A visão do usuário sobre a terapêutica utilizada em um serviço substitutivo em saúde mental no município de Belém

Por Ingryd Barros de Araújo e Rellry Rodrigues Queiroz | 17/04/2012 | Psicologia

RESUMO

 

O presente estudo tem o escopo fazer uma revisão literária dos principais fatores que contribuíram para a construção e compreensão da psiquiátrica no mundo, no Brasil e no Estado do Pará. Sendo assim, objetiva-se investigar qual a visão do usuário em relação à assistência prestada em um serviço substitutivo em saúde mental. Para isso, utilizou-se uma abordagem teórico-reflexiva, por meio da pesquisa bibliográfica e documental que implicou na seleção, leitura e análise de textos. Além disso, realizou-se uma pesquisa de campo no Centro de Atenção à Saúde Mental do Adulto, com aplicações de Formulário de Entrevista aos usuários da mesma. O Estudo concluiu que a principal insatisfação dos usuários é em relação à alimentação, pois foi possível perceber que a maioria dos pesquisados mostraram não estar satisfeitos. Sobre o método de tratamento utilizado antes, a maioria dos usuários relatou que considera como ineficaz ou estigmatizante, isso mostra que uma reforma psiquiátrica já era necessária. Por isso, estes dados confirmaram o que a pesquisa revelou: 100% consideram como ótimo ou bom o atual modelo de tratamento da instituição com os serviços substitutivos e que demonstram estar satisfeitos com a instituição e não pretendem parar o tratamento, por conta de alguma insatisfação. Além disso, que é muito importante a participação da família como parceira no tratamento. Enfim, de um modo geral a avaliação dos usuários sobre a instituição é de que está caracterizada como bom a excelente.

 

Palavras-chaves: Usuário. Psiquiatria. Serviço Substitutivo. CAPS.

 

 ABSTRACT

 The present study has the scope to do a literature review of the main factors that contributed to the construction and understanding of the psychiatric world, in Brazil and in the State of Pará Therefore, the objective is to investigate what the vision of you on the assistance substitute in a mental health service. For this, we used a theoretical-reflective, through literature and documentary which involved the selection, reading and analyzing texts. In addition, there was a field research at the Center for Mental Health Care of the Adult, with applications to the users form the same interview. The study concluded that the main users of dissatisfaction is in relation to food, it was possible to notice that most surveyed do not be satisfied. On the method of treatment used before, most users reported that it considers as ineffective or stigmatizing, it shows that a psychiatric reform was already required. Therefore, these data confirmed that the survey showed: 100% considered excellent or good as the current model of care the institution and substitute services and demonstrate they were satisfied with the institution and are not intended to stop treatment on account of some dissatisfaction . Moreover, it is very important to involve the family as a partner in treatment. Anyway, a general assessment of users is about the institution that is characterized as good to excellent.

 

Keywords: User. Psychiatry. Substitute Service. CAPS. 

 

INTRODUÇÃO

 

A assistência de enfermagem em saúde mental vem passando por um processo desafiador, o de vivenciar mudança de paradigma do modelo asilar para o modelo psicossocial. No Brasil, a transformação de tal modelo ocorreu em meados da década de 70, o qual foi marcado pelo movimento da Reforma Psiquiátrica, o qual objetivava que houvesse uma assistência médica mais humanizada e a implementação de serviços extra hospitalares, que focassem a assistência do sujeito no território, de tal modo que se extinguisse o manicômio como espaço de segregação, de tutela e de isolamento (OLSCHOWSKY e DUARTE, 2007).

Não obstante, foi nas décadas de 80 e 90 que surgiram às discussões pela reestruturação da assistência psiquiátrica no país, que acima de tudo possibilitaram mudanças ao nível do Ministério da Saúde, como por exemplo, a Conferência Regional para a Reestruturação da Assistência Psiquiátrica, realizada em Caracas, em 1990 (HIRDES, 2009).

A partir destes marcos, passou-se a privilegiar a criação de serviços substitutivos ao hospital psiquiátrico, quais sejam: redes de atenção à saúde mental, Centros de Atenção Psicossocial (CAPS), leitos psiquiátricos em hospitais gerais, oficinas terapêuticas, residências terapêuticas, respeitando-se as particularidades e necessidades de cada local (HIRDES, 2009).

Assim, dentre os desafios da reforma, encontra-se a redução no número de leitos psiquiátricos e a criação de novos dispositivos substitutivos do modelo hospitalar, que se tornam também um desafio em particular para a enfermagem no campo da saúde mental.

Sendo assim, além das novas medidas, a concepção do homem mudou fazendo com que a atenção se volte para o sujeito e não mais para a doença em si como acontecia no passado.

