APLICAÇÃO ANALÓGICA DA LEI DA ALIENAÇÃO PARENTAL (LEI Nº 12.318/2010) AOS AVÓS NO CONTEXTO BRASILEIRO.

Por Poliana Coqueiro Gouveia | 03/02/2015 | Direito

 

 

APLICAÇÃO ANALÓGICA DA LEI DA ALIENAÇÃO PARENTAL (LEI Nº 12.318/2010) AOS AVÓS NO CONTEXTO BRASILEIRO[1]

            Laíse Lima de Oliveira Sousa[2]

Poliana Coqueiro Gouveia[3]

Anna Valéria de Miranda Araújo Cabral Marques [4]

RESUMO

 

No presente trabalho será exposto o papel relevante dos avós nas relações familiares, principalmente no que se refere à relação com os netos. Assim como, as consequências jurídicas e psicológicas da Alienação Parental tanto para a criança ou adolescente quanto para os avós, quando esta é praticada em desfavor dos mesmos. Serão abordadas também as medidas judiciais cabíveis e os obstáculos presentes na verificação da Alienação Parental.

Palavras- Chave: Alienação Parental. Avós. Separação. Divórcio.

1. INTRODUÇÃO

 

 

É muito comum no contexto brasileiro a ocorrência da separação ou do divórcio dos pais, porém nem sempre isto ocorre de forma amigável acarretando uma série de problemas para o seio familiar, como brigas que se estabelecem entre os ex-cônjuges ou ex-companheiros e até mesmo entre as famílias dos genitores acarretando o surgimento de sentimentos como a raiva, vingança, rancor.

Movidos principalmente pelo sentimento de vingança um dos genitores que detém a guarda costuma realizar um trabalho em que ele altera a percepção da criança ou adolescente em relação ao outro genitor realizando uma interferência psicológica visando prejudicar a relação com este, como forma de puni-lo seja pelo fim do casamento, ou por uma eventual traição.

Esta prática conhecida como Alienação Parental tornou-se frequente nos últimos anos e acarreta para a criança ou adolescente muitos problemas a exemplo a baixa autoestima, e o mais preocupante, a Síndrome da Alienação Parental (SAP). Tal expressão foi criada em 1980 por Richard A. Gardner. A Alienação Parental é tema recente no cenário brasileiro, somente em 2010 houve a promulgação da Lei nº 12.318/10.

Porém a Alienação Parental pode tomar grandes proporções e se estender a família do ex-cônjuge, atingindo diretamente os avós. Todos os meios e artifícios utilizados pelo guardião para despertar no(s) filho(s) um sentimento de ódio e repudio em relação a aquele que não detém a guarda também são utilizados em face dos avós como forma de retaliação.                                      

Quando declarado início de ato de alienação parental, ou ainda, havendo indícios de sua prática deverá o juiz realizar uma série de providências elencadas na Lei 12.318/10 em seus artigos 4º e 5º. Prevê também no art. 6º instrumentos processuais aptos a inibir ou atenuar os efeitos da alienação segundo a gravidade de cada caso. Percebe-se que as sanções impostas pelo legislador são brandas, tendo em vista tratar-se de um ilícito.

Há vários obstáculos em torno da constatação da ocorrência ou não da Alienação Parental. O alienador, acreditando veemente estar certo do que está fazendo, ao logo do tempo acaba fixando na cabeça da criança ou adolescente uma ideia distorcida e fora da realidade dos avós, se utilizando de armadilhas, falsas memórias, mentiras realizando uma campanha em desfavor do mesmo. O trabalho muitas vezes é tão bem feito que os peritos, o juiz, o assistente social e demais profissionais envolvidos tem dificuldade em averiguar a verdade e realizar um diagnóstico preciso.

No presente artigo tem-se como objetivo realizar uma interpretação analógica da Lei nº 12.318/2010 em favor dos avós haja vista que o legislador foi omisso nas hipóteses em que eles também sofrem com a Alienação Parental, e não somente o outro genitor que não detém a guarda para que sejam a eles assegurados direitos básicos e fundamentais previstos no ordenamento jurídico brasileiro.

Serão também expostas as consequências jurídicas e psicológicas resultantes desse processo assim como as medidas judiciais cabíveis, descrevendo os obstáculos enfrentados na constatação da Alienação Parental pelos profissionais envolvidos e responsáveis.

