ALIENAÇÃO PARENTAL

Por MARLENE AVANCINI | 08/06/2015 | Direito

ALIENAÇÃO PARENTAL

 

 

MV.ALMEIDA

 

 

 

RESUMO

 

Como toda a relação humana, os relacionamentos conjugais e afetivos são pautados em sentimentos decorrentes da influência psicológica dos sujeitos, na qual permeiam descontentamentos, problemas e crises que, se não superados, podem levar um casal a romper os vínculos conjugais. A desconstituição desse vínculo e a separação dos ex-companheiros constituem um processo difícil e doloroso, envoltos em uma série de emoções extremas e violentas que perpassam além da vida íntima dos membros envolvidos, os demais indivíduos que fazem parte daquele núcleo familiar, levando igualmente o sofrimento aos filhos e outros parentes. Em decorrência de tais desentendimentos entre os ex-cônjuges é a instalação de conflitos familiares que respingam em todos os entes daquele núcleo, o que mais sofre e perde sem deter nenhuma culpa são os filhos, O presente estudo bibliográfico utilizou-se de método dedutivo com o objetivo de discorrer sobre o que se entende por alienação parental, buscando compreender seus elementos conceituais e teóricos e as consequências para as crianças ou adolescentes vítimas dessa alienação. Ao final do estudo percebe-se que a Lei 12 31/2010, que trata da alienação parental, determina que o juiz poderá advertir e imitar o responsável, ampliar o regime de visitas em favor do genitor excluído, determinar urna intervenção psicológica monitorada ou a mudança para guarda compartilhada ou sua inversão, e até mesmo suspender o poder familiar do alienante.

Palavras-chave: Alienação. Desconstituição Familiar. Filhos.

 

 

 

INTRODUÇÃO

 

A Lei 12.318, de 26 de agosto de 2010, dispõe sobre a alienação parental, adotando procedimentos para combatê-la, de oficio ou mediante requerimento, em qualquer momento processual, em ação autônoma ou incidental. A síndrome da alienação parental consiste na conduta do pai ou da mãe que possui a guarda unilateral de denegrir o outro perante o filho, com informações falsas e depreciativas, ao ponto de passar a rejeitá-lo.

Ela ocorre quando o filho afasta-se de um dos pais, ou ambos, e de seus parentes próximos, como os avós, tornando-os cada vez mais distantes, alheios, ao ponto da criança ou adolescente tornar-se órfão de pai ou pais vivos, o que é extremamente prejudicial por faltar-lhe a referência paterna ou materna. A alienação parental é uma forma de violência intrafamiliar, que transgride os direitos da personalidade do menor.

Destarte, a importância do tema reside no fato de que a Síndrome da Alienação Parental é realidade tão presente no cotidiano de diversas crianças e adolescentes, cujos genitores não mais convivem como casal.

Dentro do exposto, o estudo objetiva discorrer sobre o que se entende por alienação parental, buscando compreender seus elementos conceituais e teóricos e as consequências para as crianças ou adolescentes vítimas dessa alienação.

           

1 PRINCÍPIOS DE DIREITO DE FAMÍLIA E O PRINCÍPIO DA PROTEÇÃO INTEGRAL À CRIANÇA E AO ADOLESCENTE

 

Os doutrinadores divergem sobre quais seriam  os princípios norteadores do Direito de Família. Entretanto, para Del Vecchio (2003, p. 17), alguns princípios são unânimes, como o princípio da dignidade da pessoa humana, do qual emanam todos os demais princípios. Dentre eles, figuram o princípio da liberdade, o princípio da igualdade, o princípio da solidariedade familiar, o princípio da proteção integral a crianças e adolescentes e o princípio da afetividade.

O princípio da proteção integral à criança e ao adolescente, hodiernamente chamado segundo Del Vecchio (2003, p. 18), de doutrina da proteção integral, determina que deve ser garantida a proteção, integral e prioritária, na interpretação e na aplicação de toda e qualquer norma que diga respeito à criança e ao adolescente.

 

1.1 Princípios de Direito de Família

 

Os princípios gerais do direito norteiam todo o ordenamento jurídico. Nesse contexto, cada ramo do direito possui seus princípios específicos. Os doutrinadores, não consentem sobre quais seriam os princípios norteadores do Direito de Família. Assim, vale ressaltar a necessidade de relacionar as regras particulares do direito e os seus princípios originários, conforme preleciona Del Vecchio (2003, p. 21), “as regras particulares do direito não se tornam verdadeiramente inte­ligíveis se não se relacionam com os princípios de onde procedem; muito embora estes não se achem, e a maior parte das vezes não esta­rão, formulados nos códigos”.

Del Vecchio (2003, p. 21) ainda adverte que muitos princípios não estão positi­,vados na lei. motivo da falta de consenso na doutrina, sobre quais seriam os princípios de Direito de Família. Madaleno (2011, p. 42) indica os seguintes princípios: dignidade da pessoa humana, igualdade, autonomia da vonta­de, liberdade, solidariedade familiar, afetividade, igualdade da filiação, proteção da prole e proteção do idoso.

No escorço de Rizzardo (2007, p. 14), a CF trouxe inovações no âmbito do Direito de Família, das quais emergiram os seguintes princípios:

a) a igualdade de direitos entre o homem e a mulher; b) a absoluta paridade      entre os filhos, independentemente da origem dos mesmos; c) a prevalência da          afeição mútua nas relações de caráter pessoal; d) a aceitação da união estável e do grupo formado por um dos pais e dos descendentes como entidade familiar.

Cachapuz (2011, p. 92), ao destacar a nova principiologia advinda da CF, que apresenta novos critérios interpreta­tivos para avaliar as relações familiares, destaca como princípios do Di­reito de Família: “igualdade entre os cônjuges, proteção da família, prote­ção da paternidade e maternidade, proteção da infância, igualdade dos filhos, responsabilidade dos pais em relação aos filhos e o dever de ampa­ro aos pais na enfermidade e na velhice. No presente estudo, adota-se o rol de princípios que regem a família, os indicados por Dias (2009, p. 61), quais sejam:

            Princípio da dignidade da pessoa humana; da liberdade; da igualdade e               respeito à dife­rença; da solidariedade familiar; do pluralismo das entidades                 familiares; da proteção integral a crianças, adolescentes e idosos; da proibição           de retrocesso social e princípio da afetividade.     

O princípio da dignidade da pessoa humana está positivado no art. 1o, inc. III, da CF. De acordo com Rosenvald (2007, p. 202):

            A dignidade da pessoa humana é o núcleo essencial dos direitos da     personalidade. No constitucionalismo moderno, a tutela ao ser huma­no é           positivada mediante direitos fundamentais, cuja fonte é a digni­dade da pessoa      humana. A dignidade da pessoa humana como ele­mento fecundante inspira             proteção integral, esmaecendo as fronteiras entre as situações jurídicas               inicialmente vinculadas ora aos direitos humanos, ora aos direitos de           personalidade.

Sob a ótica de Barros (2003, p. 418). a dignidade humana é a versão axiológica da natureza humana”. Dias (2009, p. 62), por sua vez, entende que:

            O direito das famílias está umbilicalmente ligado aos direitos huma­nos, que         têm por base o principio da dignidade da pessoa humana, versão axiológica da           natureza humana. O principio da dignidade hu­mana significa, em última          análise, igual dignidade para todas as enti­dades familiares. Assim, é indigno       dar tratamento diferenciado às vá­rias formas de filiação ou aos vários tipos de       constituição de família, com o que se consegue visualizar a dimensão do        espectro desse prin­cipio, que tem contornos cada vez mais amplos.

O princípio da liberdade, no que se refere aos cônjuges ou com­panheiros, institui-se na liberdade de opção do tipo de entidade familiar a se constituir, se mantê-la ou não, da livre decisão sobre o planejamento fa­miliar, até mesmo para a concepção do filho, se natural ou por insemina­ção artificial, ou por adoção. A liberdade também refere-se à aquisição de bens e, ainda, à possibilidade de alteração do regime de bens.

Quanto aos filhos, também denota a incidência desse princípio, sobretudo no que tange à liberdade de opinião. Entretanto, Albuquerque (2010, p. 21) adverte:

            Não se pode perder de vista, todavia, que a liberdade proclamada, oriundas das                relações de afeto, entre pais e filhos, é em função da idade e maturidade da           criança, em consonância com a evolução de sua capacidade, pois são pessoas          em desenvolvimento. Neste sentido, a liberdade do filho encontra limites nos         direitos dos pais, bem como a liberdade dos pais encontra limites nos direitos    dos filhos.

Ademais, o princípio da liberdade é uma demonstração clara de que o Direito de Família não é estático e não tão rígido como no passado.

O princípio da igualdade e do respeito às diferenças, no âmbito da família, representa a igualdade entre os filhos, entre marido e mulher e entre as entidades familiares, o que representa urna grande conquista no modo de ser da família brasileira.

Ao lado da proibição de quaisquer designações discriminatórias, o art. 227, § 6o, do texto constitucional de 1988, traz o aspecto do princípio da igualdade em matéria de filiação: a igualdade de direitos dos filhos, independentemente da origem. Tal conhecimento de igualdade procurou resgatar a ideia jurídica tradicional de isonomia como aponta Marques (1999, p. 28), “só existe a proibição legal de que o essencialmente igual seja tratado de for­ma diferente”.

A igualdade no campo do Direito Parental procura aproximar os mesmos direitos em relação às pessoas dos filhos de um mesmo pai ou de uma mesma mãe, não tendo nenhuma relevância a origem da filiação, se matrimonial ou extramatrimonial, se decorrente de vínculo civil ou natural.

Aliás, o reconhecimento de outras modalidades de família ema­na dos princípios da dignidade humana e o da própria igualdade, propor­cionando às famílias a construção de um elo amoroso, respeitado e tentado por diretrizes e normas de proteção constitucional. Nesse diapasão, Dias (2009, p. 64) assevera:

            É imprescindível que a lei em si considere todos igualmente, ressal­vadas as        desigualdades que devem ser sopesadas para prevalecer a igualdade material    em detrimento da obtusa igualdade formal. É ne­cessária a igualdade na própria     lei, ou seja, não basta que a lei seja aplicada igualmente para todos.

O princípio da solidariedade familiar, por sua vez, refere-se à solidariedade entre os cônjuges ou os companheiros, e, também, a solidariedade aos filhos, materializada no dever de socorro espiritual e de assistência material, conforme elucida Madaleno (2011, p. 90), que assevera: “a solidariedade é princípio e oxigênio de todas as relações familiares e afe­tivas, porque esses vínculos só podem se sustentar e se desenvolver em ambiente recíproco de compreensão e cooperação, ajudando-se mutua­mente sempre que se fizer necessário”.

