ANTINOMIA IMPRÓPRIA NO DIREITO ELEITORAL

Por Samyr Cruz Góis | 07/12/2009 | Direito

Imagine-se que exista um gigantesco e complexo conjunto de pêndulos equidistantes, todos dispostos ao redor de um mesmo eixo central, incomunicáveis. Cada pêndulo representa um princípio que orienta a Carta Maior Brasileira e o eixo simboliza a própria Carta. Inicialmente, todos os pêndulos encontram-se em estado de igualdade e quietude, inertes uns aos outros. Com o passar dos tempos, forças externas diversas ? a sociedade e suas mutações ? rompem tal inércia inicial e violam tal equilíbrio, forçando o eixo a inclinar-se para um lado ou para outro e desorganizando o alinhamento dos pêndulos. É sabido que, dilacerada a ordem na natureza, em reação, tudo que a forma se moldará para restabelecê-la, e assim será ad eternum.
A despeito do insólito exemplo, dele se extrai a seguinte compreensão: para determinado caso social com repercussão jurídica conflitante (antinomia), tais princípios (pêndulos) obterão maior respaldo (peso), enquanto outros, menos; tudo em busca de uma situação de equilíbrio (justiça).
Seguindo a inteligência do pensamento, não seria uma teratologia jurídica fortalecer a ideia de que os princípios constitucionais, quando dispostos em situação de embate, antinomia imprópria, devido ao seu atributo programático inerente e a seu alto grau de abstração, devam ser observados sob o olhar cogente da pragmaticidade. Não se pode falar, em tais casos, em desrespeito, ofensa ou invasão principiológica - em vez de altercação, adequação; em vez de ofensa, escopo.
A norma constitucional tem suas raízes inumadas no fértil solo dos relacionamentos sociais, ou melhor, dos fenômenos reais de existência política; aquilo que fundamenta a norma é o verdadeiro objeto de seu alcance, tudo reflexo da ininterrupta mutação das sociedades - "Panta rhei"!
No ramo do Direito Eleitoral, peculiar quanto ao seu excessivo devir, prevalecem a Prevenção, a Moralidade e a Celeridade como pressupostos de sua natural (e correta) aplicação, não obstante a existência de outros açambarcados pela Carta Magna, como a Segurança Jurídica, a Presunção de Inocência e o Devido Processo Legal. Trata-se de um sobrepujamento de certo fundamento em relação a outro que menos se amolde ao caso concreto. Acresce-se que, alcançados os fins materiais aos quais se destina a tutela jurisdicional, considerado válido será o ato, independente de seu aspecto formal.
Portanto, temos que, no exemplo específico da impossibilidade de candidatura de pessoas comprometidas com a idoneidade que o mandato público exige, não há prejulgamento nem, tampouco, ofensa a presumida Não-culpabilidade. O que existe de fato é uma prevalência de preceitos fundamentalmente sociais em detrimento de direitos individuais, que demonstram uma menor relevância em face da situação existente. Além de tudo, é inegável que uma decisão do Estado-Juiz em primeira instância não é algo anódino, ignorar tal deliberação é, sem exagero, vergastar aviltantemente o poder-dever do Juízo de primeiro grau, é deprimi-lo a um papel secundário, tal pensamento enfraquece-lhe a voz e imputa-lhe caráter pusilânime.
Diga-se ainda que não se trata de punição, mas de inabilitação por suspeição. O candidato ? ou pré-candidato - simplesmente não atingiu certos prerrequisitos indispensáveis à grandiosidade do mandato.
Dito isto, pergunte-se, pois, a cada cidadão brasileiro, a cada trabalhador, a cada dona de casa, enfim, questione o povo acerca do que seria mais justo, ou melhor, de qual ato seria menos nocivo à sociedade: o de impedir que alguém suspeito ocupe um cargo eletivo, ou, criar condições para que os mesmos "apenas-suspeitos" disponham de poderes para manusear o dinheiro e - o que é mais importante - o prestígio públicos. A resposta se materializa na quantidade de assinaturas coletadas em todo o país: mais de dois milhões de cansados e insatisfeitos, mais de dois milhões de espectadores à busca de transformações, mais de dois milhões de vociferantes rubricas brasileiras!