299 parlamentares. [2]
Sob a perspectiva dos autores a vulnerabilidade do mecanismo partidário brasileiro não consiste na fragmentação partidária mais sim na ausência de coesão interna das agremiações e de regras mais rígidas para fidelidade partidária e financiamento de campanha eleitoral que enfraquecem a atuação dos partidos políticos em nosso país. Sendo assim, de acordo com os autores, o sistema partidário brasileiro deve ser classificado como pluralismo moderado, ou seja, multipartidarismo de baixa polarização ideológica, uma vez que os partidos políticos, no Brasil, ainda não funcionam como legítimo canal de comunicação entre a sociedade e o Estado, mediante a apresentação de programas de governo que representem diferentes ideias na forma e condução da coisa pública.
Inicialmente, dentro de uma inferência acerca da correlação entre Ciência, Política e Estado, Maurice Duverger assevera que “para uns, a ciência política é a “ciência do poder”; para outros, é a ciência do Estado, pois, na verdade, todas as definições de ciência política têm um ponto comum girando em torno da noção de poder, seja pelo fenômeno da força, coerção, coação desmembrada em pressão social, cultural, físico e econômico”.
Esta concepção segundo o autor retro mencionado advinha no século XVII na Europa tendo em vista que, segundo Duverger “quase todo mundo considerava que o poder no Estado devia pertencer a um homem saído de uma família real, por hereditariedade, ou seja, a monarquia era então legítima. Hoje em dia, a democracia é legítima”
Por conseguinte, correlacionando a evolução histórica da noção de poder, política e os efeitos provocados no sistema eleitoral e partidário a partir das proposições de Duverger, em estudo sobre o assunto (Nicolau, Schimidt, 1995) assinala que “duas de suas proposições ficaram conhecidas como as Leis de Duverger em sua versão clássica, explicitadas sob a ótica de que - o sistema majoritário de um só turno tende ao dualismo dos partidos e o sistema majoritário de dois turnos e a representação proporcional tendem ao multipartidarismo.
Partindo dessa ótica segundo os autores (Nicolau, Schimidt, 1995), vários desdobramentos surgiram a partir das proposições de Duverger na tentativa de tornar as leis mais flexíveis, como por exemplo, as proposições de Sartori e Tagepra e Shugart.
Inicialmente Sartori aventou ideias de leis tendenciais, cujas formulas de maioria simples favorecem o bipartidarismo e dificultam o multipartidarismo e que as fórmulas de representação proporcional favorecem o multipartidarismo e dificultam o bipartidarismo.
No entanto, Tagepra e Shugart, preferiram adotar as proposições de Duverger como lei e hipótese, haja vista que para eles, a regra da maioria simples tendem a reduzir o número de partidos para dois, independentemente do número de clivagens políticas e que a regra de proporcionalidade política não reduzem o número de partidos políticos caso o numero de clivagens favoreçam a existência de muitos partidos.
Partindo para a seara do sistema partidário inicialmente Duverger classifica o estado contemporâneo segundo (Oliveira, Duailibe, 2010) em três sistemas principais de partidos, bem como o unipartidarismo, o bipartidarismo e o multipartidarismo.