2. O PAPEL DOS AVÓS NAS RELAÇÕES FAMILIARES E SEU PANORAMA JURÍDICO

 

Ao longo do tempo os avós vêm assumindo um papel mais atuante e de destaque na família brasileira e foi a partir da década de 80 que surgiu o interesse na realização de estudos sobres os mesmos. Segundo leciona Salomão e Falcão (2005) entre os fatores que contribuíram para essa pesquisa, destacam-se; a maior expectativa de vida do ser humano, o trabalho da mulher fora do lar, a aceitação social de pais solteiros, o uso de drogas e a incidência de divórcios, recasamentos e a disseminação da AIDS entre os genitores.

Os avós costumam auxiliar na educação e cuidados com os netos, em determinadas situações acabam por assumir o papel dos pais sendo os principais responsáveis pela criação quando da omissão, desídia, ou incapacidade física e/ou psicológica dos genitores; amparam em uma gravidez precoce e, principalmente, fornecem apoio emocional quando da separação ou divórcio. Percebe-se que os avós estão cada vez mais presentes na vida de seus netos em diversos momentos e fases sempre contribuindo em alguma medida na educação, no apoio (material e/ou emocional), com conselhos.

Tal importância é verificada através de vários dispositivos do ordenamento jurídico brasileiro os quais garantem a convivência familiar dos idosos da criança e do adolescente, dentre eles podemos citar o Estatuto do Idoso (Lei nº 10741/03), apesar de nem todos os avós no contexto atual necessariamente corresponderem à figura do idoso. Em seu art. 3º o Estatuto dispõe:

 

Art. 3º. É obrigação da família, da comunidade, da sociedade e do Poder Público assegurar ao idoso, com absoluta prioridade, a efetivação do direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária.

        Já a Constituição Federal de 1988 assegura em seus art. 227 dispõe:

Art. 227. É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão.

O Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei nº 8069/90) discorre nos arts. 4º 19 e 87 que:

Art. 4º. É dever da família, da comunidade, da sociedade em geral e do poder público assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária.

Art. 19. Toda criança ou adolescente tem direito a ser criado e educado no seio da sua família e, excepcionalmente, em família substituta, assegurada a convivência familiar e comunitária, em ambiente livre da presença de pessoas dependentes de substâncias entorpecentes.

Art. 87. São linhas de ação da política de atendimento:

(...)

VI - políticas e programas destinados a prevenir ou abreviar o período de afastamento do convívio familiar e a garantir o efetivo exercício do direito à convivência familiar de crianças e adolescentes;

O legislador no art. 1.589, CC e no art. 888, CPC também assegurou o direito à convivência familiar tendo em vista a importância da relação entre netos e avós buscando o saudável desenvolvimento dos primeiros e o bem-estar dos últimos. Segundo os referidos artigos:

Art. 1.589. O pai ou a mãe, em cuja guarda não estejam os filhos, poderá visitá-los e tê-los em sua companhia, segundo o que acordar com o outro cônjuge, ou for fixado pelo juiz, bem como fiscalizar sua manutenção e educação.

Parágrafo único.  O direito de visita estende-se a qualquer dos avós, a critério do juiz, observados os interesses da criança ou do adolescente

Art. 888. O juiz poderá ordenar ou autorizar, na pendência da ação principal ou antes de sua propositura:

(...)

VII - a guarda e a educação dos filhos, regulado o direito de visita que, no interesse da criança ou do adolescente, pode, a critério do juiz, ser extensivo a cada um dos avós.

Quando da ocorrência da separação ou divórcio é comum se verificar que “muitos ex-cônjuges utilizam a maleabilidade psicológica dos próprios filhos como ‘arma’ para atingir o outro ex-parceiro, tratando como ‘inimigo’ e passando a ser visto pelos filhos como tal” (MARQUES; SANTOS, 2011, p. 173).

Esta prática em alguns casos costuma se estender aos avós (maternos e/ou paternos), estes da mesma maneira são desmoralizados pelo guardião, afastados do convívio com seus netos. O alienador se vale de mentiras, falsas memórias, armadilhas, promove desencontros visando dificultar o convívio de seus filhos com os respectivos avós como forma de retaliação seja ao ex-cônjuge ou ex-companheiro, ou por desentendimentos com qualquer um deles.

