ANÁLISE DO INSTITUTO DA FALÊNCIA COM AS INOVAÇÕES TRAZIDAS PELA LEI 11.101
Por Mário Pereira | 10/05/2011 | DireitoINTRODUÇÃO
A Nova Lei de Falência vem trazer novos paradigmas para o Direito Falimentar Brasileiro, privilegiando a recuperação das empresas a fim de garantir sua permanência no mercado e, com isso, evitar a redução de empregos e o desaquecimento econômico.
O antigo diploma legislativo (Decreto-Lei nº 7.661/45) que regia tal instituto não atendia mais às exigências de uma economia competitiva e sujeita às pressões da globalização dos mercados. Dessa forma, a nova lei tem como principal preocupação, além de tentar atender à celeridade dos processos falimentares, evitando desgastes no meio empresarial, a preservação da empresa, razão pela qual a legislação tenta fornecer ao devedor em crise todos os instrumentos necessários à sua recuperação, reservando a "falência propriamente dita" apenas para os devedores realmente irrecuperáveis, tendo em vista a busca da justiça social. Com tal escopo e sistemática, a maior beneficiada é, sem dúvida, a sociedade, a qual eliminará da sua conjuntura econômica apenas aqueles gestores e empresas que realmente não deram certo, ou seja, que só atrasavam ou prejudicavam a vida econômica do país, mas fará permanecer em atividade aqueles empreendimentos que, apesar de determinadas dificuldades, sempre foram capazes de trazer mais benefícios que prejuízos.
Com base nas idéias acima expostas, busca este trabalho, de uma forma sucinta, mas esclarecedora, abordar o instituto da falência sob a égide do novo diploma, passando pela análise de seu conceito, caracterização, inovações, procedimento, finalidade, tendo em vista estabelecer o porquê da reformulação legislativa.
Ademais, a presente pesquisa também tem por escopo analisar uma das principais inovações da nova lei, qual seja, o surgimento dos institutos da recuperação extrajudicial e judicial. Tais institutos, conforme definição da nova Lei, visam viabilizar a superação de situação de crise econômico-financeira da empresa.
A recuperação extrajudicial é uma tentativa do devedor solucionar seus problemas com os credores sem que haja grande necessidade da intervenção judicial. Em não sendo possível a recuperação extrajudicial, o próximo passo será a busca da recuperação judicial. Nesse caso, ocorrerá, obviamente, uma maior intervenção judicial e o devedor deverá apresentar um plano de recuperação judicial, devendo negociá-lo com os credores reunidos em uma assembléia, chamada Assembleia Geral de Credores.
Não resta dúvida que o novel diploma é uma evolução na legislação brasileira, haja vista que, nos atuais tempos, com a política que os presentes governos vêm tomando no sentido de estimular o emprego, a decretação da falência deve ser vista com cautela, ou então se estaria em um caminho totalmente oposto, devendo-se privilegiar, portanto, soluções e procedimentos outros que façam da falência um instituto coadunado com a função social da empresa, retirando dela aquele caráter predominantemente pejorativo de outrora. Percebe-se, ainda, que enquanto a legislação antiga se preocupava somente com aspectos formais para declarar a falência, a nova lei não é tão formalista quanto a antiga, pois aquela se preocupa com a finalidade social da empresa dentro do seu meio de atuação. Daí a necessidade do presente compêndio.
1. ASPECTOS HISTÓRICOS
Basicamente, pode-se dizer que o processo de falência surgiu quando se percebeu que uma só pessoa podia dever a muitas, e que essas muitas pessoas podiam se reunir para, quando tivessem o seu direito de crédito resistido pelo devedor, pudessem catalogar os bens do mesmo para a satisfação da dívida. Para se chegar a essa forma de raciocínio, porém, tem-se que acompanhar a história da execução, que começa com o Direito Obrigacional de muito tempo atrás, onde a obrigação sempre foi ligada ao conceito de pessoa.
Na Antiguidade, houve período em que o devedor respondia por suas obrigações com a própria liberdade e às vezes com a própria vida. Na fase mais primitiva do direito romano, antes da codificação da Lei das XII tábuas, o liame entre credor e devedor admitia a addicere, que era a adjudicação do devedor insolvente. Este permanecia em estado de servidão com o credor por um período de até sessenta dias. Caso o débito não fosse solvido nesse período, o credor podia vendê-lo como escravo, ou até mesmo matá-lo, repartindo seu corpo segundo o número de credores. Nas Leis de Hamurabi, por exemplo, essa prática ficava clara em alguns dispositivos, como do 115° ao 118°, nos quais é tratado o oferecimento de pessoas como garantia de dívidas; um pouco antes, o 54° dispositivo já falava na venda (como escravo) daquele que, condenado a pagar pelos prejuízos decorrentes de ato ilícito, inundação de campo alheio, por exemplo, fruto da negligência na fortificação do dique de seu campo, não poderia indenizar o grão perdido.
Na Grécia, sabe-se, tinha-se a prisão do devedor insolvente; Sólon terminou com tais práticas em Atenas, mas seguiram sendo executadas em outras póleis . Em Roma, quando do estabelecimento das XII Tábuas (cerca de 450 a.C.) o adimplemento das obrigações era garantido não pelo patrimônio do devedor, mas por sua pessoa, ou seja, por sua liberdade e vida.
A insolvência, portanto, era hipótese de capitis diminutio maxima, ou seja, do maior decaimento de condição social, perdendo o devedor seu status político de cidadão, sua liberdade e, às vezes, até a própria vida. Foi no Direito Pretoriano que se desenvolveu a ideia de que a insolvência poderia ser resolvida limitando-se apenas ao patrimônio do devedor.
Na época, o papel desenvolvido pelos pretores era de extrema importância, vez que detinham um poder em muito superior à iurisdictio dos juízes contemporâneos, já que lhes cabia a faculdade de publicar editos, nos quais faziam constar as fórmulas para os pleitos e as condições para a concessão dos pedidos, podendo proteger direitos que não estavam contemplados no Direito escrito, corrigir disposições anotadas em normas legais e, até, insurgir-se contra elas. São esses editos que formaram o chamado Direito Pretoriano, também chamado de Direito Honorário, cuja força estava justamente na temporariedade do mandato do pretor: um ano. Um novo pretor, assumindo a função, podia ou não repetir os editos de seu antecessor (pars translatitia, a parte das normas que era repetida, ratificada, sendo translada de um edictum a outro), além de criar os seus próprios (pars nova, a parte com fórmulas inovadoras). O sistema permite uma atualização constante do direito que, envelhecendo, é alterado pelo próximo pretor, que também pode corrigir alterações excessivamente ousadas.
Compreende-se, portanto, como a posição jurisprudencial reiteradamente assumida pelos pretores acabou por influenciar a edição da Lex Poetelia Papiria, a qual proibiu o encarceramento, a venda como escravo e a morte do devedor. O direito romano passou a conter regras que consagravam a sua responsabilidade patrimonial, em contraposição às regras de outrora, que o puniam com a pena de responsabilidade pessoal por suas dívidas.
Vale ressaltar, todavia, que nesse período inicial, o direito falimentar ? se é que já podemos assim chamá-lo ? possuía um caráter extremamente repressivo, tendo como finalidade precípua a punição do devedor, e não a satisfação dos legítimos interesses dos credores.
