AS VINHAS DA IRA: LITERATURA, HISTÓRIA E GÊNERO

Por Luis Carlos Borges dos Santos | 07/12/2010 | História

AS VINHAS DA IRA: LITERATURA, HISTÓRIA E GÊNERO

Karolyna Cristane.
Luís Carlos Borges dos Santos.
Marcos Antonio dos Santos
Tainá Nunes

RESUMO: O presente artigo tem por objetivo analisar o livro As Vinhas da Ira, escrito por John Steinbeck e publicado em 1939. Tal romance, ambientado no período da grande crise de 1929, estrutura sua narrativa em torno da migração de colonos agrícolas norte-americanos da região de Oklahoma para a Califórnia. Além disso, nos propomos destacar as relações de Gênero presentes na obra.
PALAVRAS-CHAVE: As Vinhas da Ira. Crise de 1929. Relações de Gênero


ABSTRACT: This article aims to analyze the book The Grapes of Wrath, by John Steinbeck and published in 1939. This novel, set during the great crisis of 1929, its narrative structure around the migration of settlers from the U.S. agricultural region of Oklahoma to California. Furthermore, we propose to highlight gender relations in the present work.
KEYWORDS: The Grapes of Wrath. Crisis of 1929. Gender Relations.




O presente artigo tem por objetivo analisar o livro As Vinhas da Ira, escrito por John Steinbeck e publicado em 1939, abordando os aspectos políticos, econômicos e sociais. Tal romance, ambientado no período da grande crise de 1929, estrutura sua narrativa em torno da migração de colonos agrícolas norte-americanos da região de Oklahoma para a Califórnia. Além disso, nos propomos destacar as relações de Gênero presente na obra. O aspecto que pretendemos abordar, diz respeito às relações entre homens e mulheres, especificamente, no contexto histórico-social da obra supracitada, consideramos pertinente e indispensável à utilização de uma categoria de análise social que vem tomando espaço nos debates atuais acerca das ações sociais entre os sexos: o conceito de Gênero .

Para Poggi (2008, p. 29) "[...] O crescimento econômico astronômico vivenciado pelos EUA, desde o alvorecer do século XIX propiciou, para alguns, naturalmente, uma enorme euforia social, marcando os anos 1920 como anos de prosperidade inigualável no imaginário social", porém, nem todos estavam sentindo esses benefícios econômicos. É o caso dos agricultores, que viviam de subsistência e a maioria deles composto por aproximadamente oito milhões e meio de camponeses sulistas vivendo como arrendatários em fazendas de algodão .

E para piorar a situação, segundo Sellers (1990, p. 328), "em 1934, a pior seca da história da nação ameaçou transformar o excesso em carência. Milhares de meeiros e arrendatários foram expulsos da terra e ficaram na miséria".
A seca assolava o território norte-americano de Oklahoma. Homens e mulheres estavam apreensivos em busca de alguma solução: os homens procuravam alguma resposta e as mulheres esperavam deles alguma atitude.

A partir desta realidade podemos expor a dimensão política de tal contexto histórico. Para isso, cabe-nos definir o que entendemos por política.
Entendemos política como uma prática, entre as diferentes práticas, como a econômica, que transforma a natureza em valor de uso; a científica, que transforma conhecimento em ciência. A prática política é entendida, pois, como uma ação humana intencional, que transforma (produz e reproduz) relações sociais . Política é o conceito que usamos quando discutimos interações, em que aspectos políticos são intencionalmente desejados pelos atores sociais.

Podem existir vários tipos de prática política, dependendo do tipo de relação social. A prática política de gênero, produz e reproduz relações de gênero; de educação, produz e reproduz relações educacionais, como entre professores e alunos. Finalmente a prática política como tal, que produz e reproduz relações sociais, que podem ser de dominação ou não, dentro do que se costuma chamar de "esfera pública", que seria o palco específico da política, onde se situa o sistema política, e especialmente o estado (GUARESCHI, 1997, p. 53).

