AS CONTRIBUIÇÕES DE PAULO FREIRE NO ENSINO DA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS

Por Vanessa Maria de Oliveira | 11/12/2020 | Educação

AS CONTRIBUIÇÕES DE PAULO FREIRE NO ENSINO DA EJA

Vanessa Maria de Oliveira

                                                                                 Rosária Maria Castilhos Saraiva²


RESUMO:


O artigo tem como objetivo apresentar a relevância do método de Paulo Freire no ensino da Educação de Jovens e Adultos (EJA). Procura apresentar uma visão diferenciada para com esse público que foi deixado a margem da sociedade, marcado por campanhas alfabetizadoras com intuito de formar mão de obra. Freire propôs uma perspectiva diferente do sistema da época, pois para ele a educação deveria ser emancipadora, conscientizando os alunos, tornando-as pessoas críticas e transformadoras de suas realidades. São identificadas as propostas curriculares da EJA nos documentos oficiais, abordando algumas reflexões de autores sobre a importância do currículo na escola, visto que deve atender as peculiaridades dos sujeitos pertencentes aquele ambiente. O estudo foi elaborado a partir de um estudo teórico, através de dados coletados por meio de documentação indireta, mediante pesquisa bibliográfica. Possibilitando o aprofundamento nesse estudo que trouxe reflexões acerca da modalidade EJA, à luz dos pensamentos de Freire que tornou a Educação de Jovens e Adultas vista de forma diferente pela sociedade, contudo ainda é necessário mais políticas públicas que atendam a esse público.


Palavra-chave: Educação de Jovens e adultos. Alfabetização. Currículo. Paulo Freire.


 INTRODUÇÃO

O interesse pelo tema “as principais contribuições de Paulo Freire no ensino da Educação de Jovens e Adultos – EJA  surgiu mediante uma palestra promovida pela Universidade Estácio de Sá, onde uma professora da Escola Frederico Trotta, localizada no Rio de Janeiro relatou as suas experiências na área, os desafios encontrados e como ela tentava superá-los. 

O encontro foi rico, pois ficava evidente a sensibilidade da educadora para essa modalidade, que necessita de um olhar específico, visto que os alunos têm faixas etárias variadas e já trazem consigo uma bagagem cultural, onde muitos já tiveram uma vivência negativa na escola ou sequer frequentaram uma.

Outro ponto que também incentivou a escolha foi o livro do Paulo Freire “Pedagogia da Autonomia”, que promove uma reflexão sobre educando e educador, onde ambos não são apenas meros objetos, ou seja, sujeito que aprende e sujeito que ensina.

Ensinar não é apenas transmitir conteúdo, Professor e aluno são sujeitos ativos no processo de aprendizagem, um aprende com o outro, pois a bagagem cultural de cada um tem uma grande relevância nesse processo.  É necessário haver uma união entre teoria e prática, pois ensinar exige criticidade, de forma que o educador tem que ser um pesquisador.

A EJA (Educação de Jovens e Adultos) é uma modalidade de ensino para aqueles que não concluíram seus estudos na idade certa, respaldada pela Constituição de 1988, Art. 208 (Brasil, 1988), que declara que é dever do Estado o ensino fundamental obrigatório e gratuito para aqueles que não tiveram acesso na idade adequada.

 O analfabetismo não é só uma das condições do indivíduo da EJA, ela acompanha inúmeros fatores que designam suas especificidades, como a pobreza, trabalho árduo, e a escola deve levar em consideração que primeiramente esses sujeitos são trabalhadores e veem a educação de Jovens e Adultos como uma oportunidade.

     Esse campo é marcado por grandes avanços e retrocessos, na qual uma figura se destaca: Paulo Freire, um precursor na alfabetização de Jovens e Adultos. Acreditava em uma educação emancipatória, um ato político, para transformar pessoas em sujeitos críticos, sendo capazes de mudar a sua realidade. A partir disso levanta-se a seguinte questão “quais as contribuições de Paulo Freire no ensino da EJA?”.

O método de Paulo Freire tem olhar mais específico para cada indivíduo, pois cada um é movido por interesses distintos que não são descobertos com antecipação. Uma cartilha que é usada para o Brasil todo não reflete a realidade das pessoas, pois o país é cheio de culturas diferentes.    

    Freire vem com outra perspectiva na educação de Jovens e Adultos: uma prática reflexiva e não saberes prontos e infantilizados. ele trouxe uma nova forma de olhar, onde sua metodologia diferente da época trazia especificidades dessa educação, ensinar sendo um ato político e de libertação. 


    Paulo Freire, de fato, foi um dos grandes educadores com prestígio internacional. Sua luta é inegável para com os as classes desfavorecidas em meio a um contexto da globalização neoliberal.

    No entanto, apesar dessas contribuições no ensino da EJA, atualmente ainda se encontram inúmeras dificuldades nessa modalidade, problemas que permeavam a anos atrás ainda estão presentes. 

Podemos ver claramente a realidade desse campo em uma série de televisão  “ Segunda chamada”, que aborda com veracidade os obstáculos enfrentados pelos professores e alunos, como: escola com poucos recursos e péssima infraestrutura, indivíduos que largaram a escola para trabalhar, cuidar dos filhos, por conta do marido, preconceito.        

No entanto, também mostra professores em um relação horizontal com seus alunos, trocas de conhecimento, reflexão da realidade de cada um e valorização e respeito da cultura do outro, assim como ressalta Paulo Freire (1987), que ninguém educa alguém ou educa a si mesmo, e sim em conjunto, refletindo sobre si mesmos ou sobre o mundo.  Assim, aponta-se a seguinte questão norteadora do estudo quais as principais contribuições de Paulo Freire no ensino de Jovens e Adultos? 