Na Idade Média, quando o direito comercial começa a ser constituído a partir da compilação dos usos e práticas mercantis, sobretudo nas cidades italianas, a doutrina também identifica regras especiais para a execução dos devedores insolventes, que podem ser vistas como precursoras do atual direito falimentar. Todavia, ainda se tratava de regras que se aplicavam indistintamente a qualquer espécie de devedor, comerciante ou não, e que mantinham seu caráter excessivamente repressivo.
Luiz XIV inspira-se nessas normas e práticas para introduzir na França, em 1673, uma ordenança específica para o comércio. No entanto, somente a legislação napoleônica deu ao tema um tratamento disciplinar específico, distinguindo a insolvência civil da insolvência empresarial. Foi esta legislação que influenciou, no Brasil, a edição do Código Comercial de 1850.
Com o passar dos tempos, a sociedade foi evoluindo juntamente com a economia, a qual avançou numa velocidade incrível; e como não podia deixar de ser, o direito falimentar viu-se obrigado a acompanhar tais mudanças, tendo de se adaptar aos novos paradigmas. A falência, até então considerada como uma certa patologia de mercado inerente aos devedores desonestos, passa a ser vista com outros olhos e analisada sob novas perspectivas.
Com efeito, no século XX, depois das grandes guerras mundiais, quando se iniciou o processo de globalização, importantes mudanças culturais, sociais, ideológicas, políticas e, sobretudo, econômicas, resultaram em progressos positivos inquestionáveis. A conjuntura sócio-econômica alterou-se profundamente, o que exigia do operador do direito uma completa reformulação dos princípios e institutos do direito falimentar. Neste momento, tal instituto passa a ser reexaminado: a questão primária deixa de ser o devedor per si para enfocar as conseqüências sociais e econômicas advindas da sua inadimplência.
A noção de insolvência com um sentido pejorativo começa a ser repensada, e ela passa a ser tratada como um fenômeno natural, inerente ao risco empresarial. A afirmação dos postulados da livre-concorrência e da livre iniciativa conduz à inexorável constatação de que não apenas os devedores desonestos atravessavam crises econômicas, mas qualquer devedor que estivesse no mercado.
O lance final dessa evolução foi a apresentação ao Congresso Nacional, em 1993, de um projeto de lei de uma nova regulamentação jurídica para a falência, o que, após muitas discussões, culminou com a edição da Lei 11.101/05, que neste trabalho se estudará. Tal diploma veio a substituir o antigo decreto regulador de tal instituto, o qual possuía ainda muitas regras que não se coadunavam com as mudanças ocorridas nas últimas décadas.
2. FALÊNCIA: CARACTERIZAÇÃO E NOVA CONCEPÇÃO
2.1 Conceitos do instituto
A palavra "falência" vem do latim fallere, que significa "faltar", "enganar", no sentido de deixar alguém de cumprir uma obrigação. Para efeito de aprendizado, vamos anotar alguns dos diversos conceitos de falência.
Primeiramente, na ideia de Amador Paes de Almeida (2009), podemos conceituar falência como "processo de execução coletiva contra devedor insolvente".
Outro pensamento sobre falência, agora do autor Gladston Mamede, é aquele que a define como:
O procedimento pelo qual se declara a insolvência empresarial (insolvência do empresário ou sociedade empresária) e se dá solução à mesma, liquidando o patrimônio ativo e saldando, nos limites da força deste, o patrimônio do falido (2009).
Outro juízo de falência diz que esta "é um processo judicial de execução concursal do patrimônio do devedor empresário". Essa noção advém dos ensinamentos de Fábio Ulhoa (1997).
De acordo com Rubens Requião (1993), a falência "é a solução judicial da situação jurídica do devedor-comerciante que não paga no vencimento obrigação líquida".
Para ser utilizado neste trabalho, apresenta-se como um dos mais acertados conceitos de falência, no direito pátrio, o apresentado por Sampaio de Lacerda, que afirma que:
A falência se caracteriza como um processo de execução coletiva, decretado judicialmente, dos bens do devedor comerciante ao qual concorrem todos os credores para o fim de arrecadar o patrimônio disponível, verificar os créditos, liquidar o ativo, saldar o passivo, em rateio, observadas as preferências legais .
Baseado, portanto, no conceito acima esposado, e levando em consideração a nova lei, que se adaptou às mudanças pelas quais tem passado a sociedade nos últimos anos (como já abordado no item anterior), pode-se compreender a falência como o procedimento ensejado quando não há viabilidade de recuperação judicial ou extrajudicial sob a direção do devedor, que se encontra em difícil situação econômico-financeira, que praticou atos proibidos pela lei ou que, sem relevante razão de direito, não paga, no vencimento, obrigação líquida superior a quarenta (40) salários-mínimos. A liquidação da empresa só ocorre em último recurso, quando impossibilitada a recuperação da empresa.
Muitos doutrinadores ainda não estabelecem um conceito separado de falência para o Decreto-Lei e outro para a nova Lei, mas se atêm, sobretudo, nas divergências procedimentais da falência na lei nova (que teria se tornado mais rápida e efetiva, como, por exemplo, o fato da possibilidade da venda antecipada dos bens e outras alterações) e de todo o contexto legal em que se insere a falência, em face dos novos institutos da recuperação judicial e extrajudicial, como outrora dito.
Existem dois sistemas preponderantes de falência. O latino-francês, chamado de restritivo, que só permite a falência de empresário individual ou de sociedade empresária; para os civis, caberia apenas a insolvência civil. O outro sistema é o ampliativo, anglo-saxão, que diz que tanto os civis, quanto os empresários individuais, quanto a sociedade empresária podem falir. O atual sistema, da lei 11.101/2005, adota, de acordo com o seu artigo 1º, o sistema restritivo. Senão, veja-se:
Art. 1º. Esta lei disciplina a recuperação judicial, a recuperação extrajudicial e a falência do empresário e da sociedade empresária, doravante referidos simplesmente como devedor.
Redefine-se, portanto, o universo de incidência da lei, recaindo a mesma sobre o empresário e a sociedade empresária, aproveitando o texto do conceito de empresário contido no novo Código Civil (art. 966), considerado preciso para restringir o âmbito de incidência da lei aos empresários e às sociedades empresárias, vez que, segundo o mesmo, "considera-se empresário quem exerce profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou a circulação de bens ou de serviços". Na antiga lei, falava-se em "comerciante", conceito ainda bastante ligado à teoria dos atos de comércio, figura ultrapassada, que não mais se coaduna com as novas atividades econômicas relevantes surgidas ao longo dos últimos tempos.
No entanto, conforme dispõe o artigo 2º do novel diploma, foram excluídas determinadas empresas de sua incidência, como as empresas públicas, sociedades de economia mista, instituições financeiras, dentre outras.
Quanto às suas finalidades, a falência serve, de início, para, de acordo com o par conditio creditorum, proteger os credores. Segundo tal princípio, os credores do devedor que não possui condições de saldar na integralidade todas as suas obrigações devem receber um tratamento parificado do ordenamento jurídico, dando-se aos que integram uma mesma categoria de créditos iguais chances de efetivação dos mesmos. Além disso, busca defender, também, o próprio devedor falido, porque este tem interesse em ver cumprido o seu processo de falência, podendo, após esse cumprimento, voltar à atividade empresarial, que, sem o auxílio do Estado, ele jamais poderia realizar. Apresenta também como objetivo a eliminação das sociedades empresariais financeira, econômica e patrimonialmente arruinadas, pois as empresas nessas situações atrapalham o fluxo de riqueza. Outra finalidade seria o consequente saneamento do meio empresarial (art. 75 da lei 11.101/2005).
