ASPECTOS GERAIS DO INSTITUTO DA DELAÇÃO PREMIADA NO CRIME ORGANIZADO

Por Victor Thomás Magalhães Arcanjo | 07/12/2016 | Direito

 

RESUMO 

Este estudo tem como propósito refletir acerca da essência do instituto da delação premiada, as suas especificidades e o seu grau de importância como meio de obtenção de prova em investigações complexas em que envolvem muitos acusados e organizações criminosas. É notório que o fenômeno da criminalidade está em nível acelerado na sociedade brasileira, uma vez que o crime vem se tornando mais organizado, ocorrendo o aprimoramento dos atos criminosos, e, diante dessa realidade, a justiça começou a se aparatar de mecanismos legais e jurídicos para combater as diversas modalidades criminosas, dentre eles, o instituto da delação premiada. Dessa forma, adotou-se, neste trabalho científico, uma metodologia fundamentada na pesquisa bibliográfica, sendo certo que o presente estudo constitui-se de uma coleta de informações no banco de dados eletrônicos de periódicos científicos na internet, bem como mediante pesquisas em livros e revistas. Assim, foram adotados os pensamentos dos seguintes autores para subsidiar teoricamente o presente trabalho: Boeng (2007), Nucci (2007), Lima (2010), Moreira Filho (2012), Coutinho (2006), Namba (2012), bem como documentos oficiais, como a Constituição Federal (1998), o Código Penal Brasileiro (1940), dentre outros. Diante da aplicação com frequência do instituto da delação premiada pela justiça brasileira, inúmeros estudos já foram realizados a fim de compreender os princípios e valores norteadores do instituto em comento. Dessa forma, a partir do estudo bibliográfico, objetivou-se compreender os principais pontos críticos relacionados à delação premiada. Por fim, pode-se concluir que há muita divergência entre os estudiosos acerca do instituto da delação premiada, principalmente, no que se trata da violação dos princípios e das garantias constitucionais, bem como a existência de omissões nas legislações infraconstitucionais quanto a sua aplicabilidade no sistema jurídico brasileiro.   

1 INTRODUÇÃO 

É notório que o fenômeno da criminalidade está em nível acelerado na sociedade brasileira. Ao longo do tempo, o crime vem se tornando mais organizado a fim de cada vez mais aprimorar os atos criminosos, a fim de tornar mais difíceis e obscuras as investigações, interferindo e prejudicando o Estado de exercer o jus puniendi, principalmente, quando se trata de organizações criminosas bem articuladas. Diante de inovações e de novas estratégias adotadas pelos criminosos, tornou-se necessário a justiça se aparatar de mecanismos legais e jurídicos para combater diversas modalidades de crime na sociedade brasileira, especialmente, quando se refere aos meios de obtenção de prova.        

Dentre os meios de obtenção de prova existentes no ordenamento jurídico brasileiro, há o instituto da delação premiada disciplinado pela Lei nº 12.850/2013, que tem contribuído bastante para o desdobramento das atividades investigativas, uma vez que se trata de um benefício estatal concedido aos investigados que resolvem contribuir na persecução penal. Determinado meio de obtenção de prova tem proporcionado à justiça brasileira condições adequadas para o desenvolvimento de atividades de investigação mais eficientes e eficazes.

A partir da delação premiada, verifica-se a inversão do papel do acusado/indiciado nos processos criminais, pois o próprio investigado passa a contribuir no processo de investigação, ou seja, o indiciado, mediante a concessão de alguns benefícios, passa a contribuir com a justiça, a fim de melhorar a qualidade do material probatório e, consequentemente, fomentar o papel da justiça brasileira no combate às práticas criminosas. 

Em razão de a delação premiada está em bastante voga no atual contexto jurídico brasileiro, principalmente, por conta da operação denominada de “Lava-Jato” e por se tratar de um instituto peculiar no âmbito do Direito Brasileiro, resolveu-se, a partir deste projeto de pesquisa, fazer uma abordagem histórica e conceitual acerca da valoração da prova a partir do instituto da delação premiada no Direito Brasileiro.

Dessa forma, o instituto da delação premiada implementado no Direito Brasileiro surgiu como uma oportunidade, ao mesmo tempo, para beneficiar o indiciado e a justiça, pois este instituto vem favorecer e manter a ordem pública, a partir do benefício concedido aos criminosos pela justiça brasileira. Esse benefício que o Estado vem oferecendo ao delator, na prática, fomenta o desmantelamento de organizações criminosas, fazendo com que as investigações de âmbito judicial tenham mais eficácia e eficiência, a fim de realmente promover a justiça no meio social.

Ademais, a delação premiada, instituto previsto em diversas legislações do ordenamento jurídico brasileiro e sua grande contribuição no que se refere em tornar mais célere, eficiente e eficaz as investigações judiciais, principalmente, no âmbito de organizações criminosas, resolveu-se, a partir deste projeto de pesquisa, fazer uma abordagem histórica, conceitual e a valoração como prova do instituto da delação premiada no Direito Brasileiro.

A importância pela temática partiu de ilações acerca da contribuição do instituto da delação premiada no esclarecimento de delitos, principalmente, a sua autoria, a fim de proteger a sociedade de ações criminosas. Para a aplicação do referido instituto, é imprescindível que Ministério Público e Poder Judiciário o utilizem conforme as garantias constitucionais previstas em lei, sem que este benefício obedeça aos requisitos estabelecidos pela legislação pátria.

