AS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM E A INTERAÇÃO PSICOPEDAGÓGICAINTRODUÇÃO
Por Antônia Reginalda Carvalho de Oliveira | 23/09/2016 | EducaçãoINTRODUÇÃO
As dificuldades de aprendizagem têm sido objeto de preocupação por parte dos pais e educadores e de estudo por parte dos psicopedagogos, que buscam compreender cada vez mais as suas causas para melhor conhecê-las e ainda, alertar sobre as conseqüências que elas podem trazer para a vida de uma pessoa, se não forem trabalhadas; pois, muitas vezes, as dificuldades de aprendizagem chegam a abalar famílias inteiras, sem falar que deixam as crianças com a estima baixa, fazendo com que algumas delas sintam-se totalmente incapazes.
Neste trabalho, optou-se pelo tema Dificuldades de Aprendizagem, por considerar que é um tema que não se esgota, uma vez que se apresenta sempre de forma polêmica nas discussões entre estudiosos.
Dificuldade de Aprendizagem, segundo o NJCLD (Comitê Nacional de Incapacidades de Aprendizagem) – 1998, é o termo geral que se refere a um grupo heterogêneo de transtornos que se manifestam por dificuldades significativas na aquisição e uso da escuta, fala, leitura, escrita, raciocínio ou habilidades matemáticas.
As pessoas com dificuldades de aprendizagem, quer fossem crianças, adolescentes ou até mesmo adultos, há alguns anos atrás eram vistas de maneira diferente de atualmente. Silver (1989) relembra como, antes de 1940, se classificavam as crianças com dificuldades de aprendizagem, elas eram chamadas de “transtornados emocionalmente” (emotionally disturbed), de “retardados mentais” ou de “desvantajados culturais”; em 1947, Strauss sugeriu o termo lesão cerebral mínima para justificar as DA.
A concepção da APA (Associação Psiquiátrica Americana) é de caráter médico e
inclui as DA entre os transtornos específicos do desenvolvimento. Em geral, o problema tem sido percebido primeiramente pelos pais e/ou professores. Os pais quando convivem constantemente com as crianças, acumulam uma grande quantidade de experiência sobre seu desenvolvimento e se encontram em uma posição privilegiada para detectar problemas, desde que tenham os olhos voltados para isso. Mesmo que não tenham, possuem uma série de informações dos detalhes do crescimento e, quando disponíveis, podem ajudar no diagnóstico e tratamento dos filhos. Também um professor pode ver que uma criança precisa de muito mais tempo para aprender uma tarefa que outra, não apenas em relação à classe em que atua, mas também pela experiência com outras crianças.
A Inglaterra possui dados que sugerem que uma em cada seis crianças tem probabilidades de necessitar de algum tipo de ajuda educativa especial em algum momento (Kellmer-Pringle e outros, 1996; Webb, 1967; Warnock, 1978), seja por causa de alguma dificuldade temporal de aprendizagem, seja por dificuldades de aprendizagem duradouras.
Nos Estados Unidos, Meisels & Wasik (1989) indicaram que aproximadamente 12% das crianças com idades entre 3 e 21 anos receberam serviços de educação especial. Os atendimentos especiais estavam relacionados com alterações da fala, atraso mental, dificuldades de aprendizagem, perturbações emocionais, incapacidades e outras dificuldades de saúde, déficits auditivos, visuais, surdez e problemas de incapacidade múltipla.
No Brasil, não há estatísticas abrangentes sobre esse fato, mas a quantidade de crianças que não se alfabetizam nem na primeira, nem na segunda série, só para citar um exemplo, estava estimada em torno de 60%.
O campo das dificuldades de aprendizagem delimita-se, oficialmente, a partir de 1963. Por suas origens, ainda que observado no mundo inteiro, é marcadamente norte-americano e canadense. Foi em 1963, no dia 6 de abril, que um grupo de pais reuniu-se em Chicago por terem algum filho (sobretudo menino) que sem razão aparente manifestava dificuldades persistentes na aprendizagem da leitura. Preocupados com o problema, convidaram profissionais tidos como expertos de diferentes áreas – médicos, neurologistas, psicólogos – para que lhes indicassem alguma solução e explicação para o fato de seus filhos não aprenderem a ler, como também, para organizarem-se e obterem fundos para a criação de serviços educativos eficientes que tratassem o problema de seus filhos. De fato, essas crianças não eram atendidas pela chamada educação especial, voltada, então, para quadros de atraso mental, deficiência auditiva, visual, motora ou múltipla, etc. Até então, os expertos ou especialistas referiam-se a elas como crianças com lesão cerebral ou crianças com disfunção cerebral mínima, crianças com dislexia, entre outros.
Foi nesse contexto que o psicólogo Samuel Kirk, que estava trabalhando com crianças com atraso mental, dificuldades da linguagem e da leitura, propôs que esses inexplicáveis obstáculos observados na aprendizagem da leitura – como não podiam ser atribuídos ao nível de inteligência, ao ambiente familiar ou educativo – poderiam ser chamados de dificuldades de aprendizagem (learning disabilities), pois se referiam a problemas de aprendizagem acadêmica.
Na ocasião, foi criada e organizada a Associação de Crianças com Dificuldades de aprendizagem (Association of Children With Learning Disabilities, ACLD), com objetivos bastante claros de obter fundos para a criação de serviços educativos especializados e de qualidade, como uma particularidade a mais da educação especial a ser oferecida nas escolas. E tudo para oferecer um melhor atendimento às crianças com dificuldades de aprendizagem.