Diante da realidade exposta, o presente estudo visa esclarecer a seguinte indagação: Qual a visão do usuário sobre o tratamento realizado em um serviço substitutivo em saúde mental no município de Belém?

Neste sentido, pode-se fomentar que o debate sobre esta nova concepção já foi aberto à sociedade que muito vem apoiando esta nova assistência que visa incluir e não mais excluir o doente mental do meio social. Assim, este tratamento tende a ser cada vez mais humanizado, abrangente e inclusivo.

Seguindo esta perspectiva, a prática de enfermagem em serviços de atenção em saúde mental é algo construído no cotidiano das instituições, a partir das interações estabelecidas entre profissionais, usuários e familiares.

Por meio do presente estudo é possível identificar como o tratamento da loucura foi evoluindo até chegarmos às atuais medidas assistenciais, e assim, poder contribuir para os profissionais da área, como para toda a sociedade, a necessidade de (re) incluir os pacientes que precisam de tratamento da saúde mental por meio de ações interdisciplinares.

Portanto, a proposta do trabalho torna-se relevante porque objetiva contribuir para o atendimento e o bem-estar dos pacientes com doença mental com uma ótica voltada para a importância de se repensar o tratamento da saúde mental de modo a fomentar a (re) inclusão do mesmo à sociedade.

Para isso, traçou-se como objetivo: expor os fatores que contribuíram e os desafios da reforma psiquiátrica no Brasil, analisando de que forma essa mudança influenciou o tratamento que hoje é oferecido no Estado do Pará, para que se possa investigar qual é a visão do usuário sobre a terapêutica de um serviço substitutivo em saúde mental no Estado, particularmente, no Centro de Atenção à Saúde do Adulto no município de Belém.

Mediante tal contextualização, esse estudo pretende avançar na análise e no esclarecimento dos reflexos do modelo tradicional asilar que foi modificado para a terapêutica baseada nos serviços substitutivos com ações que visem a inserção do paciente que precisa de tratamento da saúde mental.

Em vista da amplitude que comporta o objeto em consideração, decidiu-se fazer uma delimitação em que se possa discutir somente a visão dos usuários sobre tal serviço no atendimento oferecido no Centro de Atenção à Saúde do Adulto do município de Belém. Do mesmo modo, vale salientar que este estudo não tem a intenção de aprofundar discussão sobre nenhuma doença mental especificamente.

A prática de enfermagem em serviços de atenção em saúde mental é algo construído no cotidiano das instituições e que merece a atenção devida. Neste sentido, o tema em estudo visa se aprofundar e contempla a visão dos usuários sobre a utilização de serviços substitutivos, diferentemente do modelo tradicionalmente asilar utilizado outrora.


1 BREVE ABORDAGEM SÓCIO HISTÓRICA SOBRE A PSIQUIATRIA

 1.1 A PSIQUIATRIA NO BRASIL

 

Com a chegada da Família Real ao Brasil, em 1808, houve a necessidade de um ordenamento social de modo a abrigar aqueles que vagavam pelas ruas, tais como: mendigos, marginais e loucos. Para isso, eles eram destinados à prisão ou celas especiais de hospitais gerais (COSTA, 1976 apud ALVES et al, 2009).

No Século XIX, a Sociedade Brasileira de Medicina no Rio de Janeiro passou a questionar o desamparo aos loucos. Então, propõe-se a construção de um Hospício, que seguisse os padrões europeus com ênfase no tratamento moral e não mais com punições corporais. Assim, iniciava-se o processo de medicalização da loucura no Brasil (ALVES et al, 2009).

Em 1952, é inaugurado o Hospício D. Pedro II, na cidade do Rio de Janeiro, mudando completamente a forma como os doentes metais eram tratados. Depois disso, a Psiquiatria cresce no Brasil como uma especialidade médica e surgem várias instituições com o objetivo de prestar assistência aos doentes mentais. Assim, conforme Foucault (2008), a psiquiatria passa a assumir um papel no controle social, passando a interferir com ‘métodos preventivos’ que amparassem a todos e não somente aos doentes mentais.

Ainda assim, em meados da década de 60, observou-se a supervalorização da psiquiatria privada em convênios com o Estado, em detrimento da psiquiatria pública, isto é, com a institucionalização o fenômeno da loucura passou a ser visto como lucro: “a doença mental tornou-se definitivamente em objeto de lucro, e o doente uma mercadoria” (DEVIAT, 1999 apud COSTA, 2002, p. 38).

