AS CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS, ADMINISTRATIVAS E MORAIS PARA A EMPRESA...

Por myrella mendes de sousa silva | 19/11/2016 | Direito

AS CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS, ADMINISTRATIVAS E MORAIS PARA A EMPRESA, ADVINDAS DA RESPONSABILIZAÇÃO OBJETIVA DAS PESSOAS JURÍDICAS, EM DECORRÊNCIA DA LEI ANTICORRUPÇÃO: O PROGRAMA DE COMPLIANCE E O ACORDO DE LENIÊNCIA[1]

 

RESUMO 

O presente artigo tem como objetivo analisar a Lei nº 12846 de agosto de 2013, também conhecida como Lei Anticorrupção. Destarte, primeiramente, será feita uma análise a respeito das inovações desta lei, suas principais características e as consequências desta lei para as empresas no tocante às licitações. Posteriormente será analisado o Acordo de Leniência presente na nova Lei Anticorrupção, enquanto acordo que permite ao infrator participar da investigação, com o objetivo de prevenir ou reparar danos de interesse coletivo, objeto da administração pública. O artigo será finalizado discorrendo-se sobre o Programa de Compliance como instrumento adotado internamente pelas empresas para prevenir a corrupção.

 

INTRODUÇÃO 

O fenômeno da corrupção possui uma faceta complexa, podendo ser analisada sob vários óbices. Fato é que este fato social tem enormes efeitos negativos sobre a sociedade.  A palavra corrupção, gramaticalmente, tem origem do latim “Corruptione” e significa corrompimento, decomposição, devassidão, depravação, suborno, perversão, peita. Porém, historicamente, a corrupção sempre esteve associada aos conceitos de ilegalidade.

Neste sentido, atendendo às convenções internacionais da ONU, OEA e OCDE, em agosto de 2013 foi aprovado o Projeto da Lei Anticorrupção (Lei nº 12.846/2013), buscando atentar às atitudes corruptoras das empresas, regulando as relações de setores públicos e privados no Brasil. Buscando atribuir ao Poder Público instrumentos administrativos válidos e precípites para responsabilizar o erário público diante dos atos de corrupção praticados por pessoas jurídicas e os demais atuantes, especialmente no que diz respeito às licitações públicas e execução de contratos, a Lei 12.846/2013 abraçou uma série de atos, dentre eles, a responsabilização objetiva das pessoas jurídicas. (GONÇALVES; GABARDO, 2013). Outro ponto importante, é o da criação do Cadastro Nacional de Empresas Punidas – CNEP.

Diante deste novo panorama, que, independente de culpa ou dolo, estabelece a responsabilização administrativa e civil de pessoas jurídicas, abrangendo todas as negociações da empresa realizadas seja pelos proprietários ou funcionários diretos e indiretos com o setor público, evidencia-se a necessidade de atos que possam combater a corrupção, devido principalmente ao Artigo 7°, Inciso VII e VIII desta lei, que leva em consideração, para a aplicação das sanções, a existência de práticas e mecanismos internos de anticorrupção.

É neste cerne que se insere a significativa importância do Programa de Compliance e Acordo de Leniência. O primeiro se constitui em um mecanismo de procedimento interno de integridade e incentivo à denúncia de irregularidade, conforme códigos de ética e de conduta, que dizem respeito às pessoas jurídicas. O segundo trata-se da cooperação do acusado com as investigações. Ambos os institutos serão tratados de forma mais detalhada a seguir.

1 LEI ANTICORRUPÇÃO: NOÇÕES E MUDANÇAS SIGNIFICATIVAS PARA AS EMPRESAS

MOKDISSE (2013) discorre que a Lei nº 12.846, mais conhecida como Lei Anticorrupção, teve sua promulgação no dia 1º de agosto de 2013, iniciando a sua vigência em 29 de janeiro de 2014 e fora resultado do grande clamor social que adveio de recorrentes escândalos de corrupção no Brasil e adveio ainda da pressão de investidores estrangeiros, que procuram diminuir os riscos de investimentos no país. A respeito do problema da corrupção brasileira e da referida lei, Samir Leonardo Hallack Mokdisse, afirma ainda que:

Essa lei - originada do P.L. 6.826/2010 da Câmara dos vereadores, e aprovada como P.L. 39/2013 pelo Senado - volta-se diretamente ao problema da corrupção, assunto de grande destaque nos noticiários brasileiros nas ultimas décadas. Segundo o Índice de Percepção de Corrupção - elaborado pela organização não-governamental Transparência Internacional em forma de uma escala de 0 à 100 pontos, onde 0 significa que o país é percebido como altamente corrupto e 100, é percebido como muito íntegro - o Brasil recebeu apenas 43 pontos de 'integridade', ficando na 69ª colocação, demonstrando-se assim a preocupação e falta de confiança da sociedade brasileira para com nossa administração pública. Alguns fatos que corroboram à esta baixa credibilidade seriam a falta de transparência aos atos da Administração pública e o baixo índice de casos nos quais, havendo efetiva constatação de ilegalidades, ocorre a punição dos envolvidos (...) (MOKDISSE, 2013, p. 10).

Dessa forma, a lei em questão estabeleceu às empresas uma responsabilização objetiva, administrativa e civil de pessoas jurídicas por conta da prática de atos advindas de seus representantes ou terceiros, na área da administração pública nacional ou estrangeira (BITTENCOURT JÚNIOR, 2014).

 Rogério Abdala Bittencourt Júnior (2014) aponta ainda, que a referida lei dispôs também a respeito da responsabilidade individual de dirigentes e administradores, na medida de sua culpabilidade, ou seja, mesmo que já reconhecida a responsabilidade administrativa ou civil da pessoa jurídica, não exclui a responsabilidade individual de seus administradores ou dirigentes.

