Análise da obra ''O Cortiço'' de Aluísio Azevedo
Por Maria de Jesus F de Souza | 25/04/2010 | LiteraturaMaria de Jesus F. de Souza1[1]
Resumo
Certamente, a obra O Cortiço de Aluísio Azevedo retrata o conjunto social formando no início do século XIX, devido às transformações ocorridas na sociedade nesse período. Dessa forma, levando-se em consideração as características do Naturalismo, evidencia-se que o personagem de João Romão conduz junto com o seu cortiço ? cheio de pessoas problemáticas, influenciadas pelo darwinismo e inseridos num espaço propício para a perda de valores ? e anseios exclusivamente deterministas, a realidade racional e materialista da evolução da ciência. Além disso, essas transformações sociais surgem para atender às necessidades da época, que não temia em apresentar a verossimilhança da vida de pessoas frustradas, por problemas patológicos.
Palavras-chave: Influência Social; Naturalismo; Cortiço.
1 Introdução
O Naturalismo intitula um período literário caracterizado por uma visão mais determinista das transformações econômicas, científicas e ideológicas ocorridas no século XIX, pois neste momento as preocupações não eram mais influenciadas pelo sentimentalismo romântico, porém pelo racionalismo e utilização de métodos científicos de observação e experimentação no tratamento dos fatos e das personagens. Nessa perspectiva, se faz necessário conhecer a etimologia da palavra Naturalismo segundo o Dicionário Básico de Filosofia (2006, p. 198):
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Aluna do VI período, do curso de Licenciatura em Letras da Faculdade de Formação de Professores da Mata Sul ? FAMASUL. Orientação: Professora Ms. Virgínia Carvalho.
[...] concepção filosófica que não admite a existência de nada que seja exterior à natureza, reduzindo a realidade ao mundo natural e a nossa experiência deste. O naturalismo recusa, portanto, qualquer elemento sobrenatural ou princípio transcendente. Mesmo a moral deveria basear-se nos princípios que regem a natureza, tomados como fundamentos das regras e preceitos de conduta.
Em consonância com o que foi dito, o romance
O Cortiço retrata, fielmente, as peculiaridades naturalistas da época de forma minuciosa, para que os leitores possam compreender os acontecimentos narrados como verossímeis. E assim, enfatizar que essa aproximação da verdade nada mais é do que o esclarecimento de alguns termos ? determinismo, darwinismo, socialismo, positivismo, objetivismo ? tão pertinentes para o estudo referente ao Naturalismo Brasileiro.
2 Fundamentação Teórica: Realismo-Naturalismo Brasileiro
O Realismo no Brasil teve seu início em 1881 e utilizava não somente de uma linguagem contrária à do Romantismo, como também abordava outros assuntos mais chocantes para a sociedade que estava em transição. Aquele período foi tão significativo para a época que conseguiu introduzir outra escola literária, cuja fosse capaz de exagerar ainda mais no tratamento da linguagem objetiva e universal, conhecida por Naturalismo, o qual pode ser denominado por alguns autores como um realismo exacerbado, ou como enfatiza Afrânio Coutinho (2004, p. 11):
[...] Naturalismo, é um Realismo a que se acrescentam certos elementos que o distinguem e tornam inconfundível sua fisionomia em relação a ele. Não é apenas um exagero ou uma simples forma reforçada do Realismo, pois que o termo inclui escritores que não se confundem com os realistas.
E, nesse sentido, pode-se observar que
O Cortiço (1890) é uma obra que Aluísio Azevedo publicou sob influência maior do romance L?Assommoir, do escritor Émile Zola, que prescreve um rigor científico na representação da realidade. Assim, a intenção do método naturalista era fazer uma crítica à sociedade, e é por isso que os espaços apresentados no romance destacam os desvalidos de várias etnias, cujos formavam o personagem principal: o próprio cortiço. Um exemplo pode ser visto no seguinte trecho:
[...] Durante dois anos o cortiço prosperou de dia para dia, ganhando forças, socando-se de gente. E ao lado o Miranda assustava-se, inquieto com aquela exuberância brutal de vida, aterrado defronte daquela floresta implacável que lhe crescia junto da casa, por debaixo das janelas, e cujas raízes, piores e mais grossas do que serpentes, minavam por toda a parte, ameaçando rebentar o chão em torno dela, rachando o solo e abalando tudo. Aluísio Azevedo (1998, p. 26)
Na verdade, a característica precípua do romance é justamente o espaço, pois este é ressaltado minuciosamente na descrição dos acontecimentos em todo o enredo. Isso se dá em decorrência da importância que é dada ao determinismo e também ao positivismo
[...] Desenvolvido por Auguste Comte... é uma maneira de pensar baseada na suposição de que é possível observar a vida social e reunir conhecimentos confiáveis, válidos, sobre como ela funciona. Esses conhecimentos poderiam ser usados para afetar o curso da mudança e melhorar a condição humana. Dicionário de Sociologia (1997, p. 179)
Além disso, segundo Alfredo Bosi (2006, p. 190)
[...] Só em
O Cortiço Aluísio atinou de fato com a fórmula que se ajustava ao seu talento: desistindo de montar um enredo em função de pessoas, ateve-se à sequência de descrições muito precisas onde cenas coletivas e tipos psicologicamente primários fazem, no conjunto, do cortiço a personagem mais convincente do nosso romance naturalista.
