A TRAJETÓRIA DE FARADAY E O PODER POR TRÁS DA IDEIA DE CAMPO

Por DIEGO PEREIRA AGUIAR | 08/10/2014 | Arte

 A TRAJETÓRIA DE FARADAY E O PODER POR TRÁS DA IDEIA DE CAMPO.

DIEGO PEREIRA AGUIAR

(lubevi99@yahoo.com.br)

          Michael Faraday, filho de ferreiro, nunca frequentou o ensino formal, consegue emprego como assistente de encadernador de livros. Aprendeu muito sozinho copiando as páginas que lhe interessava. Mais tarde Faraday consegue assistir uma palestra de Sir. H. David, onde faz algumas demonstrações experimentais, Faraday fica muito interessado em entrar para aquele mundo. Ele verifica com H. David a possibilidade de trabalhar como seu assistente, não obtendo sucesso.

          Após um acidente que sofrera durante uma experiência, H. David fica temporariamente cego e convida Faraday para ser seu assistente. Nesse trabalho ele começa como lavador de vidrarias e com o tempo passa a se dedicar às experiências com a eletricidade.

          As revistas científicas começam a ser criadas afim de divulgar a ciência. Em 1819 Faraday tem acesso a um trabalho de Oersted. Nesse trabalho ele descreve uma experiência realizada em seu laboratório em Copenhague onde vê-se a possibilidade de relacionar a eletricidade, o magnetismo e o movimento.  Muito interessado no trabalho de Oersted, Faraday faz uma descoberta muito importante, ele prepara uma experiência com um tanque de mercúrio, uma pilha “voltaica” e um magneto. Com o magneto no centro do tanque, aplicando uma “voltagem” entre o mercúrio e um suporte de cobre, então ele pendura um fio de cobre na parte superior do suporte e este (o fio) entrava no tanque de mercúrio. O fio pendurado começa a girar em torno do centro do magneto. Em 4 de setembro de 1821 através de sua descoberta Faraday inventa o primeiro motor elétrico do mundo, isto é, ele utilizou eletricidade e magnetismo para produzir movimento, uma leitura e continuidade interessantes dos trabalhos de Oesrted. Ainda em 1821 Faraday se esforçava para entender as forças misteriosas por trás do eletromagnetismo e a revolução industrial (e a criação das máquinas a vapor) serviam de pano de fundo para esse enredo histórico da filosofia natural. Faraday interessava-se em como funcionavam os magnetos, ele conseguia visualizar em sua mente em três dimensões as “linhas de força” que saíam de um pólo a outro do magneto, assim ele consegue projetar esse modelo em duas dimensões utilizando limalha de ferro, o magneto e um anteparo fino. Ao espalhar a limalha por cima de uma folha ele visualizava as “linhas de força” desenhadas pela limalha de ferro no papel. Com conhecimento necessário sobre a força magnética ele começa uma nova série de experiências. Faraday sabia que ao combinar eletricidade e magnetismo podia produzir movimento, mas uma nova pergunta levaria a ciência mais adiante.

-Será que, combinando movimento e magnetismo produzir-se-ia a eletricidade?

      Em 29 de agosto de 1831, Faraday consegue obter a resposta e mudar o mundo. Com seu anel de indução ele descobre que o movimento de um magneto entre duas bobinas produziria eletricidade. Tanto Michael Faraday, no Reino Unido, como Joseph Henry, nos Estados Unidos, demonstraram cada um a seu modo, mas ao mesmo tempo, a possibilidade de transformar energia mecânica em energia elétrica. No dia 17 de outubro, ele realizou seu experimento mais conhecido, conseguindo induzir corrente elétrica pela variação de um campo magnético. Foi a demonstração do primeiro gerador (também conhecido como dínamo), que transforma a energia mecânica em energia elétrica.

          Faraday estava interessado em entender os princípios físicos e não se preocupava com a aplicação prática de suas descobertas, por isso mesmo o primeiro gerador elétrico comercial a utilizar as descobertas de Faraday (Lei de Faraday da Indução) só viria a ser construído mais tarde.

               Após todas essas fantásticas descobertas, Faraday surpreende novamente ao propor um princípio da não existência de cargas dentro de um condutor oco, através desse princípio nasce a famosa “gaiola de Faraday”, baseia-se na inexistência de diferença de potencial num condutor oco.

