APRENDDER A NÃO PARAR DE APRENDER

Por sebastião maciel costa | 29/09/2023 | Educação

Aprender a não parar de aprender

        uma das passagens mais hilárias sobre as relações professor-alunos, registram-se certos detalhes que ficam nas entrelinhas do que, de forma evidente, vem nos comandos das questões trabalhadas nas avaliações. Ela recorre a insetos que fazem parte do cotidiano das pessoas: as baratas.

      O professor, procurando tornar a condução de abordagem menos difícil, lança, de forma espontânea, uma pergunta: Como se deve matar uma barata sem “sujar as mãos”? Alguns alunos chutaram: , usa o chinelo, usam-se inseticidas, manda alguém matar... Respostas dessa natureza, não atendiam a proposta do professor pois, se a barata for batida por esses meios, quem usou o inseticida ou quem mandou que alguém matasse, continuaria sendo o matador, ou mandante. O professor vendo que as respostas seriam tão óbvias, comuns, produto de cabeças que, por terem ouvido falar em barata, acreditaram ser uma brincadeira, preferiu assumir as respostas e seguiu:

       Pega-se um punhado de sal refinado e, coloca-se em um lugar por onde costuma-se ver a barata circular. A uma média  de três vezes o tamanho da barata, em uma tampilha de garrafa pet verde, coloca-se uma dose de aguardente do tipo corote, logo a seguir, desprentensiosamente, coloque um palito de dente roliço, de duas pontas, do tio Olga ou Gina. Uma pedra com mais ou menos três vezes o tamanho da barata. Pronto, esse é o plano. Um aluno curioso perguntou em que consistia tal aparato. O professor explicou: O sal refinado, parece açúcar; a cachaça do tipo corote, parece água; o palito sendo roliço facilita rolar; caído com a cabeça na pedra, teremos um traumatismo craniano. Perícia feita, não houve culpado, mas houve um acidente. Não concordo, falou um aluno mais esperto: e as impressões digitais nos objetos? O        professor, serenamente disse: ora, o autor estava todo o tempo de luvas plásticas que foram destruídas. 

          De que forma, os detalhes do recorte ilustrativo acima, podem ser associados ao complexo dia a dia daqueles que durante os mais importantes anos de sua vida se colocam a serviço dos estudos, sem que pressões sejam mais presentes do que conquistas e acordos?  O sal precisava ser refinado para ser aproximar da aparência do açúcar moído. A tampilha verde nos remete à cor  da gama, facilitando um contexto natural facilitando a confusão uma graminha onde estava colocada a cachaça que por ser de baixa qualidade, era limpa como água, o palito escolhido precisava garantir que rolaria facilmente... pode ser que o peso da barata não fosse suficiente para “quebrar” o crânio a representação social do acidente era forte. Quando um professor apresenta um assunto, um tema, um problema, uma questão, espera que o seu aluno, diante de pesquisas, estudos, deveres e treinos traga um encadeamento de detalhes, argumentos e marcas que amarram situações de indicam que todos os detalhes precisam ser “lembrados” como prova de que tudo o que foi idealizado, foi assimilado e transformado em conhecimento.

        Quando é preciso aprender? Quando é possível  aprender? De que forma os ensinamentos da vida são reconhecidos pelos mestres do saber, como elementos vitais para o aprendizado? Como a escola vê o aluno sem que esteja sempre vinculado a um detalhe da representação social? De que escola vem, em que bairro mora, qual a composição da família, qual a marca do carro, qual o tipo do celular, qual a marca do casaco, quantas vezes esteve em passeio pelo exterior, o que lancham na cantina, qual a marca da mochila, que ambientes frequenta, o que fazem os pais, que universidade almeja... Nesse caso, onde fica o SER HUMANO que ali chegou à procura de si mesmo para alcançar um futuro promissor? O professor pergunta o que le “ensinou” ou sobre o que o aluno aprendeu? A resposta do aluno deverá ser d e acordo com o que o professor espera, ou de acordo com que, de fato, corresponde aos fatos? “Deve ser difícil ser professor de natação. Você ensina, ensina e o aluno: nada”. Será que o que o professor quer transmitir ao aluno, primeiro foi criado uma cumplicidade entre os protagonistas do processo ensino-aprendizagem, sejam igualmente “respeitados” dos seus princípios e motivações?