Segundo nos ensina LUIZ TZIRULNIK,
o instituto da falência vem funcionar como uma defesa para o comércio e, consequentemente, para o crédito, privando do comércio aquele que, não fazendo bom uso de suas prerrogativas creditícias, ferem os direitos de seus credores, inadimplindo obrigações assumidas quer através de contratos ou através de títulos de crédito retromencionados.
2.2 Natureza jurídica da falência
O direito falimentar é extremamente complexo, razão pela qual se estabelece, já há muito tempo, instigante polêmica acerca da natureza jurídica da falência. As principais posições doutrinárias concernentes a tal tema são aquelas que caracterizam a falência ora como instituto de natureza processual, ora de natureza substancial, ou mesmo atribuem a mesma um caráter sui generis.
A primeira corrente supracitada baseia-se no fato de a falência ser um processo de execução coletiva no qual é apurado o ativo e o passivo, pagando-se os credores na preferência de seus créditos. Assim, a falência faz parte do direito processual porque, efetivamente, ocorre simplesmente a transferência do patrimônio do devedor para o do credor, através da prestação jurisdicional.
Para os doutrinadores que entendem ser a falência um instituto de direito substancial, deve-se atentar em descrever a falência pelo que ela é, conceituar enfatizando seu aspecto de insolvência econômica, como fez o art. 1º do Decreto-Lei nº 7.661/45, estabelecendo que falido é aquele que não paga no vencimento uma obrigação líquida.
Todavia, existem aqueles doutrinadores para os quais a falência é um instituto complexo, formado por regras de diferentes ramos do Direito.
Assim, possui natureza jurídica sui generis, não havendo prevalência das normas processuais sobre as objetivas, muito menos destas sobre as administrativas.
Embora possua um processo de execução claramente processual, contém o instituto da falência inúmeros preceitos de direito objetivo.
Ora, a natureza jurídica da falência não pode estar presa mais ao processualismo de outrora. Não se pode mais ficar restrito à simples liquidação do patrimônio do devedor. Deve ser observada, acima de tudo, a preservação da empresa em crise econômica, a qual estará sujeita ao cumprimento de um plano reorganizatório.
Os interesses individuais de simples solução de pagamento dos créditos com a correlata extinção da empresa, sem verificar a possibilidade de sua reorganização financeira, não pode mais permanecer como medida legislativa. São os interesses coletivos da sociedade, em manter empregos e gerar tributos, garantindo assim um desenvolvimento global do país, que devem prevalecer.
3. DO DECRETO-LEI Nº 7.661/45 À NOVA LEI DE FALÊNCIAS ? MUDANÇAS SIGNIFICATIVAS
3.1 Análise das causas de decretação da falência na lei nova
Antes de adentrarmos à análise das principais inovações da nova legislação, faz-se necessário, de início, procedermos à verificação das causas que levam o devedor a se submeter a um processo de falência.
Cumpre destacar que os sujeitos legitimados para o requerimento da falência constam do rol do artigo 97 da nova lei, compreendendo, portanto, o próprio devedor; o cônjuge sobrevivente, qualquer herdeiro do devedor ou o inventariante; o cotista ou o acionista do devedor, na forma da lei ou do ato constitutivo da sociedade; e ainda os demais credores.
A legislação anteriormente vigente (Decreto-lei 7.661/45) trazia três situações que justificavam o pedido inicial de falência de uma empresa. Correspondiam às hipóteses de impontualidade injustificada, execução frustrada e atos de falência. E nesse ponto, a nova Lei de Falências não trouxe relevantes alterações, como se verá a seguir.
A falência do devedor poderá ser decretada quando, consoante o inciso I do artigo 94, sem relevante razão de direito, o mesmo não paga obrigação líquida materializada em título ou títulos executivos protestados cuja soma ultrapasse o equivalente a quarenta salários mínimos na data do pedido de falência, fundamentando-se, portanto, em uma impontualidade injustificada. Constata-se, pelo exposto, que não apenas a mera impontualidade perfaz a circunstância suficiente para o requerimento de falência do devedor. Ao contrário, do modo como a matéria foi regulada, exsurge a necessidade de preenchimento dos demais requisitos acima vistos, os quais deverão ser analisados para o pleno entendimento da figura da impontualidade injustificada como causa para a ação falimentar.
Quanto à necessidade do protesto, tal se justifica diante da gravidade que representa a propositura de ação falimentar e a eventual decretação da falência. Tamanho gravame não pode ser oposto ao devedor sem a existência de prova cabal do descumprimento de suas obrigações. Assim, a impontualidade injustificada deverá vir representada no documento que retrata o protesto. É aquilo que os doutrinadores chamam de protesto especial para fins falimentares, sendo este um requisito indispensável para a propositura da ação falimentar, uma vez que a falência é uma situação bastante séria para o empresário, e drástica, na maioria das vezes, para a sociedade em geral.
Ademais, como diz o inciso II do mesmo artigo supracitado, quando o devedor, executado por qualquer quantia líquida não paga, não deposita nem nomeia bens suficientes dentro do prazo legal, caracterizando a chamada execução frustrada, também pode ser submetido a processo falimentar, desde que requerida por quem de direito.
Para o Direito Falimentar, a execução frustrada demonstra-se relevante por ser outro meio indicativo da insolvência do devedor, visto que o descumprimento da ordem judicial executiva é entendido pelo legislador como uma impossibilidade material de adimplemento.
Da análise de tal circunstância, uma observação merece ser ressaltada: para a situação em análise, o inadimplemento da obrigação passa a ocupar posição secundária. O que de fato tem relevância na execução frustrada é a demonstração que, mesmo tendo sido citado em processo executivo, o devedor permanece inerte. Em função disso, percebe-se logo a desnecessidade de protesto. A nova legislação falimentar, portanto, não acolheu o Protesto de Sentença, como ocorria sob a égide do Decreto-lei 7.661/45. O § 4º do art. 94 da nova lei confirma tal afirmação ao esclarecer que:
Art. 94
(...)
§ 4º Na hipótese do inciso II do caput deste artigo, o pedido de falência será instruído com certidão expedida pelo juízo em que se processa a execução.
Referida certidão é suficiente para fundamentar o pedido de falência, tornando-se desnecessário o protesto. Tal certidão, obviamente, será endereçada ao juízo competente e o credor deverá desistir da execução originária.
Além dessas causas, o inciso III do mesmo artigo estabelece, em diversas alíneas, uma série de condutas que, uma vez praticadas pelo devedor, podem ensejar também o requerimento de sua falência. São os seguintes:
Art. 94.
(...)
III ? pratica qualquer dos seguinte atos, exceto se fizer parte do plano de recuperação judicial:
a) procede a liquidação precipitada de seus ativos ou lança mão de meio ruinoso ou fraudulento para realizar pagamentos;
b) realiza ou, por atos inequívocos, tenta realizar, com o objetivo de retardar pagamentos ou fraudar credores, negócio simulado ou alienação de parte ou da totalidade de seu ativo a terceiro, credor ou não;
c) transfere estabelecimento a terceiro, credor ou não, sem o consentimento de todos os credores e sem ficar com bens suficientes para solver seu passivo;
d) simula a transferência de seu principal estabelecimento com o objetivo de burlar a legislação ou a fiscalização ou para prejudicar credor;
e) dá ou reforça garantia a credor por dívida contraída anteriormente sem ficar com bens livres e desembaraçados suficientes para saldar seu passivo;
f) ausenta-se sem deixar representante habilitado e com recursos suficientes para pagar os credores, abandona estabelecimento ou tenta ocultar-se de seu domicílio, do local de sua sede ou de seu principal estabelecimento;
g) deixa de cumprir, no prazo estabelecido, obrigação assumida no plano de recuperação judicial.