Na década de 80, após o período do regime militar, o Brasil encontra-se num contexto histórico de redemocratização, acontece o Movimento pela Reforma Sanitária, que busca o acesso de todos à assistência à saúde, baseado na Constituição que fora promulgada neste período e, posteriormente, na Lei Orgânica da Saúde, que constitui o Sistema Único de Saúde (ALVES  et al,  2009).

No ano de 1987, acontecem dois eventos importantes: a 1ª Conferência Nacional de Saúde Mental e o 2º Encontro de Trabalhadores em Saúde Mental, os quais foram fortemente influenciados pela Psiquiatria Democrática Italiana, de Basaglia. Este último evento lança o tema: Por uma Sociedade sem Manicômios.  (MATIAS, 2006).

Neste cenário de grandes prospecções surge o Projeto de Lei 3657/89 do Deputado Federal Paulo Delgado que propõe a extinção dos manicômios e a concepção do uso de recursos assistenciais substitutivos. Ganhando grandes proporções, a proposta levantada abrange toda a sociedade e ganha força dentre os profissionais, usuários e familiares destes (ALVES  et al,  2009).

Assim, o novo debate buscava não somente acabar com os manicômios em sua estrutura física, mas também da desconstrução do entendimento sobre a exclusão e a violência, promovendo assim a ideia de um novo espaço em que se contemplasse o exercício da cidadania e da reinserção social  (MATIAS, 2006).

Portanto, surge os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS, CAPS i e CAPS ad), uma rede que busca oferecer assistência substitutiva com vários serviços interdisciplinares aos usuários com doença mental. Os CAPS tornaram-se responsáveis pela atenção à saúde mental com cuidados aos pacientes do território abrangido por eles (ALVES  et al,  2009).

Além da assistência aos doentes mentais, estas instituições devem promover ações que incluam as famílias, com o intuito de reinserir socialmente o usuário. Essas ações acontecem a partir de três formas de assistência: o cuidado intensivo, o semi-intensivo e o não-intensivo  (OLIVEIRA, 2009).

 

 

1.2 A PSIQUIATRIA NO PARÁ

 

No Pará, o rumo da psiquiatria não foi diferente a do contexto nacional, uma vez que já se via a necessidade de uma política de saúde mental orientada pelos pressupostos da Reforma Psiquiátrica. Apesar de ocorrer de forma mais lenta, o Estado pôde viver as transformações ocorridas, que começou desde a casa dos Alienados no Marco da Légua.

Fontes (2009) corrobora que a medicina paraense evoluía abandonando os velhos métodos como o uso de camisas de força e de troncos, pois a loucura passara a ser vista como algo tratável por meio de novos medicamentos e tratamentos. Do mesmo modo, novas formas terapêuticas foram propostas como a hidroterapia, baseado no modelo europeu. Nos anos 60, apesar de ações interdisciplinares como pintura, escultura em argila, em gesso e em madeira, as festas dançantes e os torneios esportivos, não foi possível evitar o arrastado processo de deshospitalização, que ocorreu os anos 70 e 80.

No século XVIII, a Santa Casa de Misericórdia era a instituição responsável pela assistência pública dos doentes mentais.  A administração da Casa era feita por cônegos, padres e freiras católicas.

Neste período, conforme Lopes et al (2006), a Casa recebeu um doente mental muito agressi­vo que causou sérios danos às instalações da instituição, crian­do conflitos com os demais pacientes, fazendo com que a direção solicitasse providências das autoridades competentes. Foi a partir de então que os enfer­mos em estado de extrema agitação, que fosse visto como uma ameaça à sociedade, eram encaminhados ao Asilo de Tucunduba, onde eram recolhidos os leprosos e elefantisíacos.

Sobre o Asilo de Tucunduba, Pedroso (1998 apud LOPES et al, 2006) afirma  que as fugas eram constantes, devido aos aspectos do isola­mento e da incomunicabilidade. Assim, a assistência prestada aos doentes mentais era a mais pre­cária possível devido à falta de meios e/ou recursos.

Em meios aos clamores nacionais e regionais sobre esse tratamento, o governo do Pará inaugurou o primeiro hospital exclusivo para doentes mentais, com o objetivo de que o novo espaço proporcionasse aos pacientes um tratamento digno que tanto necessi­tavam.

Em 1937, substituindo o antigo hospício de alienados, que ficava localizado no Bairro do Marco da Légua, é fundado o Hospital Psiquiátrico “Juliano Moreira”, em homenagem ao psiquiatra baiano que colaborou significativamente com a psiquiatria no Brasil. (LOPES et al, 2006).