O drama social vivido pelos trabalhadores itinerantes apresentados no romance As Vinhas da Ira é um bom exemplo de prática política caracterizada pela expropriação da condição de cidadania e dignidade humana, pautada pelo esvaziamento do papel do Estado na garantia dos direitos fundamentais. Os acampamentos do governo acabam por ser converter em uma arma fantástica para esconder as relações de dominação e exploração a que são submetidos os colonos.

Dentro deste contexto de crise, encontramos a família Joad. Estes eram arrendatários de terras e meeiros e estavam sofrendo com as transformações geradas pela crise de 1929. Clouhg e Marburg (1969, p. 121), destacam que os arrendatários "geralmente possuem um contrato que prevê o pagamento do aluguel em forma de uma parcela da colheita ou em dinheiro", mas esta situação já não era mais possível, pois a terra já não era tão produtiva. Para Poggi (2008), "os excedentes rurais tornavam-se crônicos, fazendo baixar os preços dos produtos agrícolas e com eles o nível de vida das camadas rurais. Era o início do endividamento de milhares de famílias como a de Tom Joad". E mais, segundo a autora "o endividamento longe de atingir apenas grandes produtores, afetara muito mais o pequeno produtor", porque este fazia empréstimo tentando se manter no mercado, perdendo muitas vezes suas terras para outros fazendeiros e, principalmente, para os bancos.

Nestas terras, os donos chegavam às plantações ou mandavam alguém no lugar deles para analisarem a qualidade do solo, pegavam pequenos torrões de terra, outras vezes, traziam consigo enormes escavadeiras, enquanto isso os meeiros "contestavam" sob a vigilância das mulheres. Alguns proprietários eram mais afáveis, outros mais cruéis, mas todos se viam presos aos algarismos. Muitas vezes os proprietários de terras eram bancos ou companhias, os quais mandavam representantes para negociarem as propriedades, impondo suas condições, como se as empresas tivessem vida própria. Os representantes justificavam suas ações explicando aos arrendatários que as terras estavam pobres, secas e que não davam mais nada. Os meeiros apenas consentiam, já era tarde demais para tomar alguma providência.

[...] E, sentados em seus carros, explicavam tudo isso aos arrendatários dizendo: vocês sabem, estas terras estão pobres, não dão mais nada; vocês já as revolveram bastante e agora não dão mais nada, Deus sabe disso?

E os meeiros acocorados no chão meneavam com a cabeça em sinal de assentimento e concordavam [...] Sim senhor eles sabiam. As terras não dão mais nada [...] (STEINBECK, 2009, p. 40).

Os representantes das grandes empresas explicavam aos meeiros que uma pessoa podia ficar na terra enquanto sua situação se mantinha regular, pagando impostos, produzindo, tendo o que comer, até que um dia as safras falham e se tinha que recorrer aos empréstimos aos bancos. O banco ou uma companhia vivem disso, de lucros e juros. Os arrendatários tentavam negociar, com alguma esperança de que se pudessem ficar mais um tempo nas terras, porém os representantes eram bem claros que não podiam negociar, pois o banco tinha de receber logo o dinheiro, os juros não iriam parar de subir. Citam as empresas como se fossem grandes monstros que se alimentam de lucros e juros.

Não, nós não podemos nos fiar nisso. O banco, esse monstro, tem que receber logo o seu dinheiro. Não pode esperar mais; senão, morre, Não, os juros não param de subir. Quando o monstro pára de crescer, morre. O mostro não pode ficar sempre do mesmo tamanho (ibidem, p. 41).

Nesta situação os meeiros não tinham outra alternativa, estavam na miséria, as crianças com fome, sem roupas, as mulheres permaneciam caladas diante de tal realidade. O sistema de arrendamentos não estava mais dando certo, um homem só guiando um trator podia tomar conta do lugar de várias famílias, pagavam-lhes um salário e se obtinha toda a colheita. Sendo assim os pequenos proprietários se viam obrigados a se retirarem de suas terras, sem ter para onde ir, sem ter o que comer, ou algum dinheiro. As terras já não lhes pertenciam mais, viam-se obrigados a começar a sua vida em outro lugar, como explica Clouhg e Marburg:

Alguns desses arrendatários eram meeiros de algodão combalidos pela pobreza, mas parecia que a maquinaria aperfeiçoada estava levando à eliminação das pequenas glebas de arrendamento no cultivo do algodão, transformando-se os antigos arrendatários em mão-de-obra assalariada ou em migração para a cidade (CLOUHG e MARBURG, 1969, p. 122).