Nesse sentido, foram construídas as seguintes questões que conduziram o trabalho, como surgiu historicamente a EJA no Brasil? Quais os desafios encontrados pelo professor da EJA na sua prática docente? Qual a proposta educacional de Paulo Freire e a relação com a EJA?  O que diz a legislação e o currículo sobre a EJA? 

Baseado nessas questões, a pesquisa tem os seguintes objetivos; Analisar o histórico da EJA no Brasil: legislação, políticas; Caracterizar o Ensino da EJA: legislação, currículo; Descrever os desafios encontrados pelos docentes e metodologias utilizadas; Identificar as propostas de Paulo Freire no processo de ensino-aprendizagem na Educação de Jovens e Adultos.

    A pesquisa tem como intuito contribuir para reflexão dos leitores para com a EJA nas suas especificidades e a relevância de Paulo Freire na alfabetização de jovens e adultos, chamando atenção para essa questão para que venham a compreender melhor o legado que esse educador trouxe para o país. 

Trata-se de uma pesquisa empírica, qualitativa, que envolve um estudo teórico sobre as principais contribuições de Paulo Freire para o ensino na EJA. Os dados serão coletados através de documentação indireta, por meio de pesquisa bibliográfica.

Este trabalho foi realizado e fundamentado em uma revisão bibliográfica, que segundo Gil (2008), refere-se a uma pesquisa bibliográfica atualizada e embasada em materiais já elaborados, composta principalmente de livros e artigos científicos.

    A princípio será apresentado a EJA: histórico no Brasil, legislação e políticas públicas que inicialmente teve carácter supletivo, voltada para o mercado de trabalho, seguida de movimentos populares, os quais foram essenciais para que enfim a Constituição de 1988, declare que é dever do Estado o ensino público e gratuito para aqueles que não concluíram seus estudos na idade certa.

Em seguida, será abordado o currículo da EJA, analisando o que os documentos oficiais destacam sobre essa modalidade, o que seria importante levar em consideração na elaboração de um currículo e uma reflexão sobre o que seria um currículo e sua importância dentro da escola com base em teóricos.

    Posteriormente será identificado a metodologia de Paulo Freire no processo de ensino-aprendizagem na Educação de Jovens e Adultos, seu método e contribuições, que propõe a inserção do aluno iletrado no contexto social e político, despertando a cidadania e transformação. 


EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS NO BRASIL

Na década de 30 com os processos de industrialização, mudanças econômicas e políticas no Brasil, notou-se que era necessário alfabetizar as camadas mais baixas com intuito de ensinar apenas ler e escrever, visto que o País tinha anteriormente uma economia predominantemente agrícola, de maneira que os trabalhadores não possuíam nenhum tipo de formação específica.

Segundo Viegas e Moraes (2017) com o avanço da economia industrial no Brasil, haviam muitos trabalhadores disponíveis dispostos a trabalhar, no entanto sem nenhuma especialização, o que desanimava os grandes investidores. 

Nesse período em que o país se desenvolvia industrialmente, era necessário qualificar a mão de obra para atender as demandas das empresas emergentes, pois nesse momento o país tinha grandes índices de analfabetismo.

De acordo com Haddad e Di Perro (2000) a Constituição de 1934 instituiu um ensino primário integral gratuito e de frequência obrigatória para adultos (Art.150) a partir do Plano Nacional de Educação (PNE), no entanto ainda como uma educação elementar, sem considerar as particularidades dessa categoria.

A Constituição de 1934 trouxe grandes avanços para época, inclusive a implantação de leis trabalhistas.

Em 1938 é criado o INEP (Instituto Nacional de Estudos Pedagógicos), onde a partir de suas pesquisas foi possível em 1942, criar o Fundo Nacional de Ensino Primário, por meio dele, com o programa de ampliação da educação primária, devendo ser incluído o Ensino Supletivo para jovens e adultos.

 Na década de 40, de acordo com Ventura (2001) com o capitalismo crescendo no País, o foco agora era no ensino profissional e ensino de base para jovens e adultos, com a intenção de formar mão de obra e eleitores.

Em 1945 com o fim da Era Vargas, em meio a crises a UNESCO apontava as grandes desigualdades entre os países e a importância que a educação exercia no desenvolvimento das nações, pois nesse período grande parte da população era constituída por analfabetos, de maneira que ela impulsionou a criação de programas nacionais. (HADDAD E DI PIERRO, 2000)

Assim em 1947 começou a primeira Campanha de Educação de Adolescentes e Adultos (CEAA), prolongando-se até o fim de 1950 atendendo as demandas da UNESCO. Ribeiro (1997) ressalta que o analfabetismo naquele período era considerado como causa e não efeito da situação vivida no país, atestando a incapacidade do analfabeto.

 Vieram outras duas companhas, Campanha Nacional de Educação Rural em 1952 e Campanha Nacional de Erradicação do Analfabetismo 1958, porém foram extintas.

As campanhas atuavam tanto no meio urbano, quanto na zona-rural. Na época achava-se que era muito fácil alfabetizar adultos, as pessoas analfabetas eram vistas como sem cultura. O ensino oferecido era simplista, utilizavam cartilhas com método silábico, descontextualizados, mecânicos, fora do contexto do indivíduo.

Na prática, ocorria uma alfabetização em três meses e o curso primário em dois períodos de sete meses; no período seguinte as ações voltavam-se para o desenvolvimento comunitário e para o treinamento profissional. Pretendia-se estimular o desenvolvimento social e econômico, através de um processo educativo que supostamente poderia promover a melhoria das condições de vida da população. (VENTURA, 2001, p. 5)


Segundo Ventura (2001) em 1958 ocorreu o 2° Congresso Nacional de Adultos, mostrando um novo olhar para esse campo, onde viu-se a necessidade de criar novas diretrizes para a educação de jovens e adultos, momento marcante para época.