Ele foi concebido como instituição asilar mediante a uma série de reformas da cidade de Belém, no início do período republicano, no qual os manicômios, assim como os hospitais e presídios foram instalados longe do centro, com o objetivo da organização e no embelezamento da cidade (FONTES, 2009).

Pedroso (1998 apud LOPES et al, 2006) diz que o aspecto geográfico espacial da cida­de foi um dos fatores que colaboraram para a concretização do hospital Juliano Moreira, pois o projeto urbanístico de Belém, na época, confirmava esse encaixe geográfico quando se constata que o Hospital dos Alienados estava à margem da légua patrimonial do Municí­pio.

No novo hospital, a direção passou às mãos do médico Isidoro Aze­vedo Ribeiro, que era formado em psiquiatria na Europa. Suas primeiras providências foram abolir os troncos onde eram amarrados os doentes, as camisas de força, as cadeias e todos os meios violentos e brutais de contenção. Tais medidas revolucionárias já eram vivenciadas na Europa e representaram um marco no desen­volvimento da psiquiatria no Pará, principalmente do ponto de vista político-assistencial. (LOPES et al, 2006)

Em 1982, segundo Fontes (2009) o Hospital Psiquiátrico “Juliano Moreira” sofreu um incêndio em seu prédio e em 1984 ele foi desativado. E atualmente é o Centro de Ciências Biológicas e da Saúde da Universidade do Estado do Pará (UEPA). Ainda hoje alguns pacientes encontram-se amparados no CIASPA (Centro Integrado de Assistência Psiquiátrica do Pará).

Portanto, o Estado do Pará, num processo semelhante ao que vem ocorrendo no Brasil, concernente à proposta reformista nos programas de saúde mental, muitas transformações ocorreram desde a desativação do Hospital Juliano Moreira até o surgimento de leitos psi­quiátricos no atual Hospital de Clínicas Gaspar Vianna, que hoje é a referência no tratamento de psiquiatria no Estado

Assim como em todo o Brasil, as Casas Mentais, no Pará, foram estruturadas na concepção de um CAPS, sendo um recurso intermediário entre a internação e o ambulatório, passando a oferecer aos pacientes assistência terapêutica com serviços substitutivos, bem diferentes do modelo asilar que outrora era realizado no tratamento dos mesmos (BRASIL, 2005).

Diferentemente das terapias utilizadas antigamente, como tortura, exclusão e internações em hospitais psiquiátricos, o objetivo do CAPS é oferecer serviços substitutivos e não complementares ao hospital psiquiátrico, ou seja, um atendimento que contemple o acompanhamento clínico e a reinserção social dos usuários, por meio dos serviços substitutivos que abranjam o acesso ao trabalho, ao lazer e ao fortalecimento dos laços familiares e sociais.  

No Pará, Centro de Atenção á Saúde Mental do Adulto, local da pesquisa deste estudo, foi inaugurado em 13 de novembro de 1997 como CAPS II, e em 20 de setembro de 2002 houve a ampliação, transformando-o em CAPS III. Em 2009, o estado do Pará ganhou quatro novos Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) com modalidade habilitada de CAPS I, que contemplaram os municípios de Água Azul do Norte, Aurora do Pará, Breu Branco e Canaã dos Carajás. Além de pacientes com transtornos mentais, os CAPS também acolhem pessoas com problemas relacionados ao consumo de álcool e outras drogas (FONTES, 2009).

Enfim, pode-se perceber que igualmente aos outros Estados do país, no Pará o processo de reforma psiquiátrica foi iniciado e conta com a participação de profissionais, pacientes, familiares e toda a comunidade, uma vez que o novo mo­delo adotado pelo Ministério da Saúde está baseado em hospitais-dia e serviços comunitários, nos quais os pacientes são tratados e não ficam in­ternados.

 

 2 O ENFERMEIRO E OS CUIDADOS NA PSIQUIATRIA

 Conforme Lopes et al (2006), a maioria os profissionais de enfermagem desconhecem o que, de fato, foi a Reforma Psiquiátrica como um processo de mudança que sugere um tratamento mais humanizado ao paciente com doença mental. Por isso, é importante entender a atuação deste profissional junto a pacientes com transtorno mental.

Neste sentido, nesse novo panorama de reestruturação da assistência psiquiátrica, o enfermeiro necessita rever suas práticas e compreender que seu papel não é mais somente de um profissional responsável por fazer controles, ob­servações e que realiza cuidados físicos, mais sim de um agente terapêutico, comprometido com a promoção de qualidade de vida e com a constituição de sujeitos res­ponsáveis por suas escolhas (KIRSCHBAUM, 2000).

