"As meninas da geração nova em Lisboa e a educação contemporânea"
Por JOSÉ ROBERTO PINTO | 07/12/2010 | Literatura"As meninas da geração nova em Lisboa e a educação contemporânea"
(um paralelo com Amélia em O crime do Padre Amaro)
Quando adentramos a segunda fase de Eça de queirós, ou fase realista, deparamos com a publicação da obra "O crime do padre amaro". A pequena Leiria serve de cenário para que se possa mostrar o intento do narrador que traça um panorama crítico da sociedade portuguesa. Dessa forma, desnuda-se a vida política, a religião, a opinião pública, o jornalismo e a literatura do seu tempo. O humor e a ironia irão figurar como tratamento dado, em textos que atravessam sua obra de romancista voltada para o inquérito à vida social, sobretudo os romances da fase dita realista-naturalista.
Para traçarmos um paralelo entre a mulher Amélia do romance introdutório da segunda fase de Eça e seu ensaio de 1872, "As meninas da geração nova em Lisboa e a educação contemporânea", necessário se faz que venhamos a compreender a mulher no cenário queirosiano.
Em Eça de Queirós, segundo Monica Figueiredo, "As mulheres de papel criadas por Eça são, em verdade, um testemunho cruel da incompetência masculina, prerrogativa audaciosa para uma obra produzida num século falocêntrico." (FIGUEIREDO, 2006, p. 287). Dito isto, a mulher assume em Eça, muito mais que representação de seu tempo, pois ocupam papel fundamental na medida em que sua existência confere verossimilhança à narrativa, pois seus enredos dependem da existência delas. Há outra visão que se empresta, está em quão importante a critica vê as personagens masculinas, em que Carlos Barcellos nos mostra em seu trabalho "Homossociabilidade masculina e homoerotismo na ficção de Eça de Queirós", em que o autor aponta para a importância, quase máxima, das personagens masculinas na obra queirosiana. Em contra ponto a este pensamento, temos o artigo "As meninas da geração nova em Lisboa e a educação contemporânea" que ora exorta o pensamento quanto "A valia de uma geração depende da educação que recebeu das mães". (QUEIRÓS, 1965, p. 45). Aí, o autor assume-se como genuíno pedagogo e refere-se ao estado da instrução em Portugal, a nível institucional, e ao tipo de formação individual ministrada em casa, desde o berço. E destaca que os dramas morais decorrentes, decerto de uma série de factores entre os quais se destaca a educação recebida. Justifica apontando para o fato de a mulher ser «educada exclusivamente para o amor». É certo que são criticas a instituições e à moral da época - menina solteira não respira, não faz exercício, não come, «os penteados não deixam arejar o crânio».
«Lisboa é a cidade do Universo onde as meninas mais se apertam e se espartilham.» «A moda destrói a beleza e destrói o espírito.» Subordinadas aos ditames da moda e a ao jugo de uma educação mal conduzida, as raparigas são fúteis e levianas, muitas vezes acabando por ser cúmplices da degradação dos costumes. Essas são a mulheres, segundo Eça, da geração nova. Uma educação corrompida e a futilidade e leviandade exaltadas, e o amor, dissolvido no interesse dos casamentos de conveniências.
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A maneira de ver o mundo era única em Eça. Sua temática, voltada para os conflitos morais dentro de um contexto social deu origem a um de seus romances principais: O crime do padre Amaro. Nessa vertente social, nos deparamos com a bela Amélia, expoente feminino do interior de Portugal. Amélia é elaborada como figura portadora da dor e a estigma do pecado. Nesse aspecto, podemos perceber que Eça inicia a construção da personagem informando que a jovem não havia conhecido seu pai, pois o mesmo morrera muito jovem. E que sua mãe, passara a ser frequentemente visitada por padres.