 Paulo Freire, foi um educador que teve grande destaque na educação de jovens e adultos. Ele pensava na educação como um ato político, poderia levar a submissão ou libertação do indivíduo, defendia o ensino horizontal e não de cima para baixo, o diálogo entre educador e educando. Pensava a educação como um instrumento de emancipação.

 Ao longo dessas iniciativas educacionais, não se olhava o analfabeto com um olhar mais específico, ou seja, como um sujeito ativo na sociedade. A presença das ideias de Freire muda essa realidade, onde provocou uma revolução com sua Educação Libertadora que defendia a conscientização reflexiva e autonomia das classes desfavorecidas, sua libertação das classes dominantes, tornando-se sujeitos críticos e ativos. 

Ao contrário das práticas tradicionais de alfabetização, voltadas prioritariamente para o aprendizado instrumental, o grupo representado por Paulo Freire muda o foco para o sentido da aprendizagem na vida das pessoas. Assim, a partir da compreensão da educação e da alfabetização como expressões culturais, Paulo Freire contribuiu para a produção de um novo arcabouço conceitual e uma nova postura epistemológica para os processos de alfabetização e educação popular. (VENTURA,2001 ,p.11)


Nesse período, entre os anos 1950 e início dos anos 1960, surgem a expansão de movimentos, marcados por duas concepções: 

De modo geral, podemos afirmar que coexistem nessa época duas concepções distintas de educação: uma que concebia a educação como formadora da consciência nacional e instrumentalizadora de transformações político-sociais profundas na sociedade brasileira; e outra que a entendia como preparadora de recursos humanos para as tarefas da industrialização, modernização da agropecuária e ampliação dos serviços.(VENTURA,2001  ,p.8)

Destacam-se alguns movimentos de acordo com Ventura (2001) Movimento de Cultura Popular (MCP), organizado por Freire, com propostas culturas e educação para crianças e adultos. Movimento de Educação de Base (MEB) sobe direção da Conferência Nacional de Bispos do Brasil (CNBB), Campanha De Pé no Chão Também se Aprende a Ler, entre outros.

    Em 1964, conforme Ribeiro (1997), Paulo Freire assume o Plano Nacional de Alfabetização (PNA), de maneira que ficaria à frente dos programas educacionais do Brasil. Para ele o analfabetismo era fruto das desigualdades sociais, situação de pobreza, onde deve ser avaliada a realidade de cada educando, onde eles devem ser vistos como sujeitos culturais, pensantes, podem refletir sobre a realidade que vivem e transformá-la. 

O que temos de fazer, na verdade, é propor ao povo, através de certas contradições básicas, sua situação existencial, concreta, presente, como problema que, por sua vez, o desafia e, assim, lhe exige resposta, não só no nível intelectual, mas no nível de ação. (FREIRE, 2002, p.86)    



    Com o Golpe Militar de 1964 Paulo Freire é afastado do programa. Ribeiro (1997) completa, que nessa época havia se difundido inúmeros programas de alfabetização, porém com receio da queda da ordem vigente e ainda com o grande problema de analfabetismo, o regime militar decide criar o MOBRAL, Movimento Brasileiro de Alfabetização, onde a educação é mais tecnicista, acrítica, para que o educando não problematize, não pense.

    Em 1971 o Ensino Supletivo foi regulamentado, Segundo Haddad e Di Pierro (2000) a proposta supria objetivos como: escolarizar aqueles que não concluíram os estudos na idade certa, promover a educação do futuro, atualizando os conhecimentos, de maneira que geraria mão de obra para o desenvolvimento do país.

    De acordo como Art. 37 da Lei n° 9.394/96 (LDB N. 9394/96), a educação de jovens e adultos será destinada àqueles que não tiveram acesso ou continuidade de estudos no ensino fundamental e médio na idade própria, sendo essas oportunidades gratuitas e apropriadas.

    A Educação de Jovens e Adultos tem uma trajetória extensa, mas foi através de Freire que esse ensino foi olhado de forma diferente. Assim foi formulado o seguinte problema de pesquisa “Quais as principais contribuições de Paulo Freire para o ensino na EJA.

A Educação de Jovens e Adultos é uma modalidade com sua própria identidade, os sujeitos que fazem parte dela trazem consigo experiências, toda uma vivência, saberes, crenças e valores já formados, que devem ser relevantes em sala de aula. Assim como ressalta Silva (2010), 

Diante da proposição de se  trabalhar  com  a  Educação  de  Jovens  e  Adultos –EJA deparasse, de pronto, com uma necessidade real de olhar para esses sujeitos de  maneira  diferenciada  da  comumente  associada  aos  estudantes  que  seguem uma  trajetória  escolar  quando  crianças  e  adolescentes.  As pessoas jovens e adultas, ao retornarem aos espaços de educação formal, carregam consigo marcas profundas de vivências constitutivas de suas dificuldades, mas  também de esperanças  e  possibilidades,  algo  que  não  deveria  ficar  fora  do  processo  de construção do saber vivenciado na escola (SILVA, 2010, p.66).


    Desta forma, ao se trabalhar com essa modalidade é importante considerar todas essas especificidades dos educandos, que foram excluídos do sistema escolar e estão tentando se reintegrar a ele, alguns sujeitos com possíveis traumas que esperam poder superar. 

