A UNIVERSALIDADE DOS EFEITOS TRANSNACIONAIS DA FALÊNCIA E O CENÁRIO BRASILEIRO
Por ANA MARINA SOEIRO PEREIRA - FRANCYANE SOUZA FERNANDES DOS SANTOS | 20/01/2016 | DireitoAUTORAS:
ANA MARINA SOEIRO PEREIRA
FRANCYANE SOUZA FERNANDES DOS SANTOS
A UNIVERSALIDADE DOS EFEITOS TRANSNACIONAIS DA FALÊNCIA E O CENÁRIO BRASILEIRO
INTRODUÇÃO
As questões envolvendo o processo falimentar são sempre provocadoras e complexas. O instituto da falência corresponde à execução concursal do empresário que, como devedor, possui o ativo inferior ao passivo, ou seja, é insolvente e deve quantia superior ao que possui em seu patrimônio. Deste simples conceito, surgem tantos outros desdobramentos importantes para a dinâmica jurídica, empresarial e econômica de um país, como no caso do estudo sobre os efeitos transnacionais da falência (COELHO, 2012).
A insolvência transnacional diz respeito à questão de que há um envolvimento real entre a economia, as finanças e a organização societária mundial e, sendo assim, a insolvência de uma parcela econômica gera efeitos globais. Porém, esse impacto em massa se desconstitui quando se trata de falência e recuperação de empresa, pois cada país possui sua organização jurídica e meios específicos de solucionar tais questões, como no caso do uso da tese da universalidade (PORDEUS, 2009).
Vista como um dos grandes desafios da globalização, a insolvência internacional se dá principalmente pela ausência de legislação específica sobre o assunto e pela forma com que as organizações empresariais atuam internacionalmente. De certo, hoje já se vê uma tentativa dos ordenamentos jurídicos em se adaptar a essa realidade. No Brasil, a nova Lei de Falências e Recuperação de Empresas trouxe poucas inovações a respeito do tema. Apesar disso, não são raros os casos de insolvência transnacional envolvendo empresas brasileiras (GODOY, 2004).
A falência e suas implicações nacionais e transnacionais é questão cada vez mais presente no dia a dia dos juristas, que devem estar sempre atentos para perceber o impacto deste tema na realidade da economia atual. Sendo assim, observando a importância não só jurídica como também econômica deste assunto, vê-se a necessidade de uma abordagem adequada que relacione tais especificações com os fatos práticos do mundo globalizado.
1 O INSTITUTO DA FALÊNCIA
Supõe-se que a origem da falência ocorreu no direito romano, mais precisamente no direito quiritário, onde a maior preocupação se dava em punir o devedor que não quitava suas dívidas para com seus credores. Entretanto, o surgimento de novos institutos (lex poeteria papiria, bonorum venditio, curator bonrum, concursus creditorum, dentre outros) neste período contribuiu com a evolução da pena corporal como objeto de pagamento do devedor inadimplente para a execução patrimonial (BONETTI, 2006).
No Brasil, o instituto falimentar insurgiu pela primeira vez na fase imperial, com a promulgação do Código Civil regulamentando a matéria com o título “Das Quebras”. Aqui, a falência foi proposta como no direito francês, caracterizando-se pela cessação de pagamentos. No direito republicano, houve o advento da do Decreto-Lei 7.661/1945, que depois de sessenta anos, foi revogado pela promulgação da Lei 11.101/05, a nova legislação falimentar, hoje em vigor em todo o país (SOUSA, 2008).
Segundo Negrão (2013, p. 247 e 248),
A falência é um processo de execução coletiva, no qual todo o patrimônio de um empresário declarado falido – pessoa física ou jurídica – é arrecadado, visando o pagamento da universalidade de seus credores, de forma completa e proporcional. É um processo judicial complexo que compreende a arrecadação de bens, sua administração e conservação, bem como a verificação e o acertamento dos créditos, para posterior liquidação dos bens e rateio entre os credores. Compreende também a punição de atos praticados pelo devedor falido (...). Apreciada economicamente, a falência interessa não somente à economia individual como à pública, pois perturba o crédito público, trazendo dano para a economia geral.
No que diz respeito à natureza jurídica da falência, não há consenso doutrinário. Existe corrente que considera o instituto como ‘misto’, pois apresenta normas de direito público e direito privado. Outra parte da doutrina garante ter a falência caráter processual, de imensa complexidade, substancial ou administrativo. Há quem defenda que a falência é um direito autônomo, com características próprias. Para outros, é um processo ‘sui generis’, regulado por lei própria e específica (BONETTI, 2006).