O trator, assim, surge como a nova tecnologia, substituindo o trabalho de várias famílias. Um homem só pilotando a máquina poderia fazer o trabalho de vários. A máquina era vista como um monstro, e o homem que a pilotava era visto como parte integrante do monstro. Muitos pilotos de tratores eram pessoas daquela terra, e mesmo sabendo que muitas famílias iriam passar fome por causa dos seus três dólares, eles não se importavam, afinal, o que se havia de fazer? Ele tinha que pensar em sua família. Não se podia mais viver da terra, a não ser que se tivessem muitos hectares e um trator. A lavoura não era mais para "pobretões". Não restava alternativa, de qualquer forma o trator iria passar por cima de suas terras e derrubar a sua casa, dando lugar a imensas plantações de algodão.

O trator industrial deu lugar a uma revolução agrícola. O trator forçou um maior investimento de capital em maquinaria agrícola, porque as antigas máquinas de tração animal não se lhe adaptavam, e, para ser lucrativo, havia necessidade de usá-lo intensivamente e de ter, como sobressalente, grande variedade de equipamentos para cumprir todos os tipos de tarefas. A grande inversão de capital representada pela nova maquinaria exigia por turno grandes fazendas, com grandes negócios que tornassem possível a amortização. (ibidem, p. 109).

Dentro desta nova lógica, estas famílias já não tinham mais espaço para produzir em pequena quantidade. Restava-lhes apenas migrar para algum lugar que lhes desse trabalho e uma melhor condição de vida. A família Joad, assim como tantas outras, preparavam-se para uma grande viagem rumo ao Oeste. Via-se no Oeste, na Califórnia, uma possibilidade de mudança de condição de vida, ou seja, uma oportunidade de trabalhar e conseguir juntar dinheiro. No entanto, tal perspectiva se configurou em frustração, pois as pessoas no Oeste vivam em péssimas condições, trabalhando por salários baixíssimos.

- [...] Eu conheci um sujeito que era lá da Califórnia. [...] E então ele disse que tem muita gente procurando trabalho lá na terra dele. E diss?que o pessoal que trabalha nas safras de frutas vive em lugares imundos e nem tem o que comer direito. Os salários são muito baixos, e assim mesmo é bem difícil arranjar trabalho (op. cit., p. 113).

As casas no campo foram abandonadas, e consequentemente os campos também. O que se via de vida agora eram apenas os tratores. Não se tem mais a ligação do homem com a terra, o motorista do trator não tem vínculo nenhum com o local, não sente amor pela terra, muito menos a ligação do homem com ela. Ele simplesmente sai arando, e no final do dia volta para a sua casa, casa que não tem nada a ver com a terra. Neste período a instabilidade econômica de certa forma afeta a figura do provedor da família, deixando-o enfraquecido no sentido de manter a condição básica necessária para a sobrevivência.

A obra de Steinbeck configura fortemente o papel do Patriarcado . Com o enfraquecimento "subjetivo" da figura do homem como provedor, logo o autor entrega a responsabilidade para Sra. Joad, mulher de personalidade forte que vai guiar a família pelos caminhos tortuosos da grande depressão.
É neste momento de crise que a família Joad, irá rever seus conceitos patriarcais, para dar lugar às novas interpretações acerca das estruturas sociais, sobretudo na questão paterna que perde espaço para a figura materna. O personagem que esboça essas novas manifestações não pertence à família, partindo de uma análise de fora do contexto familiar, esta figura está relacionada no ex-pastor o senhor Casy, onde o mesmo mantém um diálogo com a matriarca, de forma que fica evidente as relações de submissão da mulher em relação ao homem:

Deixe-que eu salgue esta carne-falou. - Eu sei fazer isso. E a senhora tem outras ocupações. Ela lançou um olhar singular ao pregador, como se este tivesse sugerido.
Algo extraordinário. - Não, isso é trabalho de mulher ? disse, afinal. - É trabalho ? replicou o pregador. ? temos muito que fazer para estar fazendo diferença entre trabalho de homem e de mulher (ibidem, p. 113).

