ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO
Por Marlete Meira de Souza | 28/01/2011 | EducaçãoALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO
Marlete Meira de Souza
28/01/11
RESUMO
Com análise das teorias de Piaget, Vygotsky e Ferreiro e suas contribuições à alfabetização, tirando-a de uma simples memorização de códigos e letras para uma função mais especifica, que é sua função social. Mediante os estudos feitos pode-se pensar nos fatores que interferem no processo de alfabetização e redefinir a posição da escola neste novo cenário de mudanças aceleradas e desordenadas da sociedade contemporânea.
Palavras-chave: Alfabetização; Letramento; Processo Ensino-Aprendizagem; Construtivismo.
1 INTRODUÇÃO
Para efetivação deste trabalho que ora se apresenta faz-se necessário analisar à alfabetização numa perspectiva construtivista e progressista diferente daquela tradicionalmente conhecida através dos métodos analítico e sintético que perduraram por muito tempo no processo de aquisição da leitura e escrita.
Portanto, este trabalho opta por analisar outros métodos destinados a alfabetizar crianças, levando em consideração critérios das propostas pedagógicas subjacentes a tais propostas tradicionais.
Apresenta como objetivo propor uma metodologia de alfabetização e letramento com base no pensamento construtivista e progressista, fazendo uma reflexão da alfabetização através dos pensamentos de autores como: Piaget, Vygotsky e Ferreiro, e analisando os fatores que interferem no processo de alfabetização.
Os métodos tradicionais de alfabetização não ofereciam mais que reprodução, incitações, práticas rituais ou conjunto de proibições, cujo objetivo era a instrução sistemática da aprendizagem com exercícios motores de habilidades especificadas por alguém.
Essa visão simplista do processo de alfabetização gerou a perda de sua especificação, portanto, tornou-se um do mais relevante problema de fracasso na aprendizagem brasileira, evidenciadas principalmente nas séries iniciais do ensino fundamental por meio da reprovação, repetência e evasão, causando uma massa desfavorecida, marginalizada e excluída socialmente por não possuírem as habilidades básicas da leitura e escrita.
A perspectiva psicogenética foi quem mais influenciou a mudança de concepção do processo de alfabetização, onde o processo de construção da representação da língua escrita deixa de ser apenas dependente de estímulos externos para aprender ? centrada nos métodos tradicionais de alfabetização ? e passa a reconstrução desse sistema na interação da língua escrita com seus usos e práticas sociais, onde o sujeito que aprende é ativo e partícipe desse processo rejeitando uma ordem hierárquica de habilidades pré-determinada.
2 ALFABETIZAÇÃO E LETRAMENTO
O processo de alfabetização baseava anteriormente, em função da relação método utilizado X maturidade da criança, considerando assim como dois pólos distintos do processo. Durante muito tempo a alfabetização foi entendida como mera sistematização do "B + A = BA", isto é, como a aquisição de um código fundado na relação entre fonemas e grafemas. Em uma sociedade constituída em grande parte por analfabetos e marcada por reduzidas práticas de leitura e escrita, a simples consciência fonológica que permitia aos sujeitos associar sons e letras para produzir/ interpretar palavras ou até mesmo frases curtas parecia ser suficiente para diferenciar o alfabetizado do analfabeto.
Contudo a prática alfabetizadora nos últimos anos tem se centrado mais nos métodos utilizados: Método sintético X método analítico, sem levar em consideração as concepções das crianças em relação ao que já traz consigo como conhecimento. Os métodos ? como seqüências ordenadas para atingir um objetivo ? não oferecia mais que reprodução, incitações, práticas rituais ou conjunto de proibições.
Os exercícios motores limitados apenas à repetição muito utilizados pelas cartilhas de alfabetização, têm dado suporte apenas a não criatividade e imaginação da criança. Não é mais admissível aceitar que é necessário para a criança resolver exercícios do tipo:
Ligue a vogal com a palavra que inicie com a mesma:
A IGREJA
E UVA
I AVIÃO
O ESCOLA
U OVO
A reprodução não propicia a criança à percepção da linguagem. A alfabetização tradicional era considerada como objeto de instrução sistemática, cuja aprendizagem suporia o exercício de habilidades especificadas por alguém.
Uma criança só produz textos ou se torna leitora de mundo a partir de sua experiência com a escrita na situação de leitor; se a situação de leitor é somente a de codificar por escrito aquilo que memorizou, portanto, faz de conta que compreendeu, não será capaz de produzir, ler, interpretar texto. Que texto se pode esperar de uma criança que executa uma seqüência de exercícios cujo objetivo seja basicamente a identificação de letras através da memorização e do treino? Porém, não se pode esquecer que alfabetizar esta intimamente ligada à própria experiência dos professores, enquanto alunos que foram, e enquanto leitores de mundo e escritores que devem ser, ou seja, esta ligada a prática social que abrange a todos: professor, aluno, família, comunidade e enfim todas as relações de produção da existência humana.
