Aspectos fisiopatológicos associados ao choque circulatório

Por EDSON COSTA | 08/08/2009 | Arte

INTRODUÇÃO

O diagnóstico e o tratamento do choque circulatório constituem-se num dos principais problemas nas unidades de terapia intensiva. Apesar dos avanços na compreensão da fisiopatologia do choque e de melhorias importantes na terapêutica, a mortalidade mantém-se elevada. Nos estágios iniciais, a ressuscitação vigorosa ode corrigir a hipóxia tecidual, permitindo a reversão do estado de choque. Entretanto, se a perfusão e o transporte de oxigênio continuarem diminuídas, as lesões celulares pode tornar-se irreversível. Mesmo quando a terapia inicial parece ser adequada, o estado de hipermetabolismo e a síndrome da disfunção de múltiplos órgãos podem ocorrer. Deste modo, o sucesso terapêutico depende do diagnóstico precoce, ressuscitação rápida e terapia agressiva, dirigida à causa do estado de choque. O presente artigo de revisão discute a fisiopatologia do choque circulatório, seus aspectos clínicos e as bases do seu tratamento, com maior ênfase aos tipos de soluções utilizadas para a reposição volêmicas (POTTER & PERRY, 2002).


FISIOPATOLOGIA

O choque circulatório é marcado por redução crítica na perfusão tecidual. A hipóxia tecidual compromete a atividade metabólica, celular e, finalmente, as funções celulares e orgânicas. A resposta inicial do sistema cardiovascular às reduções graves na perfusão tecidual é um conjunto complexo de reflexos que servem para manter o tônus vascular e o desempenho cardíaco. Ocorre ativação do sistema simpático que eleva a freqüência e a contratibilidade cardíaca. Há liberação de catecolaminas, vasopressina e angiotensina, que aumentando o tônus vascular e arteriolar, aumentando volume sanguíneo central, o retorno venoso e a pressão sanguínea. Concomitantemente, o fluxo sanguíneo é direcionado para o cérebro e coração. Á medida que o choque progride, os mecanismos compensatórios entram em falência, de modo que as medidas terapêuticas deixam de ter os efeitos desejados, resultando em choque irreversível morte (GUYTON & HALL, 2002).


METABOLISMO DO OXIGÊNIO

A hipóxia tecidual, resultante do desequilíbrio entre a oferta e a demanda de oxigênio acarreta acidose metabólica devido à instalação de metabolismo anaeróbio, que consome mais glicose para produzir menos energia. Enquanto o metabolismo aeróbico produz trinta e oito (38) moles de ATP por mol de glicose consumida, apenas dois (02) moles de ATP são produzidos por mol de glicose, durante a glicólise anaeróbica. O resultado é a elevação dos níveis séricos de ácido láctico. O ácido é um indicador de graves reduções na oferta de oxigênio e de déficits energéticos teciduais e está relacionado diretamente com a mortalidade, quando aumenta acima de 2 mmol/L, sobretudo no choque hipovolêmico e cardiogênico. No entanto, seu aumento, no choque séptico, tem um significado duvidoso (COTRAN et al.,2000).


MEDIADORES

Segundo PEDROSO et al. (1998) as manifestações sistêmicas do choque são o resultado da liberação de uma série enorme de mediadores como citoquinas, ecosanóides, betaendorfinas, toxinas bacterianas, leucotrienos, fator de ativação plaquetária, fator de necrose tumoral, sistema complemento, radicais livres de oxigênio, etc, que provocam disfunção de vários órgãos e sistemas.

1 – Disfunção cardíaca: substâncias depressoras do miocárdio contribuem para a depressão da função cardíaca nos choques sépticos e hemorrágicos, sendo necessário o uso de animais vasoativas.

2 – Disfunção respiratória: há aumento de trabalho respiratório, insuficiência respiratória, edema pulmonar cardiogênico ou não cardiogênico, surgindo à necessidade de suporte ventilatório, mecânico.

3 – Disfunção renal: comprometida pelo choque circulatório, pode levar à necrose tubular, aguda. O uso de drogas nefrotóxicas, contrastes radiológicos e a rabdomiólise aumentam a probabilidade de insuficiência renal, aguda, no choque.