O processo de falência se dá em três fases distintas. São elas: Pré-falimentar, que consiste no pedido da falência. Compreendida entre o requerimento até sair sua sentença. Falimentar, que é a fase onde se apura o passivo e o ativo. Ocorrendo também, investigações se necessário. Inicia-se com a sentença e se conclui com o encerramento da falência. Pós-falimentar ou reabilitação, que é o período de tempo onde se liquidam as dívidas. Mesmo não pagando integralmente os credores de acordo com as responsabilidades dos sócios, pode-se encerrar o processo (ARAÚJO, 2008).
Para a instauração do estado falimentar, reclama-se a existência de três principais pressupostos: a qualidade de devedor do empresário, o seu estado de insolvência ou de crise financeira grave e a decretação judicial da falência. Neste sentido, Campinho (2012) afirma que parte minoritária da doutrina também dispõe como pressuposto a pluralidade de credores, pois a existência de um único credor não seria capaz de configurar o estado de falência.
Sobre os princípios da falência, Tomazette (2011) enumera três como essenciais. O primeiro seria a igualdade entre os credores, que põe a falência como o processo de execução coletiva que visa o pagamento de todos os credores, de forma igualitária. O segundo consiste na celeridade processual, pressupondo que quanto mais rápido se der o processo falimentar, menores serão os prejuízos e melhores os resultados. O terceiro e último trata-se da economia processual, buscando-se também a redução do tempo e do custo processual.
A administração da falência se dá por três agentes: o magistrado, o representante do Ministério Público e os órgãos da falência, que seriam o administrador judicial, a Assembleia Geral de Credores e o Comitê de Credores. O juiz possui como função primordial a administração da falência, superintendendo os atos do administrador judicial. O Ministério Público agirá como fiscal da lei, podendo intervir de forma facultativa ou obrigatória, no exercício das suas funções constitucionais (COELHO, 2012).
Quanto aos órgãos da falência, tem-se que o administrador judicial atua como auxiliar do juiz e como representante dos interesses dos credores, devendo cumprir com suas funções estabelecidas em lei de forma responsável. A Assembleia Geral de Credores atua aprovando a constituição do Comitê de Credores, adotando medidas para realização do ativo do falido e tratando de interesses gerais dos credores. Já o Comitê de Credores tem como principal função a fiscalização do administrador judicial (COELHO, 2012).
Um dos principais efeitos da decretação da falência sobre as pessoas é o afastamento do devedor das suas atividades, perdendo a administração de sua empresa ou sociedade empresária e tornando-se inabilitado para o exercício do seu negócio. Somadamente, o falido vê-se obrigado a realizar prestações conforme o art. 104 da Lei de Falências. Apesar disso, vale ressaltar que o falido te conservada a titularidade do seu patrimônio moral, ou seja, dos direitos de personalidade (MAMEDE, 2012).
2 A INSOLVÊNCIA TRANSFRONTEIRIÇA
A globalização e o advento da tecnologia têm tornado o mundo cada vez mais conectado e com menos fronteiras, gerando uma forte dinamização do comércio transnacional. Tal fato tem repercutido no âmbito jurídico, pois as transações jurídicas internacionais têm sido cada vez mais requisitadas demandando uma pronta intervenção para garantir a proteção das relações jurídicas. Esta intensificação das relações transfronteiriças tem agravado a questão da insolvência transnacional (OLIVEIRA, 2002).
Neste sentido, Godoy (2004) afirma ser necessário destacar a questão do direito falimentar internacional, que não corresponde ao conceito básico já estudado sobre o que é a falência, mas sim do estudo procedimental da maneira com que a falência ocorre nos diferentes sistemas jurídicos e a forma de conexão dos procedimentos falimentares transfronteiriços, configurando-se aqui uma relação do direito falimentar internacional, não apenas no âmbito estatal, mas com o próprio direito internacional privado.
A insolvência transnacional se dá pela conexão entre dois ou mais diferentes ordenamentos jurídicos, tratando o direito falimentar internacional destes casos de insolvência coletivos com conexão internacional. Algumas hipóteses geradoras de efeitos em vários ordenamentos são os casos de devedores com patrimônio no estrangeiro ou de empresas com sede num lugar e estabelecimento em outro. Estes processos podem repercutir internacionalmente em ordenamentos distintos, pois apresentam elementos de conexão com diversas coordenadas jurídicas. A complexidade destas questões se dá quanto à competência internacional, à determinação da lei a ser aplicada e aos efeitos que a sentença produzirá em um país e no outro (OLIVEIRA, 2002).
