AFETIVIDADE, PRÁTICA PEDAGÓGICA E A APRENDIZAGEM SIGNIFICATIVA EM UMA ESCOLA INCLUSIVA.
Por Rosangela de Cassia Camarinho | 17/01/2024 | EducaçãoAFETIVIDADE, PRÁTICA PEDAGÓGICA E A APRENDIZAGEM SIGNIFICATIVA EM UMA ESCOLA INCLUSIVA.
“A alegria não chega apenas no encontro do achado, mas faz parte do processo da busca. E ensinar e Aprender não pode dar-se fora da procura, fora da boniteza e da alegria.”
Paulo Freire
RESUMO
O presente artigo visa refletir sobre a importância e contribuição da afetividade na prática pedagógica para uma aprendizagem significativa através de uma convivência agradável entre todos que estão envolvidos nos processos de aprendizagem e efetiva inclusão dos educandos. Entendendo que a inclusão escolar não se restringe à visão multifacetada da deficiência, mas o respeito pelas diferenças. Vejo a diferença como a especificidade de cada um, em seus múltiplos e complexos comportamentos. Destaco que durante as leituras, me deparei com inúmeros relatos e conclusões sobre o poder que a afetividade promove tanto na vida educacional, quanto social dos alunos. Sendo assim, entendo a afetividade ser um fator importante para a inclusão de qualquer educando, e uma mediadora entre a aprendizagem significativa e os relacionamentos desenvolvidos em todos os ambientes da escola, fortalecendo o aluno enquanto sujeito.
Palavras chaves: Afetividade. Prática pedagógica. Aprendizagem significativa.
INTRODUÇÃO
Não há como negar a interligação da afetividade e a aprendizagem, pois na escola a criança se relaciona emocionalmente com os colegas, professores e outros profissionais que atuam na unidade escolar. Onde se aprende a dividir as responsabilidades, a repartir tarefas, desenvolvem-se a cooperação e a produção em grupo com base nas diferenças e talentos de cada um e na valorização da contribuição individual para a consecução de objetivos comuns de um mesmo grupo. A interação entre colegas de turma, a aprendizagem colaborativa, a solidariedade entre alunos e entre o professor devem sempre ser estimuladas.
O que nos remete a refletir sobre a necessidade de pensar sobre este tema, na nossa prática pedagógica como facilitador do processo de ensino-aprendizagem e da inclusão despertando no aluno a motivação, a segurança e a melhora no seu desempenho escolar, a partir de atividades e atitudes que direcionam a um maior conhecimento de si e de suas possibilidades.
Aptidão, conhecimento e capacidade são características que acrescentam muito nos exemplos de práticas pedagógicas, assim como valores como a empatia, disposição, amor pela profissão e dedicação constante.
Uma educação inclusiva permeada de diversidade, exige dos professores uma busca por formação continuada para que pense em práticas pedagógicas que integrem os alunos, que valorizem as diferenças nas salas de aula, respeitando a produção do aluno, valorizando o que consegue fazer e incentivando o que pode vir a fazer garantindo uma aprendizagem significativa para seus alunos.
DESENVOLVIMENTO
A criança como um sujeito histórico que é, vivencia sua infância dentro do contexto histórico em que está inserida, compartilhando e produzindo, juntamente com os adultos, os valores culturais, sociais, econômicos e religiosos de seu tempo, ou seja, “[...] elas trazem a marca da geração a que pertencem” (AGOSTINHO, 2005 p. 73).
Atualmente sabemos que os primeiros anos de vida das crianças são fundamentais para seu desenvolvimento, englobando os aspectos físicos, emocionais, espiritual e cognitivo, que serão a base para a aprendizagem e interação com o mundo físico e social. No entanto, isso não deve ser levado em conta, olhando apenas para seu futuro, mas buscando proporcionar-lhe hoje espaços para que tenha uma vida plena. Esse entendimento mostra a diversos segmentos da sociedade, a importância de ampliar as ações para a infância.
Na Constituição de 1988, a educação das crianças de 0 a 6 anos é apresentada como um direito da criança e um dever do Estado, dever esse de ministrar um ensino que seja democrático e plural, tornando o espaço institucional da escola um lugar socialmente reservado para as crianças.
