As Mudanças Gramaticais E O Ensino De Língua Portuguesa
Por Danieli Chagas | 26/09/2008 | EducaçãoAs mudanças gramaticais fazem parte do processo de surgimento e mudança de uma língua. A língua portuguesa,por exemplo, é resultado das influências do falar lusitano no latim ou do latim no falar lusitano, e a língua portuguesa falada no Brasil uma mescla de tais influências associada às línguas faladas pelos povos pré-colombianos, em especial o Tupi-guarani, e as línguas faladas pelos escravos africanos e imigrantes que participaram do processo de colonização e construção da cultura brasileira.
O processo de mudança da língua portuguesa é contínuo,como língua viva que é, e pode se dar apenas na língua falada ou na linguagem informal, como se estabelecer nos níveis mais formais de utilização, impondo mudanças à gramática normativa da língua, seja por uma questão de aceitação irrefutável de determinado termo ou uso, seja pelo objetivo deaproximar os chamados países lusófonos, como é o caso, principalmente, do novo acordo ortográfico da língua portuguesa, que começa a entrar em vigor a partir do próximo ano.
As mudanças podem ocorrer nos vários níveis da gramática de funcionamento de uma língua, seja no campo semântico, morfológico, sintático e, sobretudo fonológico.Torna-se importante, logo, a assunção de uma postura crítica, por parte do professor , na condução do processo de aprendizagem dos mecanismos da língua , a fim de que o aluno seja capaz de entender as formas vigentes sem deixar de conhecerformas alternativas, sejam elas as formas socialmente aceitas ou não.
No nível sintático é possível destacar,por exemplo, o ensino das regras de colocação pronominal, em especial no que diz respeito à mesóclise. De acordo com as regras da gramática normativa, a mesóclise deve ser empregada com os verbos utilizados no futuro do presente e no futuro do pretérito do modo indicativo. Sendo assim, a construção abaixo constitui um exemplo do emprego do pronome às regras da gramática normativa:
Ex1: Pedro dar-me-ia um abraço, se não estivesse atrasado.
A construção acima, entretanto, dificilmente será ouvida por um usuário da língua portuguesa, sobretudo no Brasil, sem gerar um certo estranhamento, uma vez que as construções abaixo sejam empregadas com mais freqüência:
Ex2: Pedro me daria um abraço, se não estivesse atrasado.
Ex3: Pedro teria me dado um abraço, se não estivesse atrasado.
Não é surpresa que o porquê do ensino da mesóclise seja questionado, tendo em vista o uso pouco freqüente, ou praticamente nulo deste processo. Esse conhecimento se faz necessário, entretanto, por se tratar de um recurso da língua à disposição de seu usuário que ,ainda que pouco utilizado atualmente, já fora utilizado de forma corriqueira, sobretudo por autores como Machado de Assis, por exemplo. Esse ensino, logo, possibilita ao aluno o conhecimento de um uso gramatical alternativo em relação à comunicação menos formal, principalmente falada.
É possível perceber as mudanças gramaticais nos verbos também. Basta citar como exemplo as formas do pretérito mais que perfeito,do modo indicativo. Sua conjugação é ainda trabalhada em sala de aula, mas o uso cada vez mais raro. Torna-se estranha à maioria dos falantes, por exemplo,uma construção como.
Ex4: Joana acordara antes do momento em que o galo cantou.
O estranhamento em relação à frase acima se deve principalmente ao desconhecimento das circunstâncias em que se aplica o uso do verbo no pretérito mais que perfeito,a saber, para representar um fato ou circunstânciaanterior a de um outro verbo presente no período, também relacionado a um tempo passado. É possível afirmar,em relação ao exemplo acima, que o passado em que o galo canta é um passado mais recente que aquele em que Joana acorda. Ainda assim, a maioria dos falantes perceberá como sendo mais comum a construção:
Ex5: Joana acordou antes do momento em que o galo cantou.
Pode-se concluir que o ensino e a aprendizagem dos recursos de língua portuguesa não constituem processos simples, mas devem ser entendidos como uma forma de ampliar as possibilidades de comunicação do falante, capacitando-o a compreender como a língua é mutável, sem abandonar, necessariamente as construções menos utilizadas.