ADOÇÃO POR CASAIS HOMOAFETIVOS NO DIREITO BRASILEIRO

Por Camilla Pires Gonçalves dos Santos | 09/09/2016 | Direito

Resumo:

Tendo em vista que a família é um evento histórico, podemos dizer que ela se altera com o decurso do tempo. Nesse passo, particularmente, o presente trabalho de conclusão de curso, objetiva buscar bases teóricas que amparam o direito ao exercício da homoaprentalidade, por meio da adoção. Assim, serão estudados a união de pessoas do mesmo sexo sob a ótica Constitucional e seu tratamento na doutrina e jurisprudência dominantes.

INTRODUÇÃO:

Podemos dizer que a família é um evento histórico, que se altera com o decurso do tempo. No decorrer da história a família formou-se por meio das influências religiosas, patrimoniais e sexuais e que todas foram consideradas relevantes para sociedade na sua historicidade local e universal. Com o transcurso do tempo, em especial a Constituição Federal de 1988, as motivações se aprimoraram, e os seguintes arranjos familiares ganharam especial proteção do Estado: matrimonial, informal e monoparental.

No entanto, dúvidas ainda existiam com relação ao reconhecimento de uniões de pessoas do mesmo sexo. Prevalecia o entendimento de que o Art. 226, §3º da Constituição Federal, restringia a hipótese de união estável apenas para casais heterossexuais.  Apenas em 2011, as uniões homoafetivas foram reconhecidas na ADIn 4277/DF, pelo STF, como entidades familiares, merecedoras da proteção estatal.

Apesar de o Supremo Tribunal Federal, reconhecer a união homoafetiva como entidade familiar apta a merecer a proteção do Estado, controvérsia ainda existe com relação a adoção realizada por casais homossexuais.

Nesse passo, o trabalho de conclusão de curso tem o objetivo de analisar fundamentos jurídicos à concretização do direito ao exercício da parentalidade, no contexto da relação entre pessoas do mesmo sexo, por meio da adoção.

A relevância do tema está calcada na transmudação que a entidade familiar vem sofrendo, perceptível no fato de ter tirado do cume o casamento e agregado novos arranjos presentes nos lares brasileiros. Entre essas novas formas de entidades, surgem  as uniões de pessoas do mesmo sexo, que batem às portas do Poder Judiciário para pedir reconhecimento, e, em decorrência dessa união comunhão de interesses e afetos, também surgem pedido para que os casais maternidade/paternidade, possam exercer esse direito no ambiente homoafetivo.

O problema norteador da pesquisa decorre de lacunas na doutrina a respeito de fundamentos legais e doutrinários no ordenamento jurídico, que possibilita, ou até mesmo impossibilita o exercício do direito à homoparentalidade por meio da adoção. 

1. HOMOAFETIVIDADE

 1.1. Considerações gerais

A sexualidade humana possui sinais bem evidenciados, traduzidos no decorrer de sua história. Deveras, ela foi tratada com ares de mistério, lutas, conquistas, tabus ou pecados, o que se tornou objeto de significativas análises, com diversos olhares das ciências envolvidas, contribuindo para a evolução das abordagens relacionadas a essa questão. Afirma-se que, hoje, essa evolução se deve à atenção e reconhecimento que recebeu e recebe, concomitantemente com o avanço da humanidade.[1]

Hoje, não existe dúvida no âmbito do Direito de Família, ao afirmar que uma relação contínua e duradoura entre pessoas do mesmo sexo poderá produzir efeitos jurídicos, tanto na esfera pessoal como na existencial. Trata-se de simples projeção do princípio da pluralidade das entidades familiares, reconhecendo que sua base fundamental é a mesma das relações heteroafetivas como casamento e união estável.

Com base nesse fundamento, as uniões homoafetivas foram reconhecidas na ADIn 4277/DF, pelo STF, como entidades familiares, merecedoras da proteção estatal, conforme ser aprofundado abaixo.

A homossexualidade sempre foi alvo de preconceito. Assim, rios de tintas foram derramados para discutir se as uniões homoafetivas estariam, ou não, enquadradas no conceito de família.

Até o fim do século XVIII, três códigos regiam as práticas sexuais: o direito canônico, a pastoral e a cristã e a lei civil. Eles não diferenciavam as infrações advindas das alianças das da genitalidade. Isso significava que romper o casamento pela prática da infidelidade e procurar prazeres estranhos, como a homossexualidade, por exemplo, tinham o mesmo desfecho: a condenação. Eram considerados pecados graves o estrupro, o adultério, o rapto, o incesto espiritual ou carnal a sodomia.[2]

O homossexualismo existiu em todas as fases da história da humanidade, da Antiguidade aos tempos pós-modernos. Nesse contexto, cada país conduziu o tema de forma diferenciada, alguns aceitavam, muitos condenavam, uns entendiam ser demonstração de amor, de poder, de força, e outros caracterizavam como patologias, desvios ou distúrbios psicológicos.

No Brasil, antigamente, a maioria da doutrina, inseria as uniões homossexuais no âmbito do Direito das Obrigações, caracterizando-se como meras sociedades de fato, produzindo efeitos, tão somente, patrimoniais.