Com os estudos mais modernos foi possível repensar e analisar a prática escolar da alfabetização por meio de uma relação tríade: tem por um lado as concepções dos aprendizes (as crianças), como os que ensinam (professores) e por outro lado, o sistema de representação alfabética da linguagem e suas características.
Estes estudos nos levam a compreender o processo de alfabetização como interação e que inicia bem antes da escolarização.
O conhecimento da escrita começa muito antes da criança freqüentar uma escola. Portanto, sua origem é extra-escolar. Esse conhecimento evolui, muda com a idade dos sujeitos, e não é possível estabelecer uma relação direta entre o ensino sistemático e essa evolução, porque entre outras razões não se ensinava a ler e a escrever. (TEBEROSKY, 1997, p. 67)
A alfabetização se insere em um sistema de concepção e construção elaboradas que não pode reduzir a um mero conjunto de técnicas e métodos. A alfabetização não é simplesmente um produto escolar, mais sim um resultado do esforço de diversas partes interligadas ou um objeto cultural. O processo de alfabetização precede e excede os limites escolares.
2.1 DIFERENÇA ENTRE ALFABETIZAR E LETRAR
As práticas sociais de leitura e de escrita mais avançadas e complexas, que simplesmente as práticas do saber ler e do escrever, são resultantes da aprendizagem do sistema de escrita surgidos nos meados dos anos 1980 e que se dá, simultaneamente, a invenção do letramento no Brasil.
Assim sendo as práticas sociais de leitura e de escrita assumem a natureza de problema relevante, por que a população mesmo sendo alfabetizada, não dominava as habilidades básicas de leitura e de escrita necessárias para uma participação ativa na sociedade.
Como afirma (SOARES, 2004, p. 72):
Letramento é o que as pessoas fazem com as habilidades de leitura e escrita, em um contexto especifico, e como essas habilidades se relacionam com as necessidades, valores e práticas sociais. Em outras palavras, letramento não é pura e simplesmente um conjunto de habilidades individuais; é o conjunto de práticas sociais ligadas à leitura e a escrita em que os indivíduos se envolvem em seu contexto social.
No Brasil, os conceitos de alfabetização e letramento se confudem e perdem a especificação da alfabetização. Enquanto em outros paises a discussão do letramento aconteceu de forma independente da alfabetização, no Brasil essa discussão se dá entrelaçada no conceito de alfabetização o que tem levado de maneira inadequada a junção dos dois processos, com ênfase para o letramento.
O alfabetizado no Brasil era considerado aquele que declarava saber ler e escrever, isso era interpretado como a simples capacidade de escrever o próprio nome.
Somente em estudos mais recentes que tem tido uma progressiva mudança nesse conceito, onde alfabetizada é aquela pessoa capaz de ler e escrever um bilhete simples, ou seja, capaz de não só saber ler e escrever como também de exercer uma prática útil social de leitura e escrita. Há ai uma extensão do conceito de alfabetização em relação ao conceito de letramento: passando do simples ato de saber ler e escrever, para o ser capaz de fazer uso dessa como prática social.
2.2 UMA REFLEXÃO DA ALFABETIZAÇÃO ATRAVÉS DE: PIAGET, VYGOTSKY, FERREIRO.
2.2.1 PIAGET
A epistemologia genética de Piaget,é uma teoria construtivista de caráter interativo, entendendo o pensamento e a inteligência como processos cognitivos que tem sua base em um organismo ? biológico. É a partir da herança genética que o individuo constrói sua própria evolução da inteligência paralelo com a maturidade e o crescimento biológico da pessoa que, através da interação com o meio desenvolve também suas capacidades básicas para a subsistência: a adaptação e a organização.
2.2.2 Vigotsky
Para Vigotsky a aprendizagem é o resultado da interação do aprendiz com o ambiente através da sua experiência, compartilhada em um momento histórico e com determinantes culturais particulares. Essa aprendizagem como resultado dessa interação e de experiência não se transmite de uma pessoa a outra de forma mecânica, mais sim mediante operações mentais que se realiza na interação do sujeito com o mundo material e social. O fundamental do enfoque de Vigotsky consiste em considerar o individuo como resultado do processo histórico e social onde a linguagem desempenha um papel essencial. Para Vigotsky, o conhecimento é um processo de interação entre sujeito e o meio, mas o meio entendido social e cultural.