4 – Disfunção hepática: a disfunção metabólica inclui prejuízos na atividade depuradora e de síntese embora sendo transitória e desaparecendo rapidamente com a restauração da perfusão. Manifesta-se por elevação dos níveis de bilirrubinas, transaminases e fosfotase alcalina.

5 – Disfunção intestinal: o fluxo sanguíneo esplâncnico é o primeiro a ser desviado para órgãos mais importantes no choque, alterando a permeabilidade intestinal, levando a translocação de bactérias e suas toxinas, contribuindo para a falência orgânica. Manifesta-se por íleo adinâmico, hemorragia do trato gastrintestinal ou diarréia. Outras complicações são a colecistite aguda, alitiásica e, mais raramente, a pancreatite aguda.

6 – Disfunção hematológica: freqüentemente observam-se anormalidades na coagulação, podendo culminar com coagulação intravascular, disseminada (trombocitopenia, anemia hemolítica, microangiopática, diminuição do fibrinogênio e aumento de monômeros de fibrina, além de produtos degradados).


DIAGNÓSTICO DO CHOQUE CIRCULATÓRIO

De acordo com ARAUJO FILHO et al. (1999) os três componentes da fisiologia cardíaca são importantes para o reconhecimento do choque:

1 – Pré-carga: é representada pela capacitância venosa, que contém 80% do volume intravascular e pela volemia circulante, efetiva, na prática clínica, é estimada pela pressão venosa, central, média (pré-carga do ventrículo direito) e pela pressão capilar, pulmonar (pré-carga do ventrículo esquerdo) através do uso de cateter de Swan-Ganz;

2 – Bomba: a contratibilidade cardíaca é que mantém o sistema em atividade, na prática, é mediada pela fração de ejeção ventricular ou débito cardíaco;

3 – Pós-carga: é a resistência vascular sistêmica (periférica).

O diagnóstico precoce do choque e a instituição de medidas terapêuticas interferem diretamente na morbidade e mortalidade dos pacientes. Sendo assim, após a avaliação e tratamento das vias aéreas e da respiração, o passo seguinte é a avaliação cuidadosa das condições circulatórias. Confiar exclusivamente na pressão sistólica, na avaliação é muito arriscado, pois os mecanismos compensatório a mantém em níveis normais até uma perda de 30% da volemia. A atenção deve ser mais dirigida em relação às freqüências cardíacas e respiratória, perfusão cutânea e pressão de pulso (diferença entre a pressão sistólica e diastólica). O rebaixamento do nível de consciência e da diurese também são sinais precoces de choque. A freqüência cardíaca através de drogas como o propanolol e marca-passos. Atletas profissionais, em geral, mantêm freqüência cardíaca baixa, mesmo com perdas volêmicas significativas. A freqüência respiratória está aumentada de modo a combater a acidose metabólica, resultante da hipóxia tecidual, através de alcalose respiratória. A pele é fria e pálida pela vasoconstrição cutânea. A pressão de pulso está diminuída justamente por ação das catecolaminas que aumentam a resistência periférica para compensar a perda volêmica.


CLASSIFICAÇÃO DO CHOQUE, segundo AHA ( 2002)


Hipovolêmico

Pode ser causado pr hemorragias, seqüestros, diarréias e perda cutâneas. É o tipo mais comum nos pacientes traumatizados. Há diminuição da pré-carga. O baixo fluxo sanguíneo leva a hipoxia. Como mecanismo de compensação, temos os aumentos da contratilidade, da resistência vascular sistêmica (RVS) e da freqüência cardíaca.


Obstrutivo

Pode ser causado por tromboembolismo pulmonar (TEP), tamponamento cardíaco, pneumotórax hipertensivo e coarctação da aorta. No TEP, ocorre aumento da resistência ao esvaziamento do ventrículo direito, enquanto que, no tamponamento cardíaco, ocorre uma diminuição do enchimento ventricular. No retorno venoso, levando à diminuição do débito cardíaco. O choque obstrutivo tem como mecanismos compensatórios um aumento da pré-carga, da RVS e da freqüência cardíaca.


