A TRANSAÇÃO PENAL E A COMPOSIÇÃO CIVIL NA LEI 9.099/95 À LUZ DA TEORIA DOS JOGOS
Por Josafá Maia de Oliveira | 20/10/2016 | DireitoCarolina Cavalcanti Almeida²
Josafá Mai de Oliveiraa²
José Cláudio Cabral Marques³
RESUMO
O presente trabalho busca analisar a manifestação e a aplicação da Teoria dos Jogos dentro dos institutos penais alternativos da transação penal e da composição civil, de forma que aborde as características inerentes à Teoria dos Jogos, convergindo para os benefícios da aplicação dessa no Direito Processual Penal; justificando, assim, a necessidade tal utilização na melhoria do desenvolvimento processualista
INTRODUÇÃO
Tendo em vista que a justiça brasileira mostra um processamento muitas vezes falho - em relação a seus diversos âmbitos e áreas - pelas suas tantas lacunas na legislação, pela morosidade das decisões, pela precariedade nas investigações e penalidades; é falha pela forma como funciona o sistema carcerário e pelo aumento – e não a diminuição – da criminalidade a cada ano que passa.
As medidas despenalizadoras descritas na Lei nº 9.099/95 vieram como uma mudança vantajosa, pois, além das facilidades que trazem, abarcam alguns princípios do direito, como a economia processual, por exemplo, no qual os atos processuais devem ser praticados no menor tempo possível e da forma menos onerosa para o Estado. Além disso, os atos praticados durante a atuação dessas medidas não serão cercados de formalidade, o que acelera todo o processo.
Desta forma, observadas duas dessas medidas despenalizadores – a transação penal e a composição civil – enseja-se realizar um estudo conjuntural entre a Teoria dos Jogos e a medidas penais alternativas supracitadas.
Acerca da Teoria dos Jogos, em um parecer breve e geral, compreende-se por consistir em uma metodologia que é utilizada para a tomada de decisões de indivíduos que se interagem, podendo dizer que é o caminho utilizado para a escolha mais satisfatória em casos de interação estratégica (CARVALHO, 2007). Inicialmente esse método tinha sua aplicação direcionada apenas às ciências do ramo matemático, contudo, posteriormente, a teoria dos jogos passou a ser empregado em outras ciências como ciências políticas, filosofia, ética, entre outras.
Dessa forma, ao analisar a possibilidade de aplicação da Teoria dos Jogos no âmbito jurídico, questiona-se de que forma aplica-se e observa-se a Teoria dos Jogos no Processo Penal, focando nos institutos alternativos da transação penal e da composição civil, a fim de fomentar melhorias processuais nesse ramo do direito.
Tal estudo vem separado em três momentos que consistem na abordagem das características da Teoria dos Jogos, assim como sua aplicação no Processo Penal; a compreensão de como são utilizados os institutos da transação penal e da composição civil de danos e, por fim, a determinação acerca da relação dos institutos despenalizadores trabalhados com a Teoria dos Jogos e os benefícios que esta pode trazer para o Direito Processual Penal.
Nesse contexto, o assunto escolhido para estudo traz uma interessante discussão, tendo em vista que poderá ser mostrado de que maneira a Teoria dos Jogos pode ser aplicada nos institutos despenalizadores de que se trata, isto é, a Transação Penal e a Composição Civil, mostrando que estes institutos trazem uma espécie de quebra na obrigatoriedade da ação penal. Ademais, eles podem ser considerados relativamente novos no sistema jurídico nacional, e estão previstos na Lei dos Juizados Especiais Cíveis, lei nº 9.099/1995. Interessante ressaltar que a intenção desses institutos é possibilitar que se deixe em mesmo nível o crime cometido pelo agente e a pena a este aplicada.
Os institutos se tornam de fácil compreensão quando se faz uma interpretação destes através da lei, analisando, principalmente, os artigos 74, 76 e 89. Lei esta que veio na intenção de trazer uma justiça mais célere, menos complicada e de facilitar o cumprimento do princípio de acesso à justiça, quando se estiver tratando de crimes de menor potencial ofensivo. Aspecto interessante é que essas medidas dependem apenas das partes para serem utilizadas, isto é, vítima e autor, não envolvendo terceiros e tendo a intenção de afastar penas privativas de liberdade.
1 A FUNCIONALIDADE DA TEORIA DOS JOGOS E A ABORDAGEM DO DILEMA DO PRISIONEIRO
A priori, é importante abordar sobre o conceito da Teoria dos Jogos, sobre como ela pode ser aplicada na vida prática e sobre sua utilidade nas decisões pessoais de cada sujeito. Aqui pretende-se apresentar de que forma realiza-se o estudo das tomadas de decisões entre indivíduos, em que o resultado da escolha de cada um depende da decisão do outro indivíduo, sendo interdependentes, podendo, assim, vir a influenciar em tantas questões no Direito Penal.
A Teoria dos Jogos conceitua-se como um método que pode ser usado na compreensão das decisões que são escolhidas por indivíduos que interagem entre si e, assim, a partir de tal compreensão, pode-se observar qual seria a melhor escolha a ser adotada (CARVALHO, 2007).
