As palavras das imagens 10

Por António Lourenço Marques Gonçalves | 15/07/2013 | Poesias

AS PALAVRAS DAS IMAGENS 10

 

 PENHA GARCIA

A toada da montanha
É vê-la bulir assim:
Ervas bravas e frementes
E um cheirinho de jasmim!

Ouvem-se silvos nas cristas;
Abalam bufos, muares…
As azenhas estão quietinhas
E toam alguns teares.

Estalam pássaros... ginetas...
Luzes, cegonhas, abelhas…
Um porco grunhe no bardo
E a carne torra nas grelhas.

Penha Garcia, que mais?
Oh ! Subi as ruas estreitas
E do alto vi a adejar
Asas de sonho desfeitas. *

*Os garimpeiros, há alguns anos, pesquisaram ouro, sem efeito, nas areis do rio que corre ao fundo das escarpas.
— em Penha Garcia.

Voltar ao local depois da Primavera:

VISÃO MARAVILHA

É um produto da terra
Esta visão maravilha.
A natureza é sincera
E pura! Como esmerilha
À luz que o olhar retém!
E se aponta, estando oculto,
O prodígio que em si tem,
Me entontece e exulto!

HORIZONTES E PROFUNDIDADES…

Dedicada aos CUIDADOS PALIATIVOS:
O Relatório da Primavera do Observatório Português dos Serviços de Saúde fala em “estagnação” quanto à “criação da rede de cuidados paliativos” (I - 18 junho 2013). Não esquecer: No Fundão, podia estar ativa uma Escola de Cuidados Paliativos, no âmbito do Centro Hospitalar Cova da Beira e da Faculdade de Ciências da Saúde (UBI). Um golpe fatal a este desenvolvimento (pelo que se viu) foi dado no tempo do governo em funções em 2010. Andámos para trás…
— em Fundão.

Vistas das redondezas do Souto da Casa, sem perder de vista os CUIDADOS PALIATIVOS, hoje:

O Relatório do Observatório da Saúde português (notícia de hoje) apresenta números: em Portugal, existem 9 a 14 equipas a prestar apoio domiciliário em cuidados paliativos, o que dá uma equipa para 1,1 milhões de habitantes (!!!) e quanto a unidades de internamento o Observatório diz "que os dados disponíveis não permitem dizer quantas camas existem." Uma vergonha. Em 2010, o governo de então fez uma grave agressão à experiência em curso no Hospital do Fundão, e hoje o que são os Cuidados Paliativos do Centro Hospitalar da Cova da Beira? Há mesmo Cuidados Paliativos? Ou o SNS-CHCB está prestes a "encerrar" esta valência como seu serviço de todo o direito, como outros, a exemplo da Cirurgia, Cardiologia, Obstetrícia, etc. etc.? Ah! como eu tenho tantas dúvidas! Cuidados Paliativos são uma especialidade médica, como qualquer outra, em vários países desenvolvidos...Para quando, em Portugal, em que até a troika aconselhou desenvolvimento nesta área, o que não se verifica, apesar do governo ter ido além da troika em muitos outros aspetos.

— em Souto da Casa.


Os horizontes, na Cova da Beira (vê-se no primeiro plano Aldeia Nova do Cabo) para recordar umas palavras do Padre MANUEL ANTUNES: "Nessas horas difíceis, triunfou o melhor de nós mesmos. E porque não hoje? Porque haveriam de triunfar, necessariamente triunfar, o nosso individualismo mesquinho, o nosso oportunismo de trazer por casa, o nosso fatalismo resignatário, o nosso infantilismo - apesar dos anos! -, o nosso utopismo de fuga para todos os impossíveis, o nosso passivismo com ares de apatia, o nosso improvisadorismo que tantos percalços nos tem causado? Porque haveria de triunfar o pior de nós mesmos
?"

MANUEL ANTUNES, Repensar Portugal, Multinova.

OH! COMO EMBALA A PROMESSA…

Oh! Como embala a promessa
Do passado ser pior
Que o passado que há-de vir
Desse anúncio tentador!

Promessas ou juramentos
Que se desfazem: é ver!
Para que servem lamentos
Se os mesmos voltam a ser?

Tudo o que vem será ontem.
Ah! se a promessa não foi,
Com o passado que vem
Em pior... ainda mói.

— em Souto da Casa.

Pairam rasteiros perfumes
Cheios de auras campestres.
A água toa queixumes:
Tornaram campos silvestres
!

CAI O LUAR…

Esta luz não acaba. Já desponta...
O sol baixou. Esquivou-se além do outeiro.
As espigas maduras, prenhes dele,
Oh! vão dormir com ele prisioneiro..

NO CAMINHO DE DAMASCO

Como se viverá hoje, neste recanto tão belo, próximo de Damasco? Fotografia tirada na visita ao Mosteiro de Santa Tecla, em Seydanaya Maalula, em 29 de Agosto de 2009:

No caminho de Damasco,
A luz de Saulo, do céu,
Tocando-o, dentro do casco,
Varreu dos olhos o breu.
(…)
No caminho de Damasco,
A luz toante do céu
Das balas cheias de asco
Tornou os olhos de breu.
— em Síria.

