Adeus, Papai!
Por Paulo de Aragão Lins | 06/11/2008 | FamíliaQuando meu pai era vivo eu o achava ranzinza, turrão, bravo e intolerante, porque ele era a autoridade, e naquela idade toda autoridade era, para mim, considerada uma inimiga.
Procurava todos os meios para tentar provar a ele que ele estava errado, que era durão demais, que deixava a todos nós nervosos com sua cara feia, seu cenho franzido, suas exigências, suas normas e ordens.
O que nos deixava mais bravos era que ele insistia em ter todas as coisas em seus devidos lugares. Gostava de ter tudo o que era dele à mão, e ficava realmente zangado quando não encontrava algo no lugar. Sempre era um de nós que mexia nas coisas dele.
Minha mãe era uma espécie de partido de oposição. Ela contestava suas ordens, chamando-o de "ditador". Unia-se a nós em sombrias elucubrações, em ocultos complôs, nos quais falávamos em várias e rebuscadas maneiras de "tomada de poder", fazendo-o descer daquele pedestal de "pater familiae", de burguês patriarcal.
Bem, um dia tudo isto acabou. Meu pai morreu.
Acabou tudo aquilo de que não gostávamos. Foi embora o "superego", a autoridade que nos prendia em nossos lugares. Desapareceram as expressões duras e as palavras autoritárias.
Estávamos livres, enfim!
Foi então que começamos a observar outros aspectos daquela ausência. Começamos a ver que a ausência dele era algo terrível. Passamos a notar que muitas virtudes haviam desaparecido. Descobrimos, tristemente, que parte da alegria daquela casa havia ido embora.
Comecei a relembrar os banhos de açude que tomávamos juntos, as longas viagens a cavalo… Minha memória passou a formar os quadros maravilhosos do seu companheirismo.
Lembrei-me de seus olhos amorosos, de suas expressões de carinho, de suas palavras amáveis, de suas mãos fortes que me acariciavam quando estava com problemas. De sua força e apoio quando perdi a primeira namorada, quando apanhei de um colega na rua, quando quebraram meu mais precioso brinquedo…
Recordei-me de tantas coisas bonitas que ele me mostrou e me ensinou… Foi o primeiro a falar-me sobre o átomo, a fotossíntese, as leis da genética, as coisas profundas da Bíblia, os valores morais, a honestidade e a importância de ter ideais grandiosos e definidos.
Veio-me a memória que na hora em que precisei saber certas coisas especiais, foi ele que teve uma conversa "de homem para homem" comigo. Lembro-me do carinho e do orgulho com que me trouxe, como um precioso presente, meu primeiro relógio de pulso .
Ele foi embora bem antes do tempo que agora entendo que deveria ter ido. Ele não viu minha formatura, nem meu casamento, nem o nascimento de meus filhos. Não teve nenhum deles no colo, chamando-o de "vovô". Não viu alguns sonhos que sonhamos juntos tornarem-se realidade.
Que horroroso momento, quando tomei suas mãos entre as minhas, naquele quarto de hospital e, e disse: "Adeus, papai!"
Agora sei que não verei mais o meu pai aqui na terra. Agora, tenho filhos que começam a dizer que sou ranzinza, turrão, bravo e intolerante.
Como a história se repete!!!
Vai começar tudo de novo. Fico com dó deles, ao saber que vai chegar o dia em que cada um repetirá a mesma coisa que hoje repito:
- Que bom, se tivesse papai comigo agora…