Por possuírem legislações falimentares próprias, cada Estado é responsável por indicar as normas jurídicas dos procedimentos de insolvência internacional, do direito aplicável em cada caso, do direito interno aplicado à insolvência estrangeira e de cooperação internacional entre autoridades judiciárias no âmbito do direito falimentar internacional. Por não haver uma uniformização entre essas normas jurídicas de direito falimentar, é provável a ocorrência de conflitos entre os Estados (GODOY, 2004).
Reiterando este entendimento, Pordeus (2009, p. 01) complementa que a questão das falências internacionais “é provocada pelo tipo de organização adotada pelas empresas quando atuam no estrangeiro e pela falta de uma legislação que elimine as divergências no sistema de direito interno de cada país e no Direito Internacional”, afetando os distintos blocos econômicos dos quais participam a maioria das nações. No Brasil, mesmo com a promulgação da nova Lei de Falências e Recuperação de Empresas, Lei 11.101/2005, não foi possível observar a disposição expressa sobre o concurso internacional.
De fato, ainda que não uniformemente, o direito das insolvências internacionais tem contribuído, nos últimos anos, para o desenvolvimento de mecanismos de cooperação internacional que possam comungar de um sistema de insolvência transfronteiriço justo e economicamente eficaz. Existe, neste contexto, certa preocupação dos operadores do direito em promover uma maior cooperação internacional na coordenação de processos de insolvência transfronteiriços (MORAES, 2013). Um exemplo é a União Européia que, depois de várias tentativas, compactou normas de direito concursal internacional entre os seus membros, coma realização do Regulamento 1346 do Conselho (PORDEUS, 2009).
Ao prever a coordenação entre os processos de insolvência deixando pouca margem de improviso aos países que o adotam, o regulamento Europeu acaba tornando-se um modelo frágil, já que o mundo globalizado e o mercado socioeconômico estão sempre em constante modificação. Além deste regulamento, é possível também destacar, como instituto de cooperação internacional, a lei modelo da UNCITRAL. Para alguns doutrinadores, seria este o mecanismo ideal para solucionar as questões relacionadas à insolvência transnacional (MORAES, 2013).
3 O CENÁRIO INTERNACIONAL DIANTE DA UNIVERSALIDADE DOS EFEITOS
O processo de globalização ocorrido de forma acelerada no mundo, permitindo a comunicação e a possibilidade de realização de inúmeros negócios além-fronteiras tem se propagado em mercados diversos, assim a integração econômica, a formação de blocos, o incremento do comércio internacional, são exemplos de relações comercias internacionais que se realizam além-fronteiras, vindo a fomentar inúmeros problemas que antes eram restritos aos mercados internos e que passaram a se refletir no mercado internacional, fazendo com que se volte o olhar na busca por soluções, a fim de que esta evolução ocorra, mas com proteção e segurança jurídica aos negócios (GUERRA, 2009).
Guerra (2009) enfatiza que o surgimento e o crescimento desenfreado das sociedades transnacionais têm papel fundamental na expansão do mercado e por muito dos problemas sentidos, pois estas são imprevisíveis, se estabelecendo onde for apontado bons negócios e ampla lucratividade, fator este que torna o mercado mais volátil, haja vista os empresários cada vez mais buscarem meios de crescimento, ampliando a sua exploração econômica, para além do limite territorial nacional, sem que haja uma regulamentação jurídica.
A globalização além de promover o crescimento do mercado econômico, financeiro, comercial, cultural e social, tem se expandido para o campo do direito, pois hoje o direito internacional além de dizer respeito aos Estados interessa também aos agentes econômicos envolvidos nessa nova realidade do mercado, gerando o debate sobre qual direito prevalece frente a essa nova realidade, haja vista os diversos países terem seu próprio ordenamento jurídico (ROSSI, 2004).
Contudo, ainda não há uma uniformização, fator este que gera impasse, pois as transnacionais além de atuarem em grande parte do mundo, possuem negócios bilionários e que afetam em grande medida os países onde agem, e isto acaba por inibir que tais territórios busquem fazer valer sua norma, atuando apenas como mediadores na medida em que buscam garantir segurança jurídica e respeito. Para Rossi (2004, p.10) seria necessário à incidência de uma “superposição harmônica de normas que direcionem esses negócios, pois as corporações transnacionais ainda estão à margem do ordenamento jurídico, haja vista suas atividades serem nocivas e não se cogitar em tribunais internacionais de responsabilidade civil e internacional delas” (ROSSI, 2004).