Mais tarde, com a Constituição Federal de 1988, a família homoafetiva foi se tornando uma realidade presente, ganhando uma dimensão mais ampla, espelhando a busca da realização pessoa de seus membros.

Assim, diante da dignidade humana, princípio maior da Constituição Federal, a família passa a servir como um verdadeiro elemento de afirmação da cidadania, não sendo possível excluir do seu âmbito de proteção de seus membros, cuja dignidade estão resguardadas por mandamento constitucional.

Além disso, não há dúvidas, que o art.226 da Constituição Federal, contempla  a homoafetividade como núcleo familiar. Nesse passo, as uniões homoafetivas, em nosso sistema jurídico, são entidades familiares, autonomamente compreendidas, merecendo especial proteção, ao lado do casamento, da união estável, da família monoparental, dentre outro núcleos.

Nesse sentido é o entendimento de Pablo Stolze:

 

“(...) Assim, ao analisarmos o fato social da família, devemos fazê-lo em uma perspectiva imparcial, que tome por referência não dogmas religiosos, mas, sim, os princípios jurídicos reguladores da matéria, para o bom entendimento da questão. Ora, se a premissa de todo o nosso raciocínio ao longo deste trabalho fora o caráter socioafetivo e eudemonista do conceito de família, seria um indesejável contrassenso, agora, negarmos o reconhecimento do núcleo formado por pessoas do mesmo sexo. Se, em nossa concepção jurídica, a família é um núcleo moldado pela afetividade vinculativa dos seus membros (socioafetiva) e, além disso, traduz a ambiência necessária para que realizem os seus projetos pessoais de felicidade (eudemonista), como negar aquele arranjo formado por pessoas do mesmo sexo se, também aqui, essas fundamentais características estariam presentes? Afinal, se o sistema constitucional de família (CF, art. 226,) é aberto, inclusivo e não discriminatório, como negar este fato da vida sem afronta ao princípio da isonomia?”[3] 

Diante de tudo que foi exposto, nota-se que, o fundamento das uniões homoafetivas é o afeto, assim como de todas as outras. Dividem-se alegria, tristezas, sexualidade, afeto, solidariedade, amor, ou seja, projetos de vida. Por isso, não é admissível, que lhes seja negada a caracterização como entidade familiar. 

1.2. Conceito

As relações homoafetivas são aquelas mantidas entre pessoas de mesmo sexo. Ela pode ser tanto masculina como feminina. Assim, trata-se de uma inversão sexual que não é considerada vício ou doença, e sim uma variação da função sexual.

Infelizmente, no Direito Brasileiro não há norma expressa que protege as  relações existentes entre parceiros do mesmo sexo. Há, contudo, conforme será demonstrado abaixo, precedentes recentes no direito de outros povos.

No Direito Estrangeiro, a primeira Lei a dispor sobre o homossexualismo foi a dinamarquesa em 1986 que atribuiu aos homossexuais direitos patrimoniais entre si, tendo o casamento entre eles sido amparado a partir de lei de 1989, porém a lei exigia que os parceiros mantivessem domicílio em seu território nacional e tenham a nacionalidade dinamarquesa.

Em 1991, na Holanda, a Lei permitia que os municípios a regulassem as uniões homoafetivas por meio de registro e normatização local, permitiu-se, que os parceiros tivessem outra nacionalidade, que não fosse a holandesa.

Em 1993, a Noruega passou a adotar a regulamentação das uniões homossexuais e, conferiu aos parceiros o poder familiar.

Na Suíça em 1994, permitiu-se a concessão do poder familiar em favor dos parceiros homossexuais, facultando-se a interferência do Poder Judiciário para a constituição formal da união, que se torna, no entanto, obrigatória por ocasião da sua dissolução.

No início de 2006, foi sancionada, na Inglaterra, a união de pessoas do mesmo sexo. Antes, vigorava o Civil Partnership Act, 2004, que assegurou aos casais de mesmo sexo o direito de procederem ao registro da sua união junto ao cartório cabível.

No Brasil, o Projeto de Lei 1.151, de autoria da Deputada Federal Martha Suplicy, preceituou a possibilidade do contrato de união de duas pessoas do mesmo sexo, formando uma entidade familiar, com registro civil e efeitos patrimoniais. No entanto, esse Projeto não conferiu o direito à adoção pelos parceiros homossexuais.

No mais, precisamos distinguir o homossexual do transexual. O Transexual é a pessoa que se identifica psicologicamente com manter conduta característica do sexo que lhe é biologicamente oposto, desejando buscar a alteração anatômica da sua genitália para aparentá-la fisicamente com a das pessoas do outro sexo.

A intervenção cirúrgica de mudança de sexo pode se dar tanto para pacientes do sexo masculino como do feminino.

Trata-se de uma patologia, consistente em um transtorno de identidade psicossexual, catalogada pela Organização Mundial de Saúde e também observada pelo Conselho Federal de Medicina (CFM), segundo o professor LUIZ SALVADOR:

[...]

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