Distributivo

Pode ser decorrente de causas neurológicas, como trauma raquimedular, uso de drogas vasodilatadoras, anafilaxia e doenças endócrinas. A vasodilatação ocasiona diminuição da RVS, com diminuição do retorno venoso e do débito cardíaco. Para compensar este estado hemodinâmico, ocorre aumento da contratilidade e da freqüência cardíaca. Nos pacientes em choque, com trauma cranioencefálico, devemos pensar, a princípio, numa causa hipovolêmica.


Séptico

É decorrente de causas infecciosas. Há diminuição da pré-carga pelo grande seqüestro de líquidos, diminuição da pós-carga por vasodilatação e lesão celular direta. Para compensar, ocorre aumento da freqüência cardíaca e do débito cardíaco.


Cardiogênico

Ocorre devido à falência do ventrículo esquerdo por infarto agudo do miocárdio, cardiopatias e arritmias graves.

O choque hemorrágico (hipovolêmico) é a principal causa de choque em pacientes traumatizados. O sangramento pode ser externo, óbvio, no caso de lesões arteriais, venosas e fraturas expostas, como nas fraturas expostas, ou oculto como nas fraturas de bacia hematomas retroperitoneais, intraperitoneais ou intratorácicos. O quadro clínico varia de acordo com a gravidade da perda sanguínea, sendo que esta é dividida em classes para facilitar sua compreensão, embora nem sempre isto seja possível.

O tratamento do choque hemorrágico é mais bem orientado pela resposta individual do que pela classificação descrita. Assim, os mesmos sinais e sintomas utilizados para o diagnóstico são úteis para avaliar sua resposta. A normalização do pulso, pressão de pulso, pressão arterial, débito urinário, freqüência respiratória, da consciência e do equilíbrio ácido-base indicam resposta adequada. A dosagem do ácido láctico é útil na avaliação da perfusão tecidual.

As causas de choque não -hemorrágicas podem ser devidas a: falência miocárdica (cardiogênico), pneumotórax hipertensivo, choque neurogêncio e choque séptico (AHA,2000):

1. Falência Miocárdica (Cardiogênico): pode ocorrer por contusão do miocárdio, tamponamento cardíaco, embolia gasosa, arritmias ou até infarto agudo do miocárdio. O tamponamento cardíaco (TC) é mais comum nas lesões penetrantes de tórax e ocorre quando um determinado volume de sangue, contido no saco pericárdico, inibe a atividade cardíaca. O quadro clínico do TC é de taquicardia, abafamento de bulhas, ingurgitamento das veias do pescoço, hipotensão, aumento da PVC. O tratamento consiste na pericardiocentese e toracotomia de emergência para correção da lesão.

2. Pneumotórax Hipertensivo: desenvolve-se quando há razão unidirecional de ar para o espaço pleura, decorrente de lesão, ou da parede torácica, ou do parênquima pulmonar. O acúmulo de ar é progressivo, levando ao colabamento do pulmão do lado afetado, ao desvio das estruturas do mediastino para o lado oposto, colabamento dos pulmões contralateral, compressão das câmaras cardíacas e impedimento do retorno venoso do coração. O quadro clínico se assemelha ao do TC, quando ocorre do lado esquerdo do tórax, mas, como é mais freqüente, deve-se descartado em primeiro lugar. Ocorre abolição do murmúrio vesicular do lado afetado, desvio da traquéia para lado oposto, estase jugular, hipotensão, taquicardia, enfisema subcutâneo e insuficiência respiratória aguda. O diagnóstico é clínico, nunca radiológico, pois representa uma condição de risco de vida iminente. O tratamento consiste na imediata descompressão torácica através da inserção de agulha de grosso calibre no segundo espaço intercostal, na linha hemiclavicular, de modo a transformá-lo em pneumotórax simples, seguindo-se as drenagens pleurais, convencionais, com tubo de grosso calibre, ao nível da linha do mamilo, anterior á linha axilar média.

3. Choque Neurogênico: as lesões cranianas isoladas não causam choque. Uma lesão medular pode provocar hipotensão com perda do tônus simpátocp. Acentuando a hipovolemia. O quadro clínico é de hipotensão arterial, sem taquicardia e sem vasoconstrição cutânea. O tratamento inicial consiste na reposição volêmica, descartando-se causas hemorrágicas para o choque.

