ANTONIO MARRECA
Por rafael freitas reis | 02/01/2011 | CrônicasANTONIO MARRECA.
O hoteleiro Manoel do Bandeira 2, conta que o seu conterrâneo Antônio Marreca era alto, magro e sisudo. Parecia um Zulu. Na Varzelândia de antanho, nesse calorento Norte de Minas e já com seus oitenta anos, Antônio tinha a carapinha na cor original. Confirmando, com isso, o dito popular: "negro só o cabelo pinta depois de cento e trinta!"
Lavrador por profissão, caprichoso na execução de uma empreitada na roça ele era sempre procurado pelos proprietários de terras próximos à urbe. Especializara-se em lavrar a terra provocando o cio da deusa Ceres. Plantava de tudo: Mamona, feijão, milho e algodão. Sabia como ninguém lidar com uma criação prenha e parida.
Era, também, chamado de "Ti Antonio", tratado respeitosamente por todos e na intimidade dos amigos próximos e à boca pequena, conhecido como "o homem que não teimava". A bem da verdade, tratava-se de um resolvido consigo mesmo. Vivia na maciota, com as coisas que a vida lhe apresentava. Nos obstáculos e indecisões, tomava o caminho do meio, próprio de um relativista.
Os mais próximos e companheiros de trabalho, para provocá-lo, numa tarde de sol a pino iam chegando e dizendo: "Eita Ti Antonio! Que chuva danada!" Ele respondia, em cima do pedido: "Entra prá dentro se não vocês vão se molhar!..."
Comprava as suas botinas testa de touro nas vendas da sua urbe campesina. Os vendeiros já sabiam que ele tinha os pés de prancha e calçava 44. Mas, insistiam, então, em vender-lhe um par de pontuação 38 ao mesmo tempo em que floreavam a conversa: "Leva esse aqui Ti Antônio, que está mais arrumado para o seu gosto! Ele respondia enfaticamente: "Pode imbruiá que eu levo!"
Chegando à sua casa chamava a filha Jenvita e pedia: "Filha, quando for à venda do compadre, peça para ele trocar esse par por um 44. Diga que esse ficou pegando no calo!" O namorado da Jenvita para caçoar dele, combinava com ela, ao solicitar, pela manhã, para fazer os dois ovos que ele sempre degustava retrucar: "O senhor já comeu os ovos hoje, pai!"
Antônio Marreca, como não era nenhum jumentoca (mistura de jumento com boboca), retrucava: "Esquenta mais dois que aqueles não deram nem para a entrada!..." Estando trabalhando numa lavoura que durariam trinta dias de serviço, os companheiros instigavam: "Vamo meter o bambu que amanhã nós terminamos!"
Nessas ocasiões, Antônio dava uma gaitada e respondia cantando: "Eia dia! E vamo pegá na enxada cambada!" Ti Antônio era adepto da filosofia de Boquirrotas: "Descomplicado é um sonho de consumo."
As suas respostas vinham sempre em tom afirmativo. Confirmava a avaliação feita pelo interlocutor ou a ação sugerida, mesmo sabendo que as perguntas eram "caçoadas". Respondia, confirmando, mas mantendo no rosto um sorriso brejeiro e a meio mastro...