          Durante dez anos Faraday investigou, ainda que não continuamente, as consequências da indução em diferentes aplicações.  Faraday passou por um período de aproximadamente 4 anos sem dedicar-se à física tendo contraído uma doença que instalou-se em seu corpo até sua morte. Após essa pausa de 4 anos ele retoma suas pesquisas de forma intensa em 1845. Faraday fez duas grandes contribuições à ciência, investigou com sucesso o fenômeno do diamagnetismo e o efeito do magnetismo sobre a luz polarizada.

A possibilidade de utilizar a luz polarizada para investigar o estado dos corpos transparentes já havia sido testada por ele anteriormente (como revela seu caderno em anotações realizadas em 1822), porém, não havia sido levada adiante. Nessa segunda investida, Faraday utilizou vidros produzidos por ele mesmo e persistiu nas investigações até descobrir a rotação magnética do plano de polarização da luz. Essa descoberta foi especialmente valorosa por revelar uma ponte entre o magnetismo e a óptica, ou seja, representar um caminho de unificação entre teorias de diferentes campos.

        Todas essas importantes descobertas nos levam a pensar que talvez  “...sem Faraday, ainda estaríamos vivendo no escuro...”

O  CONCEITO  DE  CAMPO: O nascimento de uma ideia poderosa

                A ideia de campo proposta por Michael Faraday tem grande importância para construção de ideias posteriores na Física e uma delas é a importante compreensão da natureza da luz, como sendo onda eletromagnética, embora hoje sabe-se bem que esta apresenta natureza dual de onda-partícula. Essa ideia de campo joga luz a algumas questões que não tinham sido respondidas até então.

               Talvez seja interessante iniciar esse estudo nos fazendo a seguinte pergunta:

    O que é mesmo o Campo Elétrico?

Para (ROCHA 2002) essa questão pode ser respondida de duas formas uma de um ponto de vista puramente matemático e outra do ponto de vista qualitativo. Entretanto antes de ater-nos à resposta iremos situar a visão de Maxwell acerca da diferença entre o modo de Faraday e o modo dos matemáticos conceberem os fenômenos eletromagnéticos.

             Desse modo vale notar que a ideia que prevalecia até então na eletricidade  e no magnetismo e até na gravitação era o conceito de ação à distância, isto é, a interação entre duas partículas carregadas dava-se de forma direta e instantânea. Faraday foi quem introduziu o conceito de campo a partir de linhas de força onde a ação entre duas partículas  deveria se dar através de um certo meio. Ele visualizava as forças magnéticas e elétricas como uma espécie de linhas elásticas que se estendiam no espaço através de ímãs ou de corpos eletrizados, ou de fios condutores, e que podiam ser  destorcidas, seriam então as curvas magnéticas  e mais tarde chamadas de linhas de força. Para Faraday o espaço vazio passava a constituir-se em um campo de forças já que estas linhas deveriam preencher inteiramente este espaço.

              As ideias de Faraday foram estruturadas matematicamente por Maxwell. Embora Faraday não ter recebido uma formação regular em ciências e matemática ele conseguiu explicar muitos dos fenômenos eletromagnéticos que observara, e fazia isso no campo das ideias sem utilizar de ferramentas e artifícios matemáticos. A respeito das duas visões citadas anteriormente ( a dos matemáticos x Faraday) para Maxwell, ainda que Faraday não utilizasse da linguagem matemática para construção de suas ideias esta linguagem estava presente nos seus conceitos, ou seja, os métodos de Faraday assemelhavam-se àqueles nos quais começamos com o todo e chegamos às partes por análises, enquanto os métodos matemáticos ordinários baseavam-se sobre o princípio de iniciar com as partes e construir o todo por síntese.

          

             Agora já expostas tais ideias, voltemos a pergunta inicial sobre o campo.

Sobre o ponto de vista matemático, O campo elétrico seria um vetor obtido através da solução das equações de Maxwell. No caso particular de uma partícula carregada, este campo corresponde ao vetor representado por:  E =k(q/r³)r  , cujo módulo é k(q/r²).  

Em relação ao ponto de vista qualitativo  valoriza-se mais às “coisas” que os símbolos usados pelas equações matemáticas.