Santos [?] diz ser necessário que os Estados busquem se harmonizar a fim de elaborarem normas modernas que regulem as insolvências transnacionais e possibilitem as transações no mercado internacional. Neste sentido, alguns países tem se levantado em busca de promover soluções a este problema, que se torna cada vez mais rotineiro, vê-se isso em Portugal, neste país segundo Alexandre de Oliveira:
A norma estabelece um elemento de conexão principal e outro subsidiário, para a atribuição de competência internacional aos tribunais portugueses. Uma vez estabelecida a competência internacional do tribunal segundo o critério principal, os efeitos da decisão tomada por este tribunal têm vocação universal, produzindo os seus efeitos além das fronteiras daquele Estado. A questão da falência internacional assume particular relevo em outra sede, no Mercado de Valores Mobiliários. Em Portugal a matéria é disciplinada pelo CVM.Nos arts. 481 e ss. do CSC está previsto um regime jurídico especial para as sociedades coligadas. Segundo este diploma as sociedades que reentrem em determinadas situações, serão submetidas a um regime jurídico diferenciado, no qual lhes são impostos deveres e direitos específicos.
Apesar de Portugal deter regularização interna existem situações que somente surtirão efeitos a depender do posicionamento do Direito Internacional Privado, portanto é uma questão ainda não estabelecida, principalmente pelo fato de não existir ratificação quanto a um procedimento unificado na Comunidade Europeia. Ressalta-se que diante da não consolidação de uma norma única a União Europeia vem utilizando o Regulamento 1.346/2000, com o objetivo de facilitar os conflitos normativos quanto aos processos de insolvência, buscando desta forma a cooperação entre os países, porém muitos são os problemas encontrados de controvertida solução. Quanto ao Mercosul, não existe convenção ou tratado que regularize tal insolvência, assim cada país signatário adota a sua normatização interna ou buscam solução através da observância de tratados ou convenções internacionais que tratam do tema (BONDARCZUK, 2010).
Necessário que se ressalte a existência da Lei Modelo Uncitral que foi criada no intuito de tornar mais célere e seguro os processos que envolvam falência, na busca por obter a cooperação dos diversos países, a fim de possibilitar a igualdade entre credores, devedores e terceiros, promovendo a recuperação das empresas, e estimulando o reconhecimento dos processos estrangeiros de falência. Contudo, apesar de ser vista por muitos doutrinadores como instrumento hábil para a solução de tais conflitos, ainda se percebe uma tímida utilização pelos países (BONDARCZUK, 2010).
Dentre os países que tem se manifestado a favor de tal lei tem-se o os Estados Unidos, que incorporou a Lei Modelo nas Insolvências Internacionais, objetivando, segundo Brooks e Lantz (2008), a cooperação dos juristas americanos com os estrangeiros para promover a proteção e crescimento dos ativos do devedor; facilitar a recuperação da empresa insolvente, garantir segurança jurídica além de uma administração justa, eficaz e eficiente. Desta forma os americanos tentam ordenar e controlar a entrada de um representante estrangeiro no sistema judicial americano, assim como organizar a atuação americana em processo de outro país. Ressaltam que diversos países têm enfrentado a situação da insolvência transnacional e tem tentado buscar soluções, contudo diante das inúmeras dificuldades que norteiam tal assunto, ainda não há uma solução adequada (BROOKS; LANTZ, 2008).
Nessa busca por um melhor entendimento quanto a este assunto é imperioso segundo Rossi (2004, p.07) que “o processo legislativo para a regulamentação de normas "supra-internacionais” com alcance num mercado transnacional seja feitode forma independente e imparcial por juristas de ilibada conduta e idoneidade para análise descompromissada de alternativas jurídicas que tornassem efetiva a interferência no poder das corporações transnacionais”.
4 A SITUAÇÃO BRASILEIRA E OS ASPECTOS JURISPRUDENCIAIS
A insolvabilidade tem a capacidade de gerar no mercado, na sociedade e nos Estados inúmeros problemas, sendo que em certos casos são capazes de gerar danos em proporções alarmantes, nesse sentido o direito buscou criar instrumentos capazes de dar suporte a todos os afetados no processo falimentar, buscando fazer com que sejam cumpridas as obrigações assumidas pelo devedor, em observância a sua capacidade de solvabilidade, e, além disso, buscou criar meios de possibilitar aos credores a chance de ver adimplidas as suas pretensões. Para isso foi criada no Brasil a Lei 11. 101/05 conhecida como Lei das Falências e Recuperação de Empresas (MAMEDE, 2011).