Assim, Lopes et al (2006) ratifica a necessidade de atualização dos profissionais so­bre este assunto, pois tal realidade revela um cotidiano que ainda está alienado, tanto para si quanto para os pacientes, impedindo-o de se tornar um ator partícipe no pro­cesso de transformação dessa prática.

Sobre as relações com os pacientes, Fernandes (1999) afirma que como o enfermeiro faz parte da equipe multidisciplinar, ele também deve criar relações baseadas em critérios de companheirismo e cumplicidade, ao passo que se evite a hierarquização ou quaisquer outros obstáculos que dificultem os vínculos de confiança mútua.

Ademais, o profissional de enfermagem deve se ater ao fato de que os usuários dos serviços de saúde mental apresentam característi­cas variadas, como: alguns requerem muita atenção, outros rejeitam o contato, uns dormem o tempo todo, outros têm dificuldade para dormir, etc. Sendo assim, Lopes et al (2006) ressalta que é importante o profissional saber que as pessoas não escolhem, conscientemente terem essas atitudes ou apresentar determinada característica. Portanto, não se deve indagar por que agem de tal maneira, ou argumentar procurando convencê-las de essas coisas estão erradas ou que não têm motivos, afinal existe motivos, sim, mas geralmente o paciente não os identifica, pois eles são inconscientes.

Sendo assim, a equipe de enfermagem, por ter uma proximidade maior com o paciente, já que é quem, geralmente, que cuida, deve agir terapeuticamente também, o que consiste em: observar, ouvir o que é dito, perceber também o que não é dito e procurar compreender o que se passa. Agindo assim, o enfermeiro poderá se relacionar com o paciente de acordo com o que ele realmente é. Portanto, agir terapeuticamente exige flexibilidade e tolerância.  (ROCHA, 2005)

Assim sendo, o enfermeiro deve estar sempre atento, observando e auxiliando, quando necessário, os cuidados pessoais (oferecer a possibilidade de um banho, por exemplo), a alimentação e a ingestão de líquidos, o repouso, os cuidados quanto a riscos, dentre outros. (ROCHA, 2005)

Rocha (2005) afirma que um bom momento para o enfermeiro acompanhar e orientar os pacientes é na hora das refeições, pois é um momento em que eles podem ter um contato ‘amistoso’. Mas o mais importante não é sugerir um cuidado ou uma alimentação, mas sim de compreender suas reais necessidades e estimulando o autocuidado, ajudando-o a desenvolver suas habilidades e a lidar melhor com suas dificuldades.

Portanto, diferentemente de outras áreas da enfermagem, o cuidado em saúde mental, não pode ser construído antecipadamente, pois não se trata de intervenções objetivas, previsíveis e que, portanto, dificilmente podem ser prescritas, visto que uma relação com um indivíduo singular a ser cuidado está sempre se fazendo, se atualizando, conforme afirma Collière (1985 apud ROCHA, 2005, p. 114), ”que cuidar é estimular as capacidades de ser e contribuir para desenvolver o poder de existir, de ser reconhecido, de afirmar sua vida”.

Sendo assim, os profissionais de enfermagem perpassam entre as novas práticas propostas pela Reforma Psiquiátrica e a prática tradicional, por isso estes profissionais precisam se organizar e desenvolver competência para que sua contribuição seja significativa nesse processo de mudança. Portanto, é necessário repensar tanto o papel social do enfermeiro quanto a prática desempenhada por este profissional nas instituições psiquiátricas, de tal modo que possa recriar a própria prática da enfermagem.

 

 3 UM ESTUDO DE CASO SOBRE O SERVIÇO SUBSTITUTIVO NO CAPS BELÉM-PA

 3.1 MÉTODO

 Quanto a Abordagem do problema, a pesquisa tem como fundamentos metodológicos a abordagem quantitativa, que de acordo com Silva (2001, p. 21) é o tipo de pesquisa que “considera que tudo pode ser quantificável, o que significa traduzir em números opiniões e informações para classificá-las e analisá-las”. Além disso, é qualitativa por que nos oportunizará fazer a análise e o cruzamento das informações identificando nas respostas pessoais dos pesquisados as múltiplas facetas das ações desenvolvidas.

Quanto aos procedimentos técnicos, além da pesquisa bibliográfica com estudiosos do assunto, com uma revisão crítica da literatura peculiar ao tema e a interação com o problema exposto, que segundo Gil (1991), é apoiada em materiais já publicados, constituídos principalmente de: livros, artigos, periódicos e materiais disponibilizados na Internet.

