As palavras das imagens 5
Por António Lourenço Marques Gonçalves | 15/02/2013 | PoesiasAS PALAVRAS DA IMAGEM 5
AMADO AMATO
Ó meu Amato amado,
A medicina amaste,
E n'ela, bem cerrado,
O Homem, quanto baste! — em Castelo Branco.
UM PINGO DE NATUREZA
Um pingo de natureza
Não necessita sobejo.
Que admirável pureza,
Que graça no que aqui vejo! (ALM) — em Souto da Casa.
Uma imagem rara, ainda que tão repetida da mesma maneira, há tantos séculos! E uma reflexão para quem pode olhar:
FECHOU-SE UM RASGO DE LUZ...
Fechou-se um rasgo de luz
Que foi o tempo da vida.
Foi centelha que traduz
Uma mui ténue medida.
Passou: e a escuridão,
Ei-la, voltou como dantes.
Mas não foi um lume em vão,
Mesmo a luzir por instantes.
Quem viveu deixa memória
Que brilhará de seguida:
E assim se faz a história,
Nunca, nunca concluída.
DEMENTE IMPOSTURA...
Será, sim, um desabafo
Escrito na pedra dura:
Mas digam como me safo
Desta demente impostura? — em Castelo Branco.
A NEVE
Já de tarde, vi ao perto
Esta neve que aqui vês.
Ao longe é céu coberto,
Aqui, ganha nitidez.
O prestável facebook
Liga o amigo ao amigo.
Não uso nenhum truque,
Pois quero é estar contigo. — em Souto da Casa.
A famosa “Colecção de Clássicos Sá da Costa”:
Insisto nas coleções
De livros surpreendentes.
Outrora deram lições;
Hoje, quedam, silentes.
São livros de português,
São textos credenciais:
Camões, Diogo Bernardes
E os “Diálogos” d’Arrais.
O GATO DO ANTÓNIO, LONGE DO DONO
Que pode olhar este gato,
Que será que está a ver?
Garanto que não é rato
Nem é nada de comer. — em Souto da Casa.
O CAPITAL CONTR'Ó TRABALHO, EM CACOFONIA... (ALH'EN!)
O caso é bem demente:
sentenciar-se o trabalho
(não digo que de repente),
a ser servo e cabeçalho
do remédio do bandalho
a que chegou certa gente.
Depois de estar num frangalho
e estatelada de frente
a coisa está bem patente
ser de difícil atalho.
Pergunta: será vivente
alguém preso neste tralho,
indiferente do galho
em que esteja coerente?
Ou então dará o ralho
alguma coisa diferente?
Verdade, penso num malho
capaz de ser o batente
das políticas de tringalho*
vazadas de um tal pingente.
*Tringalho: farrapo.
O Elevador de Sta. Justa, o Carmo e as figuras alegóricas
(Justiça, Prudência, Fortaleza e Moderação):
SONDANDO OS QUATRO VENTOS…
Sondando os quatro ventos,
De todos vem o presságio:
O barco, ora em tormentos,
Sem guia, pende em naufrágio.
GENTIL
(“Que agrada pela delicadeza de sentimentos ou fineza de maneiras" Houaiss (que não faz mal aos animais)
Maria, o que é que dizes,
Por dentro dessas momices?
- Diria, serei feliz,
Se todos forem gentis.” — em Souto da Casa.
PERFIS...
Primeiro, foi hospital;
Ao fundo, a estalagem;
A escola é legal;
O cubo resta selvagem! — em Fundão.
O PAVILHÃO E A NEVE....
No dorso aqui mostrado
Desta casa sobranceira,
A neve cai no telhado
Mas em porta mais cimeira. — em Fundão.
O CONVENTO DE SANTO ANTÓNIO...
O afamado convento
De Sto António é ruína:
Porque será que o lamento
Nunca passou de surdina?
Mais feliz é a colina
Garbosa de ornamento:
Ás portas, silvedo é sina;
Nela brilha o firmamento! — em Fundão.
ANTÓNIO SALVADO
Imagem: óleo "A DOR", de Gil Soeiro
"A dor não é uma flor a dor é uma raiz" (Paul Monette)
".....................................................
Nos meandros da alma, no tremor
do receio, e sem ninguém chamar,
surpresa indesejada: ela penetra,
pequeno roedor silencioso
nos túneis do abismo, e contagia
a claridade do sangue, despoja
a carne calma de qualquer calor,
devassa de repente o equilíbrio
da voz, do sonho, do largo percurso.
Companheira jamais pensada, vem
veloz no débil pequeno intervalo
entre a note e o dia, feita reverso
duma estrela que deixou de brilhar,
e não batendo à porta acinza a casa,
envenena a água, esboroa o pão,
dominando absoluto sobre o cofre
do ser.
Onde a esperança de expulsá-la?
...................................................... ANTÓNIO SALVADO
Um quadrinho encantador comprado na Ponte de Sant'Anjo (em Roma), onde nos miram dez anjos da estatuária de Bernin:
S. PEDRO...
O pintor estava ali,
Recolhido no seu canto.
Foi na ponte de Bernin
No sítio de mais encanto.
O Tbre galgava os arcos
Com águas mansas e claras;
Do alto, oh Anjo, aos barcos
Com o teu voo os amparas!
O Castelo Mausoléu,
Do Santo Anjo chamado,
Tinha-o como um troféu
Do desenho mais cuidado.
Porém, S. Pedro, adiante,
Não lhe poupava esplendor;
E eu, peregrino andante,
Pedi-lhe, desse mais cor.
E o quadro que entrevi
Na pupila do meu olho,
Se o quero lembrar aqui,
É mesmo esse que escolho. — em Roma, Italia.