O unipartidarismo é próprio de regimes totalitários como o fascismo, o nazismo e o comunismo. As ditaduras do século XX, com raras exceções, fizeram do partido único o instrumento máximo da conservação do poder, sufocando o pluralismo político, sem o qual a liberdade se extingue. O partido único é o sustentáculo da ditadura, conforme assinala Duverger. Neste sistema, o partido se confunde com o poder e sua doutrina se torna a idéia do direito oficial. Por sua vez, o bipartidarismo é o sistema de organização de partidos no qual a disputa pelas preferências do
eleitorado é realizada por dois partidos, tendo a corrente majoritária a responsabilidade pelo exercício das políticas governamentais, cabendo ao partido minoritário o exercício do encargo de oposição. O bipartidarismo é considerado por alguns escritores políticos como o sistema democrático por excelência em matéria de organização partidária. O sistema bipartidário, porém, não significa literalmente a existência de apenas dois partidos no cenário político. É possível que vários partidos concorram no período eleitoral no entanto, o sistema tecnicamente se acha de tal forma estruturado que somente dois partidos reúnem de maneira permanente a possibilidade de chegar ao poder. Notadamente, Duverger esclarece que nem sempre é fácil distinguir entre o dualismo e o multipartidarismo, por causa da existência de pequenas agremiações partidárias ao lado dos grandes partidos. Segundo ele, nos Estados Unidos, por exemplo, existem alguns pigmeus atrás dos dois gigantes democrata e republicano: Partido Trabalhista, Partido Socialista, Partidos dos Lavradores, Partido Proibicionista e Partido Progressista; entretanto, a desproporção evidente entre eles e os grandes partidos tradicionais, bem como o respectivo caráter efêmero e local, permite considerar o sistema norte-americano tipicamente dualista. Existirá, portanto, um sistema bipartidário sempre que a existência de terceiros partidos não impeça os dois maiores de governarem sozinhos, vale dizer, nesse sistema as coalizões são desnecessárias. Assim, o formato do bipartidarismo deve ser considerado em números de cadeiras, ou seja, de cargos políticos. Por outro lado, caso o mesmo partido permaneça no poder, eleição após eleição, haverá, em verdade, o sistema de partido predominante e não um sistema bipartidário. A alternação no poder é imprescindível para a configuração do bipartidarismo. O sistema bipartidário possui algo que corresponde a um traço natural da divisão política da sociedade, conforme assinala Duverger. Para o autor, nem sempre há um dualismo de partidos, mas quase sempre há um dualismo de tendências, conforme ocorre nos Estados Unidos e na Inglaterra. Ainda no que se refere à classificação adotada por Maurice Duverger, o Estado poderá adotar o sistema multipartidário, ou seja, aquele que se caracteriza pela presença de 03 (três) ou mais partidos políticos no contexto da disputa pelo poder num determinado sistema estatal. Caso não haja lastro de representatividade distribuído pelo menos entre 03 (três) partidos, não estará configurado o sistema pluripartidário. Os adeptos do pluralismo partidário louvam-no como a forma de colher e fazer representar o pensamento de variadas correntes de opinião, emprestando às minorias o peso de uma influência que não existiria no sistema bipartidário ou monopartidário. Ademais, afirma-se que o sistema multipartidário é de cunho profundamente democrático, na medida em que confere autenticidade ao governo, tido por centro de coordenação ou compromisso dos distintos interesses que se movem no mosaico das várias classes da sociedade. Duverger esclarece que, comumente, se confundem as noções de multipartidarismo e ausência de partidos. Um país em que a opinião se divide em grupos numerosos, porém instáveis, efêmeros, fluidos, consoante o raciocínio desse cientista político, não corresponde à verdadeira noção de multipartidarismo, em verdade, situa-se na pré-história partidária. A dualidade e a multiplicidade de partidos se apresentam com vantagens e inconvenientes. Não são portanto, fórmulas perfeitas, todavia, parece válido admitir que a pluralidade de partidos, se ordenada, é o sistema que melhor protege as liberdades do cidadão e a estrutura democrática do poder, garantindo, ainda, a representação das opiniões definidas. A exagerada multiplicidade de partidos confunde e pulveriza a opinião coletiva, enfraquecendo as agremiações e dificultando, pelos conflitos entre as representações eleitas, a execução dos programas de governo. Nos regimes parlamentares, notadamente, o fenômeno tem significação especial, conforme revelam as crises ministeriais ocorridas na Itália, por exemplo. No sistema
parlamentar, no qual a formação de maioria política constitui pilastra essencial para o funcionamento do mecanismo político, o multipartidarismo conduz inevitavelmente aos governos de coalizão ou coligação, sem rumos políticos coerentes, sujeitos a uma instabilidade manifesta. Não obstante, estes governos, por sua natureza, tendem a ser mais sensíveis à opinião pública (Anais do XIX Duverger no sistema partidário. Encontro Nacional do CONPED, 2010, p. 3-7)
Analisando sobre a ótica da classificação do sistema partidário brasileiro José Alfredo de Oliveira Baracho em estudos sobre os partidos políticos a partir das concepções de Duvrger, assinala que, as relações entre sistema partidário e o sistema eleitoral constituem referência constante das exposições sobre o tema. Neste sentido, a ação de certo tipo de sistema eleitoral levará ao bipartidarismo ou ao multipartidarismo. O desenvolvimento do sufrágio universal e a ideia de representação deram ao eleitorado posição fundamental no Estrado moderno. Os sistemas eleitorais passaram a exercer influência sobre a organização dos partidos.