Será realizada uma pesquisa de campo, com aplicação do Formulário de Entrevista contendo treze perguntas, sendo onze fechadas e duas abertas. Para melhor compreensão Chizzotti (1995, p. 34), pondera: “As perguntas abertas são aquelas em que o entrevistado responde com suas próprias palavras. As perguntas fechadas são aquelas em que o entrevistado tem opção de resposta.”

A pesquisa foi realizada no CAPS III (Centro de Atenção à Saúde Mental do Adulto) da cidade de Belém, Estado do Pará.

Para a obtenção de dados, foi utilizado como instrumento de pesquisa o Formulário de Entrevista, em que se apresentou várias questões de modo face a face com o pesquisado.

O Formulário foi dividido em três partes: a primeira diz respeito a identificação do pesquisado (nome, idade, sexo), a segunda contou com onze perguntas objetivas fechadas de múltipla escolha e a terceira composta por duas perguntas abertas referente ao assunto abordado. A entrevista ocorreu pessoalmente, em horário que não prejudicou o tratamento dos entrevistados, esclarecendo-os a respeito dos procedimentos e objetivos do estudo no trabalho.

O CAPS III apresenta atualmente 21 pacientes matriculados e que participam ativamente das oficinas e serviços oferecidos pela instituição. Portanto, os sujeitos da pesquisa serão 15 pacientes que se enquadrem nos critérios de inclusão.

Para a seleção dos sujeitos foi utilizado o seguinte critério: pacientes capazes de responder ao questionário e pacientes que estejam em tratamento a mais de dois meses.

 

 

3.2 A PESQUISA

 Em relação ao sexo dos entrevistados, constatou-se o percentual maior de 69% dos usuários que são do sexo feminino, enquanto que 31% são do sexo masculino.

Falando sobre Saúde Mental e Gênero, Brasil (2005) afirma que é notória a situação de desigualdade das mulheres na sociedade brasileira. As mulheres têm menores salários, concentram-se em profissões mais desva­lorizadas, têm pouco acesso aos espaços de decisão no mundo político e econômico, sofrem mais violência doméstica, física, sexual e emocional e vivem dupla e tripla jornada de trabalho. Isso tudo justifica porque são crescentes as internações de mulheres por transtornos de humor, o uso de benzodiazepínicos entre as mulheres é significativo, e crescem os transtornos mentais e comportamentais associados ao puerpério. Portanto, as questões de gênero, somadas às condições socioeconômicas e culturais são determinantes à saúde mental das mulheres.

Na pesquisa foi perguntado a opinião dos entrevistados sobre as atividades cotidianas na instituição. Verificou-se que o maior percentual foi de 50% que conceituam como “Bom”, seguidos por 25% ótimo; 19% Ruim; 6% regular e 0% excelente.

Conforme Rabelo et al, (2005) as atividades grupais têm sido intensa e massivo. Ainda assim, é recentemente utilizado pelos serviços de saúde mental, os quais fazem parte da Reforma Psiquiátri­ca, sendo pioneiro na utilização pelo CAPS. Já de acordo com Brasil (2004), os CAPS oferecem diferentes tipos de atividades terapêuticas e caracterizam o que vem sendo denominado “clínica ampliada”. Essa nova concepção de clínica vem sendo (re) construída nas práticas de atenção psicossocial, no tratamento dos transtornos mentais.

Perguntou-se aos usuários se consideravam o tempo que passam na instituição como suficiente para suprir suas necessidades, verificou-se que que 100% respondeu que sim.

Segundo Brasil (2004) o tratamento feito é por tempo indeterminado e quanto ao tempo que o paciente passa na instituição: ele passa o dia no Centro e a noite retorna para a residência, além disso, as atividades desenvolvidas no tempo em que ele fica no CAPS apresentam, em comum, a capacidade de acomodar largas variações individuais e de respeito do tempo e ritmo psíquico de cada pessoa.

Os usuários foram indagados sobre a Satisfação quanto à Alimentação. Constatou-se, então, que 63% dos entrevistados mostraram não estar satisfeitos com a alimentação e somente 37% disseram que sim.

Conforme Brasil (2004) no CAPS, uma refeição é prevista para os usuários que o frequentam em um turno (e duas refeições para os que o frequentam em dois turnos), isto é, aos pacientes que permanecem dois períodos – manhã e tarde – são oferecidas três refeições: café da manhã, almoço e lanche da tarde.

Lopes et al (2005) recomenda que o momento da alimentação é uma boa oportunidade para os enfermeiros acompanhar os pacientes e, se necessário, orientá-los.

Perguntou-se aos pacientes entrevistados, qual o conceito atribuíam ao tipo de tratamento utilizado ás doenças mentais antes da reforma Psiquiátrica, constatou-se que 50% consideraram como ineficaz. 19% estigmatizante; 19% bom; 6% regular e 6% ótimo e nenhum dos pacientes considerou como excelente.