4. Choque Séptico: é mais comum ocorre naqueles pacientes que chegam ao hospital após várias horas do trauma. As causas, em geral, são lesões de vísceras ocas, que causam contaminação da cavidade peritoneal. Pode também ser decorrente de causas clínicas como pneumonia, meningite, coleciste, pancreatite e pielonefrite. O quadro clínico é muito parecido com o choque hemorrágico, sendo que seu tratamento inicial é direcionado à reposição volêmica. A resposta do doente à reposição volêmica inicial é a chave para se determinar à terapêutica subseqüente.




TRATAMENTO DO CHOQUE

Segundo ARAUJO FILHO et al. (1999) a própria definição do choque, como uma redução crítica na perfusão tecidual, por anormalidade do sistema circulatório, já se transforma em instrumento operacional, tanto para o seu diagnóstico quanto para o seu tratamento. Ao se conduzir o tratamento dos pacientes em choque circulatório, as duas prioridades são a rápida avaliação do processo patológico e a obtenção de estabilidade cardiopulmonar. As intervenções sobre esta última baseiam-se na ventilação, infusão e bombeamento.

Para os pacientes traumatizados, o processo de identificação do choque está diretamente relacionado ao mecanismo de lesão. Todos os tipos de choque podem estar presentes no paciente traumatizado. A sistematização do atendimento inicial é fundamental, de modo que o diagnóstico das normalidade e seu tratamento são feitos passo-a-passo, numa seqüência lógica. Além, disso as prioridades são as mesmas para qualquer tipo de choque.

Segundo a AHA (2002) na Unidade de Emergência do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo, as disciplina de Cirurgia de Urgência e de Terapia Intensiva do Departamento de Cirurgia, Ortopedia e Traumatologia seguem as normas do Comitê de Trauma do Colégio Americano de Cirurgiões, através do manual do Advanced Trauma Life Support – ATLS. Da-se prioridades ao ABC onde a letra A (do ingles airwy) corresponde ao acesso às vias aéreas, de modo a mantê-las prévias e protegidas contra obstrução por corpos estranhos e queda da língua, aspiração brônquica de conteúdo gástrico, sangue, agregamentos de dentes, etc. A letra B corresponde à respiração do (inglês breathing). A ventilação e oxigenação são mantidas através de altos fluxos de oxigênio, fornecendo altas concentrações de O2 no ar inspirado. A ventilação mecânica é instituída quando a ventilação por máscara não é suficiente. O suporte ventilatório mecânico reduz as necessidades metabólicas por reduzir o trabalho respiratório do paciente, permitindo a redistribuição do fluxo sanguíneo para áreas hipoperfundidas,. Os sinais mais claros de insuficiência respiratória são a taquipnéia e a respiração superficial, com batimento de asas do nariz. Além disso, as medidas dos gases arteriais podem orientar a conduta (de modo geral, indica-se intubação endotraqueal, quando a PaO2 < 50 mmHg mesmo com máscara de O2 ou PaCO2 > 50 mmHg). O pneumotórax hipertensivo compromete tanto a ventilação quanto o sistema circulatório. Entretanto as dificuldades de ventilação e oxigenação pelas alterações da mecânica respiratória coloca a vida do paciente em risco, de modo mais rápido do que a falta de um volume circulante efetivo. Assim, o tratamento consiste, inicialmente, na drenagem pleural imediata, seguida ou não de reposição volêmica, agressiva. Em seguida, dá-se prioridade à letra C que corresponde à manutenção da circulação. A hipovolemia grave está presente na grande maioria com causas clínicas e cirúrgicas de choque circulatório e em até um terço dos pacientes com infarto agudo do miocárdio e hipoperfusão. Conseqüentemente, a rápida infusão de líquido é necessária para expandir o volume intravascular e restaurar o retorno venoso. A terapia com líquido esta em relação direta com os parâmetros específicos do desempenho circulatório restaurado como a freqüência cardíaca, pressão arterial, pressão venosa, central (PVC), débito cardíaco (DC), diurese e depuração do lactato arterial. A medida da PVC permite estimar a pressão de enchimento do ventrículo direito (VD), constitui-se numa maneira prática, rápida e barata de estimar o grau da volemia do paciente e a necessidade ou não do uso de drogas vasoativas. Embora em algumas situações as pressões do VD não sejam o reflexo direto das pressões do ventrículo esquerdo (insuficiência ou estenoses valvulares importantes, embolia pulmonar e aumentos da resistência vascular, pulmonar), o uso da PVC está formalmente indicado nos casos de choque ou hipotensão grave, permitindo a detecção de hipo ou hipervolemia, assim como indícios de falência miocárdica. A cateterização das artérias pulmonar, método mais refinado, através do cateter de Swan-Ganz, fornece informações precisas acerca do débito cardíaco, pressão de enchimento do VE e pressão capilar, pulmonar (PCP). A PCP consiste em variável importante na quantificação da pressão hidrostática e da pré-carga do VE. Entretanto, é uma técnica bastante onerosa, exigindo local apropriado, equipe bem treinada e equipamento de alto custo. As medidas da PVC, através da prova de expansão volêmica, aliadas ao quadro clínico, são úteis na avaliação rápida do estado cardiocirculatório de um paciente grave. A prova de expansão volêmica consiste, inicialmente, na introdução de um cateter central, posicionado, em geral, próximo ao átrio direito através da veia jugular interna ou da subclávia. O valor normal da PVC situa-se entre 8 e 12 cm de água, quando o ponto zero é fixado na linha axilar média, com o paciente calmo, em decúbito dorsal, horizontal e em ventilação espontânea e tranqüila. A prova de expansão volêmica tem por finalidade analisar o papel do miocárdio frente à administração rápida de uma quantidade de volume (em geral 10% da volemia). Infunde-se, pelo cateter venoso, central, cerca de 300 a 500 ml de ringer simples em vinte (20) minutos. Mede-se imediatamente a PVC. As possíveis variações são as relacionadas a seguir.

