Aprender é transformar

Por Marilussi Tragancin Cenatti | 05/01/2016 | Educação

Aprender é Transformar

Durante o decorrer da história humana o homem foi desenvolvendo de forma natural e gradual o desejo pela comunicação. Com a complexificação da estrutura da vida humana, o ato de comunicar passou não só a ser um caminho natural do desenvolvimento humano, mas também uma necessidade. Esse movimento resultou no advento da escrita, pois a linguagem oral não mais satisfazia as solicitações da sociedade em busca da informação do conhecimento e quando alguém apresenta dificuldades para ler, escrever, se concentrar e/ou aprender, suas oportunidades de sucesso na escola e na vida são diminuídas. É comum que essas dificuldades sejam associadas a uma menor capacidade intelectual, porém o problema pode ser algum distúrbio de aprendizagem.

Atualmente, a política educacional prioriza a educação para todos e a inclusão de alunos que, há pouco tempo, eram excluídos do sistema escolar, por portarem deficiências físicas ou cognitivas; porém, um grande número de alunos (crianças e adolescentes), que ao longo do tempo apresentaram dificuldades de aprendizagem e que estavam fadados ao fracasso escolar pôde frequentar as escolas e eram rotulados em geral, como alunos difíceis.

Os alunos difíceis que apresentavam dificuldades de aprendizagem, mas que não tinham origens em quadros neurológicos, numa linguagem psicanalítica, não estruturam uma psicose ou neurose grave, que não podiam ser considerados portadores de deficiência mental, oscilavam na conduta e no humor e até dificuldades nos processos simbólicos, que dificultam a organização do pensamento, que consequentemente interferem na alfabetização e no aprendizado dos processos lógico-matemáticos, demonstram potencial cognitivo, podendo ser resgatados na sua aprendizagem.

As dificuldades de aprendizagem na escola, podem ser consideradas uma das causas que podem conduzir o aluno ao fracasso escolar. Não podemos desconsiderar que o fracasso do aluno também pode ser entendido como um fracasso da escola por não saber lidar com a diversidade dos seus alunos. É preciso que o professor atente para as diferentes formas de ensinar, pois, há muitas maneiras de aprender. O professor deve ter consciência da importância de criar vínculos com os seus alunos através das atividades cotidianas, construindo e reconstruindo sempre novos vínculos, mais fortes e positivos. Cada pessoa é uma. Uma vida é uma história de vida. É preciso saber o aluno que se tem, como ele aprende. Se ele construiu uma coisa, não pode-se destruí-la. Deveríamos, portanto, ser animados por um princípio de pensamento que nos permitisse ligar as coisas que nos parecem separadas umas em relação às outras. Ora, o nosso sistema educativo privilegia a separação em vez de praticar a ligação; chegamos ao ponto nefrálgico da educação, os alunos não sabem pensar, pois não são ensinados e incitados a isso.

Afirmar o direito da pessoa humana à educação é pois assumir uma responsabilidade muito mais pesada que a de assegurar a cada um a possibilidade da leitura, da escrita e do cálculo: significa garantir para toda criança o pleno desenvolvimento de suas funções mentais e a aquisição dos conhecimentos bem como dos valores morais que correspondam ao exercício dessas funções, até a adaptação à vida social atual. A chave da mudança é experimentar o  novo, aprender o que faz falta, viver o que tiver que ser vivido. E quando errar, que não seja repetindo os velhos comportamentos. Mudar significa fazer o que se precisa e se dispor a sentir tudo o que cada ação produzir.

Fala-se muito hoje em sociedade do conhecimento, às vezes com impropriedade. Mais  devemos dizer que vivemos a era da informação, pois percebemos com mais facilidade a disseminação da informação e de dados, muito mais do que de conhecimentos. O acesso ao  conhecimento é ainda muito precário, sobretudo em sociedades com grande atraso educacional.