Antigamente, conforme Lima e Branco Neto (2010), os asilos de forma sub-humana, abrigavam os deficientes mentais. Os que eram muitos alterados eram imobilizados com lençóis úmidos. Assim, podemos observar que estes lugares eram, na verdade, como uma casa de detenção, cujo objetivo primordial era somente abrigar e não ajudá-los com medidas assistenciais. Sendo assim, verifica-se que estes espaços eram uma forma de exclusão, visto que o deficiente mental passara a estar separado da sociedade para não agredi-la.

Quando perguntados qual conceito sobre o atual modelo de tratamento da instituição, verificou-se o maior percentual de 50% que consideram como ótimo; 31% bom; 19% regular; 6% ótimo e nenhum dos entrevistados opinou estigmatizante, ineficaz ou como excelente.

Segundo Oulês (1985), a partir do momento em que o indivíduo com doença mental foi considerado com ser humano propriamente dito, ele passou a ser detentor de direito a assistência médica, independente de sofrerem com transtornos mentais severos e persistentes.

Os cuidados clínicos e de reabilitação psicossocial passaram a ser fundamental, com o objetivo de substituir o modelo asilar, evitando as internações e favorecendo o exercício da cidadania e da inclusão social dos usuários e de suas famílias. (BRASIL, 2004)

Perguntou-se aos usuários se a família acompanhava seu tratamento. Constatou-se, então, que 69% responderam que Sim e 31% Não.

Com esta afirmativa, observa-se que mesmo diante de toda a dificuldade, os familiares recorrem à internação em último caso, e por mais que a internação seja apontada como uma alternativa desejada nos momentos mais difíceis, os familiares acabam por recusá-la.  (RIETRA, 2009)

É importante ressaltar que o CAPS oferece atendimento também para a família, com o atendimento nuclear e a grupo de familiares, atendimento individualizado a familiares, visitas domiciliares, atividades de ensino, atividades de lazer com familiares. Uma vez que, nesse contexto, tão importante a promoção da autonomia dos usuários, é a participação da família como parceira no tratamento.

Foi perguntado a o usuário se ele pensa em parar seu tratamento devido a alguma insatisfação com a Instituição.  E a maioria (94%) respondeu que não, enquanto que somente 6% respondeu que sim.

Conforme Rietra (1999) o novo tratamento é mais humanitário, pois enfatiza a manutenção dos laços sociais, e assim surge a concepção de que ele deve ocorrer de forma comunitária. Essa questão faz com que o paciente não deseje parar com seu tratamento, pois ele percebe que está tendo resultados significativos.

Verificou-se a avaliação dos usuários de um modo geral sobre a instituição e o maior percentual (50%) refere-se aqueles que consideram como Ótimo. 38% bom; 6% regular e 6% excelente. Além disso, pode-se perceber nenhum usuário opinou sobre o quesito “Ruim”.

Conforme afirma Brasil (2004) o CAPS tem alcançado seu objetivo que é de  oferecer atendimento à população de sua área de abrangência, realizando o acompanhamento clínico e a reinserção social dos usuários pelo acesso ao trabalho, lazer, exercício dos direitos civis e fortalecimento dos laços familiares e comunitários. Neste sentido, tem deixado sua clientela satisfeita porque oferece um serviço de atendimento de saúde mental eficaz, o qual foi criado para ser substitutivo às internações em hospitais psiquiátrico.

 
 

CONCLUSÃO

 O estudo veio a mostrar informações importantes acerca dos pacientes que se encontram em tratamento e que utilizam os serviços substitutivos oferecidos pelo CAPS.

Inicialmente foi possível constatar que a média de idade dos pacientes é de 25 a 50 anos e que as mulheres são maioria entre os pacientes. Essa informação ratifica que as questões de gênero, somadas às condições socioeconômicas e culturais são determinantes à saúde mental das mulheres. E por isso se apresentam em grande número.

Observou-se, ainda, que 100% dos usuários consideram o tempo que passam na instituição como suficiente para suprir suas necessidades. Verificou-se também que a nova modalidade de tratamento é bem aceita pelos pacientes, pois 94% dos entrevistados consideram o tratamento de bom a excelente.

Com os dados observados, verificou-se que: 100% consideram como ótimo ou bom o atual modelo de tratamento da instituição e que demonstram estar satisfeitos com a instituição e não pretendem parar o tratamento, por conta de alguma insatisfação. Enfim, de um modo geral a avaliação dos usuários sobre a instituição é de que está caracterizada como bom a excelente.