Na EJA encontramos em sua maioria trabalhadores, com diferentes histórias de vida, desde pessoas que nunca frequentaram uma escola, por inúmeros motivos, têm aqueles que desistiram ou foram expulsos da escola e agora estão tentando retornar à sala de aula, seja por realização pessoal ou para se inserir no mercado de trabalho. 

Assim, para estabelecer o perfil do aluno da EJA, é necessário considerar estes alunos como um público heterogêneo, com uma bagagem sociocultural empírica, cabendo ao educador atender este perfil com propostas pedagógicas diferenciadas, inserindo-os na sociedade com direito à cidadania, a trabalho e à autonomia. (FERREIRA, ALCANTÂRA, GAHYVA 2009, p.190)

O fato é que essas pessoas tem um conjunto de experiências vividas, sejam positivas ou negativas. São sujeitos de direito e também de deveres, que desejam uma nova inserção na sociedade com mais oportunidades. No entanto, a sociedade os enxerga como fracasso escolar.  

Na sala de aula, além do público heterogêneo constituinte da EJA, existem outros fatores que influenciam o aprendizado no ambiente escolar, como a estrutura do espaço disponível, o tempo de aula, a quantidade de alunos, assim como ressalta Alves (2018), 

O grande desafio, muitas vezes encontrado na sala de aula é fazer com que as experiências sejam partilhadas e a partir destas, aluno e professores cheguem a produção do conhecimento, tendo em vista que outros fatores, tais como a superlotação da sala de aula, a sobrecarga de conteúdos e assuntos a ser ministrados, o tempo reduzido e etc., não permitem olhar detalhes que surgem e se tornam evidentes ao longo do processo. (ALVES, 2018, p.35)

     Atuar na EJA é contornar obstáculos diários, com isso destacamos a figura do professor que deve recriar-se diariamente, aprender a lidar com os desafios dessa modalidade que não inclui apenas os alunos, mas as condições de trabalho em si, que muitas vezes são desfavoráveis e dificultam sua atuação.

Além dos fatores físicos, o educador sempre deve repensar sua prática e buscar formações para atender melhor seus alunos.

    Conforme Freire (1996, p.21 ) “Por isso é que, na formação permanente dos professores, o momento fundamental é o da reflexão crítica sobre a prática. É pensando criticamente a prática de ou de ontem que se pode melhorar a próxima prática”.

    O professor da Educação de Jovens e Adultos não tem um manual de como lidar com esse público, de maneira que só a vivência diária com esses sujeitos, conhecendo a fundo cada um, refletindo sua prática, buscando, que é possível oferecer um ensino-aprendizagem que atenda a realidade deles.

Apesar de ser um direito e não uma ação filantrópica, os professores lidam primeiramente com a questão de os discentes acreditarem que essa educação ofertada é um favor e acabam colocando a si mesmo em posição de desfavorecido, não merecedor, no entanto, eles estão apenas exercendo um direito que lhes foi negado. 

    É importante que primeiramente o educador salientar essas questões, sobre os direitos que esses sujeitos têm dentro da sociedade, trazer esses debates para sala de aula, assuntos relevantes e que fazem parte do contexto social de cada um. 

Conforme Freire (1996, p.13) “Não há docência sem discência, as duas se explicam e seus sujeitos, apesar das diferenças que os conotam, não se reduzem à condição de objeto, um do outro. Quem ensina aprende ao ensinar e quem aprende ensina ao aprender. Quem ensina ensina alguma coisa a alguém.” 

A sala de aula é um lugar de aprendizagem de uma via de mão dupla, professor e aluno constroem e partilham conhecimento, nenhum conhecimento é superior ao outro, apenas diferente. Paulo Freire (1996, p.25) ressalta “Saber que ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua própria produção ou a sua construção.”

Contudo, atuar na EJA é reinventar-se, buscar formações. O professor dessa modalidade não dispõe de recursos didáticos específicos para esse público, o educador deve inovar e pesquisar metodologias que atendam a essa modalidade. 

Constata-se, portanto, que outro grande desafio se apresenta:  a construção, pelos próprios educadores  da  EJA,  de  uma  proposta pedagógica  que  privilegie  os  processos  de formação  dos  jovens  e  adultos,  sujeitos  que  já  têm  voz questionamentos,  e  que  são formados  em  múltiplos  espaços. (SOARES; PEDROSO, 2013, p.8)


    Os sujeitos da EJA já têm uma trajetória de vida, o ensino-aprendizagem desse público tem     que se apresentar de maneira diferenciada a do ensino regular, isso não significa que ela é inferior, e sim que necessita de um outro olhar que valorize as experiências da vida desses sujeitos. Assim como destaca Paulo Freire (1996), 

Como educador preciso de ir "lendo” cada vez melhor a leitura do mundo que os grupos populares com quem trabalho fazem de seu contexto imediato e do maior de que o seu é parte. O que quero dizer é o seguinte: não posso de maneira alguma, nas minhas relações político-pedagógicas com os grupos populares, desconsiderar seu saber de experiência feito. Sua explicação do mundo de que faz parte a compreensão de sua própria presença no mundo. E isso tudo vem explicitado ou sugerido ou escondido no que chamo “leitura do mundo” que precede sempre a “leitura da palavra”. (PAULO FREIRE, 1996, p.42)

Antes do sujeito aprender a leitura da palavra, ele já traz consigo a leitura do mundo, as suas experiências, que serão importantes para compreender a leitura da palavra, para interpretá-la, pois nada adianta ler e não compreender o que está sendo lido, pois assim só será uma decodificação de códigos sem sentido.