Quem visita Praga, admira obrigatoriamente este celebérrimo relógio astronómico do século XV, construído por um tal Hanus. É uma parafrenália impressionante de mecanismos, que leva multidões imensas de viajantes a olharem fixamente para o relógio, durante muito tempo, à espera que a Morte toque um sino e inverta o relógio de areia, o que faz de hora a hora:
HANUS
Hanus, o seu construtor,
Que a lenda diz: "ficou cego",
Fez isto com tal fulgor
Que não mais teve sossego!
Tem o espelho da Vaidade,
O saco da Avareza;
Da Morte, tem a verdade,
E da Fé, um turco e presa. — em Praga.
Colhida perto do Seminário do Fundão:
MUROS E HORIZONTES…
Se olho logo de frente
Um muro parece ser.
Mas vendo mais adiante
Há outro transparecer!— em Fundão.
Colhida, com a Estrela em fundo. E uma ambição:
QUE BELA COVA DA BEIRA
Que bela Cova da Beira:
Tem o sol e tem a neve
E muita gente que queira
Dar-lhe força que a eleve! — em Fundão.
NEVE
Neve, que brilhas no monte
Como dentro dos meus olhos!
Tu limpas a terra fonte;
Não tiras os meus escolhos. — em Souto da Casa.
CALENDÁRIO AGRÍCOLA DE Stº ISIDORO DE LEON (MUITO BREVE)
Todos os meses do ano
Dão voltas p'ra não parar.
A vida não tem engano:
Dá voltas, sem mais voltar.
Se os anos passam, enfim,
Neste giro, sem cansar,
Na corda que está em mim,
Não passam sem a gastar.
E porque sei q'ele passa
E porque passa me arrasta,
Não vejo seja desgraça.
A vida deve ser basta
Enquanto vier com graça.
Demais ... seria madrasta! — em Leão (Espanha).
A CORDA DA ROUPA PRESA AO LAMPIÃO...
O lampião está a jeito,
Ajuda a minha intenção:
Para ao sol tirar proveito,
Pedi-lhe me desse a mão!— em Castelo Branco.
“A LIBERDADE CONSISTE EM NÃO USAR RELÓGIO" -SOFOCLETO, S ilogismos
Liberdade sem limite,
Nisso eu não quero crer,
Se p´ra tal não se omite
O mal que a outros fizer.
Pintura de RIBEIRO FARINHA
"O homem passou por aqui..."
Acrílíco s/ tela (1990)
DOR
Dói.
De fora, como vai dentro?
Quem arruma ao sítio em f´rida,
Rodeio, fantasma, centro
Do corpo pior da vida?
Corrói.
Destrói.
Foi?
Boi, boi, boi.
AS NOITES SÃO QUASE BRANCAS...
As noites são quase brancas.
Há quanto tempo? Sem conto.
Ideias livres e francas
Em vez de sonhos. E pronto!
DOS JORNAIS DE HOJE...
É virtude de um partido
(Político, vão entender!)
Dar ares de destemido
P'ra tudo poder fazer!
Discorda, com fundamento,
Sisudo, “por não poder.”
Mas muda logo de tento,
Sem dó do que parecer!
É não, sendo no Porto,
Por arpoagem demais!
Mas não lhe parece torto
Se em Lisboa for o cais! — em Sé Catedral de Lisboa.
MANIKARNIKÁ GHAT
O sonho petrificou
Com o remate do sono!
Há pranto nesta paragem;
E o rei caiu do trono!— em Varanasi.
"ROSA
Como se me dissesses
enquanto o ar te desfolha:
- Morrer é tão fácil!
E tudo em mim te responde:
- Tão fácil para uma rosa!"
MÀRIUS TORRES (Lleida, 1910-1942)
ROSA
Oh rosa, tu dizes bem:
- A morte é coisa leve
Com esta brisa que vem.
Respondo:
- A brisa por ser suave
E ter um ritmo tão breve,
P'ra ti, rosa, tem a chave!
Na minha vida o segredo,
Por ser tão doce, não cabe!
Oh doce mãe, quem não sabe
Que o fruto teu é azedo?! em Souto da Casa.
"ÓSCAR E A SENHORA COR-DE-ROSA"
"Uma pequena obra de arte" (Boston Herald)
(O livro é sobre a amizade entre uma criança e uma voluntária, na pediatria de um hospital, que permite ao Óscar, essa criança doente, que vai morrer, "reinventar o mundo sob a maravilhosa cor da fantasia, e desafiar a própria morte....". Extraordinário!)
Senhora, a minha vida,
Bem sabes, é pequenina,
Mas com o teu coração
Tão grande, nada a domina!
A MARAVILHA DA CATEDRAL DE FLORENÇA, COM A TORRE DE GIOTTO
(aguarela de artista frente ao Museu dos Ofícios)
A catedral e a torre
Enchem-te, bela Florença!
O rio Arno e a ponte
Transbordam, e se és imensa!
TOMADA DO CARVALHAL...
Irei ao alto da serra
A cantar a liberdade!
Brotou o pão desta terra
Tomada pela vontade
Do povo senhor de si!
À servidão disse não.
E se hoje a terra sorri,
É Carvalhal valentão!
(Aproveitando uma vista do Carvalhal)
“ISTO É O JÚBILO
Isto é o júbilo - ser um pássaro, cruzar
Um céu onde a tempestade deixa uma paz imensa.
E isto é a morte - fechar os olhos, ouvir
O silêncio quando a música começa."
In: A cidade longínqua, MÀRIUS TORRES
ISTO É A MÚSICA
Isto é a música - Uma flauta que tange
Bem perto e cativa um golpe de alfange. — em Souto da Casa
(Colheita das minhas imagens do facebook, 15 fevereiro 2013)