Dias (2009, p. 65) ao tratar do princípio da solidariedade, aporta que esse princípio "[...] tem origem nos vínculos afetivos, dis­põe de conteúdo ético, pois contém em suas entranhas o próprio signi­ficado da expressão solidariedade, que compreende a fraternidade e a reciprocidade. A pessoa só existe enquanto coexiste”.

Dias (2009, p. 66) prossegue, asseverando a origem constitucional do princípio da solida­riedade:

            O princípio da solidariedade tem assento constitucional, tanto que seu                preâmbulo assegura uma sociedade fraterna. Também ao ser imposto aos pais              o dever de assistência aos filhos (CF 229), consagra-se o princípio da            solidariedade. O dever de amparo às pessoas idosas (CF 230) dispõe do mesmo                conteúdo solidário. A lei civil consagra o prin­cípio da solidariedade ao dispor    que o casamento estabelece plena comunhão de vidas (CC 1.511). Igualmente                a obrigação alimentar dispõe deste conteúdo (CC 1.694).   

O princípio do pluralismo das entidades familiares, segundo Pereira (2006, p. 164), advém da CF:                                                           

            [...] embora seja um preceito ético universal no Brasil, te\'e seu marco    histórico na Constituição da República de 1988, que trouxe inovações ao             romper com o modelo familiar fundado unicamente no casamento, ao dispor      sobre outras formas de família: união estável e família monoparental.

Para Pereira (2006, p. 164), o rol de entidades familiares protegidas na Consti­tuição é meramente exemplificativo, uma vez que o princípio da dignidade da pessoa humana demanda o reconhecimento destas novas entidades familiares.

Quanto ao princípio da proteção integral a crianças e adolescen­tes e idosos, o que caracteriza a proteção integral é a fragilidade e a vul­nerabilidade dos destinatários principiológicos. Nesse contexto, Pereira (2006, p. 168), leciona:

            No que toca à dinâmica evolutiva de cada homem, surge-nos desde logo o ser   da criança e o do jovem de menor idade,  enquanto perso­nalidades com uma               estrutura física e moral particularmente em for­mação e, por isso, portadoras de              uma certa fragilidade e credoras de respeito e ajuda da família, da sociedade e             do Estado, tanto em áreas específicas [...] como na globalidade do seu ser e        com vista ao seu de­senvolvimento integral.

Deste modo, denota-se a preocupação do legislador quanto à proteção da criança, do adolescente e do idoso, visando garantir se us direitos fundamentais e promover a dignidade da pessoa humana.

O princípio da proibição de retrocesso social refere-se à garan­tia de realização dos direitos sociais, amparados pela Constituição, e que não se pode abster de atuar para a realização desses direitos. Nesse senti­do, Gagliano e Pamplona Filho (2011, p. 85), preleciona que “esse superior princípio traduz a ideia de que uma lei posterior não pode neutralizar ou minimizar um direito ou uma garantia constitucionalmente consagrado”.

Dias (2009, p. 69) por sua vez, aponta que o princípio da vedação ao retrocesso, além de configurar-se numa obrigação positiva de realização dos direitos sociais, configura-se também em obrigação negativa. Ou seja, de não sofrer limitações ou restrições da legislação ordinária frente às normativas constitucionais.

No que se refere ao princípio da afetividade, este se sobrepõe à s relações patrimoniais e biológicas, uma vez que elo que une as pessoas é o afeto. Lobo (2010, p. 64) enfatiza:

            A família recuperou a função que, por certo, esteve nas suas origens mais           remotas: a de grupo unido por desejos e laços afetivos, em co­munhão de vida.    O principio jurídico da afetividade faz despontar a igualdade entre irmãos    biológicos e adotivos e o respeito a seus direi­tos fundamentais, além do forte             sentimento de solidariedade recíproca, que não pode ser perturbada pelo            prevalecimento de interesses patrimoniais, É o salto, à frente, da pessoa             humana nas relações fami­liares.

O afeto é a razão de ser das entidades familiares. Sobrepõe-se a qualquer outro interesse, que não seja o de compartilhar o amor, a afeição e a solidariedade fraterna no seio da família. A propósito disto, Pereira (2006, p. 180) aponta:

De fato, uma família não deve estar sustentada em razões de depen­dência        econômica mútua, mas exclusivamente, por se constituir um núcleo afetivo,               que se justifica, principalmente, pela solidariedade mútua. [...] o que se         conclui é ser o afeto um elemento essencial de todo e qualquer núcleo familiar,   inerente a todo e qualquer relacio­namento conjugal ou parental.

Segundo o entendimento de Tartuce (2014, p. 10) é inegável que o afeto configura-se o principal fundamento das relações familiares. Ainda que o princípio da afetividade não esteja expressamente previsto na CF, denota-se que o afeto decorre da valorização constante da dignidade humana.

Assim, o novo olhar sobre a família exaltou os vínculos afetivos, cultivados no amor e no afeto. Segundo Sznick (1993, p. 163):

            Na esteira dessa evolução, o direito das famílias instalou uma nova ordem           jurídica para a família, atribuindo valor jurídico ao afeto. Quando as uniões              estáveis foram reconhecidas como entidade familiar e merecedoras da tutela jurídica, tal significa que a afetividade, que une e enlaça duas pessoas,             adquiriu reconhecimento e inserção no sistema jurídico. Ainda que a    Constituição tenha enlaçado o afeto no âmbito de sua proteção, a palavra afeto      não está no texto constitucional. Houve a constitucionalização de um modelo             de família eudemonista e igualitário, com maior espaço para o afeto e a             realização individual.

Cada vez mais se valoriza as funções afetivas da família. Basta atentar a toda uma nova terminologia: filiação socioafetiva, dano afetivo etc. E, na medida em que se acentuam as relações de sentimentos entre os seus membros a família se trans­forma. Foi o afeto e o princípio da afetividade que trazem legitimidade a todas as for­mas de família.

Destarte, visando a proteção integral da criança ou adolescente, no exercício de seus direitos humanos fundamentais, acrescidos os direitos à vida, à saúde, ao lazer, à educação, à alimentação, o direito ao afeto e ao amor, é imprescindível para o desenvolvimento de qualquer ser humano.

 

1.2 Doutrina da Proteção Integral à Criança e ao Adolescente

 

A doutrina da proteção integral da criança e do adolescente consiste na obrigatoriedade da atuação da justiça em garantir a satisfação plena das crianças e dos adolescentes de suas necessidades básicas, assegurando-lhes os direitos fundamentais compreendendo todas as necessidades do ser humano para o pleno desenvolvimento de sua personalidade.

A criança e o adolescente são merecedores de proteção es­pecial no direito de família, com absoluta prioridade, incumbindo o dever de proteção aos pais, à família, à sociedade e ao poder público. A criança e o adolescente, desde o advento da CF, não são mais vistos como meros objetos de assistência, mas como sujeitos de direito, cujas prerrogativas de prioridade e de supremacia do seu interesse emanam de sua especial condição de pessoas em desenvol­vimento. Segundo Lima (2014, p. 6):

            Foi preciso que a sociedade, como tal, reconhecesse que era extre­mamente         importante o tratamento da criança e do adolescente como uma questão       prioritária. Sendo assim, muitos teóricos do Direito, co­mo também aqueles               envolvidos nas questões relativas à criança e ao adolescente, estabeleceram a             Doutrina da Proteção Integral, cuja de­finição mais exata consiste no      tratamento da questão da criança e do adolescente como prioridade absoluta.              Esta doutrina tem presença marcante nos documentos internacionais, como a    Convenção sobre os Direitos da Criança, da ONU. De tanto ter sido      consagrada a nível mundial, foi incorporada na Constituição de 1988, e, como          consequência, também no ECA.

Para Teixeira (2009, p. 75), com a promulgação da Carta Magna, houve uma personalização no âmbito da família, e, dentre outras razões, a autora apresenta o seguinte argumento:

            [...] uma das maiores demonstrações do fenômeno da personalização foi o           tratamento prioritário dado à criança e ao adolescente, como pessoas em                 desenvolvimento, e alvo da proteção integral da família, da sociedade e do              Estado, cujo melhor interesse deve ser preservado a qualquer custo.

Comel (2003, p. 90) menciona a crescente intervenção do Estado nas relações familiares, justificando que essa ingerência resulta da "[...] adoção, pelo direito, da doutrina de proteção integral da criança e do adolescente”.

Madaleno (2011, p. 97), ao tratar do princípio da proteção da prole, destaca que:

            O artigo 227 da Constituição Federal contém regras destinadas à proteção das   crianças e dos adolescentes e são disposições havidas como direitos          fundamentais, tal qual o artigo 227, § 6o, também da Carta Política, proíbe       qualquer discriminação entre   os filhos, e o ar­tigo 229, ainda da Carta Federal,    dispõe terem os pais o dever de as­sistir, criar e educar os filhos menores, numa           clara percepção de constitucionalização do Direito de Família e de atenção ao    princípio da proteção integral e do melhor interesse da criança.     

Dias (2009, p. 70) aponta as mudanças havidas no âmbito das famílias, explicando que “a consagração dos direitos de crianças e adolescentes como direitos fundamentais, incorporando a doutrina da proteção integral e vedando referências discriminatórias entre os filhos (CF 227 § 6o), alterou profundamente os vínculos de filiação”.

Nesse sentido, o art. 227 da CF trata do prin­cípio do melhor interesse da criança, ao dispor que:

            Art. 227. É dever da família, da sociedade e do estado assegurar à crian­ça e ao    adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação,                 à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dig­nidade, ao respeito, à              liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de             toda a forma de negligência, discrimina­ção, exploração, violência, crueldade e     opressão.

Este princípio vem regulamentado no art. 3o do ECA, com a seguinte redação:

            Art. 3o. A criança e o adolescente gozam de todos os direitos funda mentais       inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral,             espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade.

Este aparato legislativo confere o status de cidadão às crianças e aos adolescentes, que, na condição de pessoas em desenvolvimento, pas­saram a ser vistas como sujeitos de direitos e receberam proteção especí­fica e prioritária enquanto menores.

Isto porque a proteção integral destinada ã criança e ao adoles­cente também possui o seu fundamento na Convenção sobre o Direito da Criança, aprovada pela Assembleia Geral das Nações Unidas e pelo Con­gresso Nacional Brasileiro, por meio do Decreto Legislativo 28, tendo sido ratificada com a publicação do Decreto 99.710/1990. incorporando-se assim, no ordenamento jurídico.

Nesse contexto, o princípio da proteção integral visa assegurar o direito à liberdade, ao respeito e ã dignidade humana a pessoas em pro­cesso de desenvolvimento e na condição de sujeitos de direitos civis, humanos e sociais garantidos legalmente, sendo punida qualquer forma de exploração, violência, crueldade e opressão, praticadas por ação ou omissão, conforme estabelecem os arts. 5 e 15 do ECA. A propósito disto, Madaleno (2011, p. 97) esclarece:

            Dessa forma seria inconcebível admitir pudesse qualquer decisão en­volvendo   os interesses de crianças e adolescentes fazer tabula rasa do princípio dos seus           melhores interesses, reputando-se inconstitucional a aplicação circunstancial              de qualquer norma ou decisão judicial que desrespeite os interesses             prevalentes da criança e do adolescente recepcionados pela Carta Federal.