A leitura da palavra, ajuda esses sujeitos a se integrarem na sociedade, pois irão entender o contexto social ao qual estão inseridos, pois a educação não é neutra, é ato política, pois isso ela deve ser problematizada e não mecanizada, deve fazer sentido para o educando. 

A memorização mecânica do perfil do objeto não é aprendizado verdadeiro do objeto ou do conteúdo. Neste caso, o aprendiz funciona muito mais como paciente da transferência do objeto ou do conteúdo do que como sujeito crítico, epistemologicamente curioso, que constrói o conhecimento do objeto ou participa de sua construção. (PAULO FREIRE, 1996, p. 36)


    Além de trazer questões que fazem parte do cotiado desse público, o acolhimento por parte do educador a esses discentes também é importante, pois quantas batalhas esses alunos enfrentam para estar em sala de aula, como distância, família, trabalho entre outros fatores. 

    Essas batalhas diárias fazem com que alguns alunos desistam da escola. O ensino é ofertado, porém é necessário garantir a acessibilidade e a permanência desses sujeitos. 

    Uma figura importante que contribuiu com esse olhar voltado para EJA, foi Paulo Reglus Neves Freire, conhecido como Paulo Freire, um pernambucano, nascido em 19 de setembro de 1921, filho de militar e dona de casa, com quem aprendeu a ler a sombra das árvores como ressalta GADOTTI (2004):

Paulo Freire aprender a ler com os pais, a sombra das árvores do quintal da casa em que nasceu. Sua alfabetização partiu de suas próprias palavras, palavras de sua infância, palavras de sua prática como criança, de sua experiência, e não da experiência dos pais, fato que influenciaria seu trabalho, anos depois. (GADOTTI, 2004, p.20)

    Freire logo cedo vivenciou a fome e a pobreza, devido à depressão de 1929, em consequência da quebra da bolsa de Nova York que atingiu muitos países, inclusive o Brasil, fato esse que veio a contribuir com a preocupação aos menos favorecidos. 

Pode-se dizer que Paulo Feire viveu uma infância feliz. Mas conheceu muito cedo, como a quase totalidade dos nordestinos brasileiros, o significado da fome e da miséria. Tinha 8 anos quando se fizeram sentir, também no Nordeste, os reflexos da crise econômica de 29. (GADOTTI, 2004, p. 21)

    Freire conseguiu prosseguir seus estudos devido ao seu irmão mais velhos, que começou a trabalhar para ajudar em casa.

 Assim, ingressou na Faculdade de direito em Recife em 1943, porém não exerceu o ofício e acabou lecionando língua portuguesa no Colégio Oswaldo Cruz.

Tinha mais de 20 anos quando conseguiu uma vaga na Faculdade de Direito de Recife. Nessa época, conheceu Elza Maia Costa de Oliveira, professora de primário, alfabetizadora, cinco anos mais velha do que ele, com quem se casou em 1944. Freire tinha, então, 23 anos e já trabalhava como professor secundário. Foi Elza quem o estimulou a se dedicar aos estudos, de forma sistemática, chegando até mesmo a colaborar no método que o tornou conhecido. (GADOTTI,2004, p.22)

    Casou-se com Elza Maia, professora de primário, com quem teve cinco filhos. Posteriormente, devido ao falecimento de Elza, casou-se com Ana Maria.

    De acordo com Gadotti (2004), Freire atuou como diretor do departamento de Educação e Cultura do SESI (Serviço Social da Industria), onde ocorreu suas primeiras experiências com alfabetização de famílias da classe trabalhadora, na prática ele apendeu a dialogar e perceber como de fato funcionava aquela realidade, que era necessário discutir questões significativas para aquelas famílias, assim se tornando um educador.

    Paulo Freire criticava a educação brasileira, defendia o exercício da democracia, era contra a educação bancária, onde o professor era detentor do saber e o aluno um recipiente vazio, onde é depositado conhecimento, ou seja, o professor transmite os conteúdos e eles ficam retidos nos alunos, sem uma ação reflexiva e sim como um depósito de informação.

    Conforme Gadotti (2004), Freire iniciou seus estudos ao método alfabetizador de adultos, após fundar o Serviço de Extensão Cultural da Universidade de Recife, com o papel de diretor.

    Em 1962, Paulo Freire dá início ao seu método alfabetizador junto com voluntários na cidade de Angicos, localizada no Rio Grande do Norte, que resultou na alfabetização e politização de 300 trabalhadores em 40 horas. 

    O método desenvolvido inspirou o Plano Nacional de Alfabetização, segundo Gadotti (2004, p.32) “Paulo Freire foi convidado pelo presidente João Goulart e pelo ministro da Educação, Paulo de Tarso C. Santos, para repensar a alfabetização de adultos em âmbito nacional.”

    Em 1964, com o golpe militar, o Plano Nacional de Alfabetização foi instinto, e Paulo Freire foi preso por 70 dias e em seguida exilado, visto que seu método ensino conteúdos políticos progressistas. Gadotti 2004) ressalta,

Foi uma experiência que durou 70 dias, traumática o suficiente para ensinar-lhe algumas coisas. Na cadeia, ele teve ainda maior clareza a respeito da relação entre educação e política, confirmando sua tese de que a mudança social teria de partir das massas e não de indivíduos isolados. (GADOTTI, 2004, p.54)

    O método desenvolvido por Freire, não consistia apenas em alfabetizar os trabalhadores, também era necessário conscientizá-los sobre sua realidade, problematizando os debates através de diálogos.

    De acordo com Gadotti (2004) antes de iniciar as aulas, era necessário fazer uma espécie de pesquisa com os trabalhadores locais, porém sem questionários, ou qualquer coisa parecida, apenas explorar de maneira natural as conversas dos trabalhadores, observar como percebiam o mundo, seu modo de vida, tudo era utilizado. Assim se revelava as palavras e temas geradores que eram comuns entre os trabalhadores, porém as palavras deveriam conter todos os fonemas da língua portuguesa. 