Das histórias que ouvira quando criança, uma a impressionara. ? uma freira "que morrera de amor, e cuja alma ainda em certas noites percorria os corredores, soltando gemidos dolorosos e chamando: - Augusto! Augusto!". Sua convivência no meio religioso era comum: - adorava festas na igreja i a "convivência dos santos". Sua educação religiosa foi deformada, pois concebia deus como um ser que só sabe dar sofrimento e a morte, e que é necessário abrandar os padres. Para não manter a sedução somente na personagem masculino, Eça introduz elementos que resalta em Amélia um instinto sexual. Como podemos observar nessa passagem contada por tio Cegonha. "um homem que tivera em novo uma grande paixão por uma freira; ela morrera no convento daquele amor infeliz; ele, de dor e de saudade; fizera-se frade franciscano...". No dia em que ouvira tal história, fizera-se moça, ou seja, veio sua primeira menstruação. Ao dormir, sonhos eróticos: "era um vasto céu negro, onde duas almas enlaçadas, giravam, levadas por um vento místico; mas desvaneciam-se como nevoas, e na vasta escuridão ela via um grande coração em carne viva, todo trespassado de espadas ? e as gotas de sangue que caíam dele enchiam o céu de uma chuva escarlate". "Assim vivera Amélia até a chegada de Amaro".
Com a chegada de Amaro, a donzela doce e terna cumpre sua via crúcis e, seu legado de dor se concretiza. Como uma boa personagem Romântica que é, acaba morrendo.
CONCLUSÃO
O que se pode traçar como paralelo do que fora exposto anteriormente, é que os fatos narrados demonstram que a mulher em Eça de Queirós, se presta a retratar em ambos os textos as criticas contundentes a sociedade Portuguesa à sua época, focando uma sociedade com educação corrompida e a futilidade e leviandade exaltadas; e o amor, dissolvido no interesse dos casamentos de conveniências. A mulher burguesa sem objetivos, sem cultura, imersa no ócio do prazer fútil. Também se destaca nesse texto a avareza, a acídia e outros pecados capitais que também serão vistos em Améli. Essas mulheres não raro, são tidas pela narrativa eciana como vitimas de uma sociedade que não possibilitava a elas o desenvolvimento da razão. Quando analisamos Amélia, em seu contexto social, percebemos que também o convívio social a fez vitima dessa sociedade criticada por EÇA, e que ela, Amélia, foi instrumento do autor para expressar sua indignação, quanto aos dramas morais, a hipocrisia do clero, a desestruturação familiar e principalmente personificá-la com o pecado da luxuria. Estado, família e clero são fortemente criticados nesse contexto. Expondo sua tese, ou melhor, suas teorias sobre a sociedade, às quais procurou dar vida e ação. Nessa visão critica de seu mundo, Eça perpetra vê que após o sofrimento e as perdas, o depois; mostra que alem da morte, a vida continua sem alterações, sem grandes mudanças, porque as pessoas continuam as mesmas. Em sua moral filosófica: após os grandes tumultos das desgraças, tudo se acomoda e tudo se renova como num ciclo monótono e infindável. Por fim, na manipulação das personagens femininas, Eça de Queirós, com seu estilo inigualável, considerado pela maioria dos críticos, se vale da ironia, ponto marcante de seu Realismo, para então desenvolver criações linguísticas, e não só, mas também, nas próprias criações do autor, desenvolver quadros e cena que parecem ter sido veículos perfeitos para a crítica mordaz à sociedade de seu tempo.
Trechos que define os perfis de Teresa em "Amor de perdição e Amélia em O crime do padre Amaro. ( uma comparação entre ambas, seguindo os ideários Românticos e Realistas)
Do que se pode observar do social de Portugal do século XIX, mostra um panorama geral da época um tanto desanimador: O País perdera a inteligência e a consciência moral. Dissolvidos estão os costumes e os caracteres corrompidos. Não há princípio que não seja desmentido, nem instituição que não seja escarnecida. Atente-se, igualmente, pela recorrência do tema nas obras de ficção dos autores Eça de Queirós e Camilo Castelo Branco. Nesse panorama, inaugura-se de um lado, em 1862 a obra Amor de Perdição e de outro O crime do padre Amaro em 1875. Treze anos não dista a recorrência temática implícita nas obras citadas.
