As características da cultura no capitalismo contemporânea na visão de Jameson
Por Rabim Saize Chiria | 21/11/2017 | FilosofiaDr. Rabim Saize Chiria
Saizemmm@gmail.com
Licenciado em Filosofia pela Universidade Eduardo Mondlane; Moçambique
1.As características da cultura no capitalismo contemporânea na visão de Jameson
O exercício de Jameson no seu pensamento é de projectar uma nova cultura sistemática e sua reprodução, enfatizando, de forma especial, suas manifestações no campo da arte, da arquitectura e do espaço, do vídeo, do cinema e da retórica sobre o mercado. Para Jameson (2006) “a inter-relação do cultural e do económico não é uma rua de mão única, mas uma continua interacção recíproca um circuito de realimentação. Entretanto, é impossível destacar ou examinar a cultura em separação do sistema económico.
Segundo Williams (2002: 14), há duas concepções principais a respeito de cultura. Pois, uma delas compreende a cultura como actividades artísticas e intelectuais, que incluem determinada linguagem, estilos de arte e, até mesmo expressões do jornalismo, da moda e da publicidade. No entanto, a outra concepção enfatiza que a cultura relaciona-se a uma ordem social global, a qual se envolvem essencialmente em todas as formas de actividade social, criando um modo de vida geral. Entretanto, as actividades artísticas e intelectuais são produtos dessa ordem social. E nesta linha de pensamento, Jameson alia-se a este último ponto de vista, o que fica evidente pela análise das mudanças culturais como transformações no modo de vida, que estão directamente relacionados à maneira de operar do sistema económico.
Para Jameson (1997: 63) uma das características do pós-modernismo (…) é a fusão entre a cultura e a economia, não existindo mais uma diferenciação entre esses campos. Essas características difere o pós-modernismo do moderno, uma vez que não há mais uma distinção entre alta cultura e cultura de massa, como era concebido pelo modernismo. Uma especificidade desse último era a compreensão da existência relativa da autonomia da cultura, como espaço de experiência autêntica em contraste com o ambiente circundante de cultura comercial.
(…) a dissolução da alta cultura e a simultânea intensificação do investimento em mercadorias da cultura de massas podem ser suficientes para gerir que, qualquer que tenha sido a situação em estágios e momentos anteriores do capitalismo ( quando o estético era exactamente santuário e um refúgio santuário contra os negócios e o estado), hoje não sobrou nenhum enclave – estético ou não – no qual a forma mercadoria não reine suprema( Ibidem: 88).
O outro aspecto da cultura contemporânea é o consumo estético das próprias mercadorias, que passaram a contar com uma industria especifica que planeja suas imagens e as estratégias de venda, como é o caso da industria da propaganda, da publicidade e do marketing (…), o valor de troca se generalizou a tal ponto que a lembrança do valor de uso se apagou, pois, compra-se mercadoria muito mais pela sua imagem do que pela sua utilização imediata.
“ A sociedade da imagem e da propaganda sem dúvidas comprovam a transformação gradual das mercadorias em imagens libidinais deles mesmas, ou seja, quase que produtos culturais” (Ibidem: 92). Pois, as próprias imagens tornaram-se mercadorias como um tempo de giro de consumo extremamente curto e com a possibilidade de serem vendidas instantaneamente no espaço.
Segundo Harvey (2004: 46), o capitalismo para manter seus mercados, se viu esforçado a produzir desejos e estimular sensibilidades individuais para criar uma nova estética que superasse e se opusesse às formas tradicionais de alta cultura. Neste âmbito, Hervey percebe a propaganda como arte oficial do capitalismo, pois além de mediar a relação entre a cultura e a economia, actua de maneira crucial na construção dos valores e hábitos de vida, como o individualismo e o consumismo.
De acordo com Jameson (2006: 167), o pós-modernismo possui como uma de suas características principais o enfraquecimento da historicidade, seja na esfera pública, seja na esfera privada (…), o enfraquecimento da historicidade também pode ser percebido nas diversas obras de artes, que costumam não expressar o contexto histórico em que foram produzidas, características no modernismo.