São os chamados atos de falência.
Uma vez comprovado que qualquer das circunstâncias acima estudadas efetivamente ocorreu, o juiz deverá decretar a falência em sentença, a fim de que se prossiga o procedimento comum de liquidação. Antes disso, porém, foi introduzido pela nova lei um dos mais importantes institutos do direito falimentar, qual seja, a recuperação judicial (bem como a extrajudicial), a qual será brevemente analisada a seguir.
3.2 Principais alterações na antiga lei de Falências e Concordatas
Inquestionável é a importância de uma empresa para a economia de qualquer sociedade. Sabe-se que, nos dias de hoje, grande parte dos empregos e da produção das riquezas são criadas pela atuação das empresas no contexto regional e mundial. Por conta disso, o antigo complexo normativo do Decreto-Lei, permeado de institutos e técnicas ultrapassadas, não mais atendia à dinâmica da vida empresarial nem à realidade sócio-econômica do nosso país, quebrando várias empresas possivelmente viáveis. Podemos afirmar que a possibilidade de reorganização econômica da empresa auxilia na melhor observação de sua função social, pois atinge o interesse público existente na continuação da atividade funcional da empresa (quando possível, obviamente), como também busca incentivar o crescimento do país, em virtude de um maior desenvolvimento econômico alcançado.
Nesse contexto, portanto, a nova Lei de Falências veio redefinir o Direito Falimentar brasileiro, trazendo como principal inovação o instituto da recuperação judicial, a fim de tentar garantir a permanência das empresas em crise no mercado e com isso evitar a redução de empregos e o desaquecimento econômico, o que provocaria excessivos danos à sociedade, se imediata a decretação da falência.
O novo texto da Lei de Falências é um projeto que substituiu o antigo Decreto-Lei nº 7.661, de junho de 1945, que não atendia mais às exigências de uma economia competitiva e sujeita às pressões da globalização dos mercados. Desta forma, a nova lei quer facilitar o processo de recuperação das empresas e, consequentemente, gerar mais impostos e fazer justiça social.
Sem dúvida, o novel diploma também contribuiu em muito para a redução das taxas de juros por possibilitar às instituições financeiras maior garantia de que vão receber os valores emprestados.
Dentre as principais reformas contidas no diploma, destacam-se as seguintes: há um capítulo especial destinado à regulação das pequenas e microempresas; pluralidade de formas, sob o manto da flexibilização, cuidando da recuperação da atividade produtiva; inserção de técnicos e profissionais auxiliando o juízo. A nova lei também trata da simplificação dos procedimentos, da redução dos incidentes processuais, da remodelagem dos prazos. Sobretudo, estabelece a primazia da empresa sobre o empresário, que poderá ser afastado se estiver provada malversação, fraude ou desvio patrimonial. Num momento de aguda crise, no qual as indústrias partem para demissões, com redução da jornada de trabalho e diminuição salarial atingindo transnacionais, a situação é deveras crítica em relação às pequenas empresas e às microempresas.
Nasce o instituto da cessão da empresa após a falência. Com isso, o legislador, mais uma vez, procura preservar a empresa, ou seja, toda a atividade organizada do empresário para que ela possa ter continuidade após a falência. A Nova Lei de Falências e a Lei Complementar nº 118 eliminam os riscos de sucessão tributária, previdenciária e trabalhista em qualquer modalidade de alienação judicial em processo de falência. Eliminam, ainda, o risco de sucessão tributária nas operações de alienação de filiais ou unidades produtivas isoladas em processo de recuperação judicial. Vejamos na Lei 11.101/2005:
Art. 60.
(...)
Parágrafo único: O objeto da alienação estará livre de qualquer ônus e não haverá sucessão do arrematante nas obrigações do devedor, inclusive as de natureza tributária, observado o disposto no § 1o do art. 141 desta Lei.
Esse artigo encontra-se no capítulo referente à recuperação judicial. Percebe-se que aqui não se fala da sucessão trabalhista. O problema vai ser resolvido com outro artigo da nova Lei de Falências, que reza o seguinte:
Art. 141.
(...)
II - o objeto da alienação estará livre de qualquer ônus e não haverá sucessão do arrematante nas obrigações do devedor, inclusive as de natureza tributária, as derivadas da legislação do trabalho e as decorrentes de acidentes de trabalho.
Já esse dispositivo está transcrito no capítulo que se refere à falência, divergindo do outro artigo supracitado (art. 60). Assim, o exame das duas regras deixa evidente uma distinção: o art. 60 fala expressamente em obrigações de natureza tributária, não havendo referência expressa às obrigações de natureza trabalhista, ao contrário do art. 141, que faz expressa menção às obrigações tributárias e trabalhistas. Desse modo, surge-se uma dúvida: cabe a sucessão trabalhista em sede de recuperação judicial?
Entendo que não, pois se assim ocorresse, estar-se-ia privilegiando a falência no lugar da recuperação judicial, e sabemos que o objetivo maior da nova lei é a manutenção da atividade econômica da empresa, atingindo esta, por conseguinte, sua função social.
Dessa maneira, não só na falência, como também na recuperação judicial, inexistirá sucessão de obrigações gerais, inclusive trabalhistas.
Da mesma forma entende Jóse da Silva Pacheco:
Na hipótese de figurar no plano aprovado, como um dos meios de recuperação da empresa, a venda de alguma filial ou unidade produtiva, essa alienação há de ser feita mediante: a) leilão por lances orais; b) propostas fechadas; c) pregão.
De acordo com o expressamente determinado pelo parágrafo único do art. 60, a filial ou unidade produtiva isolada que for alienada a terceiro em hasta pública, será por este recebida livre de qualquer ônus.
O arrematante deve receber o bem que lhe foi alienado sem qualquer ônus, não respondendo pelas obrigações do devedor referentes à filial ou unidade adquirida.
Não sucede o arrematante nas obrigações do devedor, ainda que se trate de obrigação tributária, de acidente do trabalho ou decorrente da legislação trabalhista.
Assim, tendo em vista o acima explicado, o investidor interessado em adquirir ativos de empresas em dificuldades financeiras ou falidas terá meios legais de se prevenir contra o risco de ter de arcar com débitos fiscais, previdenciários e trabalhistas do alienante, o que aumentará as possibilidades de recuperação de empresas, além da manutenção de empregos. Não é a pessoa jurídica (estabelecimento) que é cedida, mas a empresa (atividade econômica), por isso que a sucessão trabalhista e a sucessão tributária desapareceram, permitindo que uma pessoa possa comprar uma empresa sem comprar o passivo da pessoa jurídica. Desta forma, muitos negócios surgirão para investidores que querem comprar empresas falidas sem adquirir o passivo. É importante, no entanto, que a atividade seja mantida, caso contrário, se a empresa for comprada somente para ser extinta, a lei não estará sendo respeitada, uma vez que a finalidade precípua da nova lei é a de manter a atividade organizada em funcionamento.