Desta forma, ela passa a ser vista como um sujeito possuidor de seus direitos. Entre esses direitos, a Constituição de 1988, reconhece a criança como uma pessoa em desenvolvimento que precisa de proteção contra todo tipo de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade, opressão e, prioritariamente, tendo direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, a profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade, a conviver em família e na sociedade e à proteção especial (capítulo VII, art. 227).
A educação infantil será o primeiro contato da criança com o universo escolar, sua visão do homem, do mundo e da sociedade está em construção e se constituíra nas relações sociais, na cultura que está inserida e no processo de ensino e aprendizagem no qual será envolvida.
Segundo o Referencial Curricular Nacional da Educação Infantil (BRASIL, 1998, p. 23, v.01):
Educar significa, portanto, propiciar situações de cuidados, brincadeiras e aprendizagens orientadas de forma integrada e que possam contribuir para o desenvolvimento das capacidades infantis de relação interpessoal, de ser e estar com os outros em uma atitude básica de aceitação, respeito e confiança, e o acesso, pelas crianças, aos conhecimentos mais amplos da realidade social e cultural.
A Base Nacional Comum Curricular (BNCC), é um documento que determina quais habilidades e competências devem ser desenvolvidas em cada ciclo da educação brasileira. O documento não tem o foco apenas na formação acadêmica dos alunos, mas também em suas competências emocionais.
A BNCC aborda a pedagogia afetiva nas competências gerais da educação básica, mostrando como ela é importante para o desenvolvimento dos alunos, pois sua autoconfiança aumenta pois ela se sente capaz de realizar o que é proposto para ela. Portanto, a afetividade é um fator de inclusão/exclusão escolar.
É através da interação com o educador e demais envolvidos na comunidade escolar, que a afetividade ganha campo e desenvolve autoestima, segurança, respeito e empatia, aumentando sua vontade de aprender. A realidade é que a base desse conceito está alicerçada no respeito mútuo.
O importante do ponto de vista afetivo é reconhecer e respeitar as diferenças que despontam como chamar pelo nome, mostrar que a criança está sendo vista, propor atividades que mostrem essas diferenças, dar oportunidades para que as crianças se expressem.
A afetividade, como empatia e sensibilidade, como respeito aos direitos do outro e à diversidade, mostra cada vez mais relevância no atual momento da educação inclusiva. Não à toa os estudos de Piaget, Vygotsky e Wallon tornaram-se a base de diversos estudos acerca do tema discutindo sobre as competências socio afetivas, para basear suas ações pedagógicas e transformar a relação professor e aluno em um momento mais rico no processo ensino-aprendizagem.
Afetividade e cognição se complementam e uma dá suporte ao desenvolvimento da outra. Para Piaget (1976), o afeto pode acelerar ou retardar o desenvolvimento das estruturas cognitivas. O afeto acelera o desenvolvimento das estruturas, no caso de interesse e necessidade, e retarda quando a situação afetiva é obstáculo para o desenvolvimento intelectual. A afetividade não explica a construção da inteligência, mas as construções mentais são permeadas pelo aspecto afetivo. Toda conduta tem um aspecto cognitivo e um afetivo e um não funciona sem o outro.
Jean Piaget (1896-1980) e Vygotsky (1896-1934) já atribuíam à importância da afetividade no processo evolutivo, mas foi Henry Wallon (1879-1962) que se aprofundou na questão. Ao estudar a criança, ele não coloca a inteligência como o principal componente do desenvolvimento, mas defende que a vida psíquica é formada por três dimensões - a motora, afetiva e cognitiva -, que coexistem e atuam de forma integrada. Wallon defende que o processo de evolução depende tanto da capacidade biológica do sujeito quanto do ambiente, que lhe afeta de alguma forma. Assim sendo, a afetividade é indispensável para o desenvolvimento humano.
Ele, com seus estudos, contribuiu para o reconhecimento da importância da afetividade na vida da criança. Wallon afirma, em suma, que a expressão emocional, o comportamento e a aprendizagem do ser humano são interdependentes.