Sabe-se que uma das questões que permeia a sociedade atual diz respeito ao papel das mulheres no mundo do trabalho e a nova configuração social acarretada por essas mudanças, que ocorreram, sobretudo, a partir do século XX. Se antes as mulheres tinham seu papel de fragilidade e submissão ao homem bem definido, hoje ? embora o sexismo ainda permaneça ? muitos desses paradigmas preconceituosos foram quebrados .

No Brasil, muitas das raízes históricas imbuídas em nosso imaginário estão diretamente atribuídas às concepções positivistas do século XIX e que penduraram fortemente até meados do século XX. Nessa concepção, as mulheres tinham o dever de formar as estruturas familiares, o seu papel seria através do seu afeto, estabelecer o princípio de amor no berço familiar. As atribuições que essa sociedade encarregou às mulheres levaram-na a responsabilidade de moralizar a família, sendo à base da estruturação da vida familiar na qual será exemplo de mãe, esposa e filha, e se responsabilizará pelo início de educação dos filhos e pela vigilância constante do comportamento masculino. Na obra As Vinhas da Ira as questões de gênero não foge muito das concepções patriarcais presente na formação social do Brasil no início do século XX.

O papel biológico da mulher é uma construção cultural, uma vez que ninguém nasce mulher, mas se torna mulher (BEAUVOIR, 1989, p. 5), as personagens femininas na obra são bem caracterizadas se mostrando bastante evidentes:
- Mãe, que é que a gente vai levar daqui da cozinha? - perguntou Tom.
Ela olhou rapidamente em volta.
- O balde - disse. - Tudo o que for preciso para comer: pratos, copos, colheres,
garfos e facas. Põe tudo na gaveta e leva-a para o caminhão. E também aquela frigideira, a chaleira e a cafeteira. E, quando a grelha esfriar, tira-a do fogão. Podemos precisar dela, quando fizermos carne assada. Por mim, também levava a tina, mas acho que já não há lugar. Vou ter de lavar a roupa no balde. As outras coisas nem vale a pena levá-las. Pode-se cozinhar coisas pequenas em vasilhas grandes, mas não se pode cozinhar coisas grandes em vasilhas pequenas.

O que convém é levar todas as formas do pão. Cabem umas dentro das outras. - Ficou parada, a olhar demoradamente a cozinha. - Bom, Tom, traz as coisas que te disse. Eu vou ver o resto, a lata grande da pimenta, o sal, a noz-moscada e o ralador. Pegou numa lanterna e caminhou pesadamente para o quarto de dormir; os seus pés nus não produziam som algum ao pisar o chão. (ibidem, p. 114).

Neste momento observa-se muito a presença da mãe, como a organizadora central da família deixando em segundo plano a figura do pai. No entanto, a luta pela libertação do sexo feminino só tomou forma organizada, coletiva e política, nos movimentos feministas que surgem no século XIX. Aparecem, sobretudo, na Europa e nos EUA, movimentos organizados por mulheres para reivindicar seus direitos . De modo geral, os movimentos feministas do século XX, mais propriamente os da década de 1970, representam apenas um estopim de um longo processo histórico, marcado pela opressão feminina.

A divisão sexual do trabalho e a distribuição do poder e do prestígio a ela associada, é, portanto, uma construção sócio-cultural que afirma e justifica a presença de pré-conceitos em nome de uma inferioridade biológica. Porém, apesar da eficácia das ideologias que naturalizam estes preconceitos, as mulheres estão cada vez mais suprindo as necessidades de suas famílias com o trabalho; lutar contra estas ideias estabelecidas de inferioridade é louvável, pois é nesse momento que haverá a desconstrução dos preconceitos vindo de longa data. A presença personificada na mulher trabalhadora e guerreira que o autor destaca ficam evidenciadas nesta colocação:

- As mulheres andam sempre cansadas - disse Tom. - São assim mesmo. Só não se cansam quando estão no culto. - Sim, mas ela está demasiado cansada. Como se estivesse doente até. A mãe ainda não tinha fechado a porta atrás de si, por isso, ouvira aquelas palavras. Lentamente, o relaxamento dos músculos das suas faces sumiu-se, para dar lugar à antiga expressão de energia. (idem, p. 114).