De acordo com o que foi dito, encontra-se também no romance a influência do darwinismo, a exemplo, na personagem Pombinha, que foi criada no cortiço por sua mãe e sendo órfão de pai, era considerada a "flor do cortiço", tendo seus 18 anos de idade, a mãe dela gostaria de vê-la casada com João da Costa. O casamento acontece e eles vão morar em outro lugar, para os moradores do cortiço, enfim uma pessoa conseguiu sair do cortiço e viver feliz; engano deles, pois Pombinha era adúltera e sendo descoberta pelo esposo resolve abandoná-lo e passa a viver com Léonie numa casa de prostituição. Isso significa que se Pombinha cresceu num ambiente propício para a ausência de valores, mas cedo ou mais tarde ela iria demonstrar essa característica, por ser fruto do meio. Assim, como diz Antonio Dimas (1987, p. 20) "... não se deve confundir espaço com ambientação... o primeiro é patente e explícito; o segundo é subjacente e implícito".
2.1 A narrativa-naturalista verossímil
O romance é narrado em terceira pessoa, com narrador onisciente como propunha o movimento naturalista, a fim de se conhecer de perto: os pensamentos dos personagens, as influências do meio, da raça e do momento histórico. Adequando-se, dessa forma, às situações mais próximas da realidade, pois "Se a ótica naturalista capta de preferência a mediocridade da rotina, os sestros e mesmo as taras do indivíduo, ela não será por isso menos verossímil que a opção contrária dos românticos" (BOSI, 2006, p.189).
Vale ressaltar que, as descrições de cada personagem são psicologicamente superficiais e fazem relação com alguns tipos da sociedade. Pois a Bertoleza, quitandeira, escrava cafuza que morava com João Romão ? e no desenvolver da narrativa tira a própria vida, devido à traição do seu homem ? demonstra que a mulher é vista nesse período literário como objeto "escrava" ao realizar os afazeres domésticos e trabalhistas. E nesse ponto, Beth Brait (1985, p. 28) afirma que
[...] Tanto o conceito de personagem quanto à sua função no discurso estão diretamente vinculados não apenas à mobilidade criativa do fazer artístico, mas especialmente à reflexão dos modos de existência e do destino desse fazer.
Logo, a negra estava representando a típica personagem da realidade da época, tão materialista e centrada apenas nos desejos biológicos momentâneos e não em um amor verdadeiro. Então como João Romão poderia ser fiel a Bertoleza, se o único anseio famigerado dele era enriquecer e se tornar reconhecido socialmente.
Lígia Chiappini (1987, p. 12) complementa dizendo que
[...] O problema da relação entre ficção e realidade e da necessidade da verossimilhança, tão antigo, é o pressuposto de boa parte da teoria do foco narrativo, desde que ela começa a se constituir mais sistematicamente.
3 Considerações Finais
Nessa pesquisa, tentou-se evidenciar a presença da verossimilhança, pois
O Cortiço de Aluísio Azevedo, verdadeiramente, faz jus ao movimento Naturalista, pois retrata a sociedade do século XIX em fase de transformações, devido à evolução dos estudos científicos. Logo, o cortiço representa o aglomerado de pessoas diferentes morando num mesmo espaço, o que tende a provocar conflitos diversos e interesses de classes.
4 Referências Bibliográficas
AZEVEDO, Aluísio.
O Cortiço. São Paulo: Ática, 1998.
BOSI, Alfredo.
História Concisa da Literatura Brasileira. São Paulo: Cutrix, 2006.
BRAIT, Beth.
A personagem. São Paulo: Ática, 1985.
COUTINHO, Afrânio.
A Literatura no Brasil. São Paulo: Global, 2004.
DIMAS, Antonio.
Espaço e Romance. São Paulo: Ática, 1987.
JAPIASSÚ, Hilton & MARCONDES, Danilo.
Dicionário Básico de Filosofia. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2006.
JOHNSON, Allan G.
Dicionário de Sociologia ? Guia Prático da Linguagem Sociológica. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1997.
MORAES LEITE, Lígia Chiappini.
O foco narrativo. São Paulo: Ática, 1987.