O direito à convivência familiar como visto é direito básico, fundamental, e, portanto, irrenunciável. É impensável a situação em que o genitor guardião movido por sentimentos tão sórdidos e por argumentos ilógicos prive a criança ou o adolescente do convívio com seus avós unicamente como forma de satisfação pessoal em um ato de extremo egoísmo. De fato, é algo triste, grave e sério que merece destaque.

2.1 Consequências jurídicas e psicológicas da Alienação Parental realizada em desfavor dos avós

 

Sabe-se que Alienação Parental acarreta consequências tanto de ordem jurídica, quanto psicológica. Quando são caracterizados atos típicos da Alienação Parental, ou qualquer conduta que dificulte a convivência da criança e do adolescente com o genitor, o juiz pode tomar as seguintes medidas arroladas no art. 6º da Lei nº 12.318/10:

Art. 6º.  Caracterizados atos típicos de alienação parental ou qualquer conduta que dificulte a convivência de criança ou adolescente com genitor, em ação autônoma ou incidental, o juiz poderá, cumulativamente ou não, sem prejuízo da decorrente responsabilidade civil ou criminal e da ampla utilização de instrumentos processuais aptos a inibir ou atenuar seus efeitos, segundo a gravidade do caso: 

 

I - declarar a ocorrência de alienação parental e advertir o alienador; 

II - ampliar o regime de convivência familiar em favor do genitor alienado; 

III - estipular multa ao alienador; 

IV - determinar acompanhamento psicológico e/ou biopsicossocial; 

V - determinar a alteração da guarda para guarda compartilhada ou sua inversão; 

VI - determinar a fixação cautelar do domicílio da criança ou adolescente; 

VII - declarar a suspensão da autoridade parental. 

 

Parágrafo único.  Caracterizado mudança abusiva de endereço, inviabilização ou obstrução à convivência familiar, o juiz também poderá inverter a obrigação de levar para ou retirar a criança ou adolescente da residência do genitor, por ocasião das alternâncias dos períodos de convivência familiar.

 Trata-se de um rol meramente exemplificativo ou não taxativo, podendo a perícia no caso concreto constatar outros atos que caracterizem a Alienação Parental. Para o guardião, que na maioria dos casos é a mãe devido à ideia de que esta seria mais apta a cuidar dos filhos, a legislação prevê desde medidas brandas como a advertência, até medidas drásticas a exemplo da inversão da guarda. Neste sentido traz-se como exemplo decisão proferida pelo TJRS, 7ª Câmara Cível, na Apelação Cível n. 70014814479, Relatora Des. Maria Berenice Dias, julgado em 07/06/2006:

Impõe-se realizar, ainda, duas recomendações à origem: a) de que sejam realizadas perícias psiquiátricas que avaliem o pai, a criança e a genitora, no intuito de melhor

instruir o feito; e b) de que a mãe seja advertida no sentido de buscar auxiliar emocionalmente filha, seja deixando de criar empecilhos psicológicos à criança, com relação às visitações, seja evitando a criação de imagens negativas na mente da infante, com relação ao pai e aos familiares paternos. O fato de a agravante, conforme bem menciona a decisão guerreada, não estar (...) agindo no melhor interesse da filha (...) (fl. 32). Assim, necessário que seja a genitora advertida de que sua postura pode vir a influenciar até mesmo futura definição de guarda.

A Lei sobre Alienação Parental quando criada, em agosto de 2010, objetivou amparar aquelas crianças ou adolescentes em um contexto de crise conjugal. Brito e Sousa (2011) pontuam que a justificativa do projeto de lei sobre a matéria refere-se aos aspectos emocionais e psicológicos presentes nos filhos que seriam vítimas da Alienação Parental, abordando também os comportamento e distúrbios psicológicos acarretados.

