ASPECTOS DA PUBLICIDADE NO DIREITO DO CONSUMIDOR

Por WENERSON SOUSA COSTA | 20/06/2018 | Direito

1 DESCRIÇÃO DO CASO

Uma escola Batista divulga publicidade que encerrava com os seguintes dizeres: “Nossa diferença é Jesus!”.
Os pais de Alexandre Velasco matricularam-no na escola e, no contrato a que aderiu, havia cláusula segundo a qual todos os alunos deveriam participar dos procedimentos e cultos da religião professada pela escola. Referida cláusula estava em destaque e dela tomaram imediata ciência os responsáveis por Alexandre Velasco.
Portanto, diante do caso, pode-se formular a seguinte questão: A publicidade veiculada pela escola é abusiva?

2 IDENTIFICAÇÃO E ANÁLISE DO CASO

2.1 Descrições das decisões possíveis

O Case terá como base para avaliação: Direitos básicos do consumidor; Princípios do Direito do Consumidor; Regulação jurídica da publicidade; Proteção contratual do consumidor e Cláusulas abusivas em contratos de consumo:
a- A publicidade veiculada pela escola é abusiva.
b- A publicidade veiculada pela escola não é abusiva.
2.2 Argumentos capazes de fundamentar cada decisão
2.2.1 A publicidade veiculada pela escola é abusiva.

1- O Código de Defesa do Consumidor (Lei 8.078/90) prevê em seu art.36, parágrafo 2º, que dentre outras causas, a publicidade discriminatória de qualquer natureza a caracteriza como abusiva. O dizer ao fim da publicidade “Nossa diferença é Jesus”, caracteriza ato discriminatório em relação a outras religiões de origens não cristãs e indica em seu “diferencial” uma característica, que menospreza outras escolas em relação ao Cristianismo adotado por ela. Portanto a publicidade veiculada afronta as prerrogativas constitucionais do estado laico brasileiro, a liberdade de crença religiosa e o Princípio da dignidade da pessoa humana (CF/88, art.1º, III). Nenhum anúncio pode favorecer ou estimular qualquer espécie de ofensa ou discriminação racial, social, política, religiosa ou de nacionalidade (NUNES, 2015, p.573).
2- Pode-se defender que não é possível a existência de uma cláusula contratual que obriga os alunos da escola a participarem dos ritos religiosos, pois esta fere Direitos Fundamentais:
O direito fundamental é norma a ser respeitada pelo Estado (eficácia vertical), mas também impõe valores a serem respeitados nas relações entre dois iguais, dois privados (eficácia horizontal). As cláusulas gerais, como normas abertas que são, necessitam de uma concreção utilizando os direitos fundamentais, daí que são vetores da aplicação dos direitos fundamentais. Assim hoje quando se concretiza a boa-fé, não podemos deixar de considerar a dignidade da pessoa humana e os demais direitos fundamentais (MARQUES, 2015, p.256).
A nova concepção social dos contratos e o CDC, apontam limites em relação a autonomia da vontade, pois o intervencionismo do Estado nas relações contratuais tem como objetivo principal resguardar a sua função social.
A nova concepção de contrato é uma concepção social deste instrumento jurídico, para a qual não só o momento da manifestação da vontade (consenso) importa, mas onde também e principalmente os efeitos do contrato na sociedade serão levados em conta e onde a condição social e econômica das pessoas nele envolvidas ganha em importância (MARQUES, 2015, p.210).
A educação é direito fundamental do menor e de forma alguma pode oferecer cláusulas que venham a ferir direitos. As sanções a essas cláusulas serão vistas a seguir.
3- O fato de a cláusula vir em destaque obedecendo ao parágrafo 4º do art.54, sofrerá grandes limitações, não impedindo assim a caracterização de abusividade:
[...] Cumpre observar que a interpretação literal do parágrafo 4º do art. 54 reduz substancialmente o seu alcance. O CDC constitui-se de normas de “ordem pública e interesse social” (art.1º), que, portanto, não podem licitamente ser afastadas ou
limitadas por vontade das partes. A limitação a direito do consumidor só é possível excepcionalmente, quando o próprio código assim estabelece [...] (BESSA, 2008, p.289).
Deste modo, apesar do contrato evidenciar de maneira clara, tais condições, é perceptível a presença de cláusula abusiva referente a obrigatoriedade de participação dos alunos nos ritos religiosos, o que fere a liberdade de crença e religião e consequentemente o princípio da dignidade da pessoa humana.
A tendência contemporânea de privilegiar os Direitos Fundamentais e Humanos em detrimento da simples autonomia da vontade permite inclusive a participação mais ativa do Poder Judiciário, que a partir do CDC e o princípio da boa-fé, em seu art.47, parte da interpretação do contrato em favor do consumidor.
Portanto, no caso em questão, há a possibilidade, de sanção contratual para que possa haver a conservação do negócio jurídico, pois se trata de fornecimento de serviço educacional, direito fundamental do menor:
A sanção, portanto, é negar efeito unicamente para a cláusula abusiva, preservando-se em princípio, o contrato, salvo se a ausência da cláusula desestruturar a relação contratual, gerando ônus excessivo a qualquer das partes. Cuida-se do princípio da conservação do contrato. O magistrado, portanto, após excluir o efeito da cláusula abusiva, deve verificar se o contrato mantém condições- sem a cláusula- de cumprir sua função socioeconômica ou, ao contrário, se a nulidade da cláusula irá contaminar e invalidar todo o negócio jurídico (BESSA, 2008, p.293).
O objetivo é promover a garantia de direitos fundamentais nos contratos de adesão de forma a evitar abusos e proporcionar o equilíbrio nas relações jurídicas através do princípio da boa-fé, não apenas com um dever de informar qualificado, mas também de um conteúdo que atenda as prerrogativas constitucionais.

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