Alimentação Escolar, Cooperativismo e Agricultura Familiar: Um Olhar para o...

Por Givaldo do Carmo Souza | 04/10/2016 | Economia

Alimentação Escolar, Cooperativismo e Agricultura Familiar: Um Olhar para o Município de Santaluz – Bahia

O objetivo deste trabalho é trazer elementos significantes para uma reflexão acerca da relação das cooperativas da agricultura familiar e a política de alimentação escolar praticada nas escolas públicas do Município de Santaluz, no estado da Bahia; Procurou-se apontar o cenário de desafios e as possibilidades para se estabelecer essa parceria, como forma de fortalecer a economia local e proporcionar alternativas de segurança alimentar e desenvolvimento endógeno e sustentável no contexto local. Nos procedimentos metodológicos utilizados reportou-se a revisão bibliográfica através de artigos científicos e sites especializados sobre a temática. A pesquisa guiou-se pela análise descritiva e debate critico-propositivo.

1. INTRODUÇÃO

O cooperativismo é um movimento de universal de cidadãos e cidadãs, que livres, aglutinam forças para criar e potencializar iniciativos com propósito de transformar a sociedade em que vivem à medida que também transformam a si mesmos nesse processo.
O cooperativismo é um movimento, uma filosofia de vida e modelo socioeconômico capaz de unir desenvolvimento econômico e bem-estar social. Seus referenciais fundamentais são: participação democrática, solidariedade, independência e autonomia. É o sistema fundamentado na reunião de pessoas e não no capital. Visa às necessidades do grupo e não do lucro. Busca prosperidade conjunta e não individual. Estas diferenças fazem do cooperativismo a alternativa socioeconômica que leva ao sucesso com equilíbrio e justiça entre os participantes. Associado a valores universais, o cooperativismo se desenvolve independentemente de território, língua, credo ou nacionalidade (PORTAL DO COOPERATIVISMO DE CRÉDITO, 2013) Como afirma Flávio Gouveia, citado por VEIGA e FONSECA, 1999 sobre o cooperativismo, "seu objetivo não é o conjunto das pessoas, mas o indivíduo através do conjunto das pessoas". É, portanto, um instrumento que, através da organização das pessoas, busca-se promover a geração e manutenção de oportunidades socioeconômicas diversas em atividades enquadradas nos seus treze ramos de atuação, sendo eles: Consumo, Sociais, Trabalho, Educacionais, Transporte, Agropecuária, Saúde, Crédito, Habitacional, Produção, Infraestrutura, Mineral, Turismo e Lazer.
A primeira cooperativa semelhante ao modelo contemporâneo surgiu em 1844, a Sociedade dos Probos Pioneiros de Rochdale, na Região de Manchester na Inglaterra, pertencente ao ramo do consumo, através da organização de 27 trabalhadores industriais. Doze anos depois, já possuía 3.450 associados e um capital de 152 mil libras (ORGANIZAÇÃO DAS COOPERATIVAS BRASILEIRAS 2012).
No Brasil, o primeiro registro de uma Cooperativa foi em 1889. Ocorreu em Minas Gerais com o nome de Sociedade Cooperativa Econômica dos Funcionários Públicos de Ouro Preto, assim como em Rochdale, a brasileira era do ramo de consumo. Outro registro é o da colônia alemã em Nova Petrópolis, Rio Grande do Sul, em 1902, onde a comunidade imigrante fundou uma pequena Reiffeisenkasse, aos moldes das tradicionais Sociedades de Ajuda Mútua. Os colonos poderiam se associar pagando contribuições, e obter empréstimos para o subsídio da safra e outros benefícios, como o seguro saúde.
A lei que rege o Cooperativismo no Brasil é a Lei Federal nº 5.764, que foi aprovada em 16 de dezembro de 1971, e detalha a classificação, a constituição e o funcionamento das empresas cooperativas. Essa legislação caracteriza as cooperativas como "sociedades de pessoas, com forma e natureza jurídica próprias, de natureza civil, não sujeitas à falência, constituídas para prestar serviços aos associados" (Lei nº 5.764/71).
Na Bahia, a primeira cooperativa registrada na Junta comercial foi a Sociedade Cooperativa de Responsabilidade LTDAS - Caixa Econômica Popular, em 21 de outubro de 1914. O maior interesse pelo cooperativismo na Bahia aconteceu na década de 30, período em que foram criadas diversas cooperativas de consumo e escolares. Segundo dados da Organização das Cooperativas da Bahia (OCEB), no estado, em 2011, estavam registradas 783 cooperativas, sendo que os ramos trabalho, agropecuário, e transporte eram os mais representativos, considerando-se os principais indicadores.
Santaluz é um município brasileiro do estado da Bahia que se originou no século passado, de uma estação ferroviária da Leste Brasileira, obra implantada em local onde havia uma aglomeração de casas, dentro da fazenda Santa Luzia, no município de Queimadas. Com a inauguração e utilização freqüente da estação, formou-se um arraial, sendo edificadas casas residenciais e comerciais. O Município foi criado com a denominação de Santa Luzia e território desmembrado de município de Queimadas por Decreto Estadual de 18 de julho de 1935. Em 1943 o topônimo foi alterado para Santaluz Fica localizada a 266 km de Salvador.
No município de Santaluz há presença de cooperativas e de Empreendimentos Econômicos Solidários (EES) ligados aos ramos de Produção, Trabalho e Crédito. São cooperativas que surgiram no contexto, a partir da organização de agricultores familiares e pequenos empreendedores locais. Diante disso, protagonizam o chamado "Cooperativismo da Agricultura Familiar e Economia Solidária", que compreende-se como um instrumento da sociedade civil organizada que busca garantir a inclusão das pessoas menos favorecidas aos meios de produção, bem como, o acesso a melhores condições de vida.
Neste sentido, uma das ferramentas que possibilita que o cooperativismo se consolide enquanto um instrumento de desenvolvimento e de transformação social, bem como de inclusão econômica dos seus cooperados no município de Santaluz é o Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE), que consiste na transferência de recursos financeiros do Governo Federal, de caráter suplementar, aos estados, Distrito Federal e Municípios, para a aquisição de gêneros alimentícios destinados à alimentação (merenda) escolar. Entretanto, para isso, é necessário construir um campo de possibilidades, bem como enfrentar e superar desafios que vão além da realidade do município de Santaluz, mas que são predominantes em (quase) todos os territórios rurais do Estado da Bahia. Entender como (não) se dar essa relação é o propósito deste trabalho.