De acordo com o art. 17 do ECA, “o direito ao respeito consiste na inviolabilidade da integridade física, psíquica e moral da criança e do adolescente, abrangendo a preservação da imagem, da identidade, da autonomia, dos valores, das ideias e crenças, dos espaços e objetos pessoais”. Isto porque segundo Teixeira (2009, p. 75):

            O princípio do melhor interesse da criança e do adolescente obteve tamanha      prioridade no âmbito do Direito de Família, quando o deba­te cingiu-se aos   direitos do menor, que ao lado e funcionalizado ao Princípio da Dignidade    Humana, passou a ser o vértice interpretati­vo do ordenamento, nesta seara.

O art. 18 do ECA prevê que é “de­ver de todos velar pela dignidade da criança e do adolescente, pondo-os a salvo de qualquer tratamento desumano, violento, vexatório ou constrange­dor”. Outros artigos desta mesma lei garantem a proteção do menor por intermédio da guarda, obrigando aos pais ou responsáveis que asseverem a prestação básica necessária, como assistência médica, educação, dentre outros.

Deste modo, pode o Estado interferir nas relações familiares, mudado no melhor interesse do menor. Segundo Comel (2003, p. 94) “[...] apesar de toda a aparente e preconizada ingerência do Estado, diante do interesse maior e superior da criança e do adolescente, o poder familial' permanece qual órgão insubstituível de proteção do incapaz”.

Deste modo, denota-se que o Direito de Família passou por di­versas mudanças, acompanhando o desenvolvimento e a evolução da sociedade. Com o advento da CF, ocorreu uma verdadeira revolução no âmbito das famílias, com a normatização de desenhos de entidades familiares para além do modelo de família tradi­cional ou matrimonial. O pátrio poder cedeu lugar ao poder familiar, ad­mitindo o afeto como substrato das famílias, mediante as diretrizes legais e os diversos princípios pertinentes ao Direito de Família, sobretudo o da proteção do melhor interesse da criança e do adolescente.

Os pais possuem, em relação aos filhos, portanto, o dever de prestar não só assistência material e intelectual, mas também moral, afe­tiva e psicológica, contribuindo para a promoção da dignidade da pessoa humana e da convivência familiar.

 

1.2.1 O direito à convivência familiar

 

O direito à convivência familiar constitui um direito fundamental da criança e do adolescente, sujeitos de di­reitos, de conviver em família. A convivência solidifica os laços afetivos da criança, reforçando os vínculos com a família materna e paterna, e segundo Maciel (2010, p. 74), recebendo todos os cuidados necessários à pessoa em desenvolvimento, valorizando e assegurando sua dignidade, o que não é possível obter com mera visitação. Prevalece, assim, o melhor interesse e proteção integral dos filhos.

Porém, não raras vezes verifica-se que o genitor que possui a guarda unilateral do filho, por egoísmo ou sentimento de vingança, dificulta sobremaneira a convivência familiar da criança ou do adolescente com o outro genitor e sua família, trazendo graves frustrações e sofrimentos às partes envolvidas. Muitas das vezes às frustrações e a angústia pelo reiterado insucesso na visitação e convivência acabam provocando o distanciamento entre pais e filhos, causando abandono e traumas irremediáveis na delicada natureza dos relacionamentos familiares, que persistirão pelo resto da vida.

Proporcionar a convivência familiar do filho com o outro genitor e seus familiares, é dever do guardião que possui a guarda unilateral, nos termos do artigo 227 da CF e artigo 4° da Lei 8.069/1990. A omissão importa em forma de ne­gligência, violando os direitos fundamentais e o melhor interesse da criança e do adolescente.

Orselli (2011, p. 18) ressalta que os tribunais tem reco­nhecido a possibilidade de aplicação de multa ao guardião que di­ficulta ou impede o exercício do direito de visitas, a requerimento das partes ou de ofício pelo juiz. O fundamento encontra-se no artigo 461, §4°, do Código de Processo Civil (CPC), que autoriza a apli­cação de astreintes no cumprimento das obrigações de fazer. Res­salta, entretanto, que a mesma medida não é aplicada ao genitor não guardião que descumpre com o dever de visitas.

A aplicação de multa, com o fundamento no §4° do artigo 461 do CPC, não é o único meio eficaz de obrigar ao genitor guardião a cumprir o dever de proporcionar o convívio familiar.

O descumprimento injustificado do dever do guardião em proporcionar uma convivência familiar saudável do infante, vio­lando seus direitos e abusando do exercício da autoridade paren­tal, autoriza a aplicação de medidas de proteção para fortalecer ou restabelecer os vínculos familiares (art. 98, II e 100, ECA). Autoriza ainda a imposição de medidas pertinentes aos pais ou responsável previstas no artigo 129 da Lei 8.069/1990, como advertência, encaminhamento a orientação psicológica, modifi­cação da guarda e em casos mais extremos até a suspensão ou perda do pode familiar, conforme possibilita os artigos 22 e 24 do ECA.

Além das medidas previstas no ECA, se a conduta abusiva do genitor ou do responsável em dificultar o contato ou o exercício do direito de convivência familiar, tiver por objetivo romper os vínculos de afeto do me­nor com o genitor descontínuo, ao ponto de torná-lo distante e alheio, fazendo surgir no filho a sensação de abandono e repúdio, caracteriza-se ato de alienação parental passível de aplicação das medidas previstas no artigo 6° da Lei de Alienação Parental (Lei 12.318/2010). Entre as medidas aplicáveis incluem ampliar o regi­me de convivência, estipular multa, determinar acompanhamento psicológico, alterar a guarda unilateral para compartilhada ou vice-versa, fixar domicílio e até suspender a autoridade parental.

Não se pode olvidar ainda ser pacífico, tanto na doutrina, quanto na jurisprudência, o reconhecimento de dano moral no direito de família nos casos de abuso, omissão ou excesso nas relações familiares. O descumprimento injustificado, por ação ou omissão do guardião contínuo, importando na ausência de contato e violando injustificadamente a convivência familiar da criança ou adolescente com o genitor não guardião e seus familiares, causando danos psicológicos, é passível de compensação civil.

O dever de convivência não é apenas do genitor descontínuo, mas também do genitor guardião em propiciar a convivência, salvo se demonstrar que o convívio é nefasto e prejudicial ao menor, como, por exemplo, maus tratos, abusos sexuais, exploração, alienação parental, recomendando o afastamento para proteger a criança. Na hipótese de danos graves e irreversíveis à criança ou adolescente, o guardião que evita a convivência familiar até pronunciamento judicial possui excludentes de ilicitude a ampará-lo, mas apenas na hipótese de prejuízos ao menor.

Fato corriqueiro nas relações de família, como lembra Madaleno (2011, p. 356), é o condicionamento pelo guardião contínuo, do exercício do direito de visitas ao pagamento de pensões alimentícias pelo não guardião. Não se confunde a cobrança exe¬cutiva dos alimentos, inclusive mediante execução indireta que autoriza a prisão civil do devedor, com convivência familiar, não podendo condicionar as visitas ao pagamento da pensão alimentícia, como se fossem moedas de negociação. O condicionamento de pagamento de pensão para permitir a visitação distorce todo o sistema de interação entre pais e filhos e o respeito aos melhores interesses do menor, cuja função fundamental segundo Madaleno (2011, p. 357), “é a preservação psicológica e emocional da prole, valores supremos, vinculados à hígida formação mental do filho”.

A guarda unilateral não suspende o poder familiar do pai não guardião e não afasta seu dever de cuidado e convivência. Da mesma forma a suspensão ou perda do poder familiar não afasta os deveres da paternidade, apenas retirando dos pais o direito de administrar a pessoa e os bens dos filhos. Suspende-se ou perde-se o poder familiar no melhor interesse e proteção dos filhos e não dos pais. Entendimento em contrário levaria ao absurdo dos pais descuidados e irresponsáveis abandonaram os filhos para se verem livres dos deveres da paternidade.

A CF e o ECA erigiram a paternidade responsável como princípio e o dever de cuidado como direito fundamental dos filhos menores. O vínculo paterno-filial não é apenas afetivo, mas jurídico, conferindo à prole o direito à convivência com os pais e aos pais o dever de conviver com os filhos.

Contudo, apesar de todo esse desenvolvimento no ordenamento jurídico, que assegura ampla e irrestrita proteção aos filhos menores, uma prática que prejudica o bem estar da criança e do adolescente, causando, muitas vezes, transtornos complexos e até irreversíveis e irremediáveis, é extremamente observada, quando da ruptura do afeto, ou seja, quando ocorre a separação dos pais: a alienação parental.

 

2.3 Poder Familiar nas Relações Interparentais

 

            A figura do pai, como autoridade máxima nas relações familiares, segundo Buosi (2012, p. 41) abriu espaço para a participação conjunta da mulher, que possui papel fundamental no exercício do poder familiar, advindo do antigo pátrio poder.

            Para Grisard Filho (2011, p. 33), o pátrio poder sofreu transformações relevantes, tendo sido substituído pelo poder familiar “[...] por conta dos novos conceitos jurídicos se reformulação de valores sociais inspirados no texto constitucional, ou poder parental, autoridade parental ou ainda, responsabilidade parental [...]”.

            Lobo (2010, p. 146), ao ressaltar a mudança de paradigmas, ou seja, que houve a transmutação do poder do pai sobre os filhos para os deveres do pai e da mãe para com os filhos, aporta que o poder familiar:

[...] é a denominação que adotou o Código Civil de 2002 para o antigo pátrio poder Ao longo do século XX, mudou substancialmente o instituto, acompanhando a evolução das relações familiares, distanciando-se de sua função originária, voltada ao exercício de poder dos pais sobre os filhos, para constituir um múnus, em que ressaltam os deteres.

            O poder familiar, ou a autoridade parental, no entendimento de Teixeira (2009, p. 111), “[...] atribui a ambos os pais a titularidade, o exercício, o poder e o dever de gerenciar a educação dos filhos, de modo a moldar-lhes a personalidade, a proporcionar-lhes um crescimento com liberdade e responsabilidade, [...]”.

            É obrigação dos pais prover todas as necessidades dos filhos. Assim como é obrigação dos pais impor limites aos filhos, educando-os e preparando-os para a vida.