             

3.      O MISTÉRIO POR TRAS DAS  “ONDAS DE  LUZ” (...de  Maxwell).

“...que haja luz por trás do mistério da eletricidade e do magnetismo...” Maxwell certamente jamais disse isso, “mais a luz se fez” por meio de suas famosas equações.

       

       Maxwell consegue sintetizar uma formulação unificada das Leis de Coulomb, Oersted, Ampère, Biot e Savart, Faraday e Lenz. Essa leis foram expressas por Maxwell na forma de quatro equações denominadas: Lei de Gauss para a Eletricidade, Lei de Gauss para o Magnetismo, Lei de Ampère-Maxwell e Lei de Indução de Faraday. Essas quatro equações são conhecidas como equações de Maxwell. Faz-se portanto, uma unificação importante para a física. De fato essa unificação começa desde Oersted e Faraday quando relacionam movimento, eletricidade e magnetismo, entretanto somente através de Maxwell que essa unificação toma forma por suas equações. Essas descobertas possibilitaram a importante percepção de que tanto o campo elétrico como o campo magnético satisfazem a uma equação análoga à equação de Jean D' Alambert para ondas elásticas, desse modo Maxwell verifica que a velocidade de suas ondas eletromagnéticas coincidiam com a velocidade da luz, o que apontava para a natureza eletromagnética da luz.

            Na época já se conhecia o valor da velocidade  da luz que fora medida por Armand Fizeau em 1849, tendo encontrado um valor de 314.000 km/s para propagação no ar. Os cálculos efetuados por Kolhraush e Weber utilizando experiências eletromagnéticas indicavam um valor de 311.000 km/s para a velocidade de propagação da luz, um valor muito próximo do encontrado por Fizeau.

             Em 1887 H. Hertz, consegue produzir as chamadas ondas hertzinianas  com comprimento de 0,3 metros, hoje chamadas de ondas de rádio. Esta seria a confirmação experimental para a teoria proposta por Maxwell. Hertz utiliza um circuito oscilante de pequenas dimensões para produzir as “ondas de Luz”, e sobre isso ele escreve:

       “As experiências descritas me parecem em alto grau adequadas para remover as dúvidas sobre a identidade da entre a luz, a radiação térmica e as ondas eletromagnéticas.”

             Em 1835 essas descobertas serviriam de base para Samuel Morse construir o primeiro telégrafo eletromagnético e a partir da telégrafo em 1876 Bell desenvolve o primeiro telefone. Vale dizer que na época Elisha Gray também trabalha no desenvolvimento do telefone, tendo Alexandre G. Bell conseguido patenteá-lo primeiro.

                  As ondas eletromagnéticas produzidas por Hertz abriria as portas para a criação do primeiro telégrafo sem fio quando em 1896 o italiano Marconi criou o primeiro rádio, já se podia enviar informações sem fio através da radiotelegrafia. Na sequência tivemos a invenção da radiotelefonia ,o próprio rádio e a  TV.  Hoje em dia não conseguimos imaginar nossas vidas sem essas descobertas, com a transmissão de informações e processamento delas através de chips de computadores que utilizam milhões de componentes e a invenção do transistor tem forte influência nesse avanço.

                       De todo modo podemos dizer que sem Faraday, ainda estaríamos no escuro, mas foi Maxwell quem jogou luz no mundo obscuro e desconhecido por trás da eletricidade, do magnetismo e da própria natureza da luz. Claro que ele não teria feito tudo isso não fosse a genialidade de outros grandes notáveis.

                     Tempos mais tarde Albert Einstein daria outra interpretação para a natureza da luz, mas essa já é outra história.

    

REFERÊNCIAS

1. R. P Feynman, R. B. Leighton e M. Sands, Lectures on Physics, vol II, Addison-Wesley Publishing Company (1977).

2  M.R. Robilotta, M.J. Bechara e J.L.M. Duarte, A Física e o Eletromagnetismo (Apostila de Física 3, Instituto de Física da USP). 1981,  p. 11.   

3 ROCHA, José Fernando Moura. O conceito de "campo" em sala de aula: uma abordagem histórico-conceitual.  Rev. Bras. Ensino Fís. [online]. 2009, vol.31, n.1 

4  NETO, A. V. Andrade. O CONCEITO DE CAMPO, AS EQUAÇÕES DE MAXWELL E O MENSAGEIRO DO OUTONO.  CADERNO DE FISICA DA UEFS. 2006 , vol. 4, p. 23-39

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