Discorre ainda, no que diz respeito ao âmbito internacional, que a criação desta lei se deu a fim de que houvesse uma harmonização da legislação brasileira com tratados internacionais anticorrupção de que o país é subescritor (OEA – Organização dos Estados Americanos, OCDE – Organização de Cooperação ao Desenvolvimento Econômico e ONU Global Pact).

Simone Maciel Pumar (2014) discorre sobre quais são as principais medidas que a Lei provocará às empresas, afirmando que uma delas é que nas empresas de grande porte e naquelas que já possuem controle e práticas de combate à corrupção, as mesmas deverão documentar suas práticas e controle de maneira clara e habilidosa frente a um eventual processo administrativo ou judicial, a fim de que experimentem reduções nas sanções aplicáveis. A autora afirma ainda que:

Outro detalhe relevante da Lei que merece total atenção para as imediatas medidas na gestão de terceiros é o artigo 4º, fica claro que a responsabilidade não deixa de existir caso ocorra, dentre outras hipóteses, incorporação ou fusão societária, sendo nas hipóteses de incorporação e fusão a responsabilidade fica restrita à obrigação de pagamento de multa e reparação integral do dano causado, até o limite do patrimônio transferido (PUMAR, 2014, p. 10).

NEVES (2014) dispõe então, que desta maneira, faz-se importante definir quais são os “atos” que praticados, vão ensejar sanções previstas na Lei Anticorrupção, são os atos lesivos à Administração Pública, aqueles praticados contra o patrimônio público nacional ou estrangeiro, praticados contra princípios da administração pública ou contra os compromissos internacionais assumidos pelo Brasil. E no que concerne à licitações e contratos administrativos, destacam-se alguns atos lesivos presentes na referida lei, como por exemplo:

  1. a) frustrar ou fraudar, mediante ajuste, combinação ou qualquer outro expediente, o caráter competitivo de procedimento licitatório público; b) impedir, perturbar ou fraudar a realização de qualquer ato de procedimento licitatório público; c) afastar ou procurar afastar licitante, por meio de fraude ou oferecimento de vantagem de qualquer tipo; d) fraudar licitação pública ou contrato dela decorrente; e) criar, de modo fraudulento ou irregular, pessoa jurídica para participar de licitação pública ou celebrar contrato administrativo (...) (NEVES, 2014, p. 1).

Tendo isso em vista, resta claro que as empresas que têm relação com os entes públicos não devem cometer tais atos, atos estes que violam a Administração Pública em geral e o caráter legal e competitivo das licitações e dos contratos advindos das mesmas. No entanto esses exemplos vistos acima demonstram apenas algumas entre inúmeras situações que serão punidas pela Lei Anticorrupção.

No que diz respeito às punições, temos dentro da Lei Anticorrupção as sanções que recairão sobre as pessoas beneficiadas por atos de corrupção. Para Rogério Abdala Bittencourt Júnior (2014), uma parcela dessas sanções só será aplicada em âmbito administrativo, e a outra apenas em processo judicial, ou seja, algumas condutas irão gerar apenas consequências administrativas para a empresa e outras, somente consequências judiciais. Tem-se ainda as consequências morais, que serão vistas mais a frente.

No âmbito administrativo, tem-se como sanções a aplicação de multa, publicação extraordinária da decisão condenatória, que são aplicáveis de forma isolada ou cumulativa, dependendo da gravidade do caso concreto e a inclusão da decisão e dos dados da pessoa jurídica no CNEP, o Cadastro Nacional de Empresas Punidas. Ainda na esfera administrativa, uma alternativa para a pessoa jurídica interessada, é que a mesma firme acordo de leniência com o poder público, de forma a cooperar nas investigações e na coleta de provas, abrandando assim suas punições, o que será visto mais detalhadamente do capítulo seguinte. (NEVES, 2014).

Na esfera judicial, de acordo com o artigo 19, incisos I a IV, as sanções aplicáveis às pessoas jurídicas infratoras consistirão em:

 I - perdimento dos bens, direitos ou valores que representem vantagem ou proveito direta ou indiretamente obtidos da infração, ressalvado o direito do lesado ou de terceiro de boa-fé;

II - suspensão ou interdição parcial de suas atividades;

III - dissolução compulsória da pessoa jurídica;

IV - proibição de receber incentivos, subsídios, subvenções, doações ou empréstimos de órgãos ou entidades públicas e de instituições financeiras públicas ou controladas pelo poder público, pelo prazo mínimo de 1 (um) e máximo de 5 (cinco) anos.

 Quanto às consequências morais que a empresa terá de enfrentar, uma delas consiste no fato da inclusão da decisão condenatória e dos dados da pessoa jurídica no CNEP, pois tal fato pode levar à desclassificação da empresa de uma licitação pública ou concorrência privada, “manchando” assim a sua reputação. Sendo assim, o que se busca com a referida sanção é manter a moralidade nas contratações públicas e prevenir a Administração Pública de realizar termos com empresas que já geraram prejuízos anteriormente (PORTUGAL, 2015).

2 O ACORDO DE LENIÊNCIA DENTRO DA LEI ANTICORRUPÇÃO 

O acordo de leniência, o qual adveio de experiência norte americana, é o intrumento que possibilita ao infrator participar da investigação, objetivando a prevenção ou reparação de dano de interesse coletivo (CAMARGO, 2014).

Para Eloy Rizzo Neto, a celebração do acordo de leniência, advém do seguinte fato:

[...]

 

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