A lei não fala claramente a respeito da Síndrome da Alienação Parental (SAP). Este termo foi cunhado por Richard Gardner em 1980 para designar um transtorno em que a criança é programada para odiar o outro genitor e quem mais esta campanha denegritória se estender, na presente pesquisa, os avós. Gardner observou também um conjunto de sintomas característicos apresentados pela criança. Todos estes fatores combinados contribuem para o desenvolvimento da SAP. Gardner (2002) assim definiu esta síndrome:

A Síndrome de Alienação Parental (SAP) é um distúrbio da infância que aparece quase exclusivamente no contexto de disputas de custódia de crianças. Sua manifestação preliminar é a campanha denegritória contra um dos genitores, uma campanha feita pela própria criança e que não tenha nenhuma justificação. Resulta da combinação das instruções de um genitor (o que faz a “lavagem cerebral, programação, doutrinação”) e contribuições da própria criança para caluniar o genitor-alvo. Quando o abuso e/ou a negligência parentais verdadeiros estão presentes, a animosidade da criança pode ser justificada, e assim a explicação de Síndrome de Alienação Parental para a hostilidade da criança não é aplicável.

O poder familiar corresponde a um conjunto de direitos e deveres exercidos pelos pais em relação à pessoa e aos bens dos filhos não emancipados visando o bem-estar e proteção dos mesmos. Segundo dispõe o CC-2002 a separação judicial, o divórcio e a dissolução da união estável não alteram as relações entre pais e filhos senão quanto ao direito, que aos primeiros cabe, de terem em sua companhia os segundos (art. 1.632). Nessa hipótese, o genitor que não detém a guarda exercerá o direito de visita com todas as atribuições inerentes ao poder familiar.

 A Alienação Parental trata-se de um abuso do referido instituto, pois causa prejuízos prolongados e de difíceis reparações a relação como o genitor alienado estando sujeita a medidas judiciais as quais serão expostas em um próximo item. No que se refere às consequências psicológicas[5] acarretadas, a principal é a SAP a qual apresenta vários sintomas que podem ou não aparecer conjuntamente, segundo Gardner (2002), são eles:

a) Uma campanha denegritória contra o genitor alienado; b) Racionalizações fracas, absurdas ou frívolas para a depreciação; c) Falta de ambivalência; d) O fenômeno do “pensador independente”; d) Apoio automático ao genitor alienador no conflito parental; e) Ausência de culpa sobre a crueldade a e/ou a exploração contra o genitor alienado; f) A presença de encenações ‘encomendadas’; g) Propagação da animosidade aos amigos e/ou à família extensa do genitor alienado.

A depender da intensidade do conflito que envolve os genitores, os casos envolvendo Alienação Parental serão mais moderados ou leves e, consequentemente, com seus sintomas mais visíveis. Em alguns casos a Alienação Parental inicia-se durante o casamento e se tornando mais graves após a separação ou divórcio.

3. OS OBSTÁCULOS NA CONSTATAÇÃO DA ALIENAÇÃO PARENTAL NO CASO CONCRETO

 

 

Há vários obstáculos em torno da aferição da ocorrência ou não da alienação parental, dentre os quais podemos destacar alguns:

a)      Desconhecimento do problema pelas partes (alienador e o alienado, seja o outro genitor ou os avós), consequentemente não haverá alegação e tomada das providências cabíveis;

b)      Não declaração de ato de início de Alienação Parental de ofício, sabe-se que cabe ao juiz e não somente as partes, mas em muitas varas de família brasileiras não é o que se observa;

c)      Comprovação da ocorrência pelos peritos. Para a constatação da Alienação Parental cabe ao juiz, se necessário, determinar a perícia psicológica ou biopsicossocial, mas muitas vezes não é uma tarefa fácil seja porque o alienador camufla o problema, ou pelo nível de alienação da criança ou adolescente, e até mesmo pela falta de formação especifica dos profissionais para a constatação.

O problema da Alienação Parental teve destaque no Brasil após a edição da Lei nº 11.698/08 (lei sobre a guarda compartilhada), quando houve aumento do número de eventos e informações a respeito da SAP. Nesse contexto de comoção social nasce o Projeto de Lei nº 4.853/08 sancionado em 2010 como Lei nº 12.318/10.

A referida lei regulou o assunto, porém, a maioria da população ainda desconhece o que dificulta o enfretamento do problema. Os pais visam o melhor para seus filhos em diversos aspectos; educação, moradia, saúde, lazer. O alienador da mesma maneira acredita muitas vezes estar fazendo a coisa certa, afastando da convivência de seus filhos o outro genitor e os avós. E nem sempre o alienador e o alienado tem conhecimento exato da gravidade da situação e dos riscos a que os netos estão expostos e eles mesmos, pois a convivência familiar traz benefícios para ambas às partes.