        Lembrando que a função do saber permite aos grupos compreender e explicar a realidade que os cerca. Essa função possibilita aos grupos reconfigurar um determinado fenômeno social para o senso comum, tornando-o uma realidade compreensível para o grupo. Aqui retomemos os termos refinado, pet, corote, roliço, dentre outros vistos no recorte da morte da barata, nos provoca reflexão quando ao conhecimento prévio desses termos. Urge que o nosso interlocutor, o aluno, já que o ambiente invariavelmente é a escola, dê conta da nomenclatura que reveste as abordagens estudo/ensino/aprendizagem. Seguindo a linha do pensamento de que nem sempre todos os termos usados no material escolar, no discurso do professor, no áudio exposto, é possível se criar um conflito entre os agentes do processo. Tomemos por exemplo, o termo “biodegradável”, ao pé da letra, como se diz, será que todos já fizeram uma reflexão sobre o sentido real desse termo? “Bio significa "vida", um termo de origem grega utilizado em palavras que tenham alguma relação com o ser vivo. Diversas palavras usam o prefixo "bio", tais como: biologia, biodiversidade, biomedicina, biotecnologia, biografia etc. Por definição, os produtos biodegradáveis são todos aqueles fabricados com materiais rapidamente decompostos no meio ambiente. Assim, como são completamente absorvidos pela natureza, eles não deixam resíduos e geram menos impactos ambientais. Alguns exemplos de produtos biodegradáveis são o plástico, o detergente, o tecido e os desengraxantes”.

        Talvez um ou outro aluno jamais tenha se detido, em termos de linguagens, sobre esse aspecto, mas eles sabem perfeitamente o que é e como funciona o Código QR (sigla do inglês Quick Response, "resposta rápida" em português) é um código de barras, ou barrametrico, bidimensional, que pode ser facilmente escaneado usando a maioria dos telefones celulares equipados com câmera. O código foi criado em 1994 pela companhia japonesa Denso Wave. QR Code é uma versão bidimensional do código de barras capaz de transmitir uma grande variedade de informações através de um scan.

         O avanço tecnológico, a velocidade das informações, a popularização dos eletrônicos é a garantia de estamos avançando, de acordo com as condições do nosso tempo. Mas não  está sendo assegurado o acesso de todos a esses novos motes e modo de viver. Se em casa, em sociedade não se consegue harmonizar tais recursos com a realidade social de muitos, chegando na escola, há um acúmulo de defasagens que vão do conhecimento linguístico, seu uso adequado e sua aplicação no ato de sistematizar conhecimentos.

         Existem muitos “sítios” que nos trazem esse enfoque. Consta que Chico Bento, da Turma da Mônica em uma das suas famosas proezas, passava por momentos de apuro quando  professora formulava alguma pergunta durante as aulas. Ele sempre respondia que não sabia, ou fazia perguntas sobre o que fora pedido a fim de conseguir entender o que deveria responder, mas sempre, sem sucesso. Ele sofria esse desconforto de, nunca saber. Ficava mal diante da turma, da professora e principalmente de si mesmo. Ele andava tão aperreado que já estava pensando em largar a escola. De nada estava adiantando. Ele não vivia no universo das crianças daquela turma. Um certo dia, depois de mais vexames do nada saber, ele saiu da escola e, em vez de procurar o caminho de volta para casa, ele morava em um sítio distante, ele ficou sentado em um banco do jardim da praça e começou a pensar alto: Por que será que a professora nunca pergunta na sala sobre o que eu sei? Por que tem que ser perguntas que estão na mira dos outros alunos e não na minha? Por coincidência a professora ao sair da escola tomou aquele mesmo caminho e, por trás das plantas do jardim da praça, pôde ouvir as lamúrias daquele menino que ela tão bem conhecia, ou elo mesmo acreditava conhecer. E ele, sem perceber que ela estava por perto continuou seu desabafo.

        De repente, ela ouviu: ora, por que ela não  pergunta sobre coisas do meu mundo? Como a época certa para colher a fruta, como tirar o leite da vaquinha, como colher os ovos diariamente, sem criar caso com as galinhas, como separar os animais de reprodução daqueles destinados ao abate, como cozinhar com fogo de lenha, como dormir no calor, sem ar condicionado ou ventilador, como lavar e secar a mesma roupa que vesti hoje para usar amanhã...? Por que ela nunca me pergunta quem eu sou e o que pretendo da vida?  A professora continuou em silêncio. Ela tinha aprendido a maior lição de sua vida de professora: trazer o saber do aluno para a sua aula, torná-lo protagonista do processo. Ela aprendeu o quanto vale aprender: ser humano não é fácil, aprendamos.

  • Sebastião Maciel costa   

 

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