Na obra fica em aberto às manifestações acerca da redução da figura do homem como o provedor da família. Uma vez que a sexualidade e trabalho são pólos dinâmicos da atual luta das mulheres, estes estão intrinsecamente relacionados, se família e sociedade contam com o trabalho produtivo das mulheres, uma vez que estas desejam viver plenamente sua sexualidade, são desde cedo confrontada com a maternidade e casamento.

Para Albornoz (1985, p.16), a questão da mulher está voltada para um estereótipo que a sociedade criou, "toda a propaganda é construída sobre a afirmação de que o destino ?normal? da mulher é o casamento e a maternidade. As que decidem outro caminho precisam vencer essas pressões, que ao longo de sua vida voltarão sob formas disfarçadas". De acordo com a autora, se a mulher assume uma relação permanente e constrói família, o seu trabalho passa a ser problemático, pois a sociedade as responsabiliza pelo cuidado e educação dos filhos. A matriarca da família Joad manifesta suas atitudes igualitárias neste momento, uma vez que o patriarca se sente humilhado por aceitar a participação constante da mulher nas decisões:

Parece que as coisas ?tão mudando ? disse [ele] sarcástico. ? Me lembro do tempo que era o homem que dizia o que se devia fazer. Parece que agora e a mulher que faz isso. Acho que ?ta bem na hora de eu arrumar um pau. Vai, vai buscar um pau. ? disse [Ma Joad]. No dia em que a gente tiver um lugar pra morar, pode ser que tu possas usar esse pau sem que eu reaja. Mas agora tu não fazes coisa nenhuma, não trabalha e nem sequer pensa. Quando tu ?tiver fazendo tudo isso... Aí tu podes meter o pau e tua mulher fica fungando... Mas não agora... Eu também posso arrumar um pau pra desancar em você (ibidem, p. 378).

A sociedade tem colocado as mulheres em situações difíceis, na maioria das vezes em desigualdades de condições, fazendo emergir sentimentos de amargura, insatisfação e limitada autoconfiança. Ser respeitada e valorizada como pessoa e trabalhadora é desejo da maioria. As transformações pelas quais está passando o mundo hodierno exigem uma postura crítica da mulher. Engajar-se no trabalho produtivo, nos seus aspectos positivos, representa segurança, independência e realização pessoal. O trabalho remunerado oferece à mulher a possibilidade de evoluir tanto na esfera pública, quanto individual.
A transmissão da ideologia sexista/machista dominante na sociedade retratada na obra de Steinbeck é, ao mesmo tempo, uma forma de expandir o conceito de "educadas", pois os atributos que a sociedade às impõe, é para corresponder a uma imagem de mulher submissa, passiva e despolitizada, veiculando esta imagem aos princípios machistas, a sociedade estará com a ordem estabelecida.

Na obra, o autor destaca bem essas relações predominantes acerca das estruturas patriarcais já fragilizadas com a depressão. A figura de outro personagem chamado Connie, casado com Rosa de Sharon denuncia bem a relação de dependência da esposa com seu marido, uma vez que as estruturas patriarcais estabelecem para o homem os deveres de lutar, e prover as famílias. O autor coloca nos personagens Connie e Rosa as figuras de dois jovens aventureiros que estão à procura de uma nova vida, que de certa forma não entendem o processo econômico a que estão inseridos. Neste trecho destacam-se os sonhos de Connie e Rosa acerca de uma "vida melhor" na cidade, destacando também a submissão da mulher no seio familiar:

- Eu e o Connie não queremos viver mais no campo - disse a rapariga. - Nós já resolvemos o que iremos fazer.
Uma nuvem de preocupação deslizou pelas faces da mãe. - Então vocês não querem ficar conosco, com a família? - perguntou ela.
- Bem, eu e o Connie já resolvemos tudo. Mãe, nós vamos viver numa cidade. - Continuou excitada:- O Connie vai procurar trabalho numa loja ou talvez numa fábrica. E vai estudar em casa, talvez rádio, para vir a ser um técnico e pode ser que mais tarde até possamos ter uma loja nossa. Assim, a gente até pode ir ao cinema de vez em quando. E o Connie disse que, quando eu tiver a criança, vem o médico a casa, e que, conforme as coisas correrem, até posso ir para um hospital. Depois, a gente há-de ter um automóvel pequeno, já se vê. E, de noite, ele fica a estudar em casa e... Oh! Vai ser tão bom! (ibidem, p. 175).