2.2.3 Ferreiro
Sua investigação produziu grandes transformações na alfabetização escolar. As investigações de Ferreiro demonstraram que, a questão crucial da alfabetização é de natureza conceitual, e não perceptual. Ela mudou radicalmente as concepções sobre a origem dos estudos da aquisição da leitura e da escrita.
Ferreiro começa sua análise na origem da psicogênese da língua escrita ? uma descrição do processo através do qual a escrita se constitui em objeto de conhecimento para a criança, transferindo assim, o foco de investigação do "como se ensina" para o "como se aprende" colocando a escrita no lugar que lhe cabe ? de objeto sociocultural de conhecimento - tirando da escola o monopólio da alfabetização.
Ferreiro introduziu uma nova didática da língua, onde a alfabetização é uma construção do conhecimento e não um lugar de acumulo de informações sem significado para a criança.
2.3 FATORES QUE INTERFEREM NO PROCESSO DE ALFABETIZAÇÃO.
Neste contexto de desenvolvimento é possível analisar alguns fatores que tem incidido para que assuma uma nova postura metodológica e pedagógica da alfabetização e do letramento. Estes fatores são:
? Afetivos: A afetividade compreende os estados de animo ou humor, os sentimentos, as emoções e as paixões, ou seja, a capacidade de experimentar sentimentos e emoções. Ela determina a atitude da pessoa diante das experiências cotidianas, promove os impulsos motivadores e inibidores, percebe os fatos de maneira agradável ou sofrível.
? Sociais: Pesquisas demonstram que o estatus sócio-econômico como salário, nível educacional, nível ocupacional, localização e condições habitacionais das famílias afetam diretamente no desenvolvimento da aprendizagem das crianças.
Os fatores sociais para Vygotsky desempenham um papel fundamental no desenvolvimento intelectual. A cultura estabelece um conhecimento que é internalizado e construído pelas crianças. Piaget reconheceu os fatores sociais no desenvolvimento intelectual que provoca desiquilibração e construção desse conhecimento. Os problemas de dificuldades na aprendizagem estão intimamente ligados às variáveis de classes. Quanto mais baixa é a origem sócio-econômico da criança, maior é o risco das dificuldades.
? Tecnológicos: Com o tempo, a superação do analfabetismo em massa e a crescente complexidade de nossas sociedades fazem surgir maiores e mais variadas práticas de uso da língua escrita. Tão fortes são os apelos que o mundo letrado exerce sobre as pessoas que já não lhes basta a capacidade de desenhar letras ou decifrar o código da leitura. Seguindo esta lógica de desenvolvimento, o final do século XX e inicio do século XXI impôs a praticamente todos os povos a exigência da língua escrita não mais como meta de conhecimento desejável, mas como verdadeira condição para a sobrevivência e a conquista da cidadania. Foi no contexto das grandes transformações culturais, sociais, políticas, econômicas e tecnológicas que o termo "letramento" surgiu ampliando o sentido do que tradicionalmente se conhecia por alfabetização.
3 CONCLUSÃO
Conclui-se que ainda há muito que aprimorar na tarefa de alfabetizar, e esta tarefa não é apenas do professor.
É preciso mudar o modo de enxergar e entender o processo de alfabetização, pois, durante muito tempo a alfabetização foi entendida como mera sistematização do "B + A = BA", isto é, como a aquisição de um código fundado na relação entre fonemas e grafemas. Em uma sociedade constituída em grande parte por analfabetos e marcada por reduzidas práticas de leitura e escrita, a simples consciência fonológica que permitia aos sujeitos associar sons e letras para produzir/ interpretar palavras ou até mesmo frases curtas parecia ser suficiente para diferenciar o alfabetizado do analfabeto.
A reprodução não propicia a criança à percepção da linguagem. A alfabetização tradicional era considerada como objeto de instrução sistemática, cuja aprendizagem suporia o exercício de habilidades especificadas por alguém.
Portanto, faz-se necessário analisar à alfabetização numa perspectiva construtivista e progressista diferente daquela tradicionalmente conhecida através dos métodos analítico e sintético citado anteriormente, inserindo neste contexto outros métodos destinados a alfabetizar crianças, levando em consideração critérios de analise que permite identificar propostas pedagógicas subjacentes a tais propostas tradicionais.
A alfabetização não é simplesmente um produto escolar, mais sim um resultado do esforço de diversas partes interligadas ou um objeto cultural. O processo de alfabetização precede e excede os limites escolares. Assim, como em outros processos de desenvolvimento cognitivo crianças chegam a descobrir os princípios fundamentais desse sistema antes mesmo de ingressarem à escola.
