SINOPSE DO CASE DA DISCIPLINA TÍTULOS DE CRÉDITO: A VALIDADE DO AVAL SEM AUTORIZAÇÃO DO CÔNJUGE

Por Patrícia Fernanda Santos Velozo | 21/06/2018 | Direito

SINOPSE DO CASE DA DISCIPLINA TÍTULOS DE CRÉDITO: A VALIDADE DO AVAL SEM AUTORIZAÇÃO DO CÔNJUGE1
Patrícia Fernanda Santos Velozo²
1 DESCRIÇÃO DO CASO
O tema a ser tratado refere-se à emissão de um cheque, realizada por João de Deus, em favor de Maria José o qual tinha como data de vencimento o dia 12 de dezembro de 2013 e valor de R$ 50.000,00. O cheque foi avalizado por Antônio Francisco, casado pelo regime legal, sem que sua esposa outorgasse a autorização para tanto. Em 10 de outubro de 2013, Maria José apresentou o cheque para pagamento, porém João de Deus não possuía recursos suficientes para o pagamento. Ao realizar a segunda apresentação, novamente a conta não tinha saldo. Passados vários meses de cobranças extrajudiciais, Maria José ajuizou ação monitória contra João de Deus e Antônio Francisco em 10 de outubro de 2013. João de Deus alega em defesa que o título não pode ser cobrado por não haver provas da relação que gerou a obrigação constante do título. Antônio Francisco, por sua vez, alega que não deve ser responsabilizado por João de Deus possuir bens suficientes para o adimplemento da obrigação, bem como por seu aval ser inválido em decorrência da ausência de autorização de seu cônjuge.
2 IDENTIFICAÇÃO E ANÁLISE DO CASO
2.1 DESCRIÇÃO DAS DECISÕES POSSÍVEIS No que diz respeito ao caso descrito em se tratando do cheque como título de crédito, questiona-se: deve ocorrer a manutenção ou extinção do aval? 2.1.1 Manutenção do Aval 2.1.2 Extinção do Aval
1 Case apresentado à disciplina Títulos de Crédito da Unidade de Ensino Superior Dom Bosco - UNDB.
² Aluna do 5º período, do Curso de Direito, da UNDB.
2.2 ARGUMENTOS CAPAZES DE FUNDAMENTAR CADA DECISÃO 2.2.1 Em decorrências dos fatos, defere-se pela manutenção do aval Fábio Ulhoa Coelho, dispõe do conceito dado por Vivante do que diz respeito aos títulos de crédito. Tal autor conceitua o mesmo como o documento necessário para o exercício do direito, literal e autônomo, nele mencionado. Nesse conceito estaria presente referências aos princípios básicos da disciplina do documento (cartularidade, literalidade e autonomia), de forma que o seu detalhamento permite a apresentação da teoria geral do direito cambiário. De acordo com Ulhoa, o título de crédito se distingue dos demais documentos que representam direitos e obrigações, em três aspectos, que, em resumo, seria que ele se refere unicamente a relações creditícias, não sendo documentado nenhuma outra obrigação, de dar, fazer ou não fazer; é detentor de uma grande facilidade na cobrança do crédito em juízo e ainda ostenta o atributo da negociabilidade, ou seja, está sujeito a certa disciplina jurídica, que torna mais fácil a circulação do crédito, a negociação do direito nele mencionado. Dentre os princípios que norteiam os títulos de crédito, pode-se citar o da cartularidade, literalidade e autonomia das obrigações cambiais. O princípio da carturalidade é aquele que dispõe que o exercício dos direitos representados por um título de crédito pressupõe a sua posse. Somente quem exibe a cártula, ou seja, o papel em que se lançaram os atos cambiários constitutivos de crédito, pode pretender a satisfação de uma pretensão relativamente ao direito documentado pelo título. Quem não se encontra com o título em sua posse, não se presume credor. O princípio da literalidade busca demonstrar que somente produzem efeitos jurídico-cambiais os atos lançados no próprio título de crédito. Atos documentados em instrumentos apartados, ainda que válidos e eficazes entre os sujeitos diretamente envolvidos, não produzirão efeitos perante o portador do título. O princípio da autonomia das obrigações documentadas no título de crédito afirma que quando um único título documenta mais de uma obrigação, a eventual invalidade de qualquer delas não prejudica as demais (COELHO, 2012).