O direito falimentar brasileiro adota a regra de que será declarada a competência para o processamento do processo de falência o juízo onde o devedor possuir o seu principal estabelecimento, portanto, utiliza-se o sistema territorialista, assim se expressa o art. 3º da Lei de Falência:
Art. 3º. É competente para homologar o plano de recuperação extrajudicial, deferir a recuperação judicial ou decretar a falência o juízo do local do principal estabelecimento do devedor (leia-se empresário individual ou sociedade empresária) ou da filial de empresa que tenha sede fora.
Detendo ainda o juízo as características da unidade e universalidade, vindo a estabelecer-se como um juízo único e universal, visando assim, dirimir todas as questões que se relacionem a esta falência em âmbito nacional. No que tange a insolvência transnacional, doutrinadores apontam que o legislador pátrio perdeu uma grande oportunidade de se manifestar, pois a nova Lei da Falência e Recuperação de Empresa não trata do assunto, apenas normatiza a insolvência nacional (PEREIRA, [?]).
O legislador pátrio tem entendido que caso o devedor tenha seu principal estabelecimento no Brasil e caso não exista outros processos de falência sobre este devedor aberto em outros territórios, aqui será o juízo competente para processar a falência, porém necessita-se que os outros países envolvidos no processo reconheçam tal procedimento. Isso se dá em razão de que o ordenamento brasileiro não reconhece processo de falência aberto em outros países, quando o devedor possuir seu principal estabelecimento em terras nacionais (SOUSA, 2010).
Desta forma, o foro será absoluto, exclusivo e independente quando: os ativos do devedor se encontrarem no Brasil, quando o principal estabelecimento estiver sediado no país, e ainda quando existir bens imóveis no país ou filiais de matriz estrangeira, agora caso o principal estabelecimento esteja fixado em outro território e não houver filiais em terras brasileiras, fica impossibilitada a abertura do processo em território nacional. Contudo, os casos em que não se enquadram nas hipóteses supracitadas e que tiveram suas sentenças proferidas em territórios estrangeiros, estão sendo aceitas no Brasil caso estas sejam homologadas pelo Superior Tribunal de Justiça sob o fundamento da cooperação internacional (SOUSA, 2010).
Doutrinadores diversos apontam que inúmeras questões ficaram em aberto diante da nova realidade vivida no mercado global e da omissão legislativa por parte do ordenamento jurídico brasileiro. Ficando o mercado econômico e jurídico a esperar que o legislador se posicione quanto a tal questão, haja vista o mercado a cada dia criar novas possibilidades de negócios e relações entre os diversos setores nos mais diversos países, compreendendo-se que o processo econômico e de crescimento de um país está vinculado às suas atividades econômicas e à relação que estabelece com o mercado global, devendo assim se adequar a esta nova realidade, a fim de que cresça economicamente, mas com segurança e certeza jurídica.
CONCLUSÃO
As empresas e sociedades empresariais são constituídas com o intuito de cumprirem a sua função social, sendo consideradas organizações de grande importância para a sociedade em geral. Um estabelecimento empresarial em crise poderá causar enormes transtornos para a sociedade, para o Estado, e, principalmente, para os próprios credores, trazendo consequências como o desaquecimento da economia, demissões, queda dos níveis da concorrência e diminuição do recolhimento de tributos.
A Lei Falimentar surgiu neste contexto, possibilitando a convocação dos responsáveis pela empresa falida, dos credores, do Poder Judiciário, dentre outros, para munirem-se de meios legais, específicos e capazes de solucionar da melhor forma a falência instituída, na maioria dos casos, por conta da insolvência financeira e consequente inadimplência dos dirigentes.
A crescente globalização e a dinamização dos processos econômicos nos mercados mundiais desencadearam o surgimento das situações de insolvência de devedores com conexão internacional, hoje em dia cada vez mais frequentes. Tal fato tem obrigado os ordenamentos jurídicos nacionais a se adaptarem, adotando regras jurídicas de direito concursal internacional, que regulem a competência internacional e o direito aplicável em relação às situações de insolvência transfronteiriça.
Neste sentido, tem sido indispensável para os Estados o entendimento sobre todos os desdobramentos que envolvem a insolvência internacional, cada vez mais frequente nos negócios empresariais mundiais e nas economias em escala, tentando modelar-se para a melhor resolução destas questões. Afinal, faz parte da evolução social o crescimento econômico, assim como o seu desenvolvimento pela intensificação da liberdade de circulação de pessoas, bens, serviços, capitais e estabelecimento.
REFERÊNCIAS
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