As Lições Para o Príncipe Segundo Maquiavel
Por Robson Stigar | 01/01/2009 | FilosofiaExiste ou já existiram duas formas de Estado, República ou Principado. O principado pode ser hereditário, quando por sucessão (o poder mantido em uma mesma família), ou principado novo, quando um novo membro governa (um membro fora da família real). Estes Estados são conquistados por guerra ou por sorte.
II – Dos principados hereditários.
A preocupação neste capítulo é apenas em descrever como se conquista e se sustenta um principado hereditário, o poder se mantém em uma mesma família, assim a dificuldade de governar é menor, pois já se conhece a melhor maneira de conduzir o Estado.
III - Dos Principados mistos
Estados conquistado e anexadosum Estado antigo, se forem da mesma língua, são facilmente sujeitos. Basta fazer desaparecer a linha do príncipe que o dominava, pois mantendo-se na condição das coisas antigas os homens vivem calmamente. Então o conquistador, para mantê-los, deve ter duas regras: 1) fazer extinguir o sangue do príncipe anterior; 2) não alterar as leis nem os impostos. Desta forma se terá a união ao antigo Estado num período muito breve. Quando se conquista uma província de língua diferente e costumes diferentes começam então as dificuldades, sendo necessária uma grande habilidade e boa sorte para conservá-la. Com esta atitude os súditos ficarão satisfeitos e os ataques externos serão mais custosos, e assim o príncipe dificilmente perderá essa província...Conclui-se então que:
IV - Porque razão o reino de Dário, ocupado por Alexandre, não se rebelou contra os sucessores deste.
Analisando a forma de governar da Turquia e da França, no mesmo período em que Alexandre Magno conquistou a Ásia, fica fácil entender como não houve rebelião contra os sucessores de Dário. A monarquia Turca é dirigida por um senhor e seus servidores, que recebem províncias para administrar, ( O que dificulta uma invasão, já que os invasores têm que se preocupar com os servidores do Senhor).Já o rei da França é cercado de nobres, reconhecidos pelo próprio rei, ( o que facilita uma invasão, se houver uma aliança com alguns desses nobres ).O governo de Dário era semelhante aos turcos. Alexandre derrotou os inimigos em bloco e matou Dário, ou seja, iniciou seu ataque pelas províncias e chegou ao governo. O que não aconteceria com tanta facilidade com uma organização como a França, já que não seria só matar o rei, pois permaneceriam os nobres, que poderiam se revoltar contra o novo governo.
V – Da maneira de conservar Estados ou Principados, que, antes da ocupação, se regiam por leis próprias.
Maquiavel trata sobre o Estado que antes de conquistados tenham suas próprias leis, tais Estados devem ser arruinados, em seguida o governo deve residir ali e deixar que continuem com suas leis e impor-lhes tributos; criar um governo de poucos que se conservem amigos, porque nesses Estados em nome da liberdade perdida e antigas tradições sempre ocorrerão rebeliões. Assim, para conservar um república conquistada, o caminho mais seguro é destruí-la ou habitá-la pessoalmente.
VI – Dos principados novos que se conquistam pelas armas ou nobremente.
Os homens trilham quase sempre estradas já percorridas. Um homem prudente deve assim escolher os caminhos já percorridos pelos grande homens e imitá-los. Aqueles que por suas virtudes se tornam príncipes, conquistam o principado com dificuldade, mas se mantém facilmente.
VII – Dos principados novos que se conquistaram com armas e virtudes de outrem.
Aqueles que somente por fortuna se tornam príncipe, pouco trabalho têm para isso, mas se mantêm muito penosamente. Não têm nenhuma dificuldade em alcançar o posto, pois para aí voam, mas após sua chegada surge toda sorte de dificuldades. Tais príncipes estão na dependência exclusiva da boa vontade e da fortuna de quem lhes concedeu o Estado, isto é, de duas coisas extremamente volúveis e instáveis, e, além disso, não sabem ou não podem manter o principado: Não sabem porque, se não são homens de grande engenho ou virtude, não é razoável que, tendo vivido sempre em condições diferentes, saibam comandar; não podem, porque não contam com forças que lhes sejam, amigas e fiéis.