Em 1800, o médico alemão Franz Joseph Gall observou pessoas adultas com lesões cerebrais, supostamente com afasia, pois não conseguiam expressar idéias e sentimentos por meio da fala, apesar de conservarem a inteligência. Com base nessa observação, havia uma área intacta e uma área-problema, além da informação de que algumas pessoas com lesão cerebral podiam escrever apesar de terem perdido a fala, evidenciando a base neuropsicológica do problema e descartando outras causas como deficiência sensorial ou deficiência mental.
Samuel Kirk foi considerado o pai do campo das dificuldades de aprendizagem, ao propor um termo aparentemente afortunado.
A importância e magnitude social do problema podem ser notadas na América do Norte ao considerar-se que em 1975 a prevalência de dificuldades de aprendizagem estava entre 1-3% da população escolar e em 1994 entre 4-5% (Wong, 1996). Uma crítica comumente feita refere-se à possibilidade de um exagero dos casos, mas pesquisadores (Miller, 1993; Wong, 1996) argumentam que esse aumento é produto da conscientização e maior conhecimento do problema, melhoria das técnicas de diagnóstico, maior tolerância e aceitação social do fenômeno.
Vários autores sustentam que não existe base impírica suficiente para uma distinção entre dificuldades de aprendizagem e baixo rendimento escolar (Algozzine, Ysseldyke & McGue, 1995).
No Brasil, as dificuldades de aprendizagem são centrais no complexo fenômeno fracasso escolar, caracterizado por um alto índice de repetição e de fracasso escolar (Patto, 1993).
Não há dúvida, entretanto, de que as dificuldades de aprendizagem só podem ser entendidas na complexa interação entre os fatores intra e extra-escolares, requerendo intervenções tanto no âmbito do aluno, das práticas pedagógicas e de formação de professores, quanto no âmbito de mudanças mais amplas de natureza política, econômica e social.
Segundo Lester e Muriel Ternopol, que fizeram uma pesquisa mundial sobre
problemas de aprendizagem, em muitos países é grande a preocupação a respeito dos distúrbios encontrados na aprendizagem da leitura e da escrita. Em todos esses países existem crianças inteligentes que, no entanto, têm grande dificuldade para aprender a ler ou a escrever, em uma situação de escolarização normal.
Nessa pesquisa mundial, psicólogos, educadores e médicos de quase todos os países acabaram por concordar que as principais causas desses distúrbios podem ser
classificadas como neurológicas, algumas vezes genéticas, possivelmente intensificadas por distúrbios emocionais secundários. Alguns especialistas referiram-se ainda à privação cultural, devido ao status sócio-econômico inferior, como causa desses problemas de aprendizagem.
As dificuldades de aprendizagem podem acontecer devido a Ns fatores: orgânicos - saúde física deficiente, falta de integridade, alimentação inadequada; psicológicos - inibição, fantasia, ansiedade, angústia, inadequação à realidade, sentimento generalizado de rejeição; e ambientais - o tipo de educação familiar, o grau de estimulação que a criança recebeu desde os primeiros dias de vida, a influência dos meios de comunicação, etc.
No entanto, muitas vezes, o fato de não aprender, mesmo que de forma implícita, pode ocorrer devido à maneira de atuar do educador (prática pedagógica), ou até mesmo, ao tipo de relação existente entre eles, possibilitando a existência de fatores intrínsecos aos alunos, que implicam na manifestação de problemas de aprendizagem.
Segundo o fonoaudiólogo Jaime Luiz Zorzi, só 15% dos problemas dos alunos correspondem a distúrbios orgânicos. Para ele, os verdadeiros distúrbios de aprendizagem correspondem a uma minoria e os falsos têm mais a ver com as circunstâncias da Educação oferecida, pois muitas vezes falta ajuste entre as características do aluno e o método proposto em sala de aula. Diz ainda que as crianças com dificuldades de aprendizagem têm habilidades mas não costumam ser valorizadas pela escola, pois, costumam ser avaliadas apenas pelo ponto fraco e não pelo forte.
Quando as dificuldades de aprendizagem apresentam-se a partir de um problema de desenvolvimento ou deficiência do mesmo, utiliza-se o prefixo dis, é o caso da disfasia - quando uma criança não desenvolve a linguagem adequadamente ou da dispraxia - quando houver alguma dificuldade no desenvolvimento das praxias. Já quando as dificuldades de aprendizagem surgem pelo fato da pessoa ter perdido a função uma vez adquirida ou em processo de aquisição, utiliza-se o prefixo a, é o caso de afasia infantil - quando uma criança perde a linguagem uma vez iniciado o processo de desenvolvimento da mesma, ou no adulto que a perde, ambos como fruto de uma lesão cerebral constatada. Assim, se como conseqüência de um acidente, uma criança ou um adulto apresenta dificuldades na leitura ou na escrita, por lesão cerebral, falaríamos de alexia ou de agrafia, respectivamente.
As Dificuldades de Aprendizagem têm gerado muito desgosto, no entanto, deve-se mostrar que elas podem ser trabalhadas e que já existem profissionais especializados para isso - os psicopedagogos - mas não se deve esquecer que a família e os educadores também têm um papel fundamental a desempenhar.
È muito importante que se faça a distinção entre problemas, dificuldades e distúrbios para que seja possível entender melhor as dificuldades de aprendizagem.
Do ponto de vista psicológico, pesquisas indicam que alunos com dificuldades de aprendizagem apresentam descrença ou percepção distorcida quanto à própria capacidade de realizar tarefas escolares com sucesso (Chapman, 1989).
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