"O espaço não é primitivamente uma ordem entre as coisas, é antes uma qualidade das coisas em relação a nós próprios, e nessa relação é grande o papel da afetividade, da pertença, do aproximar ou do evitar, da proximidade ou do afastamento.” Henri Wallon
Wallon compreende que as emoções têm por função garantir as necessidades básicas do ser humano no início de sua vida. E a partir da convivência com o outro, essas emoções vão se modificando em movimentos expressivos. E assim, na interação com o outro que a criança vai adquirindo e se apropriando das mais diferentes formas de expressão.
Segundo Wallon (2005 apud BRUNO, 2012), o meio molda a personalidade humana, pois o modo como o ser humano reage a determinadas situações de afeto depende do mundo que o cerca.
A influência do meio principalmente para as crianças reflete bastante na sua personalidade quando passa a frequentar outro meio social, que não seja o familiar. Na educação, a escola é quem melhor pode promover a vida, de vivência plena, experimentação sem desperdício, expressando o valor da coletividade na individualidade de cada um, participando do cotidiano e produzindo conhecimentos por meio do afeto (CUNHA, 2010).
Mostra-se aqui a importância de uma educação pautada no afeto, onde família e escola se unem em prol de um desenvolvimento saudável, pois uma criança feliz é uma criança propensa à afetividade, fator relevante em seu processo de ensino e aprendizagem.
Tognetta e Assis (2006) destacam a importância do trabalho com afetividade na prática pedagógica em sala de aula, sugerindo também atividades que possibilitem aos alunos a expressão de emoções e sentimentos, inclusa aqui de formas diversas: através da oralidade, da expressão corporal, de dramatizações, da dança, de pinturas, desenhos, esculturas...; e o ambiente cooperativo.
O papel do professor é mediar e intervir nas atividades propostas que foram organizadas com alicerce nas necessidades de aprendizagem dos alunos, que ainda não tem autonomia para desenvolver sozinho, adotando o uso de materiais e estratégias criativas, estimulando sua vontade para participar de forma efetiva e construir seus conhecimentos partindo do que ele já sabe, e desta forma se apropriando de novos conhecimentos.
Professores comprometidos com a educação para a diversidade e para a inclusão de todos, necessitam de estar sempre se atualizando através de formação continuada que os habilitem a manter um olhar crítico para as necessidades dos alunos como sujeitos únicos, proporcionando uma aprendizagem significativa através de práticas pedagógicas partindo do que eles já sabem para que assimilem os novos conhecimentos em suas estruturas cognitivas e assim fortaleçam uma imagem positiva sobre si e suas capacidades.
Nunes, Saia, Tavares (2015, p.1.117) afirmam que: a diversidade presente na Educação Inclusiva não é um favor aos grupos historicamente excluídos, mas uma luta pela humanização de todos nós. Quando não conseguimos lidar com as diferenças que nos rodeiam perdemos uma oportunidade de caminhar na nossa própria evolução.
Para que possamos ter uma educação inclusiva é necessário verificar quais as mudanças que necessitam ser realizadas tanto pelos órgãos responsáveis pela educação e também pelas unidades escolares começando pelo seu Projeto Político Pedagógico que irá direcionar as ações necessárias de atualização, desenvolvimento de novos conceitos para que seja vista como um espaço de todos, reconhecendo as diferenças diante do processo educativo, adotando novas práticas pedagógicas no qual os alunos possam construir o seu conhecimento de acordo com suas capacidades, expressando suas ideias livremente, participando ativamente das atividades de ensino e assim se desenvolvendo como cidadãos, nas suas diferenças. Porque quando privamos os alunos de conviverem com outras crianças com dificuldades visuais, motoras, auditivas, intelectuais ou com outras diferenças marcantes tais como classe social, lugar de origem, religião, opção sexual etc., falhamos na sua formação.
Segundo Ausubel: Aprendizagem significativa é aquela em que ideias expressas simbolicamente interagem de maneira substantiva e não arbitrária com aquilo que o aprendiz já sabe. Substantiva quer dizer não literal, não ao pé da letra e não arbitrária significa que a interação não é com qualquer ideia prévia, mas sim com algum conhecimento especificamente relevante já existente na estrutura cognitiva do sujeito que aprende (AUSUBEL apud MOREIRA, 2011, p. 13 – grifos do autor).