A obra Amor de Perdição pode ser considerada como marco do Ultrarromantismo português. "Pode-se dizer que Camilo, pelo realismo do dialogo, se situa já na transição para o realismo em obras de intenção sociológica,mas,por outro lado,atinge o Ultrarromantismo no tratamento de temas de caráter psicológico e amoroso"(PPHC-1998,p43) curtida à segunda metade do século XIX e que cultivava o mais alto grau dos ideais do romantismo e o sentimentalismo dramático, a obra tematiza o amor de dois jovens, tendo como pano de fundo os conflitos sociais de famílias rivais. O ideal romântico se faz presente quando a moça, negando às imposições da família, não aceita um casamento contrario às regras de seu coração. Como ideário romântico, se expressa aí o desejo à liberdade de expressão, que é um dos fundamentos do estilo romântico. Sob esta concepção, a personagem Teresa é apresentada como uma adolescente de quinze anos, bonita e bem nascida. Aparentemente frágil, de forte caráter, contraria seu pai em nome de seu amor. Esta coragem, que caracteriza as heroínas românticas, rompe com os desígnios da sociedade e de sua família em defesa de seus sentimentos. Obstinada e apaixonada, luta para não se casar a seu contra senso, porém se vê obrigada a cumprir ordens de seu pai dominador.
"Amava Simão uma sua vizinha, menina de quinze anos, rica herdeira, regularmente bonita e bem nascida. Da janela do seu quarto é que ele a vira pela primeira vez, para amá-la sempre. Não ficara ela incólume da ferida que fizera no coração do vizinho: amou-o também, e com mais seriedade que a usual nos seus anos. Os poetas cansam-nos a paciência a falarem do amor da mulher aos quinze anos, como paixão perigosa, única e inflexível. Alguns prosadores de romances dizem o mesmo. Enganam-se ambos. O amor dos quinze anos é uma brincadeira; é a última manifestação do amor às bonecas; é a tentativa da avezinha que ensaia o vôo fora do ninho, sempre com os olhos fitos na ave-mãe, que a está de fronte próxima chamando: tanto sabe a primeira o que é amar muito, como a segunda o que é voar para longe. Teresa de Albuquerque devia ser, porventura, uma exceção no seu amor".
"Em cada mulher, quatro mulheres incompreensíveis, pensando alternadamente como se hão de desmentir umas às outras". Isto é o mais seguro; mas não é infalível. Aí está Teresa que parece ser única em si. Dir-se-á que as três da conta, que diz a sentença, não podem coexistir com a quarta aos quinze anos? Também o penso assim, posto que a fixidez, a constância daquele amor, funda em causa independente do coração: é porque Teresa não vai à sociedade, não tem um altar em cada noite na sala,
não provou o incenso doutros galãs, nem teve ainda uma hora de comparar a imagem amada, desluzida pela ausência, com a imagem amante, amor nos olhos que a fitam, e amor nas palavras que a convencem de que há um coração para cada homem, e uma só mocidade para cada mulher. Quem me diz a mim que Teresa teria em si as quatro mulheres da máxima, se o vapor de quatro incensórios lhe estonteasse o espírito?"
Há um contexto em que em que a supremacia do sujeito no processo estético do romantismo, o sentimentalismo ganha destaque especial. A emoção superando a razão invade a determinação das ações das personagens românticas. Amor e ódio; a amizade o respeito; e a honra, são valores evidentemente presentes. O mundo romântico, das personagens, é idealizado, repleto de elementos virtuosos, guiados essencialmente por seus sentimentos.
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A obra de Eça de Queirós, em sua segunda fase, tem início com a publicação do romance O crime do padre Amaro em 1875. Amélia, expoente feminino do interior de Portugal. É elaborada como figura portadora da dor e a estigma do pecado. Nesse aspecto, podemos perceber que Eça inicia a construção da personagem informando que a jovem não havia conhecido seu pai, pois o mesmo morrera muito jovem. E que sua mãe, passara a ser frequentemente visitada por padres.