A nova Lei busca de imediato a recuperação da empresa; não sendo possível tal recuperação, o legislador buscou proteger mais os credores para facilitar que o mesmo tenha uma possibilidade de recuperar o que investiu. Como consequência imediata disto, tendo os credores uma garantia maior, não sendo mais necessários altos juros, como já relatado, poderá vir a ocorrer a queda de juros e, logo, menores preços nas mercadorias, aumento nas vendas e nos empregos etc.
A nova lei é mais rigorosa no aspecto penal mediante a tipificação de novos crimes, bem como pelo aumento das penas, dando ensejo, inclusive, à possibilidade de decretação de prisão preventiva do devedor e/ou de seus representantes, já na fase preliminar (1ª fase) do procedimento falimentar, no caso de constatação pelo magistrado de prova de cometimento de crime falimentar. Sobre isso, leia-se o artigo 99, inciso VII da lei atual:
Art. 99. A sentença que decretar a falência do devedor, dentre outras determinações
(...)
VII - determinará as diligências necessárias para salvaguardar os interesses das partes envolvidas, podendo ordenar a prisão preventiva do falido ou de seus administradores quando requerida com fundamento em provas da prática de crime definido nesta Lei;
À respeito do cabimento ou não dessa prisão preventiva, muitas dúvidas surgem quanto a esse tema. Procura-se saber se o juízo universal da falência também é competente para determinar a prisão preventiva do devedor no caso de indícios de autoria e materialidade de cometimento de crime falimentar.
Pertenço a doutrina que não acredita que o juízo falimentar é competente para a decretação de prisão preventiva do falido, uma vez que este teria seu direito de locomoção restringindo por um juiz cível, e não criminal, ferindo seus direitos constitucionais, como reza o artigo 5º da Constituição Federal de 1988:
Art. 5. Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:
(...)
LIII - ninguém será processado nem sentenciado senão pela autoridade competente;
LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal;
Dessa forma, se o contrário ocorresse, seria o devedor processado por autoridade incompetente, sendo privado da liberdade sem o devido processo legal, ou seja, teria perdido alguns de seus direitos fundamentais.
Isso posto, pode-se dizer que esse problema pode ser resolvido através da simples leitura do artigo 183 da Lei 11.101:
Art. 183. Compete ao juiz criminal da jurisdição onde tenha sido decretada a falência, concedida a recuperação judicial ou homologado o plano de recuperação extrajudicial, conhecer da ação penal pelos crimes previstos nesta Lei.
Portanto, o juiz cível deveria informar ao Ministério Público sobre o acontecimento de um suposto crime falimentar, cabendo a este relatar o ocorrido ao juízo criminal da jurisdição onde tenha sido decretada a falência, concedida a recuperação judicial ou homologado o plano de recuperação judicial, para que este juízo decrete ou não a prisão preventiva do devedor empresário.
Com relação aos crimes falimentares, não podemos esquecer ainda que a sentença que declara a falência ou concede recuperação judicial ou extrajudicial é condição objetiva de punibilidade das infrações penais descritas na nova lei de falências. Isso quer dizer que o devedor só pode ser punido por crime falimentar se, antes disso, sua falência for declarada ou sua recuperação judicial ou extrajudicial for concedida, ambas por sentença proveniente de processo falimentar. Sobre esse entendimento:
Art. 180. A sentença que decreta a falência, concede a recuperação judicial ou concede a recuperação extrajudicial de que trata o art. 163 desta Lei é condição objetiva de punibilidade das infrações penais descritas nesta Lei.
Na lei 11.101/2005, há o processo comum da falência, regulado do artigo 162 a 175, com algumas alterações em relação ao procedimento comum regido no regulamento passado. No "novo" processo comum, há três fases. A fase preliminar é a primeira, tendo as características de um processo de conhecimento. Já a segunda é a fase informativa, na qual se faz um levantamento do passivo e do ativo do falido.
Na fase preliminar, há primeiramente o requerimento de falência, seguido pela resposta do réu (prazo alterado de 24 horas para 10 dias), que, já nesse momento, poderá apresentar o pedido de recuperação judicial, como afirma o seguinte artigo:
Art. 98. Citado, o devedor poderá apresentar contestação no prazo de 10 (dez) dias.
Na nova lei, logo após a sentença que porventura reconheça a falência, o Ministério Público, que passa a ter um papel mais ativo na nova lei, pode já apresentar denúncia por crime falimentar, caso haja indícios suficientes de prática de tais ilícitos; caso contrário, tal órgão pode pedir a instauração de um inquérito policial para fins de averiguação.
Esses procedimentos da nova lei são diversos do decreto-lei nº 7.661 de 1945. Neste o inquérito judicial ocorria no final da segunda fase, isto é, na fase investigatória. Assim, no antigo decreto, só era possível se realizar o inquérito judicial no final da segunda fase. Assim também se sucedia com a denúncia realizada pelo Ministério Público sob égide desse decreto. No antiquado decreto, a denúncia era peça fundamental que decidia o futuro do processo falimentar. Logo, quando a denúncia era recebida, passava-se à fase derradeira do procedimento falimentar. Caso ela não fosse recebida, não se podia realizar a fase de liquidação, cabendo nessa hipótese a concretização da concordata suspensiva. Como se vê, isso contribuía também para deixar esse processo mais moroso.
Muitos autores dizem que o processo de falência era demorado, porquanto tinha de se esperar pelo término das 1ª e 2ª fases para começar a liquidação e, por conseguinte, o pagamento. Hoje não se espera terminar tais fases para dar início à liquidação, que é a 3ª fase. Dessa maneira, após a realização da arrecadação, já se passa à fase de liquidação.
Para mim, a segunda fase é a mais importante das fases do procedimento falimentar, pois é nela que se vai saber a real situação do falido, isto é, como ele está. Isso acontece através da arrecadação dos bens. Ao mesmo tempo, há a verificação e habilitação dos créditos, sabendo-se quem são os credores e quais tipos de créditos existem, estabelecendo-se os privilégios e as preferências, determinando cada um dos tipos de créditos que existem na falência.
O art. 7º da Nova Lei de Falências não apresenta correspondente na legislação anterior. Ele prevê dispositivos gerais sobre a verificação de créditos. O ponto de partida é a publicação da relação dos credores. As obrigações que eram de responsabilidade do síndico passaram a constituir deveres do administrador judicial, o qual pode contar com o auxílio de profissionais e empresas especializadas.
O prazo para apresentação das declarações de crédito era estipulado na sentença declaratória de falência, podendo variar entre 10 e 20 dias. Na nova lei, a declaração de créditos é denominada habilitação de créditos e deve ser realizada dentro do prazo de 15 dias contados da publicação da relação de credores no Diário Oficial, na forma de edital. Na lei antiga a intimação dos credores indicados na escrituração do falido era responsabilidade do síndico e era efetivada por via postal ou em mãos, enquanto atualmente a via correta é o edital, bem mais eficiente e célere, contendo a relação dos credores.
O administrador judicial detém maior discricionariedade em relação à habilitação dos créditos que o síndico na lei antiga, pois, diante das habilitações e divergências apresentadas pelos credores, baseia-se no seu livre convencimento para republicar a relação em novo edital, sem necessidade de apresentar qualquer resposta direta aos credores nem submeter sua decisão ao juiz da falência. Sobre isso, leia- se o seguinte artigo da lei 11.101:
Art. 7º. A verificação dos créditos será realizada pelo administrador judicial, com base nos livros contábeis e documentos comerciais e fiscais do devedor e nos documentos que lhe forem apresentados pelos credores, podendo contar com o auxílio de profissionais ou empresas especializadas.