O cheque possui três agentes: o emitente (emissor ou sacador), que é a pessoa que emite o cheque; o beneficiário, que é a pessoa a favor de quem o cheque é emitido; e o sacado, geralmente é o banco ou instituição financeira onde o dinheiro do emitente está depositado. É ordem de pagamento à vista. O cheque pode ser emitido de três maneiras: Nominal à ordem: no qual só pode ser apresentado ao banco pelo beneficiário indicado
no cheque, podendo ser transferido por endosso do beneficiário; nominal não à ordem: não pode ser transferido pelo beneficiário; e ao portador: não nomeia um beneficiário e é pagável a quem o apresente ao banco sacado. O cheque é considerado um título dito cambiariforme, visto que a Lei confere a ele força cambial, podendo assim instruir um Processo de Execução. Existem quatro tipos de cheque: o cruzado que é aquele que possibilita a identificação do credor e só poderá ser pago via depósito em conta; o que é para ser creditado em conta: O emitente proíbe o pagamento em dinheiro mediante a inscrição no anverso da expressão: “para ser creditado em conta”; o cheque visado: é aquele garantido pelo banco sacado durante um certo período e o cheque administrativo: é aquele sacado pelo banco contra um de seus estabelecimentos (J.S.P, 2014).
No caso que está sendo tratado, pode-se verificar que se tem como suposto emitente João de Deus, como beneficiário, Maria José e, como avalizado, Antônio Francisco.
O cheque não admite aceite por se tratar de uma ordem de pagamento à vista, sendo assim a praça é obrigada a aceitar pagamentos em cheque. Sua transmissão a pessoa qualificada é feita através do endosso, com ou sem a cláusula “à ordem”. Indica dois atos jurídicos diversos, a transferência da propriedade do título e o mandato.
De acordo com Nodimar Correa:
“O aval também é admitido do cheque, podendo ser ele total ou parcial, lançado no anverso do cheque ou na folha de alongamento. O aval poderá estar expresso no título com as palavras “por aval” com a assinatura do avalista, ou simplesmente a assinatura no anverso do cheque considera-se avalista, com isso obrigando-se da mesma maneira do avalizado ao pagamento do título, se o avalista realizar o pagamento tem direito de regresso contra o avalizado e contra os coobrigados com este em virtude do cheque. ”
No que tange ao seu aval, este é expresso da forma convencional ou pela simples assinatura no anverso do cheque. Sendo que, na falta de indicação, considera-se avalizado o emitente. (J.S.P, 2014) No caso disposto, pode-se perceber que a manutenção do aval deve ocorrer tendo em vista que o avalizado Antônio Francisco agiu de má-fé e que a sua alegação de que não deve ser responsabilizado por João de Deus possuir bens suficientes para o adimplemento da obrigação não pode ser considerada, haja vista que na existência de aval, inexiste o benefício de ordem pois sua obrigação é autônoma e não acessória. Tal aval pode ter desobedecido o princípio da boa-fé objetiva haja vista que esta diz respeito a regra de conduta dos indivíduos nas relações jurídicas contratuais e no caso descrito, por saber que o aval poderia ser desconsiderado futuramente pela falta da assinatura de seu cônjuge levanta-se a dúvida sobre a atitude de boa-fé. Como dispõe Venosa: “[...] o princípio da boa-fé se estampa pelo dever das partes de agir de forma correta, eticamente aceita, antes, durante e depois do contrato, isso porque, mesmo após o cumprimento de um contrato, podem sobrar-lhes efeitos residuais. Importa, pois, examinar o elemento subjetivo em cada contrato, ao lado da conduta objetiva das partes. A parte contratante pode estar já, de início, sem a intenção de cumprir o contrato, antes mesmo de sua elaboração ” (VENOSA, 2008) 2.2.2 1 Em decorrências dos fatos, defere-se pela extinção do aval. Como encontra-se disposto no artigo 31 da Lei de Cheque e considerando o que foi observado no caso, pode-se afirmar que deva ocorrer a extinção do aval tendo em vista que: “Art . 31 O avalista se obriga da mesma maneira que o avaliado. Subsiste sua obrigação, ainda que nula a por ele garantida, salvo se a nulidade resultar de vício de forma. ” Tal nulidade, baseando-se no vício formal existente por não conter a assinatura do cônjuge, tem como defesa legal o artigo 1647 do Código Civil que tipifica:
“Institui o Código Civil.