Situação 1: é a mais freqüente. Geralmente, ocorre no pós-operatório imediato, na desidratação leve e em hemorragias de classe I. A PVC e a diurese se normalizam.

Situação 2: as perdas líquidas são maiores, de modo que há necessidade de infusão de quantidade adicionais de líquidos após o teste, a fim de restabelecer o estado hemodinâmico. Caso haja demora no retorno da diurese, pode-se a partir daí, utilizar diuréticos de ação rápida, como o furosemide. Caso a demora se prolongue, pode ser útil a utilização de dopamina em doses diuréticas.

Situação 3: é característica das hemorragias traumáticas de classe III e IV, onde o tempo para restabelecimento dos parâmetros hemodinâmico é maior e com necessidade de utilização de hemoderivados. A partir da normalização da PVC é que se pode pensar na utilização de diuréticos e aminas vasoativas.

Situação 4: ocorre ascensão rápida da PVC (5 a 7 cm acima do valor basal) devido ao comprometimento miocárdico com necessidade precoce de diuréticos e aminas vasoativas (dopamina, dobutamina), a fim de melhorar as condições hemodinâmicas.

Situação 5: é a situação mais grave, onde o componente cardiogênico exerce papel fundamental, e, se não tratado de forma adequada, evolui para choque irreversível. A PVC inicial já se encontra em níveis elevados (acima de 12 cm de água). A reposição volêmica deve ser feita com muita cautela e o uso de aminas simpatomiméticas, mais notadamente a dobutamina, é monitorização hemodinâmica, invasiva.

No atendimento inicial ao paciente traumatizado, inicia-se a infusão rápida no adulto, de um a dois litros e, na criança, de 20 ml/kg de peso corporal de cristalóide (soro fisiológico a 0,9% ou ringer lactato). A resposta hemodinâmica norteia o passo seguinte. Se não houver melhora, repete-se o passo anterior. Persistindo a instabilidade hemodinâmica,já está, indicada a reposição com concentrado de hemácias, de preferência tipo específico, ou em condições de emergência, tipo O negativo. O controle do choque hemorrágico é feito através da restauração rápida da volemia concomitantemente ao combate do foco de sangramento. Para os casos com resposta à reposição, a necessidade de cirurgia torna-se mais provável para o controle do foco hemorrágico.