VIII – Dos que alcançaram o principado pelo crime.
Há duas maneiras de tornar-se príncipe e que não se podem atribuir totalmente à fortuna ou ao mérito: 1) Pela maldade, por vias celeradas, contrárias a todas leis humanas e divinas; 2) por mercê do favor de seus conterrâneos.
IX – Do principado civil.
O principado é estabelecido pelo povo ou pelos grandes, segundo a oportunidade que tiver uma destas partes. O que ascende pela ajuda dos poderosos se mantém com mais dificuldade do que aquele que é eleito pelo próprio povo. O que se torna príncipe mediante o favor do povo deve manter-se seu amigo, não os oprimindo, mas quem se torna príncipe por favor dos grandes, antes de mais nada, deve procurar conquistá-los.
X – Como se devem medir as forças de todos os principados.
Julgo capazes de manter-se por si, os príncipes que podem, em vista de ter abundância de homens ou de dinheiro, formar um exército forte e fazer frente a qualquer assaltante, tendo também cuidado de fortificar e municiar o próprio Estado bem como o de formar um celeiro farto de alimento, bebida e combustível.
XI – Os principados eclesiásticos.
Este principado sofre toda sorte de dificuldades, pois são conquistados ou pelo mérito ou pela fortuna. Mas mantêm-se sem qualquer uma das duas, pois são sustentados pela rotina da religião. Somente estes principados são por natureza felizes, pois possuem Estado e não os defendem, e nem por isso os são arrebatados; possuem súditos que não governam, nem por isso seus súditos tentam o colocar de lado.
XII – Dos gêneros de milícia e dos soldados mercenários
As principais bases de um Estado sejam de qual fase for, são boas leis e boas armas, porém para que haja boas leis é necessário que haja boas armas, mas que não sejam mercenárias, pois seus capitães ou são grandes militares ou não são nada. É melhor que as tropas sejam comandadas pelo príncipe ou pela República. A experiência ensina que os príncipes, agindo por si mesmos, e as Repúblicas armadas alcançam grande progresso.
XIII – Das tropas auxiliares, mistas e nativas.
As tropas auxiliares são como armas inúteis. São as que mandam algum auxílio, mas que no final te fazem prisioneiro. È melhor lutar com as forças próprias, mesmo que venha a perder, do que vencer com a força das outras e ter uma falsa vitória. Sem possuir armas próprias, nenhum principado está seguro.
XIV – Dos deveres do príncipe para com as suas tropas
Um príncipe não deve ter outro objetivo que não seja o de guerrear bem o de conhecer os regulamentos e a disciplina da guerra. Um príncipe que não entenda de milícia não pode ser estimado pelos seus soldados nem ter sua confiança.
XV – Das razões por que os homens e, especialmente, os príncipes, são louvados ou vituperados.
"É necessário a um príncipe, para se manter, que aprenda a poder ser mau...segundo a necessidade".É apresentada uma série de comparações entre qualidades virtuosas e vícios, porém salienta que sem determinados defeitos dificilmente poderia se salvar um governo.
XVI – Da liberdade e parcimônia (economia; poupança)
Para se manter entre os homens com a fama de liberal é necessário não omitir nenhuma suntuosidade, mas vivendo desta forma todas suas rendas serão consumidas. Desta forma será necessário proceder cruelmente no fisco e fazer tudo para se ter dinheiro, e isto não é bom, mas nocivo. Um príncipe deve gastar pouco para não consumir seus súditos.
XVII – Da crueldade e da piedade – se é melhor ser amado ou temido.