Neste viés, traz Sandroni:
De modo geral, a teoria dos jogos demonstra que, em jogos de apenas uma pessoa, a estratégia é determinada exclusivamente pelas regras do próprio jogo. Em jogos com duas pessoas, cada jogador leva em consideração as possíveis estratégias do outro. (...) Finalmente, nos jogos com mais de duas pessoas, o que uma perde não é necessariamente ganho por outra, exigindo considerações mais complexas. No entanto, o resultado pode ser influenciado pela formação de coalizões, até o ponto de reduzir o jogo com n participantes a um jogo com apenas dois participantes. No mundo dos negócios podem acontecer situações desse tipo, quando algumas empresas de grande porte fazem acordos com a finalidade de retirar do mercado pequenos concorrentes e exercer de fato um poder de cartel
À princípio, a Teoria dos Jogos fora desenvolvida em um contexto matemático-economista; encabeçada por John von Neumann e Oskar Morgenstern, um matemático e um economista, respectivamente, que desenvolveram a teoria do matemático francês Felix Edouard Justin Emile Borel, quem fez o esboço dos conceitos dos quais emergiria a Teoria dos Jogos; e mais adiante foram desenvolvidas teorias por John Forbes Nash Jr., John C. Harsanyi e Reinhard Selten, que contribuíram para a disseminação da Teoria dos Jogos (CARVALHO, 2007). Entretanto, a Teoria dos Jogos não ficou apenas aderida à Matemática e à Economiga, ela se irradiou para outros âmbitos científicos, como a Biológica, a Psicologia, a Administração, as Ciências políticas, a Sociologia e o Direito.
Assim, em vários âmbitos, a teoria dos jogos trouxe a conjuntura que observa o comportamento decisional-estratégico, onde toma-se por decisão estratégica a escolha que o indivíduo opta em consideração a outros indivíduos e as decisões destes, que podem influenciar diretamente na decisão daquele; desta forma, as decisões estratégicas interligam dois ou mais indivíduos em um contexto decisional (BALBINOTTO, 2016).
Mostra-se necessário constar aqui a teoria encabeçada por John Forbes Nash Jr., acima citado, que serviu de grande contribuição para a consolidação e propagação da Teoria dos Jogos. Conforme a sua teoria, denominada de equilíbrio de Nash, onde os jogadores devem fazer “a escolha ótima (aquela que maximiza seu payoff), dada a escolha do outro” (BALBINOTTO, 2006, p. 17). Ou seja, considera-se que um par de estratégias “constitui-se num equilíbrio de Nash se a escolha de A for ótima, dada a escolha de B, e a escolha de B for ótima dada a escolha de A e não houver incentivos para que ambos mudam de estratégia” (BALBINOTTO, 2006, p. 17).
Deve-se entender que o equilíbrio de Nash diz respeito a jogos não cooperativos, conforme explicita Alecsandra Neri de Almeida (2006, p.4):
Um conjunto de estratégias constitui um equilibro de Nash se a escolha de cada jogador for ótima dada à escolha de todos os outros jogadores, o qual implica em não arrependimento. O teorema de Nash refere-se a jogos não cooperativos, mas pode haver mais vantagem para os jogadores se concordarem em cooperar, pelo menos parcialmente do que insistirem em enfrentarem-se uns aos outros, podendo melhorar os respectivos ganhos e atribuir ganhos indiretos aos outros jogadores a troco de poderem influenciar nas suas ações. Nash formulou
Trazendo o contexto da Teoria dos Jogos para o âmbito do Processo Penal, primeiramente faz-se necessário visualizar o processo como um jogo, o jogo processual, no qual as regras são determinadas pelo Estado e têm sua sustentação na figura do magistrado; limita-se no tempo desde o recebimento da denúncia até o trânsito em julgado; devendo ser dinâmico e possibilitando mudanças, alternâncias, vitória, empate ou derrota (ROSA, 2014). Complementando seu pensamento Alexandre Morais da Rosa (2014, p.16) continua:
De alguma maneira o jogo processual penal dá ordem parcial ao caos, estipulando o local do jogo, seus limites, regras, jogadores e julgadores. Daí seu efeito cativante. Para ser um bom jogador não basta apenas conhecer as regras processuais. É preciso ter habilidade, inteligência, ritmo, harmonia, capacidade de improviso e fair play. Ao se assumir a função de jogador ou julgador, no jogo processual penal, acontece a criação de ambiente apartado das preferências pessoas. Utilizam-se mascaras e lugares diferenciados, para os quais a estética, a performance, roubam a cena, O espetáculo do jogo processual lança luzes narcísicas, promove o aparecimento de traços não existentes e/ou obliterados na vida privada.
Dessa forma, instrumentaliza-se a Teoria dos Jogos para ser aplicada no Processo Penal, partindo do pressuposto que o resultado processual a ser alcançado advém da interação estratégica e tática no curso do processo; o comportamento daqueles jogadores que participam do processo pode influir consideravelmente no desfecho do processo; assim, o jogo processual tem uma intricada interação entre os jogadores e o julgador, vindo o resultado a depender do seguimento das regras do jogo, levando a anulação do processo quando estas não são seguidas (ROSA, 2014).
Interessante abordar um dos modelos teóricos mais conhecidos dentro da moderna Teoria dos Jogos, que é o chamado Dilema do Prisioneiro, que vem a ser um jogo simultâneo e não cooperativo, onde descreve-se pela seguinte situação: dois indivíduos infratores são presos e na carência de provas da participação deles no crime, a polícia passa a fazer interrogatórios em salas separadas e realiza propostas também separadamente:
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