Isto ocorre segundo Baracho, tendo em vista que, o sistema majoritário e proporcional, que promovem a distribuição das representações tem muita importância no processo de efetivação dos partidos políticos. O princípio supõe a atribuição da totalidade dos cargos de uma circunscrição eleitoral ao partido que conseguiu maior número de votos. Já a representação proporcional determina a cada partido um número de representantes que guarda relação com os votos que conseguiram.
Todavia, assevera ainda om autor retro mencionado que o princípio majoritário tem passado por críticas, quando transformou-se em dogma que corresponde à monocracia, que leva a unicidade do poder, que implica no despotismo popular ou no despotismo de um só, Entretanto, a eleição proporcional é reconhecida como conquista que completou o sufrágio universal, refletindo nas bases democráticas do processo político com a adoção do número uniforme e do coeficiente eleitoral.
Sendo assim, Duverger dentre as suas proposições inerentes ao sistema partidário e eleitoral permite-nos inferir que, o sistema majoritário e proporcional tem obtido diversas investigações que apresentam críticas as duas formulas, uma vez que, a representação proporcional é tida como a maneira d possibilitar a presença de todas as tendências políticas nos órgãos eletivos acarretando a multiplicidade de partidos, ao passo que o sistema majoritário tido como catalisador de grandes agremiações, na pratica ocorre pela falta de ideologia básica de suporte.
Discorrendo ainda acerca da influência das proposições de Duverger no sistema partidário, conclui (Nicolau, Schimidt, 1995) que, ideias por ele aventadas desmembram-se em efeitos mecânicos e psicológicos, pois, para o primeiro delineia-se pela tendência de que todos os sistemas eleitorais em práticas nas democracias têm de sub representar os menores partidos e sobre representar os maiores, ou seja, operam de maneira desproporcional caso os partidos menores recebam votação abaixo do quociente eleitoral mínimo, fazendo com que, os partidos maiores recebam percentualmente mais cadeiras do que votos. Para o efeito psicológico vigora a sensação de perda de voto ao votar em partido de menor expressão ou sub representado.
Ou seja, nos dizeres de José Alfredo de Oliveira Baracho em estudos sobre os partidos políticos a partir das concepções de Duverger, existem dois tipos de partidos a saber: os partidos de massa e os partidos de quadros.
Sendo assim, os partidos de quadros são os primeiros que surgem dentro de um sentido moderno, em decorrência do sistema eleitoral como, por exemplo, do tipo tradicional (conservadorismo e radicais), tipo americano e os partidos indiretos. Agora, os partidos de massa delineiam-se em técnicas criadas pelos movimentos socialistas que seriam usados pelos partidos comunistas, fascistas e pelos partidos das nações subdesenvolvidas.
Referências:
OLIVEIRA, Bruno Queiroz . sistemas partidários e sistemas eleitorais: as leis sociológicas de Maurice Duverger e Giovanni Sartori no cenário político brasileiro. Disponível em: http://www.conpedi.org.br/manaus/arquivos/anais/fortaleza/3069.pdf. Acesso em 30 de setembro de 2-14.
Nicolau, Jairo Marconi. Sistema eleitora e sistema partidário. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/ln/n36/a08n36. Acesso em 30 de setembro de 2-14.
DUVERGER, Maurice. Ciência Política, teoria e Método. Disponível em maurice+Duverger++Ci*c3*aancia+pol*c3*adtica*2c+Teoria+e+m*c3*a9todo,64942790.pd. Acesso em 29 de setembro de 2014.
[1] BRAGA, Maria do Socorro. Sistema Eleitoral e Sistemas Partidários em perspectiva comparada: Especificidades e Similaridades. In: Encontro Nacional da Associação Brasileira de Ciência Política, Rio de Janeiro. Disponível em: <www.ciênciapolítica. org. br.>
[2] Os dados relativos às bancadas de cada partido na posse de 2007 estão veiculados no site da Câmara dos Deputados. Disponível em: <www2.camara.gov.br/deputados/posse>