§ 1º. Publicado o edital previsto no art. 52, § 1º, ou no parágrafo único do art. 99 desta Lei, os credores terão o prazo de 15 (quinze) dias para apresentar ao administrador judicial suas habilitações ou suas divergências quanto aos créditos relacionados.
Com relação à tramitação da habilitação de credores do art. 9º, a nova lei, respaldando a prática que já se tornara comum, tornou desnecessária a apresentação da declaração em duas vias. A habilitação se processa perante o administrador judicial, não sendo mais um incidente processual a exigir atividade jurisdicional, tornando o processo falimentar bem mais célere. À respeito do procedimento da habilitação, importante é o estudo da seguinte:
Art. 9º. A habilitação de crédito realizada pelo credor nos termos do art. 7º, § 1º, desta Lei deverá conter:
I ? o nome, o endereço do credor e o endereço em que receberá comunicação de qualquer ato do processo;
II ? o valor do crédito, atualizado até a data da decretação da falência ou do pedido de recuperação judicial, sua origem e classificação;
III ? os documentos comprobatórios do crédito e a indicação das demais provas a serem produzidas;
IV ? a indicação da garantia prestada pelo devedor, se houver, e o respectivo instrumento;
V ? a especificação do objeto da garantia que estiver na posse do credor.
Parágrafo único. Os títulos e documentos que legitimam os créditos deverão ser exibidos no original ou por cópias autenticadas se estiverem juntados em outro processo.
Quanto aos efeitos da perda do prazo do art. 10, não houve grandes inovações. A habilitação retardatária, contudo, sofreu mudanças procedimentais. O prazo para impugnações era de 10 dias, seguido parecer do MP em 3 dias, daí viria sentença de mérito por parte do juiz, combatível mediante apelação sem efeito suspensivo. Os credores retardatários continuam perdendo o direito a rateios, mas passam a ser expressamente responsáveis pelo pagamento das custas e acessórios do novo pedido de habilitação. O credor poderá requer a reserva do valor em relação aos créditos retardatários. A habilitação desses créditos quando realizadas antes da homologação do quadro-geral de credores segue a forma dos artigos 13 a 15. O procedimento para a habilitação posterior é o ordinário do CPC. Acerca disso, cabe o seguinte:
Art. 10. Não observado o prazo estipulado no art. 7º, § 1º, desta Lei, as habilitações de crédito serão recebidas como retardatárias.
(...)
§ 3º. Na falência, os créditos retardatários perderão o direito a rateios eventualmente realizados e ficarão sujeitos ao pagamento de custas, não se computando os acessórios compreendidos entre o término do prazo e a data do pedido de habilitação.
§ 4º. Na hipótese prevista no § 3º deste artigo, o credor poderá requerer a reserva de valor para satisfação de seu crédito.
§ 5º. As habilitações de crédito retardatárias, se apresentadas antes da homologação do quadro-geral de credores, serão recebidas como impugnação e processadas na forma dos arts. 13 a 15 desta Lei.
O prazo para eventual impugnação por parte de algum credor ou até mesmo do Ministério Público cresceu de três para cinco dias. Na nova lei, a contestação da impugnação é seguida pela intimação do falido, seu representante legal ou Comitê de Credores, para se manifestarem, em cinco dias, sobre as matérias litigiosas. O procedimento da impugnação segue o rito previsto nos artigos 13 a 15 da nova lei.
O art. 13 traz redação idêntica ao do art. 88 da lei anterior. O juiz deve homologar a relação de credores apresentada com quadro geral de credores, caso transcorra o prazo para impugnações sem que elas sejam apresentadas. É dispensada nova publicação, como vemos a seguir:
O art. 15 é equivalente em conteúdo ao art. 92 da lei anterior.
O art. 16 trata da reserva para satisfação do crédito impugnado, que não era prevista no regulamento anterior, o que representa mais uma garantia de pagamento aos credores. Pode-se observar a seguir:
Art. 16. O juiz determinará, para fins de rateio, a reserva de valor para satisfação do crédito impugnado.
Parágrafo único. Sendo parcial, a impugnação não impedirá o pagamento da parte incontroversa.
Como se vê, a nova lei também não impede o pagamento da parte incontroversa do crédito impugnado, apresentando-se como uma evolução benéfica aos credores.
O art. 17 substituiu o recurso cabível da decisão de impugnação. Antes se entrava com apelação sem efeito suspensivo. Hoje é cabível o agravo que poderá ter efeito suspensivo. O prazo para o recurso é contado da publicação da decisão, não mais da publicação do quadro geral de credores. A nova sistemática força o habilitante ou impugnante a apresentar o recurso antes de ter uma visão geral do quadro de credores e saber se está, de fato, prejudicado.
O art. 18 também não inovou em relação à lei antiga.
Já no art. 19, a lei nova trouxe duas importantes modificações: a) conferiu legitimidade ao Ministério Público para entrar com a ação rescisória do crédito admitido; b) estabelece a prestação de caução como condição para o credor demandado poder vir a ter seu crédito satisfeito em concurso falimentar. Essas medidas protegem agora não os credores, mas sim os devedores ou falidos, uma vez que foi atribuído ao Ministério Público legitimidade para impetrar ação rescisória contra crédito ilegal, protegendo o devedor e evitando enriquecimento ilícito do suposto credor. Além disso, estabelece que o credor impugnado deve prestar caução para poder ter seu crédito satisfeito, sendo assim, mais uma figura de cautela do falido. Sobre esse artigo, leia-se o seguinte:
Art. 19. O administrador judicial, o Comitê, qualquer credor ou o representante do Ministério Público poderá, até o encerramento da recuperação judicial ou da falência, observado, no que couber, o procedimento ordinário previsto no Código de Processo Civil, pedir a exclusão, outra classificação ou a retificação de qualquer crédito, nos casos de descoberta de falsidade, dolo, simulação, fraude, erro essencial ou, ainda, documentos ignorados na época do julgamento do crédito ou da inclusão no quadro-geral de credores.
§ 1º. A ação prevista neste artigo será proposta exclusivamente perante o juízo da recuperação judicial ou da falência ou, nas hipóteses previstas no art. 6º, §§ 1º e 2º, desta Lei, perante o juízo que tenha originariamente reconhecido o crédito.
§ 2º. Proposta a ação de que trata este artigo, o pagamento ao titular do crédito por ela atingido somente poderá ser realizado mediante a prestação de caução no mesmo valor do crédito questionado.
Por fim, o art. 20 prevê que os credores dos sócios ilimitadamente responsáveis podem se habilitar na falência como quaisquer outros credores, podendo ser impugnados e seguindo a ordem de preferência. No regulamento anterior, eles necessariamente recebiam depois dos credores da sociedade. Percebe-se, dessa forma, a proteção conferida aos credores na nova lei de falências, atuando em prol de um mínimo da sociedade quando não se pode atuar em prol de um máximo, ou seja, quando não possível a recuperação da empresa.
Há ainda nessa fase os procedimentos paralelos (processos em que o administrador judicial ou qualquer credor interessado pode atuar para proteger os valores da massa falida), que são o pedido de restituição, os embargos e as ações revocatórias, que são intentadas contra aqueles atos que estão prestes a prejudicar a massa falida.