SUBTÍTULO I
Do Regime de Bens entre os Cônjuges
Art. 1.647. Ressalvado o disposto no art. 1.648, nenhum dos cônjuges pode, sem autorização do outro, exceto no regime da separação absoluta:
I - alienar ou gravar de ônus real os bens imóveis;
II - pleitear, como autor ou réu, acerca desses bens ou direitos;
III - prestar fiança ou aval;
IV - fazer doação, não sendo remuneratória, de bens comuns, ou dos que possam integrar futura meação.
Parágrafo único. São válidas as doações nupciais feitas aos filhos quando casarem ou estabelecerem economia separada. ” Em relação ao cheque pós-datado, de acordo com Andrea Aldrovandi, o cheque pode ser antedatado ou pós-datado, o que não afetará a validade do título. Entretanto, a lei determina que o cheque apresentado para pagamento antes do dia indicado como data de emissão, seja pago no dia da apresentação (Lei 7.357/85 art. 32 parágrafo único, correspondente à 2ª alínea do art. 28 da Lei Uniforme). O cheque pós-datado, instrumento de crédito largamente utilizado no comércio, não é reconhecido legalmente no Brasil, enquanto conceito, portanto, não existe um suporte legislativo para ele em nosso país. Entretanto, a maioria dos doutrinadores brasileiros define o cheque pós-datado simplesmente como sendo "cheque com data posterior à data em que foi efetivamente emitido”. Ela ainda dispõe que:
“Como já visto, a pós-datação do cheque não impede que este seja apresentado para pagamento antes da data convencionada, bem como não representa qualquer impedimento ao pagamento do mesmo pelo sacado (art. 32, Lei 7.357/85). Quanto à esse assunto não há dúvidas, pois a lei é clara, e tanto a doutrina como a jurisprudência admitem essa regra, sem divergências. Entretanto, a pós-datação influi nos prazos de apresentação e, consequentemente, prescrição do cheque. Pois o prazo de apresentação deverá contar-se a partir da data aposta no título, ficando, assim, prorrogado, o que, por consequência, ocasionará a prorrogação do prazo de prescrição. Esta é a melhor interpretação, apesar de não estar prevista na lei. ” (ALDROVANDI, 2003) 2.3 DESCRIÇÃO DOS CRITÉRIOS E VALORES CONTIDOS EM CADA DECISÃO POSSÍVEL 2.3.1 Má-fé
Pode-se considerar o uso da má-fé para exigir a manutenção do aval, devendo analisar que, por conhecer tal direito, de que deveria ter a assinatura do seu cônjuge, Antônio Francisco, agiu de forma inadequada ao ser avalizado de tal cheque.
2.3.2 Boa-fé e nulidade
A boa-fé e a nulidade devem ser avaliadas no caso, considerando a boa intenção de avalizar o cheque, podendo ter considerado que o beneficiário solicitaria apenas na data que foi acordada; e que a nulidade existe efetivamente com a ausência da assinatura do cônjuge ato que é defendido pela lei.
REFERÊNCIAS
ANDROVANDI, ANDREA. Cheque pós-datado. Disponível em: <http://jus.com.br/artigos/4048/cheque-pos-datado/3 >. Acesso em: 12.out.2015
COELHO, Fábio. Curso de Direito Comercial. v.1: direito de empresa. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2012. CORRÊA, Nodimar. Lei do cheque nº 7.357 de 02 de setembro de 1985. Disponível em: < http://egov.ufsc.br/portal/conteudo/lei-do-cheque-n%C2%BA-7357-de-02-de-setembro-de-1985 >. Acesso em: 12.out.2015 J.S.P, L.H, N.P.S. Direito Cambiário. 2014. VENOSA, Sílvio. Direito Civil: parte geral. v.1. 4 ed. São Paulo: ATLAS S.A, 2004.

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