2. REFERENCIAL TEÓRICO

2.1. Empreendimentos Econômicos Solidários (EES)

Empreendimentos Econômicos Solidários são formas de organização sociais que proporcionam estruturas de coletividade e reciprocidade entre seus envolvidos. Empreendimentos Econômicos Solidários
[...] são atividades primordialmente ligadas à produção e reprodução de meios de vida, seja produção de bens, prestação de serviços, consumo, comercialização, trocas, ou crédito e finanças; trata-se do
'fazer junto' dentro da atividade econômica - não necessariamente produção conjunta, mas também outras formas possíveis, como produção individual e comercialização coletiva, produção coletiva e comercialização individual, compras conjuntas de insumos, e remete
à superação da divisão interna entre capital e trabalho, entre "patrão" e "empregado" - ou, no caso em que há trabalhadores não-sócios, o número não podendo ser muito significativo diante daquele de membros associados (CUNHA,2009).
Podemos dizer que os EES são organizações criadas para cumprir uma função social, ou seja, agrupar pessoas em busca de um bem comum. Porém, os empreendimentos devem também ser compreendidos enquanto ferramentas auto-sustentáveis e competitivas, capazes de contribuir para o desenvolvimento da economia local a partir da comercialização de produtos que favorecem a inclusão econômica dos seus envolvidos. Para isso, estes adotam ferramentas de gestão, planejamento, organização, controle responsabilidade, comprometimento e, principalmente, transparência nas ações intervenção política, e participação qualificada nos espaços institucionais e comerciais, pautando seus interesses, na perspectiva de fazer novos negócios e parcerias comerciais, e conseqüentemente favorecer o desenvolvimento local. É necessário observar de forma mais profunda os empreendimentos econômicos solidários, não somente seu lado social, mais sim sua capacidade de manter-se em um mercado competitivo.

2.2. O Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE)

A alimentação escolar é basicamente apoiada pelo Programa Nacional de Alimentação Escolar (PNAE). É um mercado institucional (em seus limites e possibilidades) ainda pouco acessado pelas cooperativas representativas da agricultura familiar das regiões e territórios do nosso país. É aqui que se insere o debate da alimentação escolar e sua relação com a agricultura familiar. Esta relação traz, de um lado, para a alimentação escolar, elementos fundamentais de uma alimentação saudável e de respeito aos processos e tradições alimentares dessas regiões e territórios, de outro, para a agricultura familiar local, a possibilidade de um mercado constante para seus produtos, dinamizando a presença de recursos nessas regiões, gerando mais riquezas e renda, contribuindo para a segurança alimentar e nutricional tanto das crianças quanto das famílias envolvidas no processo. Conforme os documentos legais (como os Decretos Federais nºs 31.106/55 e 72.034/73) que o regulamentaram o programa da merenda escolar tinha como um dos seus objetivos oficiais melhorar as condições nutricionais das crianças e diminuir os índices de evasão e repetência, com a conseqüente melhoria do rendimento escolar.

[...]

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