Cabe ao juiz em cada caso determinar a perícia psicológica ou biopsicossocial em ação autônoma ou incidental quando houver indício da prática de Alienação Parental. Porém em algumas varas de família brasileiras não é o que se verifica, quando há a alegação (em pouquíssimos processos) é feita por uma das partes.

Segundo dispõe os parágrafos do art. 5º da lei em discussão, o laudo pericial terá base em ampla avaliação psicológica ou biopsicossocial a depender do caso compreendendo: a) entrevista pessoal com as partes; b) exame de documentos dos autos; c) histórico do relacionamento do casal e da separação; d) cronologia de incidentes: e) avaliação da personalidade dos envolvidos; f) exame da forma como a criança ou adolescente se manifesta acerca de eventual acusação contra genitor.

 A perícia será realizada por profissional ou equipe multidisciplinar habilitados, devendo sua aptidão ser comprovada. O perito ou equipe multidisciplinar designada para verificar a ocorrência de alienação parental terá prazo de 90 (noventa) dias para apresentação do laudo prorrogáveis.

No caso concreto os peritos responsáveis pela constatação da Alienação Parental não se mostram capazes de aferir os atos característicos desta prática. Conforme lições de Sandra Araújo (2013):

“Penso também que ainda vivemos em um mundo de fantasia acerca da maternidade e da paternidade, negando que tais sujeitos possam, conscientemente ou inconscientemente, causar no outro e principalmente em seus filhos danos do tamanho que vejo ocorrer (...) Encontro pareceres de peritos psicólogos que ainda escrevem que “mãe não causa mal aos filhos”, que é absurdo pensar que genitores possam provocar tais comportamentos dos filhos”.

Outro obstáculo perpassado na constatação é o nível de alienação em que a criança ou adolescente encontra-se, em casos mais graves a campanha denegritória é tão bem feita que a verdade seja difícil de ser apurada. A criança possui uma verdade pronta e acabada a respeito do alienado, elaborada, ao longo do tempo, pelo genitor que detém a guarda. Colaborando com este processo a criança possui, ainda, falsas memórias criadas pelo guardião, lembranças que a criança não se recorda, mas acredita realmente ter acontecido despertando nesta uma gama de sentimentos ruins (angústia, raiva etc.). E dessa forma, o alienador consegue camuflar a Alienação Parental.

3.1 Medidas judiciais cabíveis

 

 

Segundo a Lei nº 12.318/10, declarado indício de ato de alienação parental, seja a requerimento ou de ofício, em ação autônoma ou incidental, o processo deverá ter tramitação prioritária, e o juiz nesta hipótese, ouvido o Ministério Público, determinará as medidas provisórias necessárias para preservação da integridade psicológica da criança ou do adolescente assegurando sua convivência com genitor ou viabilizar a efetiva reaproximação entre ambos, se for o caso.

 O juiz assegurará também à criança ou ao adolescente e ao genitor alienado a garantia de visitação assistida ressalvados os casos em que há iminente risco de prejuízo à integridade física ou psicológica da criança ou do adolescente, atestado por profissional designado pelo juiz para acompanhamento das visitas.

 No caso em que a Alienação Parental é também dirigida aos avós é perfeitamente cabível a mesma medida pautada ainda na disposição presente no parágrafo único do art. 1589 do CC, o qual dispõe que “o direito de visita estende-se a qualquer dos avós, a critério do juiz, observados os interesses da criança ou do adolescente”.

Havendo indício de prática de Alienação Parental o juiz determinará se necessário, a perícia psicológica ou biopsicossocial. O laudo pericial deverá estar conforme as Resoluções do Conselho Federal de Psicologia e o Código de Ética Profissional do Psicólogo.

Afora as medidas judiciais cabíveis, existem algumas soluções apontadas pelos doutrinadores para o problema da alienação parental, neste sentido lecionam Marques e Santos (2011):

Os processos que a abordam deveriam merecer prioridade especial, para tanto sendo necessária não só a multiplicação do número de Varas de Família como também uma preparação maior dos operadores do Direito de Família, por exemplo, através de cursos e seminários (...). As Escolas Judiciais dos Tribunais Estaduais e as Escolas da OAB e do Ministério Público deveriam promover maior quantidade de eventos destinados a divulgar esse tema, e igualmente as entidades de classe dos operadores do Direito, dentre as quais as de magistrados e do Ministério Público.