Todo príncipe deve desejar ser tido como piedoso e não cruel, mas empregando convenientemente essa piedade. Porém, se tiver de falhar em uma das qualidades, é muito mais seguro ser temido do que amado. Quando o príncipe estiver em campanha, não deverá se importar com a fama de cruel, porque sem ela jamais conseguirá manter um exército unido e disposto a qualquer ação.
XVIII – De que forma os príncipes devem guardar a fé da palavra dada.
É de grande vali um príncipe (governante) agir dentro de uma conduta moral-ética irrepreensível, para que conquiste e mantenha o respeito e obediência de seus súditos. Pelas leis, deverá um príncipe governar com autoridade cumprindo e fazendo cumprir todas as determinações legais que são impostas a todo o principado (país). Já o uso da força somente deverá ser colocado em prática depois de esgotados os recursos civilizados (pacíficos). Cabe ao príncipe ser astuto e valente, bom e mau, dentro de suas necessidades e conveniências administrativas, não expressar nenhum sentimento humano, mas apenas demonstrá-los pela expressão facial, pois é próprio do homem a leitura pela imagem. Cabe ao príncipe pregar a paz e a fé, defendendo seu principado, empregando para tanto os meios que lhe fizer necessário: e será enaltecido pelo povo, que se contenta pela aparência.
XIX – De como se deve evitar ser desprezado e odiado.
Cabe ao príncipe preocupar-se em não ser odiado e desprezível, passando desapercebidos os outros defeitos. Apropriando-se dos bens e das mulheres de seus súditos, por eles será odiado. Ser volúvel, leviano, efeminado, pusilânime (covarde), e irresoluto, torna o príncipe desprezível. Uma ordem, determinação ou sentença de um príncipe, de maneira alguma deve ser descumprida, pois se isto acontecer o príncipe perde sua autoridade. Para que o príncipe tenha respeito externo, deve ter muitas e boas armas, bem como um contingente de amigos externos, pois assim sendo terá a admiração e manterá a estabilidade social e política interna do principado. Aquele que conquistar o apoio, a admiração, o respeito, a confiança política e o bem-querer de seu povo, pode estar protegido das conspirações a que possa sofrer. É notável ao príncipe compartilhar em parte o seu governo. Ele deve buscar o apoio dos poderosos e a confiança e admiração do povo.
XX - Se as fortalezas e muitas outras coisas que dia a dia são feitas pelo príncipe são úteis ou não.
É conveniente ao príncipe novo armar seus súditos, mas quando conquista um novo Estado é prudente desarmar aquele Estado e entregar estas a seus próprios soldados. A melhor arma que um príncipe pode ter é não ser odiado pelo povo. Para tornar-se grande, o príncipe deve superar obstáculos e desestabilizar toda oposição. É prudente também que o príncipe construa fortaleza a fim de resguardar a segurança de seu Estado, sendo um refúgio que o proteja de ataques surpresa. É louvável à um príncipe (estadista) a precaução e uma visão futurista, principalmente em se tratando de segurança.
XXI – O que a um príncipe convém realizar para ser estimado.
Um príncipe conquista a estima popular através de realizações de grandes empreendimentos e de demonstrar exemplos pouco costumeiros. Um príncipe deve manter uma conduta irrepreensível, não deve dar margem a críticas desconstrutivas. Deve estar, sempre, acima de toda especulação, interna e externa. O príncipe deve ser digno e justo, amigo e grato, para com os principados vizinhos e aliados. Ao príncipe cabe promover e participar de festejos, espetáculos e comemorações populares, demonstrando assim carisma para com o povo e recebendo respeito e admiração de todo principado.
XXII – Dos ministros dos príncipes.
É prudente ao príncipe um minucioso estudo para a escolha de seus ministros e formulação de uma equipe de governo, para que esta seja composta por pessoas competentes, fiéis e de conduta fiel inabalável. O príncipe deve conhecer bem seus ministros sobrepondo-se a seus pensamentos, avaliando se o ministro pensa apenas em si ou no Estado, pois se pensa apenas em si este prejudica o Estado devendo, portanto ser excluído do governo. Mas se o ministro é fiel e pensa e pensa exclusivamente nas questões do Estado, este deve ser dignificado, elogiado, recompensado e admirado pelo príncipe.