    O recurso utilizado para os debates, eram os círculos de cultura, onde se utilizava as palavras geradoras ou os temas que os trabalhadores traziam, ou seja, palavras que faziam parte das situações concretas da realidade de cada um, por isso o nome círculo de cultura. Assim essas palavras seriam decodificadas, e a partir delas geradas as situações de problematizações e conscientização.

    Para Paulo Freire todos deveriam ter acesso ao conhecimento, visto que ele não é uma propriedade. Defendia que a educação tem o papel de libertar o homem da sua opressão e de transformação da sociedade. “O mundo não é. O mundo está sendo” PAULO FREIRE (1996, p.39).

    A pedagogia libertadora de Paulo Freire, traz uma metodologia de questionamento da realidade social do educando, visando a transformação da sua realidade.


 AS PROPOSTAS CURRICULARES PARA EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS

    Ao pensarmos em currículo, primeiramente nos vem à mente conteúdo das disciplinas a serem trabalhados, grade escolar. No entanto, currículo é mais que isso, pois abrange inúmeros fatores que não se limitam apenas a conteúdos, mas a experiências, saberes, construção de conhecimentos, práticas pedagógicas. Segundo Moreira e Candau (2007):

(...) estamos entendendo currículo como as experiências escolares que se desdobram em torno do conhecimento, em meio a relações sociais, e que contribuem para a construção das identidades de nossos/as estudantes. Currículo associa-se, assim, ao conjunto de esforços pedagógicos desenvolvidos com intenções educativas. (MOREIRA e CANDAU, 2007, p.18)

 

    O currículo é um instrumento norteador da escola, o qual não é neutro e também não é estático, pois pode ser adaptado de acordo com a realidade de cada escola, envolvendo aspectos política, humanísticos e sociais.

Pode-se afirmar que é por intermédio do currículo que as “coisas” acontecem na escola. No currículo se sistematizam nossos esforços pedagógicos. O currículo é, em outras palavras, o coração da escola, o espaço central em que todos atuamos, o que nos torna, nos diferentes níveis do processo educacional, responsáveis por sua elaboração. (MOREIRA e CANDAU, 2007, p.19)

Sendo assim, o currículo deve levar em consideração toda a comunidade escolar, as peculiaridades de cada sujeito que constitui o grupo. O currículo deve ser refletido constantemente, pois ele é um conjunto de ações. 

No ano de 1996 foi distribuído a Proposta Curricular Nacional para EJA, voltada para o primeiro segmento (1° ao 5° ano). Essa proposta traz orientações que podem auxiliar a elaboração do currículo, que devem ser adaptados à realidade de cada escola. Pois a proposta, “Trata-se de um subsídio para a formulação de currículos e planos de ensino, que devem ser desenvolvidos pelos educadores de acordo com as necessidades e objetivos específicos de seus programas’’ (BRASIL, 2001, p.14). 

No primeiro capítulo da proposta é abordado um breve histórico da EJA, o segundo capítulo apresenta os fundamentos, elaborados para a formulação dos objetivos gerais da proposta e os capítulos posteriores abordam três áreas: Língua Portuguesa, Matemática e Estudos da Sociedade e da Natureza com seus objetivos didáticos.

A proposta ressalta em muitos momentos sobre a especificidade da EJA, comenta sobre não infantilizar ou estereotipar os conteúdos, faz referência a fazer uma ligação dos conteúdos com a realidade dos educandos ou utilizadas como temas geradores. Acrescentando, “O educador de jovens e adultos tem de ter uma especial sensibilidade para trabalhar com a diversidade, já que numa mesma turma poderá encontrar educandos com diferentes bagagens culturais” (BRASIL, 2001, p. 46).

A Proposta Curricular para o segundo segmento da Educação de Jovens e Adultos, lançada em 2002 com base no Parecer CNE/CEB 11/2000 contêm três volumes. No primeiro contêm a introdução do conteúdo, divido em duas partes. Na primeira as Características específicas da EJA, onde apresenta o histórico, dados estatísticos desse atendimento, características dos alunos e professores.

 Na segunda é a Construção de uma proposta curricular para EJA, onde inicia-se apresentando a modalidade EJA, seguida das concepções norteadoras e por fim organização curricular. O segundo e terceiro volume, relaciona-se as disciplinas trabalhadas. 

O volume introdutório, explicita que é necessário conhecer as particularidades dessa modalidade, pois são jovens e adultos e não crianças.

A escola que atende à educação de jovens e adultos precisa conhecer e levar em conta as singularidades dos alunos dessa modalidade da educação básica do Ensino Fundamental, a fim de não se configurar como mera adaptação de uma escola de crianças, nem um suprimento de algo que os alunos não tiveram anteriormente. (BRASIL, 2002, p. 89)

A proposta também comenta sobre a importância de a Instituição educacional saber quem são seus alunos, pois seu currículo, projeto pedagógico deve apresentar conteúdos que são relevantes para EJA.

