Almas Gêmeas

Por Assad Abdul Nour | 15/07/2009 | Contos

Um caso de amor juvenil,o meu segundo e mais importante caso de amor...que resiste ao tempo, embora quarenta anos tenham se passdado.Outros aconteceram antes e depois,mas este...ah foi o menos conturbado,mais róseo e mais sensível de todos. Era tempo de férias.Verão...Calor abrazante pedindo briza .marítima. O que poderia acontecer naquelas nossas férias, quando terminasse a descida da serra, quando Santos se descortinasse aos nossos ólhos? O mar, à nossa esquerda,manso,prateado, preguiçoso,e a lua abrindo sua cara cheia,admirando aquela dôce placidez.

Pouco adiante,uma rua chamada Maranhão...nosso destino. Era noite,rua escura...Nossos parentes nos esperavam. Casa assobradada, à uns 600 metros da orla, como se quizesse ficar longe da umidade salina. Da casa vizinha, som de risadas e músicas, denotando que ali havia festa.Não abrimos nossas malas...o ímpeto de participarmos daquiela "loucura" nos levou à casa vizinha ( os moradores de ambas as casas eram muito amigos...tinham eles livre trânsito, como que se o muro que as separasse fosse ilusório). Então tudo começou a acontecer, e começou assim...

Uma voz maviosa, doce,partindo de algum lugar...Outras vozes se faziam ouvir, mas aquela era muito especial.Então, atraidos pela magia, nossos olhares se encontraram. Então tudo e todos se tornaram invisíveis,a musica que vinha da vitrola,emudeceu aos meus ouvidos Nada mais havia naquela sala. Apenas eu e ela, trocando olhares. Mas uma nuvem pardacenta toldou meus sentimentos,na manhã do dia seguinte. Fomos, eu,ela e Eduardo, curtir a praia de Itanhaem.Andávamos sobre a areia,conversando...eu mais sonhando que conversando. Quando me dei conta,os dois haviam se afastado. Sentei na areia, e eles uns 50 metros alem.

Com um graveto trazido pela maré, procurei escrever algumas bobagens, que as ondas do mar levaram . Quando ergui os olhos,percebi que algo acontecia entre os dois...algo que gritava à minha mente tratar-se de uma poderosa atração sexual .Abaixei a cabeça, dando-me por vencido,ao sentir,pela primeira vez na vida , a dor e o desespero do sentir ciumes. No dia seguinte, Eduardo retornou a São Paulo e não voltou mais. Enquanto que eu,em todos os verões, a via e me deleitava com nossa convivência. Sabia que seu corpo pedia Eduardo, mas que sua mente pedia a mim. Depois de tres verões seguidos que deixei de ir a Santos, ela conheceu aquele que viria a ser seu marido.

Um ano e pouco,depois do nosso último contacto, o telefone de casa tocou. Era ela,transbordando sua felicidade. "Sabe,Cesar,nasceu meu primeiro filho...no dia do seu aniversário " . Então,decorridos quarenta anos,ela me telefona nas datas mais importantes. Nossa amizade, que nunca envolveu atração sexual, mas uma inexplicável atração espiritual,perdura. Daí deduzi que podemos amar,de diferentes maneiras,muitas pessoas...sem estar traindo nenhuma delas.

Parte 2

Hoje ela tem quase setenta anos de idade, e ainda é coquete.Lúcia é seu nome,e não existe melhor adjetivo...Coquete.Mas quarenta anos não são quarenta dias.Então me pergunto,se afóra ser ainda coquete,como será ela hoje? Algumas mulheres não envelhecem nunca. A pátina do tempo, sabemos que às mulheres sem encantos na juventude,as tornam de um frescor e de uma beleza especial.

E às que eram sumamente belas tiram, em algumas delas, o frescor e a beleza, de uma tacada só. Mas a alma,o conteúdo de todas elas,belas ou sem encantos...que malefícios ou benefícios o tempo lhes deu? É um segredo. Não Lúcia,Lúcia não. Sua alma não tem segredos, continua doce e sincera.Ela tem os mesmos fantasmas de sempre, e tambem os mesmos anjos. Não consegue enxotar os primeiros, e os últimos dela não se apartam.

Nossas conversas eram tolas, hoje percebo isso. Mas, naqueles anos dourados não eram. Análisavamos nossos horóscopós, buscando afinidade entre eles. Questionavamos a vida e a morte, amávamos as músicas italianas...jogavamos cartas, frequentavamos o alpendre do ainda vivo Hotel Atlântico. Nas manhãs, andávamos na praia...ela sempre de bikini sumário,eu não tendo como esconder minha magreza. Não falávamos em namôro,entre nós não havia cobranças...não precisavamos ser namorados. Naqueles tempos mágicos,eu escrevia para um jornal da minha cidade. Lúcia era então q estrela maior das minhas crônicas. Mas a sabedoria popular já dizia : "longe dos ólhos,longe do coração "...

Em tres verões que deixei de ir a Santos,entraram dois personagens novos em nossas vidas. Lá, um professor jovem,tambem nascido no interior,surgiu do nada e a pediu em casamento. Na minha cidade alguem, pouco a pouco, conquistou meu coração, e entabulamos um início de namoro sério. Que não deu em nada.Antes de colocar o ponto final nesta narrativa, quero lhes contar que, de fato,eu e Lúcia ainda mantemos nosso mágico laço de amizade. E que,ao invés de cartas ou encontros na praia,nos correspondemos pela internet.