Diante do exposto, pretende-se, mediante este trabalho acadêmico, compreender a essência do instituto da delação premiada, as suas especificidades e o seu grau de importância como meio de obtenção de prova em investigações complexas em que envolvem muitos acusados e organizações criminosas. Nessa perspectiva, objetiva-se de forma clara e objetiva, refletir sobre conceituações e algumas considerações, dentre outros aspectos relevantes levantados pela doutrina, relacionados à delação premiada. 

Com a finalidade de compreender a aplicação do instituto premial da delação premiada, objetiva-se realizar uma pesquisa bibliográfica de natureza qualitativa, a partir de fundamentação teórica na doutrina e no ordenamento jurídico brasileiro, com o intento de construir entre os estudiosos e os acadêmicos do Curso de Direito uma visão panorâmica acerca e compreender a aplicabilidade da delação premiada no atual contexto jurídico brasileiro. Não obstante, também se propõe refletir sobre a eficiência e a eficácia deste instituto no combate à organização criminosa.  

Por fim, o presente estudo se encontra dividido em quatro capítulos: o primeiro se propõe fazer uma abordagem histórica sobre o instituto da delação premiada no ordenamento jurídico internacional e brasileiro; o segundo se pauta em compreender a delação premiada a partir da Constituição Federal de 1988; o terceiro capítulo analisa o instituto da delação premiada na perspectiva do Código Penal Brasileiro e das leis extravagante; por fim, o quarto consiste em verificar a contribuição da delação premiada no combate ao crime. 

2 ABORDAGEM HISTÓRICA DA DELAÇÃO PREMIADA

Neste capítulo, propõe-se realizar uma contextualização histórica e a evolução do instituto da delação premiada no âmbito do ordenamento jurídico internacional e brasileiro.  Assim, verifica-se a existência de diversos institutos que foram criados a fim de combater o crime, especialmente, o organizado, dentre os institutos, pode-se destacar a delação premiada.

Dessa forma, ao longo deste estudo, almeja-se, a partir de leituras, compreender instituto premial da delação, desde a sua origem até a sua aplicabilidade contemporânea no ordenamento jurídico brasileiro.  

2.1 BREVE HISTÓRICO DA DELAÇÃO PREMIADA NO ORDENAMENTO JURÍDICO INTERNACIONAL

O instituto da delação premiada é considerado bastante moderno e atual, uma vez que foi disciplinado somente no final do século XX. Entretanto, desde os primórdios da civilização, na história da humanidade, há inesquecíveis delatores que tiveram recompensas em virtude, principalmente, do fenômeno da traição, permanecendo-os vivos e presentes na memória da humanidade como indignos, como o legendário Judas Iscariotes que, em razão de uma quantia, resolveu trair Jesus Cristo, fazendo com que o exército romano até o líder do catolicismo (BOENG, 2007).   

No período medieval, o processo de delação premiada teve a sua modesta formação em virtude de diferentes modelos de Processo Penal Inquisitório. Assim, a estrutura do processo investigatório era mais pautada em uma simples delação do que propriamente na ação da acusação. Nesse período, o fundamental era desvendar os casos criminais mediante a adoção do instituto da delação premida e não no processo investigatório propriamente dito, o qual deveria se pautar realmente na essência da investigação (BARREIROS, 1981).

Ademais, deve-se esclarecer que Beccaria (2002), em sua obra “Dos Delitos e das Penas”, em meados do século XVIII, realizou uma análise acerca do instituto da Delação premial mediante duas perspectivas a dos delatores e a dos traidores, a fim de refletir sobre a impunidade ofertada pelos Tribunais aos cúmplices de um grave delito que resolverem delatar os demais companheiros. Nessa perspectiva, Beccaria (2002) considerava a delação premiada como o favorecimento a impunidade, uma vez que beneficiaria um dos criminosos pela simples condição de delatar os demais, sem, realmente, proceder a punição pela prática do ato criminoso. 

No ano de 1853, o estudioso Ihering (2004), influenciado pela modernidade, idealizou o direito premial na perspectiva de que o direito em comento não se restringe somente ao interesse do beneficiário, mas se direciona em satisfazer o interesse da coletividade, ou seja, o direito coletivo é superior aos demais direitos, pois a finalidade da delação premiada é atender os anseios e as necessidades da sociedade no âmbito da criminalidade.       

No Nazismo, as delações foram utilizadas para investigar a presença de judeus, uma vez que os delatores, ao informarem ao governo alemão acerca da existência de judeus, eram recompensados e tinham a confiança do governo nazista. Ao longo dos regimes ditatoriais na Europa, foi mantida a referida concepção de delação premiada, uma vez que o governo tinha como finalidade eliminar qualquer cidadão ou pessoa que reagisse contrariamente as normas estabelecidas pelo governo (BOENG, 2007).   

Conforme Steinheuser (2008), no direito alemão, a delação premiada era denominada de testemunha da coroa, que, em troca de seu testemunho, o delator obtém imunidade, mediante as hipóteses de transação penal, pode-se mencionar o benefício da redução da condenação. No âmbito do direito italiano, este instituto fora adotado no período de declínio do terrorismo e das estruturas mafiosas, a fim de obter resultados mais eficazes e eficientes no combate ao crime organizado na Itália. Na perspectiva do direito dos países de língua alemã, o instituto em comento tem a nomenclatura de testemunho principal ou da coroa. Por fim, recentemente, o instituto da delação tem sido adotado e se proliferado em todo o planeta, especialmente, nos setores da criminalidade considerados de maior gravidade, como crime organizado, o narcotráfico e o terrorismo.

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