Cada escola necessita conhecer quem são seus alunos para, a partir daí, desenvolver um projeto educativo que contemple questões importantes a serem trabalhadas. Diferenças de idade, características socioculturais, inserção ou não 90 no mundo do trabalho, local de moradia, relações com a produção cultural variam significativamente e exigem projetos educativos diferenciados ( BRASIL, 2002, p. 89)

    A EJA é uma modalidade que atende a educação básica, destinada para aqueles que não terminaram seus estudos na idade certa ou não tiveram acesso. Conforme LDB Art. 37 da Lei n° 9.394,

 A educação de jovens e adultos será destinada àqueles que não tiveram acesso ou continuidade de estudos nos ensinos fundamental e médio na idade própria e constituirá instrumento para a educação e a aprendizagem ao longo da vida. (BRASIL,1996)


Essa modalidade que é obrigação do Estado a oferta de ensino gratuito para esses sujeitos que foram excluídos da sociedade por alguma situação, recebe jovens a partir de quinze anos no ensino fundamental e no ensino médio a partir dos dezoito anos.

Desta forma, a Educação de Jovens e Adultos tem suas especificidades que requerem muita atenção no momento da elaboração do currículo, pois os alunos que compõem essa modalidade são um grupo heterogêneo, que trazem vivências e saberes que devem ser levados em consideração.

Os alunos da EJA, por terem uma trajetória pessoal maior em vivências e complexidades do que os alunos do ensino regular, nos trazem um cardápio de saberes próprios que vêm a contribuir e enriquecer os espaços pedagógicos. Seria uma falta imperdoável dos professores não aproveitar essa diversidade de culturas e de habilidades que perpassa no palco da sala de aula. (SOTELO, 2012, p. 11)

Para subsidiar e orientar a construção do currículo nas escolas, existem documentos oficiais que norteiam as instituições, como as Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNS), Proposta Curricular, Base Nacional Comum Curricular (BNCC). 

No entanto, foi só a partir dos anos 2000 no parecer n° 11 do CEB, que as Diretrizes Curriculares Nacionais para a modalidade EJA foram homologadas, efetivando a EJA como modalidade da Educação básica.

É importante reiterar, desde o início, que este parecer se dirige aos sistemas de ensino e seus respectivos estabelecimentos que venham a se ocupar da educação de jovens e adultos sob a forma presencial e semi-presencial de cursos e tenham como objetivo o fornecimento de certificados de conclusão de etapas da educação básica. Para tais estabelecimentos, as diretrizes aqui expostas são obrigatórias bem como será obrigatória uma formação docente que lhes seja conseqüente. (CEB 11/2000: 4).


Esse Parecer possui 25 artigos, os quais institui normas que devem ser seguidas obrigatoriamente, levando em consideração as especificidades dessa modalidade, assegurando o pleno exercício do direito. Ressalta as seguintes funções da EJA, a reparação, a equalizadora e a qualificação.

O Parecer CNE/CEB 11/2000 ressalta sobre a divisão existente no país que vem de séculos atrás, duas realidades totalmente opostas como o oficial e o real, onde a educação era eletista, boa parte da população como os negros, não tinham acesso a escolaridade. 

Devido a esse passado histórico, que deixou vestígios na sociedade e as situações adversas, logo existe uma divisão em alfabetizados e analfabetos, assim a função reparadora vem rompendo com isso, restaurando esse direito que lhes foi negado, garantindo uma educação de qualidade e a igualdade ontológica.

A função equalizadora tem relação com a igualdade de oportunidades para as pessoas que não tiveram chances de ingressar na escola por motivos variados, possibilitando que tenham nova inserção no meio social.

O ser humano é um sujeito inacabado, com potencial para sempre estar se reinventando e construindo conhecimento. A função qualificadora associa-se a essas novas possibilidades, onde o processo educativo pode colaborar para essas mudanças.

As Diretrizes Curriculares Nacionais, ressaltam que é necessário levar em consideração o perfil do aluno, sua faixa-etária, pois precisam de um modelo pedagógico específico. 

Para melhorar as condições e a qualidade da educação de jovens e adultos, deve-se elaborar e implementar um currículo flexível, diversificado e participativo, que seja definido a partir das necessidades e dos interesses dos grupos, levando-se em consideração sua realidade sociocultural, científica e tecnológica e reconhecendo o seu saber.(BRASIL, 2004, p.32)


Esses sujeitos de direito, possuem vivências, suas problemáticas, leitura de mundo, que foram construídos ao longo de sua vida. Têm uma cultura e produzem cultura. É preciso pensar nesse aluno que pode contribuir ativamente a partir de sua bagagem cultural.

A escola deve pensar nesse currículo que vai formar esse sujeito integralmente, os alunos que ali frequentam buscam ter uma inserção na sociedade, compreender o mundo em que vivem, querem entender a realidade atual, buscar sua emancipação.

Os alunos da EJA, por terem uma trajetória pessoal maior em vivências e complexidades do que os alunos do ensino regular, nos trazem um cardápio de saberes próprios que vêm a contribuir e enriquecer os espaços pedagógicos. Seria uma falta imperdoável dos professores não aproveitar essa diversidade de culturas e de habilidades que perpassa no palco da sala de aula (SOTELO, 2012, p. 11)

    Apesar desses documentos apresentados acima, ainda é necessário documentos atualizados que falem sobre essa modalidade, trazendo atualizações, já que a sociedade está sempre em construção. 

    Recentemente, foi homologada a Base Nacional Comum Curricular (BNCC), ela aborda o conjunto de conhecimentos que deverão ser trabalhados por todos os municípios da Ed. Infantil até o Ensino fundamental 2, ou seja, todos terão uma referência comum. Contudo ela deve ser adequada a cultura local. 