A classificação dos créditos na falência obedecerá à seguinte ordem:
Art. 83. A classificação dos créditos na falência obedece à seguinte ordem:
I ? os créditos derivados da legislação do trabalho, limitados a 150 (cento e cinqüenta) salários-mínimos por credor, e os decorrentes de acidentes de trabalho;
II - créditos com garantia real até o limite do valor do bem gravado;
III ? créditos tributários, independentemente da sua natureza e tempo de constituição, excetuadas as multas tributárias;
IV ? créditos com privilégio especial, a saber:
a) os previstos no art. 964 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002;
b) os assim definidos em outras leis civis e comerciais, salvo disposição contrária desta Lei;
c) aqueles a cujos titulares a lei confira o direito de retenção sobre a coisa dada em garantia;
V ? créditos com privilégio geral, a saber:
a) os previstos no art. 965 da Lei no 10.406, de 10 de janeiro de 2002;
b) os previstos no parágrafo único do art. 67 desta Lei;
c) os assim definidos em outras leis civis e comerciais, salvo disposição contrária desta Lei;
VI ? créditos quirografários, a saber:
a) aqueles não previstos nos demais incisos deste artigo;
b) os saldos dos créditos não cobertos pelo produto da alienação dos bens vinculados ao seu pagamento;
c) os saldos dos créditos derivados da legislação do trabalho que excederem o limite estabelecido no inciso I do caput deste artigo;
VII ? as multas contratuais e as penas pecuniárias por infração das leis penais ou administrativas, inclusive as multas tributárias;
VIII ? créditos subordinados, a saber:
a) os assim previstos em lei ou em contrato;
b) os créditos dos sócios e dos administradores sem vínculo empregatício.
§ 1º. Para os fins do inciso II do caput deste artigo, será considerado como valor do bem objeto de garantia real a importância efetivamente arrecadada com sua venda, ou, no caso de alienação em bloco, o valor de avaliação do bem individualmente considerado.
§ 2º. Não são oponíveis à massa os valores decorrentes de direito de sócio ao recebimento de sua parcela do capital social na liquidação da sociedade.
§ 3º. As cláusulas penais dos contratos unilaterais não serão atendidas se as obrigações neles estipuladas se vencerem em virtude da falência.
§ 4º. Os créditos trabalhistas cedidos a terceiros serão considerados quirografários.
Não se pode olvidar que, antes de obedecer à ordem de pagamento elencada acima, devem-se pagar, primeiramente, os créditos extraconcursais do artigo 84 da nova lei, os créditos de natureza salarial referente aos três meses de trabalho antes da quebra, até o valor de cinco salários mínimos, e realizar as eventuais restituições. Só após esses fatos que a ordem do artigo 83 deve ser obedecida.
Como já exposto neste trabalho, feita a arrecadação dos bens e a verificação dos créditos, passa-se logo para a liquidação. Diferentemente de antes, onde se esperava a solução do inquérito policial e mais outros empecilhos, o que deixava o antigo procedimento falimentar bem mais moroso e ineficiente.
Com referência a nulidades dos atos praticados pelo devedor, a nova lei aumenta o prazo que era de 60 para 90 dias do período suspeito, tornando indisponível perante a massa falida certos atos praticados pelo devedor que venham a prejudicar os credores. Reza o seguinte artigo:
Art. 99. A sentença que decretar a falência do devedor, dentre outras determinações:
(..)
II ? fixará o termo legal da falência, sem poder retrotraí-lo por mais de 90 (noventa) dias contados do pedido de falência, do pedido de recuperação judicial ou do 1o (primeiro) protesto por falta de pagamento, excluindo-se, para esta finalidade, os protestos que tenham sido cancelados;
Logo, esse alongamento do prazo garante ainda mais o objetivo da lei de falência, ao resguardar os direitos dos credores de maneira mais eficaz. Para declarar a ineficácia ou revogar os atos praticados pelo devedor no período suspeito (termo legal), o credor ou qualquer outro legitimado deve propor uma ação chamada de revocatória.
De todo o exposto, percebe-se que o processo falimentar, tal como regulado na Lei nº 11.101/2005, apresenta características que o tornam mais célere, como as mudanças procedimentais citadas acima. Além disso, outra importante inovação trazida pela nova lei, em substituição à antiga figura da concordata, foi a introdução, em nosso ordenamento, da figura da recuperação judicial, adiante abordada.
3.3 Recuperação Judicial e extrajudicial: principal inovação
Como já afirmado anteriormente, sabe-se já dos novos paradigmas que orientam o direito falimentar moderno. O desenvolvimento das relações sócio-econômicas fez com que o ordenamento jurídico passasse a encarar a crise da empresa de maneira diversa. Nesse diapasão, a falência, que antes era vista como algo exclusivo de devedores desonestos, passa a ser considerada como um fenômeno normal, natural, decorrente das dificuldades inerentes ao exercício da atividade econômica, e sabemos, pelo direito laboral, que o risco da atividade econômica recai apenas sobre uma pessoa, sendo esta o empresário.
Também já se destacou o fato de que o desenvolvimento econômico verificado, principalmente, após a Revolução Industrial do século XVIII e intensificado pelo processo de globalização, tornou clara a importância das atividades empresariais dentro do ciclo econômico mundial para o progresso da humanidade. Nesse contexto, os operadores do direito passaram a se preocupar com a verdadeira função social da empresa.
Foi com base nesse princípio de grande relevo que vários pontos relevantes do direito falimentar brasileiro foram alterados pela nova lei, dentre os quais se destaca a substituição da obsoleta figura da concordata pelo instituto da recuperação judicial.
Tal instituto encontra-se regulado nos artigos 47 a 72 da Lei nº 11.101/2005:
Art. 47. A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.
Art. 48. Poderá requerer recuperação judicial o devedor que, no momento do pedido, exerça regularmente suas atividades há mais de 2 (dois) anos e que atenda aos seguintes requisitos, cumulativamente:
I ? não ser falido e, se o foi, estejam declaradas extintas, por sentença transitada em julgado, as responsabilidades daí decorrentes;
II ? não ter, há menos de 5 (cinco) anos, obtido concessão de recuperação judicial;
III ? não ter, há menos de 8 (oito) anos, obtido concessão de recuperação judicial com base no plano especial de que trata a Seção V deste Capítulo;
IV ? não ter sido condenado ou não ter, como administrador ou sócio controlador, pessoa condenada por qualquer dos crimes previstos nesta Lei.
Parágrafo único. A recuperação judicial também poderá ser requerida pelo cônjuge sobrevivente, herdeiros do devedor, inventariante ou sócio remanescente.
Diante do conceito legal, pode-se conceituar tal instituto como o procedimento judicial regulado pela Lei 11.101 de iniciativa do devedor que exerça regularmente suas atividades há mais de 2 anos e atenda aos demais requisitos legais, tendo por objetivo restabelecer a situação econômico-financeira do devedor e, sobretudo, resguardar o meio empresarial, com a finalidade de evitar uma solução mais drástica, que seria a falência. Todos os créditos existentes na data do pedido ficam sujeitos ? ainda que não vencidos ? menos os fiscais. O curso da prescrição e de todas as ações e execuções são suspensos em face do devedor, com exceção das ações que demandarem quantia ilíquida e as de natureza trabalhista.
Pode-se entender que o fundamento de tal instituto encontra respaldo na Constituição Federal de 1988, artigo 170, inciso VIII, onde é estabelecido que a ordem econômica está fundada no trabalho e na livre iniciativa objetivando assegurar uma existência digna em busca do pleno emprego.
Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios:
(...)