A formação de crianças leitoras e escritoras, numa perspectiva de alfabetização ampla, onde a leitura e a escrita sejam significativas e importantes, é um processo que pode e deve contar com a contribuição da Educação Infantil e das series iniciais do ensino fundamental, pois, é nela que a criança tem seu primeiro contato real com o mundo letrado, com o mundo da alfabetização, tornando assim terreno propício para desenvolver na criança desde cedo o gosto pela leitura. São inúmeras estas contribuições entre elas pode-se citar: o fortalecimento da comunicação gestual e oral entre educadores e crianças; a organização do espaço físico que permite interagir com seus pares, criando diferentes formas de manifestações através das brincadeiras, do contato com livros de histórias infantis, da expressão corporal através da música, das dramatizações e do faz - de conta, etc.... das salas de aula e espaços externos, que se constituem em espaços textualizados, elaborados com a cumplicidade das crianças, da escrita que pode aparecer com significado e funcionalidade para as crianças de varias maneiras: na receita do bolo, nas cartas para os amigos, no jornal que esta sendo elaborado, nos bilhetes e avisos, nos convites diversos, nos jogos de palavras, nos bingos de letras, nas visitas diversas ao museu, à biblioteca, ao supermercado, na criação de textos de todos os tipos, etc... ou seja, no mundo imaginário da Educação Infantil e séries iniciais do ensino fundamental.
O desenvolvimento tecnológico tem acarretado inúmeras transformações na sociedade contemporânea, especialmente nos últimos anos. Diante deste cenário desafiador de novas maneiras de aprender e de ensinar incorporada nessa sociedade que também é virtual, na qual as dimensões tempo e espaço são percebidas como sendo mais flexíveis e mutáveis e onde a grande quantidade de informações é transmitida velozmente, a educação tem um papel desafiador de pensar novas práticas para atender essas demandas.
Porém, o que acontece no sistema educacional, em particular o brasileiro, é totalmente adverso; São na maioria das vezes professores em sala sem a devida especialização para o exercício do trabalho, escolas sem adaptação específicas aos meios tecnológicos ou ineficientes para atender a demanda; o que observa é que o desenvolvimento educacional não se da na mesma proporção do desenvolvimento social-tecnológico, acarretando o que se percebe hoje no Brasil milhões de pessoas analfabetas, desempregadas, crianças abandonadas, excluídas digital e socialmente, por que como afirmam os pensadores que fundamentam este trabalho ?elas têm conhecimento de letras, de códigos, sabem ler, ou seja,- são alfabetizadas ? porém, não sabem fazer uso social deste conhecimento de mundo, ou seja, - não são letradas.
Para concluir é preciso mudar o aprender, e isto demanda tempo, talvez muito tempo, que não acontece de uma hora para outra, porque requer forças de muitos segmentos, segmentos estes, que na maioria extrapolam o ambiente escolar. Como o social, econômico, tecnológico, político e muitos caminham alheios aos objetivos da educação.
O desafio da escola atual está em sua contribuição à redefinição dos saberes e dos valores aptos a participar dos processos de construção de novos cenários, num mundo ao mesmo tempo global e intercultural.
REFERÊNCIAS
BISCOLLA, Vilma Mello. Construindo a alfabetização. São Paulo: Pioneira, 1991.
FERREIRO, Emilia. A Construção do Conhecimento. Revista Viver Mente& Cérebro, Coleção ? Memória da Pedagogia, Edição Especial Nº 5.
------------------------------. Reflexões sobre Alfabetização. 25ª ed. ? São Paulo:
Cortez, 2000.
PIAGET, Jean. O Aprendizado do mundo. Revista Viver Mente & Cérebro.
Coleção Memória da Pedagogia, Edição Especial, Nº 1.
REVISTA VIVER MENTE&CEREBRO. Piaget ou Vygotsky: Uma Falsa Questão. Edição Especial: Vygotsky, pág 38 à 83.
SOARES, Magda. Letramento: Um tema em três gêneros. 2ª edição. Belo
Horizonte: Autêntica, 2004
TEBEROSKY, Ana. Aprendendo a Escrever: Perspectivas Psicológicas e
Implicações Educacionais. 3ª ed. São Paulo: Atica, 1997.
VYGOTSKY, Lev, Semenovich. Uma Educação Dialética. Revista Viver Mente&
Cérebro. Edição Memória da Pedagogia,
----------------------------------------------. Pensamento e Linguagem. 2ª ed. São Paulo:
Martins Fontes, 1998.