(...) a BNCC está estruturada de modo a explicitar as competências que devem ser desenvolvidas ao longo de toda a Educação Básica e em cada etapa da escolaridade, como expressão dos direitos de aprendizagem e desenvolvimento de todos os estudantes. (BRASIL, 2017, p.23)

    A BNCC também será referência para a Educação de Jovens e Adultos. Nas suas primeiras versões a base trouxe um foco na EJA, trazendo debates sobre a modalidade e suas especificidades. No entanto na versão final não há orientações específicas para a modalidade. Acrescentando,

Essas decisões precisam, igualmente, ser consideradas na organização de currículos e propostas adequados às diferentes modalidades de ensino (Educação Especial, Educação de Jovens e Adultos, Educação do Campo, Educação Escolar Indígena, Educação Escolar Quilombola, Educação a Distância), atendendo-se às orientações das Diretrizes Curriculares Nacionais (BRASIL, 2017, p.17)

O documento considera que as mudanças e adequações do currículo deverão ser elaboradas pelos estados e municípios. 

De acordo com Cunha, Moraes e Voigt (2019) a Educação de Jovens e Adultos dispõe de realidades distintas, onde os processos de aprendizagem devem colaborar para que os sujeitos desenvolvam suas capacidades, as quais o currículo deve ser elaborado priorizando os conhecimentos que desenvolvam seu potencial de aprendizagem. 

A BNCC norteia a educação no Brasil de uma forma padronizada, para que todos tenham acesso aos mesmos conhecimentos, porém ela nega as especificidades dos sujeitos, pois não existe uma educação uniforme para todos, pois a EJA tem as questões distintas, sua identidade, assim como os indígenas também têm as suas.

A partir destas descrições, podemos considerar que a participação de FREIRE no pensamento educativo constitui-se como pilar fundamental na construção de uma educação que atenda às classes menos favorecidas, potencializando condições para sua ascensão.

Nosso país necessita de investimentos na área da Educação e em especial na EJA. Esta modalidade deveria ser o centro das preocupações governamentais, uma vez que entendemos a dívida considerável com a população atendida por ela. 


CONSIDERAÇÕES FINAIS

    O presente artigo surgiu por intermédio dos depoimentos de uma professora de EJA em uma palestra e a leitura do livro Pedagogia da Autonomia, os quais mostraram que essa modalidade tem muito a ser discutido e a ensinar, despertando assim o interesse no estudo sobre essa modalidade que é a Educação de Jovens e Adultos, surgindo a pesquisa as contribuições de Paulo Freire no ensino da EJA.

    Nessa perspectiva, a pesquisa teve como objetivo geral analisar as principais contribuições de Paulo Freire no ensino da EJA, constatando-se que ele foi um educador importante para essa modalidade, trazendo um novo olhar para esse público com seu método alfabetizador que visava a emancipação das camadas populares. 

    Diante disso para auxiliar a pesquisa, foram traçados objetivos específicos que foram alcançados, iniciando com a análise do histórico da EJA no Brasil, a qual teve uma trajetória marcada por campanhas com propósito de ensinar a ler e escrever, para que pudessem formar mão-de-obra para o novo modelo industrial que se estabelecia no Brasil. 

A partir de movimentos sociais que cobravam políticas mais efetivas para a educação de jovens e adultos, a educação básica gratuita para esse público passa ser um direito garantido por lei. 

Posteriormente com base no objetivo identificar as propostas de Paulo Freire no processo de ensino-aprendizagem na Educação de Jovens e Adultos, foi possível perceber que as ideias de Freire foram revolucionárias na época, ele tinha um pensamento oposto dos demais, almejava a libertação dos menos favorecidos das classes dominantes.

Com os movimentos liderados por Freire foi se destacando com sua Educação Libertadora, que defendia a conscientização dos educandos, para fazê-los pessoas críticas, transformadoras de suas realidades. 

Seu método de alfabetização ganhou destaque, pois partia do pressuposto que não é possível fazer uma educação sem conhecer os educandos, ou seja, compreender o universo do aluno e partir do mesmo, para que o ensino- aprendizagem possa fazer sentido para ele. 

Seus pensamentos fizeram com que esses sujeitos a margem da sociedade, tivessem uma visibilidade diferente, são pessoas que constituem a sociedade e merecem ser protagonistas da sua vida, por isso a educação como um ato político e emancipatório.

Por fim caracterizar o currículo da EJA, dessa forma nesse objetivo foi identificado as Propostas Curriculares Nacionais para EJA, Diretrizes Curriculares Nacionais e a Base Nacional Comum Curricular, documentos que ajudam na elaboração do currículo das escolas. 

No entanto, apesar desses documentos serem um instrumento que ajudam a orientar a instituição de ensino, os alunos da EJA necessitam de currículos adequados que se atentem a esse público heterogêneo que já foi excluído em um determinado tempo de sua vida da escola, para que se sintam incluídos e valorizados.

 É necessário que os educadores utilizem metodologias de ensino diferentes para essa modalidade de ensino para que possam ter uma aprendizagem significativa em sala de aula, levando em consideração primeiramente suas vivências.

Conforme o estudo, Paulo Freire de fato contribuiu para a Educação de Jovens e Adultos, pois trouxe um novo sentido para a educação e o para o aluno, como um sujeito ativo e não estático. A educação pode ser libertadora ou opressora, cabe a aos professores colaborarem com essa transformação e aos governantes com políticas públicas que assegurem a permanências dos educandos em sala de aula. 

    A pesquisa foi elaborada a partir de um estudo teórico, através de dados coletados por meio de documentação indireta, mediante pesquisa bibliográfica, que tornou possível alcançar os objetivos previstos. 

    Diante da metodologia utilizada para realizar a pesquisa, notou-se que o trabalho poderia ter sido realizado com uma pesquisa mais ampla, a vivências em sala de aula com jovens e adultos também poderia ser que grande relevância no estudo. Assim deixo a pesquisa em aberto, para possíveis complementações.





REFERÊNCIAS 

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