Artigo: A crítica da Anistia Internacional ao Supremo Tribunal Federal por não punir os torturadores do Regime Militar

Por Roberto Jorge Ramalho Cavalcanti | 01/06/2010 | Direito

Artigo: A crítica da Anistia Internacional ao Supremo Tribunal Federal por não punir os torturadores do Regime Militar

Roberto Ramalho é Advogado, Jornalista, Relações Públicas e estudioso de assuntos políticos

A organização Anistia Internacional principal ONG em defesa dos direitos humanos no mundo acaba de publicar um relatório sobre a violência no Brasil e que traz duras críticas à manutenção da Lei da Anistia de 1979 pelo Supremo Tribunal Federal.

"É chocante que o STF possa ir tão obviamente contra as leis internacionais e ser tão atrasado com relação ao resto da região, que está avançando", justificou Tim Cahill, especialista da ONG em Brasil.

Essa declaração de Tim Cahill se refere ao fato dos Congressos Nacionais da Argentina, do Chile e do Uruguai estar anulando leis que visavam punir os militares que participaram de governos ditadoriais, inclusive com a prisão do general Bignone, ex-presidente da Argentina entre 1981 a 1983 e da prisão domiciliar a que foi submetido o ex-ditador general Augusto Pinochet.

No Brasil essa Possibilidade de punir os militares das Forças Armadas, policiais militares, civis, federais e delegados praticamente foi sepultada com a decisão final do Supremo Tribunal Federal de afirmar que a Lei de Anistia também vale para eles, ou seja, os proteje de qualquer tentativa de processo no Poder Judiciário.

Em relação a essa decisão assim se manifestou o jornal O GLOBO em seu Editorial de 30 de abril:
"O julgamento, pelo Supremo Tribunal Federal, da arguição sobre a amplitude da Lei de Anistia, de 1979, encaminhada pela Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), foi um daqueles momentos da República em que o Poder Judiciário sai fortalecido e, por isso mesmo, amplia a musculatura do estado de direito democrático".

Em outra passagem do Editorial O GLOBO afirma:
"A querela chegou ao fim em grande estilo, pois, por sete votos a dois, a ação foi arquivada, ontem, pelo STF. No julgamento, destaca-se o voto do relator do processo, ministro Eros Grau. Militante comunista, preso e torturado nas masmorras do DOI-CODI, o ministro redigiu um voto de grande relevância pela manutenção da Lei de Anistia, à altura da função de magistrado, na qual a pessoa precisa se despir de ideologias e pendores próprios para fazer valer a Lei.

Em outra passagem afirma:

"A OAB argumentou que a anistia não fora ampla, pois não beneficiara militantes de esquerda punidos pelos tribunais militares. A Ordem também se baseou em artigo da Constituição de 1988, segundo o qual crimes hediondos, como tortura, não são passíveis de perdão".

E concluiu com chave de ouro seu artigo:
"Grau foi cortante: a Anistia surgiu de um acordo político pelo qual veio a redemocratização, e tudo transcorreu sem violência. "O que se deseja agora? Que a transição tivesse sido feita, um dia, posteriormente ao momento daquele acordo, com sangue e lágrimas, com violência?" A maioria de votos dos ministros a favor do respeito à Lei de Anistia, que favoreceu ambos os lados naquela guerra suja, deu resposta à pergunta de Eros Grau. A lembrança feita pelo relator das negociações entre a oposição (Tancredo, Ulysses Guimarães, Thales Ramalho, entre outros) e o regime (general Golbery), que resultaram na Lei de Anistia, no governo Figueiredo, o último presidente da ditadura, ressalta a diferença entre o perdão dado no Brasil e as anistias concedidas em outros países do continente. Aqui, uma conciliação para servir de passaporte à democracia. Naqueles, para preservar primordialmente militares. Algumas anistias foram devidamente revistas. Não era o caso brasileiro. O STF, mais uma vez, fincou um marco de delimitação de espaços institucionais para a ação das diversas correntes político-ideológicas".

Descontente com a decisão do STF o sociólogo Paulo Sérgio Pinheiro escreveu um artigo a Folha de São Paulo com o título: "O STF de costas para a humanidade"
E afirmou em alguns trechos de seu artigo:
Assistir à sessão em que o Supremo Tribunal Federal (STF) derrubou a revisão da Lei da Anistia foi entrar em viagem no tempo que levasse ao ano de 1979 e ali ficássemos imobilizados.

Os ministros estavam angustiados, quase às lágrimas, diante dos supostos riscos de reverem lei elaborada por regime de exceção e submetida por ditador militar goela adentro do Congresso Nacional.

Nos votos, preponderou exacerbado anacronismo, o tempo presente, ausente. Ali, não foi levada em conta a evolução da norma internacional, da prática acumulada das democracias e dos Judiciários no mundo em face de crimes cometidos por regimes de exceção e a exigibilidade de sua punição.

E finalizando argumentou:
Revelem ou não, a consagração, pelo STF, da impunidade dos agentes do Estado bandido faz ainda mais candente e urgente o estabelecimento de uma comissão da verdade, para que a sociedade, tendo-lhe sido negado o acesso à justiça, possa ao menos conhecer a verdade.

A recusa da revisão da Lei de Anistia, ressalvados dois votos contrários, consagrou de vez o Brasil na rabeira dos países do continente quanto à responsabilização dos agentes do Estado responsáveis por graves violações de direitos humanos.

Realmente lembro-me muito bem de tudo pois tinha 19 anos de idade e nessa época cursava Direito na Universidade Federal de Alagoas.

A oposição na época o MDB queria que a anistia fosse ampla, geral e irrestrita e o partido do governo, a ARENA, não.

Mais ai entrou em cena o Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil e outras entidades representativas da sociedade civil organizada pressionando para que o projeto de Lei da Anistia fosse aprovado.

No final da votação 206 deputados da ARENA e 2001 deputados do MDB tinham votado a favor do projeto de lei que depois seria sancionado pelo último presidente do Regime Militar João baptista Figueiredo.

A posição da entidade repercute e encoraja membros da Organização das Nações Unidas, para pleitearem o fim das leis de anistia no mundo. A decisão mantida pelo STF veta a abertura de processos contra acusados de torturar presos políticos durante a ditadura militar.

A Anistia Internacional foi criada na década de 80 na Grã-Bretanha e é uma entidade sem fins políticos e lucrativos e que tem por finalidade combater em todos os países do mundo a violação dos direitos humanos.

Segundo o site www.dhnet.org.br são objetivos principais da Anistia Internacional:
? Obter a libertação imediata e incondicional de todos os prisioneiros de consciência, assim chamadas as pessoas encarceradas apenas pelas suas convicções, cor, sexo, origem étnica, idioma ou religião, que não tenham usado ou defendido o uso da violência.
? Assegurar julgamentos rápidos e justos, de acordo com as normas internacionais, para todos os prisioneiros políticos, bem como a libertação de pessoas detidas sem acusação ou julgamento.
? Abolir a tortura, os maus-tratos, as execuções judiciais e extrajudiciais e o desaparecimento forçado de pessoas.

De acordo ainda com o referido site a Anistia Internacional não tem fins políticos, sendo uma instituição totalmente imparcial.

A Anistia Internacional é imparcial. Não apóia nem se opõe a qualquer governo ou sistema político. Não apóia nem se opõe às opiniões dos prisioneiros, cujos direitos procura defender. A sua única preocupação diz respeito à proteção dos Direitos Humanos que estão em jogo em cada caso, independentemente da ideologia do governo ou das convicções das vítimas.