Nos pacientes com choque cardiogênico ou séptico, ou naqueles com doenças cardíaca subjacente, a monitorização hemodinâmica, invasiva, com cateterização da artéria pulmonar deve ser empregada. A escolha do líquido a ser infundido ainda é controvertida. Tanto as soluções cristalóides quanto as colóides devem ser utilizadas para restaurar a volemia, além de sangue e seus derivados, quando necessários. De modo geral, é necessária a administração de grandes quantidades de líquidos, via intravenosa, para os casos de choque, sendo bem tolerada quando a permeabilidade vascular está mantida. Entretanto, em situações de aumento da permeabilidade capilar, como no trauma, sepse e reação anafilática, a infusão de líquido acarreta um edema intersticial que pode afetar algumas funções orgânicas, como: edema cerebral com alterações neurológicas, edema pulmonar com alteração das trocas gasosas, edema intestinal com alteração na absorção de nutrientes e translocação bacteriana, edema de partes moles, favorecendo lesões superficiais, com dificuldade de cicatrização. Os colóides podem reduzir o risco de edema pulmonar, pela manutenção da pressão coloidosmótica, plasmática, durante a reposição volêmica. Os preparados com soluções colóides e solução salina hipertônica também estão sendo empregados. A hipernatremia, hipertonicidade e maior custo são hipernatremia, hipertonicidade e o maior custo são os principais riscos e desvantagens do seu uso. Os cirtalóides também são eficazes, mais baratos, mas levam a hemodiluição, comprometendo substancialmente a oferta global de oxigênio sistêmico, se o débito cardíaco não estiver significativamente aumentado pela melhora da pré-carga. Em geral, procura-se manter o hemotócrito em 30% e a taxa de hemoglobina em 10 g/dl. Os mais jovens, geralmente, têm condições de suportar taxas menores (até 5 a 7 g/dl), seguindo a tendência mundial de evitar expô-los ao riscos das transfusões sanguíneas (POTTER & PERRY,2002).

A seguir, os tipos de soluções disponíveis para reposição volêmica (AHA,2002).


CRISTALÓIDES

São soluções pouco onerosas e facilmente acessíveis. A mais utilizadas são o ringer lactato e o soro fisiológico a 0,9%. Estas soluções se equilibram livremente entre os espaços intravascular e intersticial, sendo eficazes em expandir ambos os compartimentos. Seu efeito hemodinâmico é máximo ao final da infusão, mas tem curta duração. Após a infusão destas soluções, a expansão plasmática é da ordem de 25%. Evidências atuais indicam que a ressuscitação com cristalóides está associada a reduções na pressão coloidosmótica e, em alguns casos, ao edema pulmonar, sistêmico e cerebral. A ressuscitação com colóides, que mantêm pressão coloidosmótica, parece não predispor à formação de edema. Mitchell et al. em 1992, descreveram, em pacientes críticos, uma correlação negativa entre a sobrevida e o balanço hídrico positivo. A manutenção da estabilidade hemodinâmica requer duas a seis vezes o volume de cristalóides, quando comparados ao de colóides. Os cristalóides são as soluções mais utilizadas para a reanimação inicial do choque hemorrágico, de acordo com as normas do ATLS.


SOLUÇÕES SALINAS HIPERTÔNICAS

Recentemente, tem-se discutido muito o uso de solução salina, hipertônica, a 7,5%, isolada ou associada ao colóide dextran 70. Estas soluções exercem pressão osmótica importante na membrana celular, com redistribuição do fluido intracelular para o compartimento extracelular. As soluções salinas hipertônicas têm sido indicada na ressuscitação pré-hospitalar do choque hemorrágico devido a sua capacidade superior expandir o volume sanguíneo, elevar a pressão arterial e o débito cardíaco com volumes pequenos, cujo efeito é praticamente instantâneo, com duração de até quatro horas. Entretanto, alguns estudos têm demonstrado piora dos parâmetros hemodinâmicos e maior mortalidade quando este tipo de solução é utilizada em hemorragias ,sem controle do foco hemorrágico. Parece haver efeito benéfico sobre a pressão intracraniana nos pacientes com choque e trauma cranioencefálico, quando comparado ao uso de ringer lactato. A sua principal desvantagem é o risco de hipernatremia e hiperosmolaridade. Apesar das suas aparentes vantagens, as soluções salinas, hipertônicas não devem se utilizadas como opção de rotina no tratamento do choque.