Das histórias que ouvira quando criança, uma a impressionara. ? uma freira "que morrera de amor, e cuja alma ainda em certas noites percorria os corredores, soltando gemidos dolorosos e chamando: - Augusto! Augusto!". Sua convivência no meio religioso era comum: - adorava festas na igreja i a "convivência dos santos". Sua educação religiosa foi deformada, pois concebia deus como um ser que só sabe dar sofrimento e a morte, e que é necessário abrandar os padres.Eça introduz em seu texto elementos que resalta em Amélia um instinto sexual. Como podemos observar nessa passagem contada por tio Cegonha. "um homem que tivera em novo uma grande paixão por uma freira; ela morrera no convento daquele amor infeliz; ele, de dor e de saudade; fizera-se frade franciscano...". No dia em que ouvira tal história, fizera-se moça, ou seja, veio sua primeira menstruação. Ao dormir, sonhos eróticos: "era um vasto céu negro, onde duas almas enlaçadas, giravam, levadas por um vento místico; mas desvaneciam-se como nevoas, e na vasta escuridão ela via um grande coração em carne viva, todo trespassado de espadas ? e as gotas de sangue que caíam dele enchiam o a
Quando o padre amaro chega a Leiria, Amélia tem 22 anos e é descrita assim: "Tinha um vestido azul muito justo ao seio bonito; o pescoço branco e cheio saía dum colarinho voltado; entre os beiços vermelhos e frescos o esmalte dos dentes brilhava; e pareceu ao pároco que um buçozinho lhe punha aos cantos da boca uma sombra sutil e doce".
"Estava há muito namorada do padre Amaro - e às vezes, só, no seu quarto, desesperava-se por imaginar que ele não percebia nos seus olhos a confissão
do seu amor! Desde os primeiros dias, apenas o ouvia pela manhã pedir de baixo o almoço, sentia uma alegria penetrar todo o seu ser sem razão, punhase a cantarolar com uma volubilidade de pássaro. Depois via-o um pouco triste. Por quê? Não conhecia o seu passado; e lembrada do frade de Évora, pensou que ele se fizera padre por um desgosto de amor. Idealizou-o então: supunha-lhe uma natureza muito terna, parecia- lhe que da sua pessoa airosa e pálida se desprendia uma fascinação. Desejou tê-lo por confessor: como seria estar ajoelhada aos pés dele, no confessionário, vendo de perto os seus olhos negros, sentindo a sua voz suave falar do Paraíso! Gostava muito da frescura da sua boca; fazia-se pálida à idéia de o poder abraçar na sua longa batina preta! Quando Amaro saía, ia ao quarto dele, beijava a travesseirinha, guardava os cabelos curtos que tinham ficado nos dentes do pente. As faces abrasavam-se-lhe quando o ouvia tocar a campainha".
O problema do adultério se revela como uma das suas causas sociais e morais, quase sempre relacionadas com uma educação mal orientada. No domínio da literatura, Eça critica, sobretudo, o lirismo convencional e hipócrita do Romantismo tardio, bem como o romance passional, que considera ter consequências negativas na educação feminina.
CONCLUSÃO
O perfil de cada personagem se difere por assumirem propostas literárias opostas, se por um lado o amor representado pela paixão desenfreada na exteriorização carnal, o que demonstra a preocupação de Eça em retratar sua personagem como elemento autentico do realismo, tal e qual, em todas as suas mazelas, dores e sofrimentos advindos das opções e suas possíveis consequências. Em Camilo, o amor idealizado, o drama passional, a característica personal da heroína romântica. A exaltação da subjetividade, do individualismo, do idealismo amoroso, marcas evidentes do seu Ultrarromantismo.
REFERÊNCIAS
1. O Brasil na vida de Eça de Queirós. Lisboa: Livros do Brasil, 1965. 9 Ibid. 10 Cf. BROCA, Brito. A vida literária no Brasil - 1900. Rio de Janeiro: MEC
2. Fênix ? Revista de História e Estudos Culturais - Outubro/ Novembro/ Dezembro de 2006 Vol. 3 Ano III nº 4-ISSN: 1807-6971 Disponível em: www.revistafenix.pro.br
3. Portugal ? O País, A História, A Cultura ? Wang Sun-Ae, Im Eun-Sook, 1ª edição Dezembro, 1998 ? Impressão, Art Korea.
Páginas:
http://virtualbooks.terra.com.br/freebook/port/o_crime_do_padre_amaro.htm
http://web.portoeditora.pt/bdigital/pdf/NTSITE99_AmorPerdi.pdf
http://www.dacex.ct.utfpr.edu.br/12_Nunca%20Subestime.htm
http://cvc.instituto-camoes.pt/conhecer/bases-tematicas/literatura-portuguesa.html
Citações:
Professora Doutora. Monica do Nascimento Figueiredo ? UFRJ.