Com o propósito de colaborar para a melhora nos serviços prestados pela instituição, considerando relevantes para a discus­são, sugerimos um levantamento para averiguar os motivos da insatisfação quanto à alimentação oferecida pela e também uma melhora no espaço físico para que este seja mais ventilado e arejado e que possa oferecer um melhor conforto para os usuários e familiares

Portanto, a este propósito e à guisa de uma abordagem preliminar, ratificamos às recomendações para estudos futuros, haja vista que tais questões abordadas não esgotam, evidentemente, o rol de questões que se podem levantar sobre o assunto, mas de apenas iniciar um debate que pode ser pro­veitoso para a busca de soluções e alternativas de uma melhor prestação do serviço no tratamento substitutivo oferecido pelo CAPS – Belém-PA.

 

 REFERÊNCIAS

 ALVES, C. F. O. et al. Uma breve história da reforma psiquiátrica. Revista de Neurobiologia, jan./mar.,  2009.

 BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Saúde mental no SUS: os centros de atenção psicossocial / Ministério da Saúde, Secretaria de Atenção à Saúde, Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. – Brasília: Ministério da Saúde, 2004.

 _______. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. DAPE. Coordenação Geral de Saúde Mental. Reforma psiquiátrica e política de saúde mental no Brasil. Documento apresentado à Conferência Regional de Reforma dos Serviços de Saúde Mental: 15 anos depois de Caracas. OPAS. Brasília, novembro de 2005.

CHIZZOTTI, A. Pesquisa em ciências humanas e sociais. São Paulo: Cortez, 1995.

 COSTA, M. M. A Contribuição Da Psicomotricidade Em Usuários De Saúde Mental. Monografia de Especialização. Rio de Janeiro: Universidade Cândido Mendes Pró-Reitoria De Planejamento e Desenvolvimento, 2002.

 FONTES, E. A História do Hospital Psiquiátrico “Juliano Moreira”. 2009. Disponível em: <http://edilzafontes.blogspot.com/2009/12/historia-do-hospital-psiquiatrico.html>. Acesso em: 26 Mar. 2011.

 FOUCAULT, M. História da Loucura. São Paulo: Perspectiva, 2008.

 GIL, A. C. Como elaborar projetos de pesquisa. São Paulo. Atlas. 1991

 HIRDES, A.  A reforma psiquiátrica no Brasil: uma (re) visão. Ciência & Saúde Coletiva. Ciênc. saúde coletiva. Vol. 14. N. 1. Rio de Janeiro. Jan./Fev. 2009. Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php?pid=S141381232009000100036& script=sci_art text>. Acesso em: 25 Mar. 2011.

 LIMA, V. B. O. BRANCO NETO, Joffre do Rêgo Castello. Reforma Psiquiátrica E Políticas Públicas De Saúde Mental No Brasil: resgate da cidadania das pessoas portadoras de transtornos mentais.  2010.

 LOPES, M. M. B. et al. Realidade Amazônica: Recortes da enfermagem do Pará. Belém: EDUFPS, 2006.

 OLIVEIRA, R. C. S. de. Desconstruindo o manicômio: a experiência dedesinstitucionalização no Hospital de Custódia e Tratamento do Estado da Bahia. Dissertação (mestrado). Universidade Católica do Salvador. Superintendência de Pesquisa e Pós-Graduação. Mestrado em Políticas Sociais e Cidadania. Salvador, 2009.

 OLSCHOWSKY, A. & DUARTE. M. L. C. Saberes dos enfermeiros em uma unidade de internação psiquiátrica de um hospital universitário. Revista Latino-Americana de Enfermagem. vol.15 no.4. Ribeirão Preto. Jul./Ago. 2007.

 OULÊS, J. Neurologia e psiquiatria para enfermeiras. São Paulo: Organização Andrei, 1985.

 RABELO, A. R. et al.  Um manual para o CAPS: Salvador: Departamento de Neuropsiquiatria da UFBA, 2005

 RIETRA, R. de C. Inovações na gestão em saúde mental: um estudo de caso sobre o CAPS na cidade do Rio de Janeiro. [Mestrado] Fundação Oswaldo Cruz, Escola Nacional de Saúde Pública; 1999. 125 p.

ROCHA, Ruth Lylius. Enfermagem em saúde mental. 2 ed. Rio de Janeiro: Senac Nacional, 2005.

 SILVA, Edna Lúcia da. Metodologia da pesquisa e elaboração de dissertação. 3 ed. rev. atual. Florianópolis: Laboratório de Ensino a Distância da UFSC, 2001.