A Volubilidade dos Seres Humanos

Por Julio Cesar Souza Santos | 16/10/2010 | Sociedade

Embora existam inúmeras teorias sobre Liderança a maioria se baseia numa simplicidade atraente, mas perigosamente falha. Elas adotam o pressuposto de que os seres humanos são como enxadristas, ou soldados de chumbo. Muitas dessas teorias acabam nos fornecendo a "certeza" de que as pessoas se moverão com precisão nessa ou n?aquela direção. Elas acreditam que as pessoas responderão a estímulos externos, muito parecidos aos cães condicionados de PAVLOV. E assim, a maioria das teorias sobre Liderança se esqueceu de uma importante tendência humana: _ sua volubilidade enlouquecedora.
Tais teorias são montadas sob a dicotomia e sob estereótipo. No caso da TEORIA X e Y ? que postula uma dicotomia ? é descrita detalhadamente nos muitos textos de Administração e Programas de Treinamento de executivos.
Muitos administradores (X) acham seus empregados preguiçosos, incapazes de assumirem responsabilidades e de não irem além do mínimo esforça.
Outros administradores (Y) vêem seus empregados quase perfeitos, verdadeiros dínamos, cheios de dedicação desinteressada.
A teoria funciona muito bem na sala de aula e em seminários corporativos. Mas, as pessoas de verdade são qualquer coisa, menos binárias (X ou Y; A ou B). Na verdade, pode-se dizer que as pessoas são tão complexas que não podem ser estereotipadas e categorizadas com precisão.
Poucos na História comunicaram a personalidade multifacetada e imprevisível do ser humano tão bem quanto Geoffrey Chaucer. Observador atento da natureza humana, ele era capaz de enxergar tanto o ridículo da pessoa quanto sua tragédia. O seu livro ? Contos de Canterbury ? começa lustrando a reunião de um grupo de peregrinos numa hospedaria.
O tal grupo era composto de um ilustre cavaleiro, um escudeiro efeminado, um monge gordo, um frade ganancioso, um mercador bem-sucedido, um cozinheiro doente, um arrendatário de terras temente à Deus, um moleiro tocador de gaita e o anfitrião. Eles concordaram em realizar entre eles um concurso de histórias, enquanto caminhavam até a Catedral de Canterbury.
- O mercador dava impressão de riqueza (chapéu de feltro, botas afiveladas) e, ao mesmo tempo, de falta de interesse pela aparência (roupas multicores). Era dogmático, mas um "excelente camarada" e embora bom comerciante, estava endividado.
- O agente comprador era mais brilhante e habilidoso que os 30 advogados a quem servia. Era excelente em seu trabalho, ainda que analfabeto.
A genialidade de Chaucer, porém residia em não permitir que suas personagens fossem estereotipadas, apresentando uma versão do indivíduo que desafiava a fácil rotulação. Esse curioso grupo lembra-nos o quão são complexos os indivíduos e não unidimensionais. "Cada indivíduo é uma coleção de eus", informa-nos a psicóloga Leona Thler.
Os paradoxos são o que fazem as pessoas (assim como os personagens de Chaucer), tão fascinantemente humanas e produtivas. Muitas vezes, as pessoas menos prováveis inventaram alguns dos mais bem sucedidos produtos:
Pode-se imaginar como Chaucer descreveria King Gillette, o modesto caixeiro-viajante de cortiças que inventou a lâmina de barbear. Ou, os dois músicos que inventaram o filme "Kodachrome". Ou o advogado especializado em patentes que descobriu a "xerografia". O funerário que criou a discagem telefônica automática. E o veterinário que criou o pneumático.
O ponto principal sobre Liderança que aprendermos com Chaucer é que as pessoas não são estereótipos. Rotulação, classificação ou qualquer outro tipo de categorização podem nos levar a não perceber algumas importantes potencialidades nos seres humanos. E, aqueles que enxergamos apenas como mais um colega de trabalho, pode vir a ser o próximo grande sucesso da organização.