A questão da industrialização presente neste processo deixa Connie em dúvida em continuar casado com uma esposa que depende totalmente dele ao contrário da matriarca que toma frente nas diversas situações.
A relação com a Matriarca e Rosa está na atitude de ação, a matriarca conduz a sua família com seriedade e segurança, já Rosa sonha em ter uma vida bela e cheia de esplendor. E, diante deste contexto histórico é que, atualmente, se propõe a necessidade de concretizar o término da desigualdade de gêneros (neste caso, entre homens e mulheres). O que passa em As Vinhas da Ira é a falência dessas relações acerca da submissão que o autor acrescenta na matriarca.
Para Joan Scott (1990):

Ideia de masculinidade repousa sobre a repressão necessária de aspectos femininos do potencial bissexual do sujeito e introduz o conflito na oposição do masculino e do feminino. Os desejos reprimidos estão presentes no inconsciente e constituem uma ameaça permanente para a estabilidade de identificação de gênero, negando sua unidade, subvertendo sua necessidade de segurança (SCOTT, 1990, p. 12).

Na obra de Steinbeck a masculinidade enfraquece devido à falta de persistência e determinação acerca dos acontecimentos, ou seja, a figura do paternalismo estava totalmente voltada a terra, uma vez perdida não se construiria de novo. Enquanto que, a figura materna sobressai nos momentos mais difíceis na família Joad, quando a família passa pelos períodos mais árduos de sua travessia. De certa forma, a esperança se manifesta em Rosa, entretanto, esta perde o bebê que por sua vez significava a esperança em uma realidade tão difícil. Em um momento que a morte os perseguia, Rosa decide ajudar um estranho na beira da morte: "O homem esboçou um movimento negativo com a cabeça... Rosa de Sharon desfez-se do cobertor, deixando os seios desnudos. ? Tem que ser ? falou, aproximando-se mais dele, e puxando-lhe a cabeça para si". (op. cit., p. 489). Compreendemos que Steinbeck se utiliza de uma metáfora para significar a esperança brotando no seio da América, representado na citação acima.

Portanto, o romance norte-americano possibilitou um novo entendimento acerca das características existentes na década de 1930. As Vinhas da Ira refere-se a um período bastante conturbado da história política e econômica dos Estados Unidos. No plano econômico, a confiabilidade do sistema capitalista sofreu abalos que culminaram na Grande Depressão, marcado pela especulação, superprodução e super-expansão do crédito, num contexto de baixos salários. A crise de 1929 foi produzida pela superprodução agrícola e industrial, bem como pela especulação financeira nos EUA, ela iniciou com o "crack" da Bolsa de Nova Iorque e expandiu-se pelo mundo, se transformando numa grande depressão.

A recessão econômica, o desemprego em massa e a volta da intervenção do Estado na economia foram suas principais características. A obra As Vinhas Ira dá mostra ao processo histórico acerca dos acontecimentos econômicos, que por sua vez estavam ligados a terra. As relações capitalistas ficam expressamente nítidas no romance, assim como todas as suas contradições, dentre elas, a relação de gênero, que sofre profundas alterações, invertendo a estrutura familiar e a sua organização.

Referências

ALBORNOZ, Suzana. Na condição de mulher. Santa Cruz do Sul: Faculdades Integradas de Santa Cruz do Sul, 1985.

BEAUVOIR, Simone de. O segundo sexo. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1989.

CASTELLS, Manuel. O Poder da Identidade. In: A era da informação: a economia, sociedade e cultura. São Paulo: Paz e Terra, 1999.

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POGGI, Tatiana. Os opositores conservadores do New Deal. In: Revista Eletrônica da ANPHLAC, Goiânia, ANPHLAC, n° 7, 2008, pp. 27-56.

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