Arte e História do Cotidiano: uma parceria no processo da formação e da construção do conhecimento.

Por Carlos Finochio | 19/05/2009 | História

        Discutir os sujeitos, suas relações e interações com o cotidiano e o contexto político-social, sob uma perspectiva histórica, evidenciando o objeto de pesquisa a partir da polifonia das obras de arte, sob novos referenciais e esferas culturais é uma possibilidade de acabar com a falta de contato do jovem com a produção artística.
        Para acabar com essa lacuna, existente no âmbito da educação, o educador precisa administrar sua trajetória, incluindo a finalidade de resgatar, registrar e evidenciar as emoções e encantamentos despertadas pelos trabalhos dos grandes artistas, proporcionando, ao aluno, uma leitura mais abrangente do processo cultural como um todo, ao lado dos elementos que compõem o cotidiano. O objetivo é aproximar a arte da realidade de cada um e provocar o interesse do jovem, em formação, na leitura das obras artísticas da humanidade, num processo que permita o desenvolvimento do hábito de consumo, quase "antropofágico", do convívio e da paixão pela arte e suas mais diversas manifestações num mecanismo lúdico e construtivo.
        A obra de arte não pode ser encarada como algo feito fora do contexto do cotidiano humano, algo extraordinário dentro da cultura humana. Ela deve ser admitida como um elemento totalmente integrado na cultura da sociedade, retratando o meio natural, expressando sentimentos, religiosidade, situações sociais ou mesmo, registrando valores pictóricos, sugerindo diferentes impressões ao observador.
        Segundo o crítico de arte inglês, Ruskin:
"As grandes nações escrevem sua autobiografia em três volumes: o livro de suas ações, o livro de suas palavras e o livro de sua arte. Nenhum desses três livros pode ser compreendido sem que se tenham lido os outros dois, mas desses três, o único em que se pode confiar é o último".
        O discurso que aborda o conhecimento das artes plásticas e dramáticas como facilitador da compreensão das obras literárias, parece ser de conhecimento e aceitação da comunidade acadêmica. A História tem o poder de trabalhar esse universo, situando-o como fonte de referência para pesquisas, novas leituras, interpretações e debates sobre os mais variados objetos de estudo.
        A arquitetura com o seu partido diversificado, por exemplo, pode ser uma fonte que permite definir o objeto de pesquisa, segundo sua trajetória histórica, através do dinamismo da questão urbana, determinando um novo desenho da cidade, implicando as mudanças estéticas e conceituais nas esferas do morar, trabalhar, conviver, viver e conceber novos parâmetros sociais. Os referenciais podem ser ícones edificados, traduzidos na arquitetura ou nas suas variações e transformações ao longo de um período, denunciando uma situação ou evidenciando uma conjuntura.
        Novas leituras de fontes têm sempre importante papel no redirecionamento da investigação histórica, causando um confronto entre o objeto de estudo e a releitura do seu entorno.
Essa nova dimensão, adotando as artes, não exclui o sentido, os sujeitos ou mesmo os objetos originais, apenas aborda outras esferas, seguindo uma nova metodologia, justificativas e objetivos, que se renovam a cada momento da investigação.
        O teatro é a manifestação artística que mais se aproxima da vivência a qual poderá ser explorada no nosso objeto de estudo. Tal aproximação com o universo histórico, a ser trabalhado através das artes dramáticas, é bastante revelador e estimulante quando adotamos a linha da "História do Cotidiano".
        Esta conduta metodológica estará sempre norteando e ampliando o horizonte de pesquisa, tornando mais clara a reconstituição do meio no qual se insere o tema a ser estudado com os alunos.
        Com maior riqueza de elementos torna-se mais fácil o estudo dos comportamentos coletivos.
       A História do Cotidiano como uma linha de abordagem da historicidade dos sujeitos sociais, atribui a cada agente da história uma função no desenvolvimento dos sistemas, permitindo a leitura da realidade que poderá, ainda, ser evidenciada através de uma obra de arte, seja ela musical, plástica, literária ou da dramaturgia.
       É importante reafirmar aqui, o papel do historiador - professor como elemento fundamental para o direcionamento dessa abordagem, aplicando todo o seu rigor para não se perder nos encantamentos proporcionados pela liberdade poética, ilusória e romântica, impressa nas manifestações artísticas, através de seus autores, ameaçando sua veracidade em nome da verossimilhança - prática comum permitida ao artista.
        Diante disso, temos a legitimidade da História do Cotidiano e o estudo do universo da produção artística, com toda a sua dinâmica e ramificações temáticas, como parcerias otimizadoras na construção do conhecimento, definindo uma trama estrutural para o estudo e a formação do jovem.
        Ao nascer, o homem já está inserido no cotidiano. Como nota Agnes Heller:
...O amadurecimento do homem significa, em qualquer sociedade, que o indivíduo adquire todas as habilidades imprescindíveis para a vida cotidiana da sociedade em questão.(...) O homem deve aprender a segurar o copo e a beber no mesmo, a utilizar o garfo e a faca (...)isso evidencia que a assimilação da manipulação das coisas é sinônimo de assimilação das relações sociais... .
        A historiografia do cotidiano não pretende fazer discursos de simples curiosidades pois, é o palco onde a ação do homem se mostra mais contínua e presa à princípios de difícil mutação.
       Nesse campo, a preocupação é encontrar dados preciosos para o estudo dos comportamentos e costumes do coletivo. 
       Assim, nos deparamos com as novas preocupações da historiografia em busca de novos temas e agentes favorecendo a abordagem de outros espaços e tempos, redesenhando a ampliando noções tradicionais de significados sob novo enfoque de discurso histórico. Nesse sentido, a fonte oral, as imagens, a leitura das obras de artes, os movimentos culturais e a própria cultura material serão pontos de apoios e de partida para a decodificação das tramas de relações cotidianas e suas diferentes dimensões.
        A singularidade do sujeito, assim como sua estrutura emocional, estão evidenciadas em vários aspectos do cotidiano. É onde encontramos, em constante atuação, os sentidos, habilidades, capacidades intelectuais, paixões, idéias, ideologias e sentimentos do homem atuante, ativo e receptivo. É o caminho próximo à “História das Mentalidades”, andando ao lado da “História do Cotidiano”. Todo esse contexto abordado, nos permite analisar o limite das várias linhas da historiografia se aproximando entre si, sem perder de vista o que chamamos de Cultura Material.
Prof. Me. CARLOS EDUARDO C. S. FINOCHIO