            Na atualidade, percebe-se, então, a importância da família e a influência que ela representa na formação do caráter do ser humano. A sociedade evolui, as tradições e histórias se modificam. Tanto é assim, que a figura do pai austero, como senhor absoluto e ditador das regras na família, cedeu espaço à administração conjunta do lar, em igualdade de condições e de prerrogativas com a mulher, respeitando-se, deste   modo, o princípio constitucional da igualdade entre o homem e a mulher

2 ALIENAÇÃO PARENTAL

 

Os pais possuem, em relação aos filhos, o dever de prestar não só assistência material e intelectual, mas também moral, afetiva e psicológica, de acordo com a CF. Os pais possuem, em relação aos filhos, o dever de prestar não só assistência material e intelectual, mas também moral, afetiva e psicológica,  de  acordo  com  a CF. Diante  disto,  a alienação parental é uma forma de violência intrafamiliar, que transgride os direitos da personalidade do menor.

A síndrome da alienação parental, consiste na conduta do pai ou da mãe que possui a guarda unilateral de denegrir o outro perante o filho, com informações falsas e depreciativas, ao ponto de passar a rejeitá-lo. Segundo Buosi (2012, p. 54):

                                      A implantação paulatina e constante na memória do filho pelo genitor que       possui a guarda, de falsas verdades acaba por causar na criança ou adolescente               a sensação de que foi abandonado e não é querido pelo outro, causando um                                                   transtorno psicológico que o leva a acreditar em tudo que foi dito em desfavor               do guardião descontínuo e passa a rejeitá-lo, dificultando as visitas e tornando-              o cada vez mais distante até aliená-lo, tornando-se órfão de pai vivo, o que é                                                   ex­tremamente prejudicial para ambos.

A alienação parental ocorre quando o filho afasta-se de um dos pais, ou ambos, e de seus parentes próximos, como os avós, tornando-os cada vez mais distantes, alheios, ao ponto da criança ou adolescente tornar-se órfão de pai ou pais vivos, o que é extremamente prejudicial por faltar-lhe a referência paterna ou materna.

Apesar de ser utilizada a expressão alienação parental, o que na realidade se percebe é a ocorrência de uma síndrome em face do conjunto de sintomas que o menor apresenta. O doutrinador Duarte (2009, p. 35), ensi­na que:

                                                  A síndrome da alienação parental deve ser compreendida como uma patologia   jurídica caracterizada pelo exercício abusivo do direito de guarda, vitimando       especialmente o filho, que vive uma contradição de sentimentos até chegar ao                                                   rompimento do vínculo de afeto com o genitor não guardião.

O guardião passa a manipular o filho com uso de táticas verbais e não verbais, distorcendo a realidade para que segundo Segundo Buosi (2012, p. 57), passe a acreditar que foi abandonado pelo outro genitor, acabando por perceber um dos pais totalmente bom é perfeito (o alienador) e o outro totalmente mau. A principal característica do guardião alienador é a lavagem cerebral do menor para que atinja uma hostilidade quanto ao pai visitante e passe a acreditar que foi desprezado e abandonado, compartilhando ódios e ressentimentos com o alienador, tornando-o seu cúmplice.

O filho se transforma em defensor abnegado do guardião, repetindo contra o outro genitor as mesmas palavras apreendidas durante o processo de alienação. O acesso ao filho se torna arma de vingança.

Para o alienador, obrigações e compromissos nada significam, nem mesmo os firmados perante o juiz, utilizando, no jogo de manipulações, mentiras e, até mesmo, falsas denúncias, inclusive de abusos sexuais. Leciona Guimarães (2002, p. 58):

                                                  As crianças, maiores vítimas, perdem a espontaneidade, sendo visível o              sofrimento, tornando-se reféns dos alienadores. De tanto induzi­das e                manipuladas possuem medo de falar suas vontades e passam a repetir ideias                                                   pejorativas e falsas acusações contra o outro geni­tor, ainda que aparentemente             o faz de modo autônomo, longe da presença física do genitor alienador, como   se as ideias partissem dela própria. Muitas vezes são proferidas decisões                                                   judiciais de afas­tamento do genitor baseadas em fatos inverídicos, apontadas                pela criança, que apenas repete o que foi dito pelo alienador.

Existindo conflito entre os pais é necessário ter muito cuidado nas narrativas do menor, pois pode fantasiar induzido pelo alienador e descrever situações que nunca ocorreram, evitando o convívio com o genitor descontinuo para atender o alienador. Duarte (2009, p. 39) ressalta que a doutrinação de uma criança através da síndrome da alienação parental é uma forma de abuso emocional porque enfraquece a ligação psicológica entre a criança e um genitor amoroso. E em alguns casos pode conduzir à destruição total dessa ligação, então, pode ser pior do que outras formas de abuso como maus tratos e negligência.

A Lei 12.318, de 26 de agosto de 2010, dispõe sobre a alienação parental, adotando procedimentos para combatê-la, de oficio ou mediante requerimento, em qualquer momento processual, em ação autônoma ou incidental. A lei conceitua alienação parental exemplifica suas formas ao dispor no art. 2°que:

                                      Art. 2° Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação        psicológica da criança ou do adolescente promo­vida ou induzida por um dos          genitores, pelos avós ou   pelos que tenham a criança ou adolescente sob a sua                                                   autoridade, guarda ou vigilância para que repudie genitor ou que cause            prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este.

Havendo indício de alienação parental, em ação autônoma ou incidental, a requerimento ou de oficio, o processo terá tramitação prioritária, e o juiz determina medidas provisórias para preservação da integridade psicológica do menor, inclusive para assegurar a convivência ou reaproximação com o genitor alienado (art. 4°).

Determina ainda, se necessário, perícia psicológica ou biopsicossocial por equipe interdisciplinar, que terá o prazo de noventa dias para apresentação do laudo, com ampla avaliação, compreendendo entrevista pessoal, exame de documentos, histórico do relacionamento do casal, incidentes, avaliação da personalidade das partes, forma como a criança se manifesta, para detectar a ocorrência de alienação e orientar nas medidas a serem aplicadas (art. 5°).

O atendimento por profissionais qualificados das áreas em psicologia, de serviço social, ciências sociais e do direito, incluindo policiais e conselheiros tutelares, preparados para detectar a ocorrência de alienação parental ainda no início, orientar as partes envolvidas e mediar os conflitos, é de extrema importância para minorar o sofrimento e traumas das partes, especialmente das crianças e adolescentes.

 

3.1 Características da Alienação Parental

 

O fenômeno da alienação parental apresenta algumas características que lhe são peculiares, que, uma vez conhecidas e observadas precocemente, podem facilitar o reconhecimento da alienação, para que se busque auxílio interdisciplinar e a devida orientação/punição ao alienador. Para Podevyn (2014, p. 33):

A Síndrome se manifesta, em geral, no ambiente da mãe das crianças, notadamente porque sua instalação necessita muito tempo e porque é ela que tem a guarda na maior parte das rezes. Todavia pode se apre­sentar em ambientes de pais instáveis, ou em culturas onde tradicio­nalmente a mulher não tem nenhum direito concreto.

Para Fonseca (2006, p. 164), a relevância de se detectar a manifestação da alienação parental funda-se no risco de que o genitor alienado não mereça, de forma nenhuma, ser rejeitado e odiado por comportamentos realmente depreciáveis. Isto é, o suposto pai, que se apresenta como vítima de alienação, pode ser, de fato, o algoz da família. Daí a importância de ser realizada uma análise mais apurada, interdisciplinar, com o intuito de evitar qualquer forma de injustiça. Para a autora (2006, p. 164):

Essa patologia afeta mais os meninos - que são os que mais sofrem com a ausência paterna em idade que varia entre S e 11 anos. Cri­anças mais velhas tendem a opor maior resistência à pressão do geni­tor alienante, pois já têm um pouco mais de independência e de von­tade própria.

O rompimento do afeto entre os pais, a separação do casal, não é, por si só, o que acarreta problemas psicológicos no filho Souza (2007, p. 54), mas é o conflito, o estado de tensão, a discórdia familiar, a instabilidade das relações e, consequentemente, a insegurança pela perda dos referenciais em que até então a criança se apoiava, que causam danos psicológicos incomensuráveis.

Nesse sentido, Souza (2007, p. 54), preleciona:

De forma geral, identificou-se que tanto profissionais da área do Di­reito quanto da Psicologia, ao abordarem as causas da SAP, enfati­zam sentimentos desencadeados com o rompimento do casamento, ca­racterísticas individuais ou atributos de personalidade como justifica­tivas de um genitor empreender o alijamento do ex-consorte da vida dos filhos.

Esses sentimentos decorrentes da ruptura do afeto, se resultarem em mágoa, baixa autoestima ódio e vontade de vingança, farão com que o genitor que se sente traído e abandonado, passe a praticai1 atos de alienação contra o outro genitor, manipulando o filho dos mais diversos modos e diferentes estratagemas para alcançar o seu intento. Sua eficácia, Fonseca (2006, p. 164):

[...] é obtida por meio de um trabalho incessante levado a efeito pelo genitor alienante, muitas vezes até mesmo de modo ilencioso ou não explícito. Nem sempre é alcançada por meio de lavagens cerebrais ou discursos atentatórios à figura paterna. Na maior parte dos casos, o cônjuge titular da guarda, diante da injustificada resistência do filho em ir ao encontro do outro genitor, limita-se a não interferir, permi­tindo, desse modo, que a insensatez do petiz prevaleça. [...] Em outras circunstâncias, o genitor alienante opõe às visitas toda sorte de desculpas: estar a criança febril; acometi da por dor de gar­ganta; visitas inesperadas de familiares; festinhas na casa de amigos etc. Também com frequência, o genitor alienante vale-se de chantagem emocional para lograr a alienação parental: induz a criança à crença de que, se ela mantiver relacionamento com o genitor aliena­do, estar-lhe-á traindo, permitindo, desse modo, que ele, genitor alie­nante, permaneça só, abandonado e, portanto, infeliz.

Observa-se, desta maneira, uma situação forjada pelo genitor alienante, com o intuito de afastar a criança da convivência do outro genitor, tudo com o fito egoístico de ter a criança apenas para si, como forma de vingança e de compensar a ausência do ex-consorte.

Trindade (2008, p. 26), ao discutir a celeuma se a alienação parental constitui abuso ou negligência, assevera:

[...] longe de pretender provocar dissensões terminológicas de pouca utilidade, a Síndrome da Alienação Parental constitui uma forma de maltrato e abuso infantil Aliás, um abuso que se reveste de caracte­rísticas pouco convencionais do ponto de vista de como o senso co­mum está acostumado a identificá-lo, e, por isso mesmo, muito grave, porque mais difícil de ser constatado.   