XXIII – De como se evitam os aduladores.
Um príncipe prudente deve afastar-se de aduladores e desconsiderar seus conselhos, é digno de um príncipe buscar a serenidade e a fidelidade dos sábios, mas quando entender que seja necessário. A príncipe cabe deliberar sobre a verdade, mas não deve demonstrar seu desprazer. É de um príncipe prudente compreender e avaliar os conselhos que lhe são dirigidos avalizando o seu conteúdo, e, por fim, acatar ou não.
XXIV – Porque os príncipes da Itália perderam seus Estados.
Entre os senhores da Itália que perderam seus Estados encontra-se um defeito comum quanto as armas; depois se verá quer alguns deles ou foram hostilizados pelo povo, ou não souberam neutralizar os grandes, porque sem estes defeitos, não se perdem Estados.
XXV – De quanto pode a fortuna nas coisas humanas e de que modo se deve resistir-lhe.
Não é desconhecido que muitos têm tido e têm a opinião de que as coisas do mundo são governadas pela fortuna e por Deus, de modo que a prudência dos homens não pode corrigi-las, e mesmo não lhes traz remédio algum. Quando um príncipe se apóia totalmente na fortuna, arruína-se segundo as variações daquela. Em relação aos caminhos que os levam à finalidade que procuram, isto é, glória e riquezas, costumam os homens proceder de modos diversos: Um com circunspeção com impetuosidade, um pela violência, outro pela astúcia, cada um Poe estes diversos modos pode alcançar aqueles objetivos. Assim, dois agindo diferentemente alcançam o mesmo efeito, e dois agindo igualmente, uma vai direto ao fim e outro não. Porém o homem circunspeto, quando chega a ocasião de ser impetuoso não o sabe ser, e por isso se arruína. Portanto é melhor ser impetuoso do que circunspeto, porque a sorte é como mulher: para dominá-la é preciso bater-lhe e contrariá-la.
XXVI – Exortação aos príncipes para livrar a Itália das mãos dos bárbaros.
Consideradas, pois todas as coisas acima referidas e pensando comigo mesmo, se na Itália, os tempos presentes poderiam prometer honras a um príncipe novo e se havia matéria que desse a oportunidade de introduzir umanova ordem que lhe desse fama, e prosperidade para o povo, pareceu-me que há tantas coisas favoráveis a um príncipe novo que na sei de época mais propícia para a realização daqueles propósitos. Assim tendo ficado como que sem vida, espera a Itália aquele que lhe possa curar as feridas já há muito tempo apodrecidas. Não se deve. Portanto, deixar passar esta ocasião a fim de fazer com que a Itália, depois de tanto tempo, encontre um redentor.
Considerações finais
Para Maquiavel, um príncipe não deve medir esforços nem hesitar, mesmo que diante da crueldade ou da trapaça, se o que estiver em jogo for à integridade nacional e o bem do seu povo.Para Maquiavel, como renascentista que era, quase tudo que veio antes estava errado. Esse tudo deve incluir os pensamentos e as idéias de Aristóteles. Ao contrário deste, Maquiavel não acredita que a prudência seja o melhor caminho. Para ele, a coerência está contida na arte de governar. Maquiavel procura a prática. A execução fria das observações meticulosamente analisadas, feitas sobre o Estado e a sociedade. Maquiavel segue o espírito renascentista, inovador. Ele quer superar o medieval. Quer separar os interesses do Estado dos dogmas e interesses da igreja.
Bibliografia
MAQUIAVEL, Nicolau - O Príncipe, trad. De Livio Xavier - 2a. Ed. São PAulo: Abril Cultural, 1979 ( Os pensadores)