COLÓIDES

Existem muitas suspensões coloidais disponíveis, com variedade no tamanho das moléculas, meia-vida, pressão coloidosmótica, efeitos colaterais e custo. Os agentes coloidais mais comumente utilizados para reposição volêmica incluem a albumina humana, o dextran, o hidroxietilamido (HES) e o penta-amido.


O PLASMA FRESCO CONGELADO (PFC)

Não é recomendado para reposição volêmica, segundo normas de consenso norte-americanas. O PFC foi descrito como o hemoderivado mais utilizado de maneira incorreta (aproximadamente 90% dos casos). Indicações inaceitáveis são o seu uso como expansor de volume, fonte de imunoglobulina, exceto em raras circunstância, fonte de nutrição ou de fibronectina. Indicações aceitáveis incluem o tratamento de defeitos da coagulação pós- reposição e tratamento da intoxicação por warfarin, com risco de vida. Além disso, o PFC é caro, tem poder oncótico igual ou menor que as soluções descritas anteriormente e tem o risco de transmissão de doenças como citomegalovírus, SIDA e hepatite.


ALBUMINA

É responsável por 60 a 80% da pressão oncótica, plasmática, normal. É cara por ser derivada de um “pool” de plasma humano. Seus níveis estão mais relacionados a fatores prognósticos do que à necessidade de mantê-lo em níveis adequados através da infusão de albumina exógena. Pode ser utilizada a 5 e 25% e está indicada, principalmente, quando há risco de distúrbios da coagulação, onde o uso dos outros colóides pode desencadear coagulopatias.


DEXTRAN

É um agente coloidal, polidesiperso, preparado a partir de polímeros. Comercialmente existem dois produtos: dextran 40 e o 70. O dextran 40 é preparado sob a forma de solução hiperoncótica a 10%, com peso médio de suas moléculas de 40.000 dáltons, tendo meia-vida curta, porque muitas de suas moléculas são pequenas. O efeito hiperoncótico produz uma expansão inicial do volume intravascular, que é maior que o volume administrado. O dextran 70 é um colóide polidisperso, com média ponderada de pesos moleculares de 70.000 dáltons. Tem um tempo de retenção vascular maior que o dextran 40. Ambos os dextrans podem melhorar a circulação microvascular por diminuir a viscosidade sanguínea e minimizar a agregação de plaquetas e hemácias.
Entretanto, podem causar sangramentos pelos mesmo mecanismo e estão associados a 0,03 a 0,07% de anafilaxia. Para evitar estes efeitos adversos, recomenda-se não ultrapassar o volume de 1,5g/kg/dia (1500 ml/dia).


HETAMIDO (HES – HIDROXYETYL STARCH OU HIDROXIETILAMIDO)

É um amido natural de polímeros de glicose derivados da amilopectina. É composto por moléculas com media ponderada de 45.000 dáltons, tendo uma meia-vida plasmática de aproximadamente dezessete (17) dias e pressão oncótica de 28mmHg. Está disponível em solução a 6% e 10%, sendo que sua degradação produz produtos que são excretados pela urina e fezes. Os efeitos adversos do HES são similares aos de outros colóides e incluem possíveis reações anafiláctódes, precipitação de insuficiência cardíaca, congestiva u insuficiência renal e alterações da coagulação. É difícil recomendar a dosagem máxima segura, pois a resposta de cada paciente é variável e as doses recomendadas pelo fabricante de 33 ml/dia para o HES 10% e 20 ml/kg/dia para HES 6% não são suportadas por dados publicados. Entretanto, é alternativa ao uso da albumina como expansor volêmico, em várias situações clínicas e com menor custo.