Moreira (2011) ainda apresenta a ideia de Ausubel mostrando que primeiramente o professor deve considerar e valorizar os conhecimentos que os alunos trazem para sala de aula. Visto que há todo um repertório de conhecimentos inerentes às vivências desses sujeitos que estão em processo de construção da aprendizagem, seja no que concerne às linguagens, aos costumes, às culturas, aos saberes domésticos ou às subjetividades, em outras palavras, cada aluno traz consigo algum conhecimento relevante para sala de aula.
Ausubel é um representante do cognitivismo, por isso é importante atentarmos para alguns apontamentos sobre essa teoria. A cognição é quando um indivíduo se torna capaz de fazer significações e diferenciações. A estrutura cognitiva começa então a se formar a partir do momento que o indivíduo atribui significado na realidade que o cerca, para a partir desses primeiros significados construírem novos.
Nas palavras de Marco Antônio Moreira: O cognitivismo de Ausubel é um caminho que busca responder a essas questões, ao se propor estudar o ato da formação de significados ao nível da consciência ou, em outras palavras, ao estudar o ato da cognição. (MOREIRA, 1982. p. 2)
Ao refletir sobre a aprendizagem significativa de Ausubel, aquela que tem sentido para os alunos, entendo que ela pode proporcionar mudanças em suas vidas e motivação para querer aprender mais.
Conclusão
O tema abordado neste estudo, acerca da afetividade, práticas pedagógicas e aprendizagem significativa em uma escola inclusiva, nos mostra que a relação professor/aluno é muito importante. Pois, para que a criança consiga seu desenvolvimento integral, a educação escolar deve estar presente de modo significativo na sua vida.
Refletir sobre suas práticas pedagógicas vindas do conhecimento dos alunos, permitem ao educador atualizar suas práticas e estratégias criando uma melhor interação com o aluno, o que trará resultados significativos para a aprendizagem. Desta forma a educação revela a clareza e a definição de seu objetivo.
Portanto os objetivos dessa pesquisa foram alcançados, pois o resultado dos estudos aponta a importância da afetividade, de práticas pedagógicas que estimulem os alunos a participarem de forma ativa e comprometida com sua aprendizagem.
REFERENCIAS
ALMEIDA, Laurinda R.; MAHONEY, Abigail A. Afetividade e aprendizagem: contribuições de Henri Wallon. 2 ed. São Paulo: Loyola, 2007
AUSUBEL, D.P. Aquisição e retenção de conhecimentos. Lisboa: Plátano Edições Técnicas, 2003.
BRASIL. Ministério da Educação. Base Nacional Comum Curricular. Brasília, 2018.
CUNHA, Antônio Eugênio. Afeto e Aprendizagem: relação da amorosidade e saber na prática pedagógica. 2 ed. Rio de Janeiro: WAK, 2010.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 1996.
MOREIRA, M.A. e Masini, E.A.F. (1982). Aprendizagem significativa: a teoria de David Ausubel. São Paulo: Editora Moraes.
NUNES, Sylvia da S.; SAIA, Ana L.; TAVARES, Rosana E. Educação Inclusiva: entre a história, os preconceitos, a escola e a família. Psicologia: Ciência e Profissão (Online), v. 35, p. 1.106-1.119, 2015.
PIAGET, J. Psicologia e Pedagogia. 4ª. ed. Rio de Janeiro: Forense/ Universitária, 1976.
Ministério da Educação. Secretaria de Educação Fundamental. Referencial Curricular Nacional para a Educação Infantil. Brasília, 1998.
TOGNETTA, Luciene; ASSIS, Orly. A construção da solidariedade na escola: as virtudes, a razão e a afetividade. Revista Educação e Pesquisa, São Paulo, v. 32, nº 1, p.49-66,2006.
https://educacaopublica.cecierj.edu.br/artigos/22/36/educacao-para-transformacao-formacao-continuada-promovendo-aprendizagem-significativa acesso 29/07/2023