Para os autores supracitados, deveria haver o reconhecimento deste tipo penal específico, pois consideram a alienação parental um fato de extrema gravidade tendo em vista tratar-se, ainda, de um ilícito.

4. CONCLUSÃO

 

 

 A alienação parental é definida no art. 2º da Lei nº 12.318/10 como a interferência na formação psicológica da criança ou do adolescente promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este. 

A expressão Síndrome da Alienação Parental (SAP), resultante desta prática foi criada em 1980 por Richard A. Gardner para caracterizar um distúrbio em que a criança cria um sentimento de repúdio dentre outros sem qualquer razão a um dos genitores. Os atos característicos da Alienação Parental ferem uma série de direitos básicos e fundamentais, (convívio familiar, saúde mental, por exemplo) tanto da criança ou do adolescente como também do genitor alienado e dos avós para quem também são dirigidos os atos típicos da AP.

No Brasil a prática da Alienação Parental tornou-se comum causando verdadeira comoção social. Nas varas de família brasileira é perfeitamente admissível, sendo mencionada inclusive em jurisprudências. Foi em vista deste panorama que se criou a Lei nº 12.318/2010 a qual dispõe sobre a Alienação Parental altera o art. 236 da Lei nº 8.069/90.

Percebe-se que esta prática não raro é realizada em desfavor dos avós como forma de retaliação seja a eles ou mesmo ao ex-cônjuge ou ex-companheiro, por diversos motivos pessoais, pois a separação ou divórcio nem sempre ocorre de forma tranquila e amigável.  Este tema é de grande relevância acadêmica tento em vista que a lei nº12318/10, assim como outros dispositivos legais visam assegurar direitos fundamentais tais como, o direito a convivência familiar, o direito ao desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social em condições de liberdade e de dignidade tanto da criança e do adolescente, quanto dos avós.

 

 

REFERÊNCIAS

 

 

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BARDELO, Claudia Gay. A Alienação Parental do Idoso, do Adolescente e da Criança. In: CRISTIANO CHAVES DE FARIAS. Família e sucessões sob um olhar prático. Porto Alegre: Letra & Vida, 2013. p. 237-252.

 

BARRETO, Ricardo Menna; SOUZA, Ana Maria Oliveira de. Síndrome de Alienação Parental, Falso Abuso Sexual e Guarda Compartilhada: a Necessidade de uma Observação Jurídica Transdisciplinar. Espaço Jurídico, Joaçaba, v. 12, n. 1, p. 67-82, jan/jun. 2011. Disponível em: < http://editora.unoesc.edu.br >. Acesso em: 10 fev. 2014.

 

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Brasília, DF: Secretaria Especial dos Direitos Humanos, 2004.

 

FALCÃO, Deusivania Vieira da Silva; SALOMÃO, Nadia Maria Ribeiro. O papel dos avós na maternidade adolescente. Revista Estudos de Pscicologia, Campinas, v. 22, n. 2, abr-jun, 2005. Disponível em: < http://www.scielo.br/>. Acesso em 20 Abr. 2014.

 

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REIS, Raphael Silva; REIS, Nara Conceição Santos Almeida. Alienação Parental: Consequências Jurídicas e Psicológicas. Revista da Esmese, n. 14. 2010. Disponível em: < http://bdjur.stj.jus.br>. Acesso em 10 fev. 2014.

 

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ZAMATARO, Yves A. R. Alienação Parental no Direito Brasileiro. Disponível em: < http://www.migalhas.com.br>. Acesso em 15 fev. 2014.

 



[1] Paper apresentado à disciplina Direito de Família e Sucessões do 6º Período Noturno do Curso de Direito da Unidade de Ensino Superior Dom-Bosco (UNDB).

[2]Aluna do 6º período Noturno do Curso de Direito da Unidade de Ensino Superior Dom-Bosco (UNDB).

[3]Aluna do 6º período Noturno do Curso de Direito da Unidade de Ensino Superior Dom-Bosco (UNDB).

[4] Professora, Mestra, Orientadora.

[5] Grifo Nosso.

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