            A linguagem é considerada a primeira forma de socialização da criança, e, na maioria das vezes, é efetuada explicitamente pelos pais através de instruções verbais durante atividades diárias, assim como através de histórias que expressam valores culturais. A socialização através da linguagem pode ocorrer também de forma implícita, por meio de participação em interações verbais que têm marcações sutis de papéis e status. (Ely & Gleason, 1996).

            Desta forma, através da linguagem a criança tem acesso, antes mesmo de aprender a falar, a valores, crenças e regras, adquirindo os conhecimentos de sua cultura. À medida que a criança se desenvolve, seu sistema sensorial – incluindo a visão e audição – se torna mais refinado e ela alcança um nível lingüístico e cognitivo mais elevado, enquanto seu campo de socialização se estende, principalmente quando ela entra para a escola e tem maior oportunidade de interagir com outras crianças. De acordo com Garton (1992), quanto mais cedo a criança se envolve nas relações sociais, mais benefícios obterá a curto ou longo prazo, tendo em vista as experiências e aprendizagens que resultam de tais interações.

A educação é, por conseguinte, não apenas uma formação , mais uma condição formadora necessária ao próprio desenvolvimento natural. Ninguém caminha sem aprender a caminhar, sem aprender a fazer o caminho caminhando, sem aprender a refazer, a retocar o sonho por causa do qual a gente se pôs a caminhar. É na  interação professor/aluno, aluno/professor que grandes conquistas são obtidas. Educamos de verdade quando aprendemos com cada coisa, pessoa ou ideia que vemos, ouvimos, sentimos, tocamos, experimentamos, lemos, compartilhamos e sonhamos; quando aprendemos em todos os espaços em que vivemos, família, escola, trabalho, lazer.

            A aprendizagem é um processo integrado que provoca uma transformação qualitativa na estrutura mental daquele que aprende. Essa transformação dá-se através da alteração da conduta de um indivíduo. A dinâmica da aprendizagem põe em jogo  a própria evolução da estrutura e das funções de aprender, numa perspectiva de mudança do próprio ser. Passamos do fazer que é uma produção, a aprender que é uma transformação.

            Podemos modificar a forma de ensinar e de aprender. Ensinar e aprender exigem hoje muito mais flexibilidade espaço-temporal, pessoal e de grupo, menos conteúdos fixos e processos mais abertos de pesquisa e de comunicação. Um ensinar mais compartilhado.

            Para uma aprendizagem de sucesso, com vista a obtenção por parte dos alunos de uma realização pessoal e profissional, é essencial que o ensino incorpore a cultura de origem dos próprios alunos, do conhecimento familiar e da aceitação individual.

            É importante , a tomada de consciência e a reflexão sobre as problemáticas da aprendizagem diferenciada, o saber adaptar o ensino para ir ao encontro das necessidades de todos os alunos. Melhorar as competências através do trabalho colaborativo, utilizando processos de desenvolvimento pessoal e profissional.

            Nós, seres humanos, não só somos seres humanos inacabados e incompletos como temos consciência disso. Por isso precisamos aprender “com”, precisamos do outro, fazemo-nos na relação com o outro, mediados pelo mundo, pela realidade em que vivemos. Não podemos dar aula da mesma forma para alunos diferentes, para grupos com diferentes motivações. Precisamos adaptar nossa metodologia, nossas técnicas de comunicação a cada grupo. Tem alunos que estão prontos para aprender o que temos a oferecer. Outros podem estar distantes, mas sabendo chegar até eles, mostrando-nos abertos, confiantes e motivadores, sensibilizando-os para o que eles vão aprender, respondem bem e se dispõem a participar. Existem outros que não estão prontos, que são imaturos ou estão distantes das nossas propostas.

A prática educativa implica ainda processos, técnicas, fins, expectativas, desejos, frustrações, a tensão permanente entre prática e teoria, entre liberdade e autoridade, cuja exacerbação, não importa de qual delas, não pode ser aceita numa perspectiva democrática, avessa tanto ao autoritarismo quanto à licenciosidade. O educador ou a educadora crítica, exigente, coerente, no exercício de sua reflexão sobre a prática educativa ou no exercício da própria prática, sempre a entende em sua totalidade.  Não centra a prática educativa, por exemplo, nem no educando, nem no educador, nem no conteúdo, nem nos métodos, mas a compreende nas relações de seus vários componentes, no uso coerente por parte do educador ou da educadora dos materiais, dos métodos, das técnicas.