Aliás, existe ainda uma forma mais nefasta de praticar alienação parental, que é a falsa denúncia de maus-tratos ou de abuso sexual, por meio da qual o genitor alienador pretende interromper o contato do genitor alienado, sacrificando o próprio o filho, quando, valendo-se do poder judiciário, fez a falsa acusação, ciente de que haverá a suspensão temporária das visitas, ou, no mínimo, que as visitas serão reduzidas e acompanhadas por monitoramento de terceira pessoa. Sousa, entretanto, adverte que:

[...] a combinação falsas denúncias de abuso sexual e SAP, feita nas publicações nacionais, está em discordância com as proposições de Gardner, pois este asse\'era que na maioria dos casos de SAP essas denúncias não estão presentes. Segundo o psiquiatra norte-americano, as denúncias surgem somente em casos nos quais falha­ram todas as formas de programação da criança.

De outro viés, conforme se depreende do entendimento de Podevyn (2014, 41), após examinar "[...] 700 casos de separações conflituosas durante os últimos 12 anos. se pode observar a presença de quatro critérios, que permitem de maneira razoável predizer que o processo de alienação está ocorrendo", quais sejam: a obstrução a qualquer contato da criança com o genitor: denúncias falsas de abuso: deterioração da relação após a separação: e, ainda, a reação de medo da parte dos filhos.

Os critérios de identificação da alienação parental indicados por Podevyn (2014, p. 41) possibilitam uma visão bastante ampla do fenômeno, facilitando sua precoce detecção. Entrementes, importa analisar, também, alguns atos que, uma vez praticados, ensejam a alienação parental.

 

3.2 Modalidades de Alienação Parental

 

Não bastassem os inúmeros atos que podem ser praticados com o intuito de cometer a alienação parental, é possível observar, também, que existem várias modalidades de alienação, que podem ser praticadas dentro do casamento, quando de uma separação, por um dos genitores ou qualquer outro integrante do grupo familiar, em face do outro genitor ou, contra os avós, os tios, ou mesmo contra os irmãos. Ou seja, qualquer integrante do grupo familiar pode praticar a alienação parental na criança ou no adolescente, em face de qualquer outra pessoa daquele mesmo grupo familiar.

Segundo o entendimento de Trindade (2008, p. 103), a alienação parental ocorre "principalmente no ambiente da mãe, devido à tradição de que a mulher é mais indicada para exercer a guarda dos filhos, principalmente quando ainda pequenos". Entretanto, num sentido mais amplo ainda, a alienação pode se estender a outros cuidadores, e não apenas quando da separação dos pais.

 

3.2.1 Alienação parental dentro do relacionamento dos pais

 

A maioria das ocorrências de alienação parental se apresenta em ambiente materno, quando da ruptura do afeto, onde há separação dos pais e disputa pela guarda do filho, conforme visto alhures.

De acordo com Schmidt (2014, p. 54), o genitor alienante vale-se de articulados estratagemas para concretizar o seu intento.

As estratégias de alienação parental são múltiplas e tão variadas quanto a mente humana pode conceber, mas a síndrome possui um denominador comum que se organiza em torno de avaliações prejudi­ciais, negativas, desqualificado­ras e injuriosas em relação ao outro genitor, interferências na relação com os filhos e, notadamente, obstaculização de visitas ao alienado.

Porém, a alienação pode configurar-se mesmo antes da separação dos pais, ou seja, enquanto a família ainda forma uma unidade. Nesta hipótese, um dos genitores realiza, no ambiente doméstico, criticas para o filho do genitor alienado, sobre seu estilo de vida, hábitos, bem como, referindo-se ao outro de forma pejorativa, criticando os presentes por ele ofertados ao filho, não poupando nem mesmo os familiares desse genitor.

Nesse cenário de desestruturação familiar, sobretudo na hipótese de separação, é imprescindível ter consciência de que será necessária uma superação do ex-casal, tanto do genitor que permaneceu com a guarda do filho, quanto do outro, com enfoque no melhor interesse do filho. A raiva e o ódio só geram maiores problemas, inclusive e especialmente ao filho, que não terá um bom exemplo de como superar as adversidades da vida.

Gagliano (2014, p. 54), ao tratar dos fundamentos para o divórcio, assevera que "Vigora, mais do que nunca, agora, o princípio da ruptura do afeto, o qual busca inspiração no "Zerrüttungsprinzip" do Direito alemão (princípio da desarticulação ou da ruína da relação de afeto)",

Isto significa que, mesmo que os pais ainda convivam sob o mesmo teto, já ocorreu a ruptura dos laços afetivos. Nesse contexto, um dos genitores, normalmente a mãe, antevendo a futura separação, pretende se antecipar ao fato, preparando o filho para garantir para si a guarda da criança Até, porque, segundo Dias (2010, p. 24):

A Síndrome de Alienação Parental é mais provável de acontecer em famílias multidisfuncionais. Quando uma família possui uma dinâmica muito pertur­bada, a Síndrome de Alienação Parental pode se manifestar como uma tenta­tiva desesperada de busca de equilíbrio. Ademais, como a Síndrome de Alienação Parental acaba mobilizando familiares, amigos, vizinhos, profissio­nais e as instituições judiciais, existe sempre a fantasia de que essas pessoas ou órgãos, de alguma forma, irão reestabelecer a homeostase familiar que já não existe mais.

Entre outras coisas, o alienador omitirá ao alienado informações importantes sobre o filho, tais como problemas escolares, doenças, viagens, etc. Ou seja, são várias as formas de praticar a alienação parental, sempre com o mesmo objetivo romper os laços de afetividade do filho para como outro genitor.

Nestas situações, o filho acaba por se submeter à prática alienante e assume a postura determinada pelo alienador em relação ao genitor alienado, a contragosto, por receio de ser castigado na hipótese de desobedecer ou desagradar o alienador, ou até mesmo pela postura de vitima que o alienador sustenta perante o filho, como se a permanência do vinculo como outro genitor o deixasse abandonado e infeliz.

 

3.2.2 Alienação parental na separação dos pais

 

A alienação parental pode configurar-se na hipótese de separação dos pais, sobretudo quando há disputa pela guarda dos filhos. Aliás, este é o modelo que mais se constata na rotina forense. Isto porque o genitor alienador, por motivos egoísticos, separa o filho do genitor alienado, incutindo na criança ou adolescente fatos inexistente sobre o outro genitor, que, aos poucos, vão sendo assimilados pelo filho, que, consequentemente, deixa de querer estar com ele, ainda que sem motivo concreto. Para Groeninga (2006, p. 125):

O alienante seria, em geral, a mãe que costuma deter a guarda, e que a exerceria de forma tirânica. Inegável ê a grande influência que a mãe exerce nos filhos pequenos, dada a natural sequencia de um vín­culo biológico para o psíquico e afetivo. O que se observa é que há mães que utilizam sim de forma abusiva, consciente e inconsciente­mente, o vínculo de dependência não só física, mas, sobretudo, psí­quica que a criança tem para com ela.

De acordo com Trindade (2008, p. 22), a separação dos pais é o fator decisivo para a prática da alienação parental:

A situação que desencadeia a Síndrome de Alienação Parental está relacionada com a separação e o divórcio, mas traços de comporta­mento alienante podem ser identificados no cônjuge alienador duran­te os tranquilos anos de vida conjugal. Essa predisposição, entretan­to, ê posta em marcha a partir do fator separação.

O objetivo do alienador é afastar o filho do outro genitor, rompendo definitivamente os laços afetivos existentes entre eles, de forma absolutamente egoísta e irresponsável, pensando em vingança, por sentir-se abandonado ou traído, e como forma de castigo, porque o ex-companheiro, alienado, já não convive naquele ambiente familiar. Quem mais sofre com toda essa situação, são os filhos, conforme relata Duarte (2006, p. 130):

Em decorrência dessas situações alheias á sua vontade, observa-se na clínica, em vários casos, que eles apresentam angústia e sintomas, precisando elaborar mágoas, conflitos de lealdade e luto pela separação conjugal dos pais, e muitas vezes também parental, quando perdem o contato comum dos pais, irmãos, avôs, primos. Elas sofrem ao serem afastadas á revelia, de pessoas com quem tinham constantes trocas de carinho e amor, e ao deixar de encontrá-las perdem referências importantes, quando podem surgir muitas carências efetivas, bloqueios emocionais e cognitivos, além de sentimentos depressivos.

O genitor alienador realiza falsas denúncias, garantindo assim, a guarda da criança e o afastamento do genitor alienado, seja pela proibição de visitar o filho, seja pelo maior espaçamento entre as visitas e com acompanhamento de terceiros. Sabendo que a investigação de suas denúncias é um processo longo e moroso, o genitor alienador usa o tempo a seu favor, conforme leciona Guazzelh (2010, p. 122):

A partir daí o genitor alienador (que visa alienar e afastar o outro) já detêm, parcialmente, uma vitória, pois o tempo e a limitação de con­tato entre o genitor alienado e o filho jogam a seu exclusivo favor. As­sim, mesmo que se inicie com urgência uma perícia pelo Serviço So­cial Judiciário ou ainda uma perícia psiquiátrica todo o processo, como meio de se lograr esclarecera verdade, acabará operando a fa­vor daquele que fez a acusação, embora falsas, Ou seja, o ônus morosidade do processo recairá exclusivamente sobre o réu, mesmo que ele seja inocente.

Quando o alienador garante a guarda do filho, sente-se imedia­tamente vitorioso. A partir de então, a criança ou o adolescente viverá uma situação de dependência e submissão, como prova de lealdade, pelo medo de ser abandonado ou de perder o amor desse genitor, alienante. Sem qualquer motivo aparente, começa a rejeitar o outro genitor. Passa a desprezá-lo, a criar conceitos negativos sobre sua pessoa, a evitá-lo, e com o tempo, o afastamento será completo, rompendo-se total e irremediavelmente os vínculos afetivos entre pai e filho.

 

3.2.3 Alienação parental na família

 

A alienação parental configura-se, de forma mais frequentemente, quando da separação do casal, praticada por um dos genitores contra o ex-cônjuge ou companheiro. Porém, é possível observar-se o fenômeno da alienação parental sendo praticada não por um dos genitores, mas por outra pessoa do círculo familiar, como ocorre de a avó materna alienar o neto em face do pai, ou, de outro modo, a avó paterna alienando a criança contra a mãe.

Nesse contexto, segundo Trindade (2010, p. 24) “a Síndrome de Alienação Parental ê o palco de pactualizações diabólicas, vinganças relacionadas a conflitos subterrâneos inconscientes ou mesmo conscientes, que se espalham como metástases de uma patologia relacional e vincular”. Esta prática é mais comumente observada quando da ausência de um dos genitores.