A falta de profundidade e novo tipo de superficialidade e volatilidade é outra característica da cultura pós-moderna. Além de estar presente nas relações humanas também pode ser identificada nas obras de arte e na produção teórica. No entanto, o autor salienta que, “as obras de artes não são mais unificadas ou orgânicas, mas um quarto de desejo de subsistemas desconexos, matérias-primas aleatórias e impulsos de todo tipo” (Ibidem: 169). Pois, essas características são o repúdio aos modelos fundamentais da profundidade, neste contexto, a evidência da falta de profundidade está presente nos meios de comunicação de massa, a partir dos quais a maioria da população tem acesso aos conhecimentos gerais da realidade.
Segundo Jameson, a diminuição do afecto é também uma das características do pós-modernismo, portanto, essa tem resultados na vida psíquica, que torna debilitada por súbitas depressões e mudanças das pessoas, pois nas artes, essa característica aparece em obras impessoais, que não externalizam a individualidade do artista, fazendo com que o estilo pessoal entre em decadência. “Essa mudança na dinâmica da patologia cultural pode ser caracterizada como aquela em que a alienação dos sujeitos é deslocada pela sua fragmentação” (Ibidem: 172). No ponto de vista de Jameson (…) o vídeo é a arte que mais evidencia a lógica cultural do capitalismo contemporâneo, ultrapassando o domínio cultural já exercido pela literatura e pelo cinema em outros momentos.
Nestes casos, o autor afirma que a cultura no pós-modernismo está intimamente relacionada à mídia, que precisa ser compreendida na sua dimensão artística ou como forma especifica de produção estética, com destaque para a produção de imagens. No que diz respeito ao vídeo, em especial sua característica principal é o fluxo de imagens, que dificulta um distanciamento crítico do telespectador e o trabalho da memória. Pois, o público é dissolvido no processo, o que reforça sua fragmentação.
Para os grupos políticos que procuram intervir activamente na história e modificar o seu momentum passivo (convista a canaliza-lo no sentido de restabelecimento regressivo de uma fantasia de um passado mais simples), só pode haver uma coisa deplorável e representável em uma forma cultural de vício da imagem que, ao transformar o passado em uma miragem visual (…) abandona atarefa de pensar o futuro as fantasias de puras catástrofes e cataclismas inexplicáveis, que vão de visões do terrorismo no nível social a visão de câncer no nível pessoal (Ibidem: 207).
Segundo Jameson, a fragmentação do sujeito do mesmo modo pode ser conhecida na mutação do espaço, que fica mais evidenciada nas construções arquitectónicas pós-modernas. Para o autor, elas são feitas de modo a ultrapassar a capacidade do corpo humano de se localizar no espaço, de organizar o seu entorno imediato pela percepção e até de mapear cognitivamente sua posição no mundo. Ora, na visão do autor, arquitectura pós-moderna possui características como “ o estranho sentimento do novo de uma ausência do externo e do interno, desnorteamento e a perda da orientação espacial […], a desordem de um ambiente no qual as pessoas nem as coisas têm mais seu lugar (Ibidem: 140).
Entretanto, a lógica cultural contemporânea é baseada na ausência da historicidade e da memória; na falta de profundidade na leitura de mundo e nas relações humanas; e na fragmentação espacial, social e política das pessoas. Todos esses elementos são reforçados cotidianamente pelos mecanismos mais direitos de produção de cultura, como os meios de comunicação de massa, que se tornarão um instrumento de peso para a manutenção do poder da classe dominante na sociedade capitalista.
Em síntese, salientar que o pós-modernismo descreve a emergência de um contexto social caracterizado pela ideia de que os meios de comunicação de massa moldam todas as formas de relações sociais. As imagens dominam cada vez mais o nosso senso de realidade, o modo pelo qual nós nos definimos e definimos o mundo ao nosso redor. Pois, a sociedade contemporânea é tão absorvida pela mídia (…) que, conforme a teoria pós-modernista, a realidade pode ser exclusivamente representada pelos meios de comunicação de massa. Portanto, a mídia constitui o nosso senso de realidade, ou seja, ela é a única realidade que possuimos. A sociedade pós-moderna consome as imagens e os signos por serem imagens e sinais e não por sua utilidade ou por seus valores intrínsecos.
A cultura pós-moderna caracteriza-se por uma trivialidade essencial que impede a transformação socialista da sociedade. Por sua vez, a eliminação de distinção entre alta cultura e cultura popular foi conquistado pelo aniquilamento do espaço crítico do modernismo.