Esse caminho de ida e volta, onde todos se envolvem, participam é fascinante, criativo, cheio de novidades e de avanços. O conhecimento que é elaborado a partir da própria experiência se torna muito mais forte e definitivo em nós.

É importante nesse processo dinâmico de aprender, utilizar todos os recursos. Vale a pena descobrir as competências dos alunos que temos em cada classe, que contribuições podem dar ao curso. Vamos construindo caminhos de aprendizagem em cada etapa, estando atentos para avançar da forma mais rica possível em cada momento.

Na educação precisamos de pessoas que saibam interagir de forma mais rica, profunda e vivencial, facilitando a compreensão e a prática de formas autênticas de viver, de sentir, de aprender, de comunicar-se. Ao educar facilitamos, num clima de confiança, interações pessoais e grupais que ultrapassam o conteúdo para, através dele, ajudar a construir um referencial rico de conhecimento, de emoções e de práticas.

As mudanças na educação dependem de termos educadores maduros intelectual e emocionalmente, pessoas curiosas, entusiasmadas, abertas, que saibam motivar e dialogar; gestores e coordenadores que entendam todas as dimensões que estão envolvidas no processo pedagógico, que apóiem os professores inovadores, para que haja um ambiente de maior inovação, intercâmbio e comunicação e  alunos curiosos, motivados, facilitam enormemente o processo, tornam-se interlocutores lúcidos e parceiros de caminhada do professor-educador.

A solidariedade, humanidade e esperança podem alicerçar esse processo para não tornar-se  mecânico, frio e distante. Porém não se pode pensar que a esperança sozinha transforma o mundo e atuar movido por tal ingenuidade é um modo excelente de tombar na desesperança, no pessimismo, no fatalismo. Mas, prescindir da esperança na luta para melhorar o mundo, como se a luta se pudesse reduzir a atos calculados apenas, à pura cientificidade, é frívola ilusão. Prescindir da esperança que se funda também na verdade como na qualidade ética da luta é negar a ela um dos seus suportes fundamentais. As escolas que quiserem evoluir terão que aprender a reeducar-se em ambientes mais significativos de confiança, de cooperação, de autenticidade. Isso as fará crescer mais, estar mais atentas às mudanças necessárias. Com ou sem tecnologias avançadas podemos vivenciar processos participativos de compartilhamento de ensinar e aprender através da comunicação mais aberta, confiante, de motivação constante de integração de todos os alunos com dificuldades ou não, num processo dinâmico e amplo de informação.

É importante educar para a autonomia, para que cada um encontre o seu próprio ritmo de aprendizagem. O educador autêntico é humilde e confiante. Mostra o que sabe e, ao mesmo tempo está atento ao que não sabe, ao novo. Mostra para o aluno a complexidade do aprender, a sua ignorância, suas dificuldades. Ensina aprendendo a relativizar, a valorizar a diferença. Aprender é passar da incerteza a uma certeza provisória que dá lugar a novas descobertas e a novas sínteses provocando grandes transformações pessoais e sociais.

 

Nádia Maria Dias da Silva
Pedagoga – Psicopedagoga
Orientadora Educacional
Professora das disciplinas pedagógicas do Curso Normal

©Paulo Freire

Preparação: Ana Maria O. M. Barbosa

Revisão: Celso Donizete Cruz e Sandra Rodrigues Garcia

 

Joselita Marques Santos

Pedagogia contemporânea: Uma abordagem sobre as práticas educativas.

 

Edgar Morin

Tradução Juremir Machado do Silva.

Da necessidade de um pensamento complexo

Moran, José Manuel, Masetto, Marcos e Behrens, Marilda.

Novas Tecnologias e Mediação Pedagógica, 2009