Trabalhando no Núcleo de Prática Jurídica de uma Instituição Fe­deral de Ensino Superior, é possível segundo Duarte (2006, p. 131), se deparar com as mais diversas situa­ções que envolvem o fenômeno da alienação parental. Exemplifica-se:

Um casal separou-se porque o pai era usuário de substâncias entorpecentes e estava em fase de reabilitação. Como a mãe trabalhava, pagava pensão alimentícia e a criança de cinco anos ficava sob os cuidados da avó paterna, a qual realizava todo tipo de articulação para evitar o contato da filha com a mãe, que então, procurou o amparo do Núcleo de Prática Jurídica, pretendendo uma regulamentação de visita. Posteriormente, quando da perícia realizada pelo Serviço de Assistência Social, foi detectado que a avó paterna transmitia uma imagem horrenda da mãe para a neta. A criança relatou, em ambiente lúdico, que tinha medo da mãe, porque, como ela contribuía com dinheiro para o sustento da menina, poderia cobrar o valor em forma de afazeres domésticos, desde limpar vidros a esfregar o piso. A menina contou, chorando, que não queria ser escrava da própria mãe, que supostamente se via no direito de cobrar a subsistência da criança.

Esta é uma situação onde a alienação parental não foi praticada pela mãe, como costuma acontecer. Ao contrário, a mãe é que foi a alienada, vítima do ciúme e do egoísmo da avó paterna de uma criança de apenas cinco anos. Figueiredo e Alexandridis (2011, p. 49) asseveram:

Assim, apesar de mais frequentemente e comprovável a alienação pa­rental ocorrer por um genitor, nada impede que a campanha depre­ciativa seja promovida por qualquer um dos avôs que em muitas ve­zes acabam por educar seus netos diante da necessidade do trabalho do genitor que detêm a guarda do menor tendo, assim, durante grande parte do tempo autoridade sobre ele.

Há ocasiões, entretanto, em que a alienação parental não é realizada pelos genitores, mas por outros membros da família, e não contra um dos genitores, mas contra outro membro da família.

A propósito disto, Figueiredo e Alexandridis (2011, p. 50) esclarecem quem pode figurar no polo ativo do fenômeno alienador:

Também se mostra possível a alienação promovida pelo tutor do menor ou mesmo pelo curador do incapaz, quanto a outros parentes do menor. Desta forma, ê importante mensurar que fica restrita afigura do alienador à pessoa de um dos genitores, podendo recair o repudio contra qualquer parente próximo desse menor (irmãos, avós, tios etc).

Crianças e adolescentes, envolvidos no fenômeno da alienação parental, precisam de acompanhamento profissional interdisciplinar, por meio do qual fique claro que os mesmos não são os culpados pela separação dos pais.

Como nenhuma verdade é absoluta, é necessário bom senso para não se cometer injustiças. O maior problema é que, quando se trata de família, com laços afetivos, os sentimentos afloram à pele, tomando o ser humano, inúmeras vezes, impulsivo e descontrolado.

Denota-se, então, a importância de que os filhos de pais que litigam em juízo sejam ouvidos por profissionais capacitados, para viabilizar a distinção entre os seus verdadeiros sentimentos e necessidades, e atos abusivos do genitor ou do guardião, afastando a alienação parental da criança ou adolescente.

 

 

 

 

 

3 MEDIDAS PREVENTIVAS A ALIENAÇÃO PARENTAL

 

A alienação parental é um mal que assola muitas famílias, causando efeitos nefastos à sociedade, sobretudo à criança e ao adolescente que são usados como objeto de vingança, castigo e retaliação contra genitor alienado. Nesse contexto, é preciso conscientizar a sociedade da relevância de se prevenir esse mal, o que pode ser feito por meio do planejamento familiar e do exercício da paternidade responsável.

Quando há a ruptura do afeto, em que os casais se separam, guarda compartilhada também se apresenta como forma eficaz de prevenção à alienação parental, devendo ser incentivada e implementada que possível, conforme o caso concreto.

A multidisciplinaridade pode atuar como um agente facilitador nas hipóteses em que houver dificuldade em se estabelecer da guarda compartilhada. Por outro lado, urna vez constatada a prática da alienação parental, também será importante um acompanhamento interdisciplinar, envolvendo advogado, juiz, assistente social e psicólogo, a fim de restabelecer os laços afetivos entre a criança ou o adolescente e o genitor alienado, além de possibilitar acompanhamento adequado ao agente alienador.

Diante disto, é necessário garantir-se o pleno acesso à justiça às famílias que sofrem alienação parental, especialmente por meio da mediação familiar, que possibilita um diálogo entre as partes, como devido acompanhamento  multidisciplinar,  mostrando-se como  uma resposta célere e eficaz para a solução amigável do conflito.

 

4.1 Planejamento Familiar e a Paternidade Responsável

 

A CF, no § 7° do art, 226[1], apresenta o principio da paternidade responsável, estimulando o planejamento familiar, urna vez que o nascimento de filhos demanda recursos de natureza física, social e econômica, o que importa na necessária consciência do casal em relação aos deveres oriundos desse processo de escolha.

A paternidade responsável, como principio, está igualmente prevista nos artigos 3° e 4° do Estatuto da Criança e do Adolescente, e ainda, no inc. IV do art. 1.566 do CC, podendo ser conceituada como assevera Cardim (2014, p. 12),  "a obrigação que os pais têm de provera assistência moral, afetiva, intelectual e material aos filhos”.

De todo modo, os pais devem explicar aos filhos e deixar claro, por meio de suas atitudes, que romperam apenas a relação conjugal, mas que, quanto aos filhos, nada mudou. Os pais devem manter e incentivar os laços parentais da criança, proporcionando um desenvolvimento saudável mediante uma ampla convivência com ambos os genitores, evitando assim, a prática da alienação parental.

 

4.2 Guarda Compartilhada

 

A guarda é um dos deveres inerentes ao poder familiar (art. 1.634, II, CC) e à tutela (art. 36, parágrafo único, parte final da Lei n. 8.069/90) tendo como prioridade, os interesses e à proteção da criança e adolescente, obrigando seu detentor a prestar assistência material, moral e educacional, atribuindo ao menor a condição de dependente do guardião para todos os fins, até mesmo previdenciário, possibilitando ampla proteção.

A utilização da denominação guarda, usada pelo CC e pelo ECA, apesar de ambos importarem na proteção integral do menor, possuem significados diversos. No CC, a criança ou adolescente fica na posse dos dois genitores (guarda compartilhada) ou de somente um deles (guarda uniparental ou exclusiva) preservando ao outro o direito de visitas e fiscalização, possuindo, ambos, o poder familiar. No ECA a guarda é substituta, pois diz com a situação do menor de não poder conviver com qualquer dos pais, uma vez que estão com os seus direitos ameaçados ou infringidos. Tem cabimento para regularizar direitos ameaçados ou violados. Tem cabimento para regularizar a posse de fato como medida liminar ou incidental nos procedimentos de tutela e adoção ou como medida especifica de proteção por falta, abuso ou omissão dos pais, do Estado ou em razão de sua própria conduta (arts. 33, §§ 1° e 2°, e 101, VIII, do ECA), podendo a sua perda ser aplicada aos pais que não cumprem os deveres (art. 129, VIII, ECA). Para Carvalho (2013, p. 60):

No interesse do menor, excepcionalmente, a guarda pode, portanto, ser deferida judicialmente para colocação em família substituta fora dos casos de tutela e adoção, para regularizar a posse de fato, para atender a situações peculiares, como o menor abandonado ou órfão, suprir a falta eventual dos pais ou aplicada como medida de proteção, inclusive mediante acolhimento institucional ou inclusão em programa de acolhimento familiar, podendo ser deferido ao guardião o direito de representação para a prática de atos determinados e conferido o direito de opor-se a terceiros, inclusive aos pais.

A guarda dos menores destina-se, assim, a regularizar a posse dos filhos com ambos os cônjuges, com um deles, ou até mesmo com terceiros, atribuindo, nesta hipótese, a condição de dependentes para todos os fins e efeitos, obrigando à prestação de assistência material, moral e educacional, conferindo ao detentor o direito de opor-se a terceiros, inclusive aos pais, e podendo ser deferido o direito de representação para a prática de atos determinados (art. 33, ECA). Diniz (2007, p. 285) salienta que:

A guarda é um conjunto de relações jurídicas existentes entre o genitor e o filho menor, decorrentes do fato de estar sob seu poder e companhia. Assumindo, a responsabilidade de sua criação, educação e vigilância, cabendo-lhe decidir sobre a educação do menor e sua formação religiosa, competindo ao outro genitor, que não a possui, o direito de visita e o de fiscalizar a criação do filho, não tendo poder decisório. Denomina de guardião continuo o que detém a guarda, o genitor-guardião, o que possui a titularidade do exercício do poder familiar, enquanto o outro genitor que não possui a guarda é o guardião descontínuo, sendo titular do direito de visita.

A guarda conferida a um dos genitores não importa em perda do poder familiar do outro ou afasta da criança ou adolescente o direito de conviver com ambos os pais (art. 1.632, CC). Confere, entretanto, ao guardião o poder decisório na criação e educação no melhor interesse do filho, cabendo ao outro a fiscalização e o dever de recorrer ao juiz quando a guarda estiver sendo exercida de maneira prejudicial ao menor.

 

4.2.1 Modalidades de guarda

 

A doutrina e a jurisprudência reconheciam aguarda unilateral e aguarda compartilhada, até que a Lei n° 11.698, de 13 de junho de 2008, introduziu a guarda compartilhada na legislação, dispondo o art. 1.583, caput e § 1°, que:

Art. 1.583. A guarda será unilateral ou compartilhada.

§ 1° Compreende se por guarda unilateral a atribuída a um só dos genitores ou a alguém que o substitua (art. 1.584, § 5°) e por guarda compartilhada a responsabilização conjunta e O exercício de direitos c deveres do pai c da mãe que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos comuns.

A guarda unilateral, exclusiva ou não dividida é a tradicional no direito brasileiro, atribuída a um só dos genitores ou terceiros, e regulada nos §§ 2° e 3° do art. 1.583 do CC  e, especialmente, no art. 33, § 1° e caput, da Lei n° 8.069/90 (Estatuto da Criança e do Adolescente) ao dispor que a guarda destina-se a regularizar a posse de fato e ainda que obriga à prestação de assistência material, moral e educacional à criança ou adolescente, conferindo a seu detentor o direito de opor-se a terceiros, inclusive aos pais. Ao permitir que o guardião oponha-se a terceiros, inclusive aos pais, confere-lhe o exercício exclusivo da guarda, unilateralmente, no melhor interesse do menor. Cabe ao genitor que não a detenha supervisionar os interesses dos filhos.

Na hipótese de não ser recomendável  os filhos permanecem em companhia do pai ou da mãe, o juiz deferirá a guarda a pessoa idônea, no melhor interesse da criança e do adolescente, dando preferência aos parentes, como avós, tios, irmãos mais velhos, ou a pessoas sem vínculo do parentesco, privilegiando os laços de afinidade e afetividade (art. 1.584, § 5°).

Na nova redação do art. 1.583, introduzida pela Lei n° 11.698/2008, dispõe o CC, nos §§ 2° e 3°, que:

Art. 1.583 [...]