III - função social da propriedade;
De acordo com a lei 7.661/45 o devedor deveria apresentar em juízo uma proposta de pagamento que seria feita a seus credores. Uma vez preenchidos os requisitos estabelecidos na legislação, o julgador, sem ouvir ninguém, determinava a abertura do processo de concordata, que visava resolver a situação econômica de insolvência do devedor, ou prevenindo e evitando a falência (concordata preventiva) ou suspendendo a falência (concordata suspensiva), para proporcionar a recuperação e restauração da empresa comercial. Com o adimplemento da nova lei, o devedor apresentará seu pedido com um plano detalhado de recuperação e administração dizendo de que forma ele vai se recuperar e pagar seus credores. Durante esse período de observação, o processo de recuperação judicial é aberto por uma fase preparatória e conservatória que permite uma análise profunda da situação econômico, financeira, patrimonial e social da empresa para ver se é possível sua recuperação, com a aprovação do plano de recuperação judicial pela Assembleia Geral de Credores.
Pela nova lei, os meios de recuperação judicial são amplos, abarcando concessão de prazos e condições especiais para pagamento das obrigações vencidas ou vincendas, alterações do controle societário; cisão, incorporação, fusão ou transformação da sociedade, constituição de subsidiária integral, ou cessão de cotas ou ações; substituição total ou parcial dos administradores do devedor ou modificação dos seus órgãos administrativos; concessão aos credores de direito a eleição em separado de administradores e de poder de veto; aumento do capital social; trespasse ou arrendamento de estabelecimento, inclusive as sociedades constituídas pelos próprios empregados; arrendamento de estabelecimento, inclusive à sociedade constituída pelos próprios empregados; redução salarial, compensação de horários e redução da jornada mediante acordo ou convenção coletiva; constituição de sociedade de credores; venda parcial dos bens; equalização de encargos financeiros relativos a débitos de qualquer natureza, tendo como termo inicial a data da distribuição do pedido de recuperação judicial, aplicando-se inclusive aos contratos de crédito rural; usufruto da empresa; administração compartilhada; emissão de valores mobiliários e constituição de sociedade de propósito específico para adjudicar, em pagamento dos créditos, os ativos do devedor. Todos eles estão presentes no artigo cinqüenta (50) da nova lei.
O plano, bem como suas modificações, será aprovado com 2/3 dos votos do total dos credores. Em caso de não aprovação do plano, será decretada a falência do devedor. O plano pode ser revisto se houver modificações substancias na situação econômico-financeira do devedor.
O objetivo do processo de recuperação judicial é propiciar ao devedor as condições necessárias à superação de sua crise econômico-financeira. As medidas propostas no plano, pois, devem ser levadas a cabo para que surtam os efeitos esperados e permitam que a empresa continue em atividade. Sendo assim, estabelece o art. 63 da nova lei: "Cumpridas as obrigações vencidas no prazo previsto no caput do art. 61 desta Lei, o juiz decretará por sentença o encerramento da recuperação judicial [...].
Vale ressaltar, ainda, que a nova lei também regula um outro instituto similar: a recuperação extrajudicial. O instituto da recuperação extrajudicial encontra-se previsto nos artigos 161 a 167 da Lei 11.101/05. Trata-se, na verdade, de uma ação judicial cujo fim consiste na homologação, por sentença, de acordo celebrado pelo devedor com determinada(s) espécie(s) ou grupo de credores.
Portanto, de acordo com essa definição, pode-se concluir que, através desse instituto, o devedor tem a prerrogativa de negociar com seus credores a melhor forma de pagar seus débitos, não mais constituindo ato de falência a convocação dos credores para a proposta de dilação, remissão de créditos ou cessão de bens, assim como o era tratado à época do Decreto-Lei 7.661/45.
Dessa forma, havendo comum acordo entre os credores a respeito da proposta apresentada, deverá o plano de recuperação extrajudicial ser levado a juízo para que seja homologado. Impende destacar que a recuperação extrajudicial não exclui a possibilidade de realização de outras modalidades de acordo privado entre o devedor e seus credores, conforme esclarece o art. 167, que diz:
Art. 167. O disposto neste Capítulo não implica impossibilidade de realização de outras modalidades de acordo privado entre o devedor e seus credores.
Vale ressaltar que as microempresas e empresas de pequeno porte poderão apresentar plano especial de recuperação judicial. Tal plano será apresentado no prazo previsto no artigo 53, ou seja, 60 (sessenta) dias e deverá respeitar as condições estabelecidas nos incisos do artigo 71, da Lei 11.101/05. O artigo 72 disciplina que não será convocada a assembleia de credores para deliberar sobre o plano de recuperação especial. Neste caso caberá ao juiz conceder a recuperação judicial, caso julgue improcedente o pedido decretará a falência do devedor, nos termos do artigo 55 da lei.
Portanto, a nova lei de falências contemplou duas medidas com o objetivo de evitar que a crise na empresa acarrete a falência imediata de quem a explora. De um lado, a recuperação judicial; de outro, a recuperação extrajudicial. Os objetivos delas são iguais: saneamento da crise econômico-financeira e patrimonial, preservação da atividade econômica e dos seus postos de trabalho, bem como o atendimento aos interesses dos credores. Diz-se que, recuperada, a empresa poderá cumprir sua função social.
Apesar das facilidades impostas com o novo regramento, é mister ressaltar que a nova legislação também foi alvo de duras críticas, especialmente ao outorgar aos credores o poder de decisão quanto ao plano de recuperação apresentado pelo devedor, limitando, dessa forma, as atribuições da autoridade judiciária. Com isso, os credores poderiam aprovar ou rejeitar a recuperação judicial segundo as suas conveniências, dando margem a fraudes e conluios, além de privilegiar os interesses dos grandes credores, em detrimento dos menores.
De qualquer forma, embora ainda com imperfeições, não se pode olvidar que o novo instituto foi fundamental para a economia brasileira, representando, inequivocamente, um enorme avanço no tratamento dado às empresas em dificuldade.
CONCLUSÃO
Procurou-se demonstrar, ao longo desta pesquisa, a nova concepção conferida ao instituto da falência, vez que a mesma deveria se adaptar aos novos rumos da atividade econômica, a qual tem passado por significativas mudanças nos últimos anos.
Em primeiro lugar, com a alteração da legislação antiga, buscou-se conferir aos processos falimentares características como a celeridade e a economia processuais mediante procedimentos mais simples e rápidos. Além disso, visando ao princípio da função social da empresa, previu-se um instituto específico para se recuperar a empresa em si, entendendo-se esta como a atividade efetivamente desempenhada pelo empresário.
Todas essas modificações tiveram o escopo de proteger não somente o crédito individual de cada credor do devedor em específico, mas sim o desenvolvimento e a economia nacional, possibilitando, sempre que possível, a manutenção de atividades econômicas que um dia foram (e até podem ser) lucrativas para toda a sociedade. O Estado, sempre tendo em vista o bem estar da sociedade, deve fomentar e desenvolver cada vez mais a recuperação da empresas, sempre que possível, logicamente, como forma de atingir e preservar o interesse público. Esse foi o principal motivo das alterações há muito discutidas, mas nunca implementadas. Agora, pode-se dizer que nosso procedimento falimentar se adequa muito mais a diversos princípios constitucionalmente previstos, tornando muito mais célere o procedimento falimentar e mais compatível com a realidade social que presenciamos em nossos dias atuais. Assim, com a nova lei, revela-se importante a intervenção do Estado na economia com o objetivo de proteger a sociedade dela mesma.
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