 Lembrando a Fonte do Meio, de há tantos anos…

CAI DOCE ÁGUA NA TAÇA…

Cai, doce água, na taça;
Nunca esqueceste teu termo.
A sede curaste sempre
Ao são e quem chega enfermo.

E se transbordas os lábios
Dessa concha tão sobeja,
Lembra o burro que cansado
Tu tratavas cheio de inveja!
— em Souto da Casa.

 "PÓRTICO

Quem quer que sejas: quando a noite vem
sai do teu quarto onde tudo conheces;
a tua casa é a última ante o longe:
Quem quer que sejas.
Com teus olhos, que, de cansados, mal
conseguem libertar-se do teu limiar gasto,
levantas devagar uma árvore negra
e põe-la ante o céu: esguia, só.
E fizeste o mundo. E ele é grande
e como palavra ainda a amadurar no silêncio.
E quando o teu querer abrange o seu sentido,
teus olhos o abandonam, ternamente..."

RAINER MARIA RILKE - O Livro das Imagens

— em Plasencia, Extremadura.

Num recanto do Souto da Casa:

AS PALAVRAS DA IMAGEM


Oh! que hortênsia tão gentil:
Guarda o gato, dando sombra;
Guarda as flores que hão-de vir
Azuis. Vermelhas? Assombra!

Guarda a porta. Truz, truz, truz.
- Venho pedir que me dês
Licença p’ra ter a chave
Desse segredo que escondes:

Se é azul, do mar ao céu
O que vejo é imensidão;
Mas se é vermelho, 'inda mais,
Porque avisto o coração!
— em Souto da Casa.

 Em Idanha -A- Velha:

"FRAGMENTO

Com as lembranças acordamos agora
e fixamos o olhar no que é já passado;
doçura ciciante, que nos penetrou outrora,
de cabelo solto está sentada ao nosso lado."

RAINER MARIA RILKE, Poemas (II)

— em Idanha-a-Velha.

LABAREDAS ALTEROSAS…

Labaredas alterosas
Devoram tudo, eu juro.
Ao vê-las acicatadas…
Oh! Escusarão o monturo”

PORQUE TE AFLIGES COM A LUZ CLARA DO DIA?

Porque te afliges com a luz clara do dia?
Deixou a noite atrás, mas outra noite virá.
E se agora vejo a catedral em ruínas,
O grande pináculo não tombou.
Escora aquela cimalha. Dá volta ao telhado.
E não esqueças a bela rosácea!
As pedras antigas têm esse dom:
Resistem e deixam-se afagar!
A abelha virá sempre a nutrir o seu favo
Ali escondido, entre os recessos, dos predadores.
E a oliveira assistirá comovida, e pode ajudar a noite.
Oh! mas não te esqueças da bela rosácea!”
— em Souto da Casa.

PARA OS DIAS TÓRRIDOS

Sinto um marulho: de onda?
Sinto uma chama na pele.
Oh! vaga, acode e afoga
Este castigo cruel.

— em Panjim, Goa.

Relembrando a lápide da civilização do Lácio, incrustada na parede da Igreja do Souto da Casa, que o Pe. António Genro da Silva estimou, e o Dr. Pedro Salvado decifrou, com uma reflexão sobre a História:

 Não me tragas uma ordem,
Nem o brilho de um louvor.
Revela-me, assim te peço,
A prova do criador.


 UMA LÁPIDE MEMORÁVEL E O POVO DA RAMA DO CASTANHEIRO

Tem a forma de serpente
Estas casas povoadas.
Um olho alto à frente,
Da torre lança miradas.

Por aqui viveu em tempos,
Já muito longe passados,
Dona Lívia em que os exemplos
De esposa eram louvados.

Foi Lucius Julius quem fez
A lápide que a deixou viva,
Dormindo com placidez
Perto da torre, cativa.

No mesmo sono, a filha,
Que sendo Júlia, o pai lembra,
Dorme na pedra que brilha
Um passado que relembra

Povos honrados, senhores
Destes sítios tão fagueiros,
Que hoje são os credores
Da rama dos castanheiros.

— em Souto da Casa.

"Com os pássaros do campo /
Eu me quero comparar /
Andam vestidos de penas /
O seu alívio é cantar."

(Cancioneiro, canção da Raia) Etnografia da Beira, Jaime Lopes Dias

— em Penha Garcia.

 Com os pássaros do campo
Quem me dera comparar:
Ter penas leves, macias,
E como ofício, cantar!


SERÕES N'ALDEIA

Há danças e alegria.
Corre uma brisa. Um regalo.

O melhor canto da aldeia.
É aqui em São Gonçalo.

 — em Souto da Casa.


Sentado num canto desta sala
Vejo ainda a mesa bem-disposta,
O pai sentado e um berço que m’embala,
Vento, sinos e o verde duma encosta!

 

As minhas palavras das imagens do facebook – colheita em 14 de julho 2013