§ 2° A guarda unilateral será atribuída ao genitor que revele melhores condições para exercê-la e, objetivamente, mais aptidão para propiciar aos filhos os seguintes fatores:

I - afeto nas relações com o genitor c com o grupo familiar;

II - saúde e segurança;

III - educação.

§ 3° A guarda unilateral obriga o pai ou a mãe que não a detenha a supervisionar os interesses dos filhos.

A guarda unilateral será atribuída, portanto, ao genitor que revele aptidão e melhores condições de exercê-la, considerando o afeto nas relações com o filho e com o grupo familiar, permi­tindo-se considerar as relações do menor também com os avós e parentes do guardião, a saúde, a segurança e a melhor educação do menor, cabendo ao outro supervisionar o exercício nos inte­resses dos filhos (art. 1.583, §§ 2o e 3o, CC).

A guarda compartilhada, ou conjunta, ou alternada, ocorre quando os pais conjuntamente se responsabilizam pela criação e educação dos filhos ao mesmo tempo, decidindo de comum acordo. A guarda compartilhada, ensina Freitas, (209, p. 37), surgiu para diminuir a distância da criança ou adolescente em relação ao pai ou à mãe que não compartilha o mesmo lar, diante do novo enfoque do direito de família que privilegia o melhor interesse da prole. Segundo Carvalho (2013, p. 62):

Apesar de tratar-se de um mesmo arranjo familiar, dividindo-se entre os pais as responsabilidades e decisões sobre os filhos, em conjunto, a doutrina distingue a guarda conjunta da divida ou compartilhada propriamente dita.Na guarda conjunta o menor possui moradia com apenas um dos genitores, mantendo livre a visitação do outro, ou seja, apenas um possui a guarda física, mas o outro participa de todas as decisões no seu exercício, ambos os pais exercem e partilham conjuntamente a autoridade e decisões.

                Conforme preleciona Freitas (2009, p. 37):

Na guarda compartilhada propriamente dita ou dividida também a guarda física é dividida, vivendo o menor alguns períodos com o pai e outros com a mãe. O filho possui dois lares, dividindo o período de vida entre as residências dos genitores, sendo que autoridade parental é exercida por ambos conjuntamente.

            Ainda, de acordo com Freitas (2009, p. 37):

Nesta modalidade privilegia-se a ideia de estar com e de compartilhar, não existindo conotação de posse, pois é sempre voltada para o melhor interesse da criança ou do adolescente e, consequentemente, dos pais. Exige-se, entretanto, para que tenha sucesso, total acordo entre os pais.

A guarda física compartilhada inclui também , segundo Carvalho (2013, p. 63):

A guarda alternada, entretanto também esta se distingue da compartilhada propriamente dita ou dividida. Nas duas subespécies a guarda física é compartilhada, mas na alternada a autoridade parental é exercida exclusivamente durante o período que o guardião possui a guarda física, resguardando ao outro o direito de visitas e fiscalização. Neste arranjo de guarda, todavia, não existe compartilhamento, pois a diferença da guarda unilateral comum é a alternância. Trata-se, na realidade, de uma espécie de guarda unilateral exercida por períodos alternados entre os pais, sem cooperação, reservando ao outro apenas o direito de visitas e fiscalização, o que é muito criticado na doutrina por criar instabilidade e insegurança no menor.

A doutrina ressalta ainda a possibilidade de guarda compartilhada mediante nidação ou aninhamento, de pouca viabilidade na prática e raramente utilizada, que consiste em alternação de convivência com o filho no mesmo lar, ou seja, permanece a criança na residência e cada um dos pais reside com ele por um período, mantendo o menor no ninho.

A guarda unilateral ou compartilhada, segundo Carvalho (2013, p. 64)  pode ser fixada por determinado período, considerando os interesses do filho, requeridas por consenso pelos pais ou decretada pelo juiz, atendendo às necessidades específicas do filho e observando a distribuição de tempo necessário ao convívio deste com o pai e com a mãe.

O ECA prevê ainda a guarda institucional, ao regular a inserção da criança e do adolescente em situação de risco em programas de acolhimento familiar ou institucional, de caráter provisório e excepcional, utilizados como forma de transição para, preferencialmente, reintegração do menor na família, e, na impossibilidade, a integração em família substituta. A inclusão em programa de acolhimento familiar prevalece sobre o acolhimento institucional, possibilitando a convivência familiar (art. 34, § 1°).

Nas duas hipóteses devem ser preservados os vínculos familiares e promovida a reintegração familiar, promovendo visitas e contato com os pais, salvo determinação judicial em contrário por motivo justificável ou o menor estiver em preparação para adoção, devendo a situação da criança e do adolescente ser reavaliada a cada seis meses, e não permanecer institucionalizada por prazo superior a dois anos (arts. 19, §§ 1° e 2°, e 33, § 4°, RCA).

Ao ser inserido em acolhimento familiar ou institucional, ainda que temporário, é necessário nomear um responsável pela pessoa em desenvolvimento, dispondo a lei que a pessoa ou casal cadastrado em programas de acolhimento familiar poderá receber a criança ou adolescente, mediante guarda e ainda que o dirigente de entidade que desenvolve programa de acolhimento institucional é equiparado ao guardião para todos os efeitos de direito (arts. 34, § 2°, e 92, § 1°, ECA).

Assim, a pessoa ou casal cadastrado em acolhimento familiar recebe o menor mediante guarda, sem excluir dos genitores o dever de prestar alimentos, e o dirigente da instituição que o acolher é equiparado ao guardião para todos os efeitos.

 

4.3 Busca da Efetivação da Justiça

 

A multidisciplinaridade pode atuar como um agente facilitador nas hipóteses em que houver dificuldade em se estabelecer a guarda compartilhada. Por outro lado, urna vez constatada a prática da alienação parental, também será importante um acompanhamento interdisciplinar, envolvendo advogado, juiz, assistente social e psicólogo, a fim de restabelecer os laços afetivos entre a criança ou o adolescente e o genitor alienado, além de possibilitar  acompanhamento adequado ao agente alienador. Segundo Sales (2002, p. 103):

É de suma importância que os operadores do direito possam atentar para a contribuição dos aspectos psíquicos imperativos envolvidos num processo de decisão de tal ordem e que influi e m tantos destinos. É necessário considerar, principalmente, os aspectos psíquicos que envolvem a criança, os requerentes da guarda e o vínculo existente entre eles. Deve ser considerado, também, que há aspectos subjetivos implicados em cada um dos membros envolvidos num processo de disputa de guarda, como: juízes, advogados, promotores e técnicos habilitados a elaborar laudos psicossociais.

Deste modo, se observado qualquer indício de alienação, o juiz determinará perícia psicológica ou biopsicossocial envolvendo os pais e os filhos, no intuito de constatar a prática de alienação e indicar as melho­res alternativas de intervenção, conforme determina o art   5o da   Lei 12 318/2010.  Isto porque, segundo Sales (2002, p. 104):

Todos os casos de acusação de abuso sexual devem se r investigados levando-se em conta duas alternativas: sua veracidade ou sua falsi­dade. Cabe aos profissionais saber manter distanciamento e neutrali­dade necessários na apuração dos dados. Uma boa forma de se al­cançar uma postura mais isenta e segura ê trabalhar em equipe, pela visão multifacetada dos clientes em questão.

A atuação conjunta de psicólogos e assistentes sociais junto ao processo no qual há a disputa da guarda dos filhos, é de extrema relevância, não só para constatar se de fato ocorre alienação parental naquela família, mas, também, para examinar se não há uma falsa acusação de alienação parental, o que pode causar efeitos ainda mais nefastos do que a própria síndrome, uma vez que de acordo com Correia (2014, p. 41):

A principal vítima dentro dessa relação ê a criança e o adolescente, e, por conseguinte esta é a destinação do texto legal. Essa vítima precisa ser ouvida e estudada atentamente por equipe multidisciplinar de psicólogos, assistentes sociais e psiquiatras, que deverão oferecer um parecer técnico do caso, com a maior brevidade possível. Recentemente podemos (SIC) observar um caso verídico, que ocorreu na quinta Vara de Família da Comarca de Nova Iguaçu -  Rio de Janeiro, que corrobora com esta afirmativa: a menina de cinco anos Joanna Cardoso Marcenal Rodrigues Marins que foi revertida à guarda da mãe ao pai, sob a alegativa falsa de alienação parental por parte da mãe, e dois meses depois estava morta por negligência e maus tratos paternos. Vários pareceres contraditórios e intempestivos foram despachados, tornando o desfecho desde caso um triste exemplo de inoperância do sistema.

O fato é que o Juiz, o advogado ou mesmo o promotor, não possuem conhecimentos técnicos para detectar a ocorrência da alienação parental ou, ao contrário, urna falsa acusação dessa prática Daí a relevância de um acompanhamento especializado, cujos laudos fornecerá os subsídios necessários ao Juiz, para um julgamento voltado ao melhor interesse da criança e do adolescente. Para Guimarães (2014. p. 43):

Diante da importância dos aspectos subjetivos, enfatiza-se a necessidade de contar com uma equipe multidisciplinar formada por profissionais habilitados como psicólogos, psiquiatras e assistentes sociais para auxiliar os operadores do direito. Estes técnicos têm preparo para avaliar cuidadosamente a demanda de quem requer a guarda, suas condições não só materiais de sustentar e fornecer um ambiente adequado à criança, bem como suas condições psíquicas, investigando as motivações conscientes e inconscientes para requerer a guarda, considerando sua história de vida, os vínculos e afetos de cada genitor. É importante estar atento ao que representa a  atribuição guardião para cada um dos genitores ou mesmo para um terceiro que venha a requer a guarda.

Aliás, a importância de um acompanhamento multidisciplinar é observada não só quando se vislumbram indícios de alienação parental. Sempre que houvera disputa de guarda dos filhos, será necessária atuação de profissionais habilitados para o acompanhamento psicossocial àquela família, denotando-se, deste modo segundo Sales (2002, p. 106), a importância, a seriedade, a responsabilidade e a amplitude do tema que encerra um processo com­plexo, onde inúmeros aspectos, não só jurídicos, mas também psíquicos, estão implicados e devem ser valorizados. Ainda, segundo o autora:

Contudo, para melhor aplicação da guarda compartilhada nos casos litigiosos concretos, que batem á porta do Judiciário, os Magistrados, os membros do Ministério Público, os Defensores Públicos e os Ad­vogados devem recorrerão auxílio técnico de equipe multidisciplinar, formada, pelo menos, por Assistentes Sociais e Psicólogos, que devem acompanhar a demanda, através de entrevistas individuais, com o grupo familiar e visitas sociais (á escola da criança ou adolescente a residência de cada um dos pais.