PENTAAMIDO

É uma formulação única recente do HES, com média ponderada de pesos moleculares de 280.000 dáltons, com meia-vida plasmática de dez (10) horas e pressão oncótica de 40 mmHg. O penta-amido produz um grau maior de expansão do volume intravascular do que o HES ou albumina devido à sua maior pressão oncótica. Apresenta, também, possíveis efeitos adversos semelhantes ao HES, porém, em geral, menos extensos.


GELATINA

Devido à sua diferença insignificante de capacidade de expansão volêmica, quando comparada aos cristalóides e aos potencias riscos de reações anafiláticas, não são mais utilizadas em países desenvolvidos.

A monitorização eletrocardigráfica pode mostrar arritmias que deve ser tratadas rapidamente através de tratamento farmacológico e, dependendo do aparecimento de instabilidade hemodinâmica, através de cardioversão. As bradiarritimias, que não respondem ao uso de atropina ou isoproterenol, necessitam de estimulação endocavitária temporária.


A função cardíaca inadequada e a hipoperfusão persistente, após reposição da volemia, podem ser tratadas com o uso de aminas vasoativas. Entretanto o uso excessivo pode afetar de forma adversa o metabolismo do oxigênio sistêmico, do miocárdio e a perfusão tecidual. Não há regras nem doses uniformes para o seu uso. No entanto, é consenso que seu uso só se torna benéfico após restauração da volemia, sendo que a dose deve ser ajustada para cada caso, começando-se a infundir sempre a menor dose possível, de modo a diminuir seus efeitos indesejáveis. As principais drogas utilizadas a dobutamina, dopamina e noradrenalina além das drogas vasodilatadoras. A dopamina entre 2 e 5 mg/kg/min é empregada isoladamente ou em combinação com outros inotrópicos para aumentar a perfusão renal e estimular a diurese, podendo atenuar efeitos deletérios de vasoconstritores como a noradrenalina. Provoca, também, vasodilatação mensentérica, coronariana e cerebral. Entre 6 e 25 Mg/kg/min, sua ação é predominantemente beta, causando aumento do débito cardíaco por aumento da freqüência cardíaca do retorno venoso e diminuição da resistência vascular periférica. Em doses ainda maiores, provoca vasoconstrição periférica ainda maior e queda da diurese, com aumento da pressão arterial. Esta indicada em situações de oligúria choque. Como efeitos adversos, têm-se aumento do “shunt” pulmonar com piora da hipoxia, náuseas, vômitos, taquicardias, arritmias ventriculares e angina. A dobutamina está indicada nos casos de choque e insuficiência cardíaca, nas doses entre 5 a 15 Mg/kg/min, causando aumento do débito cardíaco e vasodilatação periférica. Seus efeitos adversos incluem arritmias cardíacas, cefaléias, ansiedade, tremores, hiper ou hipotensão arterial. A noradrenalina é utilizada em doses entre 0,02 a 0,05 Mg/kg/min, provocando vasoconstrição periférica, sendo indicada no choque séptico. Os efeitos adversos são decorrentes da vasoconstrição: queda da diurese, necrose e ulcerações cutâneas e hemorragias cerebrais.

Não Há consenso sobre o uso de bicarbonato de sódio no tratamento do choque com acidose láctica. Estudos recentes demonstram não ocorrer melhora dos parâmetros hemodinâmicos, em pacientes críticos que apresentam acidose metabólica e elevação do ácido láctico (ARAUJO et al.,1999).


CONCLUSÕES

Finalmente o uso de agentes antimicrobianos e intervenções cirúrgicas adequadas devem ser utilizados para os pacientes com choque séptico. A embolia pulmonar maciça deve ser tratada com agentes trombolíticos ou cirurgia. A monitorização hemodinâmica invasiva também é útil na avaliação de parâmetros de oxigenação, otimizando a oferta e a demanda de O2. No doente crítico, a oxigenação sistêmica, adequada é fundamental para a recuperação desses parâmetros. Os cálculos de oxigenação e a calorimetria indireta ajudam a caracterizar a eficiência da oxigenação do sangue e as taxas de transporte e consumo de O2 (VO2) e a taxa de extração de O2 (O2 ER).



REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS


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