A própria Lei 1231/2010 estabelece os criténos para as avaliações necessánas e os passos que o profissional deve observar, ao realizar a perícia, conforme vislumbra-se especificamente no § 1° do art. 5°, ao estabelecer:

Art. 5°. § 1°. O laudo pericial lera base em ampla avaliação psicológica ou biopsicossocial, conforme o caso, compreendendo, inclusive, entrevista pessoal com as partes, exame de documentos dos autos, histórico do relacionamento do casal e da separação, cronologia de incidentes, avaliação da personalidade dos envolvidos e exame da forma como a criança ou adolescente se manifesta acere a de eventual acusação contra genitor.

Já o § 2° do art. 5° da Lei 12.318/2010 determina a realização de perícia por um profissional ou por uma equipe multidisciplinar, com habilitação específica para atuar nestas situações, e que esteja m aptos a diagnosticar a presença da alienação parental

Art 5o. § 2o. “A pericia será realizada por profissional ou equipe mul­tidisciplinar habilitados, exigido, em qualquer caso, aptidão comprovada por histórico profissional ou acadêmico para diagnosticar atos de alienação parental”.

De acordo corno § 3o do art. 5o da Lei 12 318/2010, o prazo pa­ra a apresentação do laudo pericial é de 90 dias, sendo que no processo terá tramitação, se constatado qualquer indício de alienação parental, conforme determina o art. 4o da referida Lei:

Art. 4o. Declarado indicio de ato de alienação parental, a requerimen­to ou de oficio, em qualquer momento processual, em ação autônoma ou incidentalmente, o processo lera tramitação prioritária, e o juiz determinará, com urgência, ouvido o Ministério Público, as medidas provisórias necessárias para preservação da integridade psicológica da criança ou do adolescente, inclusive para assegurar sua convivên­cia com genitor ou viabilizar a efetiva reaproximação entre ambos, se for o caso.

Quando a disputa da guarda está sendo discutida através da mediação familiar, também será necessária a atuação multidisciplinar. Além de atuar como agente facilitador na solução do conflito, poderá observar, com mais clareza e profissionalismo, se há indícios de alienação parental no caso concreto. Ressalta-se, ainda, que na utilização desse método alternativo de solução de conflitos/mediação, poderá valer-se no desenvolvimento dos trabalhos, durante as reuniões, de comediadores, a saber: psicólogos, assistentes sociais, psicoterapeutas, psicanalistas, posto que, muitas vezes, a raiz do conflito não reside numa questão jurídica envolvendo pessoa com pessoa, ou com pessoas relacionadas a bens. A interdisciplinaridade, aqui, ê uma exigência para b em pacificaras relações dos sujeitos em conflito de interesses.

É preciso que os operadores do Direito tenham conhecimento da relevância da atuação multidisciplinar em demandas   que envolvam conflitos familiares, pois, sem o auxilio de profissionais habilitados a trabalhar e entender os sentimentos das pessoas, que normalmente já estão fragilizadas diante da ruptura familiar, sob pena de se deparar com julgamentos com objetividade, mas que, na verdade, não se coadunam com a realidade e a necessidade das pessoas envolvidas naquela questão. Para Silva (2003, P. 4):

Mas, apesar desse crescimento, esse campo ainda e desconhecido ou não adequadamente explorado por diversos setores do Judiciário e até mesmo pelos próprios psicólogos. Como consequência, muitas decisões judiciais acabam se baseando exclusivamente na objetividade jurídica, porque muitos juízes ainda insistem em dispensar o suporte que a Psicologia pode lhes trazer, e que poderia tornar as sentenças efetivamente voltadas para os interesses afetivos das pessoas envolvidas em juízo, principalmente quando se trata dos direitos e garantias fundamentais de crianças e adolescentes.

A multidisciplinaridade é tão importante, na hipótese de configurar-se a alienação Dias  (2007, p. 103) assevera, por seu turno, que hodiernamente "[...] não há como desvincular o novo direito de família do direito da criança e do adolescente, [...]", advertindo em seguida, acerca da necessidade de que "[...] se invista em ações marcadas pela interdisciplinaridade, sem perder de vista a aplicação dos princípios da dignidade da pessoa humana e da prioridade absoluta à infância e manutenção ao comando constitucional vigente”.

Nas relações familiares deve ser incentivado o desenvolvimento e a solidificação do afeto, de modo a respeitar o melhor interesse da criança e do adolescente, de modo que as situações incompatíveis comesse novo paradigma devem ser tolhidas pelo Estado, seja por meio do Poder Judiciário, seja através da mediação familiar, sempre com o devido acompanhamento multidisciplinar que demanda cada caso concreto.

É de fundamental importância, portanto, que o processo de ruptura familiar e de discussão de guarda dos filhos se desenvolva de modo a minimizar os sofrimentos e traumas de todos os familiares envolvidos, o que representa a necessidade de uma justiça de família mais eficiente, que atenda os conflitos de sua seara, contribuindo sobremaneira para a promoção da dignidade humana.

 

4.4 Alienação Parental e o Acesso à Justiça

 

O homem, como um ser social e vivendo em comunidade, muitas vezes encontra-se em situação de choque de interesses com outrem. Nesse diapasão, os conflitos originam-se dos embates entre os interesses individuais decorrentes da vida em sociedade.

De acordo com Colucci (1997, p. 16), da vida em sociedade pode configurar-se:

 

Um conflito de interesses todas as vezes que, para um mesmo bem, se voltam as atenções de pelo menos dois indivíduos, havendo da parte de ambos uma tal intensidade de interesse em relação ao mesmo bem, que a exclusão do interesse contrário é a meta de ambos.

Observa-se que os conflitos normalmente decorrem dos interesses em choque, voltados a determinado bem, podendo ocorrer em duas situações distintas.

Esses conflitos caracterizam-se por situações em segundo Cintra (2004, p. 20) que uma pessoa, pretendendo para si determinado bem, não pode obtê-lo, seja porque (a) aquele que poderia satisfizer a sua pretensão não a satisfiz, seja porque (b) o próprio direito proíbe a satisfação voluntaria da pretensão. Para Ruiz e Gazola (2010, p. 167):

O convívio, porém, vícios, ambições, emoções, desequilíbrios de razão, enfim, vários são os motivos existentes que ensejam discórdia e conflitos de interesses, acontecendo principalmente quando se extrapolamos próprios limites, invadindo o direito do próximo.

 Isto se explica tendo em vista que Schnitman (1999, p. 170):

[...] os conflitos são inerentes à vida humana, pois as pessoas são diferentes, possuem descrições pessoais e particulares de sua realidade e, pós-conseguinte, expõem pontos de vista distintos, muitas vezes colidentes. A forma de dispor tais conflitos mostra-se como questão juridamental quando se pensa em estabelecer harmonia nas relações cotidianas. Pode-se dizer que os conflitos ocorrem quando ao menos duas partes independentes percebem seus objetivos como incompatíveis; por conseguinte, descobrem a necessidade de interferência de outra parte para alcançar suas metas.

Quando se configurar urra resistência ou proibição jurídica à satisfação voluntária dos interesses individuais, a insatisfação será o resultado desses conflitos, que denota angústia e tensão, causando sofrimento e infelicidade ao indivíduo. Para Cintra (2004, p. 22):

A tarefa da ordem jurídica é exatamente a de harmonizar as relações sociais intersubjetivas, afim de ensejara máxima realização dos valores humanos com o mínimo de sacrifício e desgaste. O critério que deve orientar essa coordenação ou harmonização é o critério do justo e do equitativo, de acordo com a convicção prevalente em determinado momento e lugar.

A vida em sociedade possui como característica a existência de conflitos que, para que se garanta a harmonia e a pacificação social, devem ser resolvidos da maneira mais rápida e justa possível, sendo necessário disponibilizar-se á sociedade, ferramentas e técnicas adequadas para a resolução de tais conflitos.

Esses conflitos de interesse devem ser resolvidos porque configuram uma situação de desequilíbrio nas relações intersubjetivas existentes na sociedade, representada por violação a lei ou a   contrato, ou pretensa violação, ou ainda, ameaça a direitos.

Segundo o entendimento de Correia (2007, p. 36), na medida em que se configura "a violação daquilo que é atribuído a cada um segundo a norma de conduta jurídica, abre-se ensejo à faculdade de se buscar a segurança jurídica, com o reconhecimento da mácula ao direito e suas consequências".

Neste caso, a segurança jurídica é fundamentada no Direito, na medida em que  o Estado, corno provedor da pacificação social, deve garantir o acesso à justiça, lembrando que acesso à justiça não é sinônimo de acesso ao Poder Judiciário.

 Deste modo, para um efetivo acesso à justiça, é necessário que o  indivíduo  saiba  quais  são  os  seus  direitos  e  que  consiga  identificar  as situações de desrespeito ou mesmo de ameaça a seus direitos, buscando a solução não apenas pelas vias judiciais, mas, também, como meios alternativos, pelos métodos extrajudiciais de resolução de conflitos.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

 

E inegável a constante evolução da família em nossa sociedade, principalmente a partir dos anos 60 quando as mulheres passaram a conquistar espaços até então por elas não ocupados. Exigem-se, assim, novas configurações acerca dos papéis exercidos, pois passaram a contribuir ativamente com o orçamento doméstico e, consequentemente, estabeleceram novas práticas de convívio dentro e fora do lar.

Como toda a relação humana, os relacionamentos conjugais e afetivos são pautados em sentimentos decorrentes da influência psicológica dos sujeitos, na qual permeiam descontentamentos, problemas e crises que, se não superados, podem levar um casal a romper os vínculos conjugais.

A desconstituição desse vínculo e a separação dos ex-companheiros constituem um processo difícil e doloroso, envoltos em uma série de emoções extremas e violentas que perpassam além da vida íntima dos membros envolvidos, os demais indivíduos que fazem parte daquele núcleo familiar, levando igualmente o sofrimento aos filhos e outros parentes.

Em decorrência de tais desentendimentos entre os ex-cônjuges é a instalação de conflitos familiares que respingam em todos os entes daquele núcleo, o que mais sofre e perde sem deter nenhuma culpa é a prole daquele casal, principalmente por constituir-se como instrumento capaz de atingir o outro e, visto por um dos genitores como um meio de promover vingança por ele estar causando tanto sofrimento.

Pelo fato da criança ou o adolescente estar em uma importante fase do desenvolvimento psíquico e sua formação ainda não estar completa, ainda não tem condições de separar o que de fato é de sua responsabilidade ou não, e pode passar a sentir-se culpado da situação e agir como alienado de um dos pais, geralmente do genitor guardião, que é aquele com quem tem mais convívio.

Assim, com o advento da Lei 12 31/2010, que trata da alienação parental, determina que o juiz poderá advertir e imitar o responsável, ampliar o regime de visitas em favor do genitor excluído, determinar urna intervenção psicológica monitorada ou a mudança para guarda compartilhada ou sua inversão, e até mesmo suspender o poder familiar do alienante.

 

 

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[1] Art. 226, § 7º, CF: Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas.

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