A TERCEIRIZAÇÃO E SUAS CONSEQUÊNCIAS PARA O TRABALHADOR

Por Katherynne Dias | 06/11/2016 | Direito

RESUMO

TERCEIRIZAÇÃO E TRABALHO

A terceirização é tema que há tempos desafia a doutrina e em especial a jurisprudência dos Tribunais trabalhistas país afora, em razão de suas características e peculiaridades que, se de um lado trazem benefícios produtivos às empresas e empregadores, do outro trazem em si o risco da relativização ou enfraquecimento de direitos trabalhistas conquistados após grande esforço social e político. Atualmente, o Projeto de Lei nº 4.330 de 2004 do Deputado Sandro Mabel se propõe a regulamentar a prestação de serviços a terceiros e as relações de trabalho dela decorrentes, na tentativa de colocar fim à insegurança jurídica que caracteriza a terceirização no Direito brasileiro. O Projeto de Lei positiva alguns entendimentos já consolidados na jurisprudência trabalhista, apresenta uma conceituação do trabalho terceirizado, regulamenta a atividade de empresas prestadoras de serviços a terceiros, e ao mesmo tempo, pode criar novos paradigmas ao tornar legais situações até então proibidas pela orientação jurisprudencial e pela imensa maioria doutrinária, como por exemplo, a possibilidade de a atividade terceirizada ser inerente à atividade econômica da empresa contratante. Sob este prisma, pode o Projeto de Lei ao ser aprovado, e ao que tudo indica será aprovado em sua redação atual sem modificações, reavivar sob novos paradigmas um debate doutrinário e jurisprudencial sobre o tema.

INTRODUÇÃO

A proposta do trabalho em questão é pesquisar a origem da terceirização, um breve estudo dos poucos diplomas legais que tratam do assunto no Brasil. Em regra, leciona a doutrina que a terceirização é possível nos casos de trabalho temporário, vigilância, conservação e limpeza, bem como serviços sempre relacionados a atividades meio da empresa tomadora. A própria doutrina preconiza a ideia de que a terceirização ocorra, desde que não precarize as condições de trabalho e salário, portanto há que se analisar os diversos aspectos deste fenômeno que não foi criado no mundo jurídico, mas que produz efeitos no mundo do trabalho.

Não há como estancar os efeitos que tal instituto provoca, tão pouco bani-lo das relações trabalhistas, o Brasil se utiliza largamente da terceirização, mas há uma lacuna legislativa que deve ser preenchida de maneira criteriosa devido à multiplicidade de questões e problemas fáticos que suscita.

Trabalha-se com a hipótese de que o fenômeno da terceirização deve ser analisado com cuidado, uma vez que o objetivo principal da empresa tomadora é o enxugamento de custos, em contrapartida a contratada deve oferecer valores atrativos. A “conta” de tal economia é paga pelo empregado terceirizado que geralmente mantém a percepção de salários menores que os empregados efetivos na mesma função. A discrepância é real, comprovada e ofende a inviolabilidade de direitos sociais assegurados pela Constituição da República, como os princípios da dignidade da pessoa humana e da isonomia.

A finalidade da proposta é, através da reunião do entendimento doutrinário e jurisprudencial acerca do tema, discutir sob uma perspectiva crítica, a fragilidade das relaçõestrabalhistas na esfera das terceirizações, tendo como foco a analise do Projeto de Lei 4330/04 proposto pelo deputado do Estado de Goiás, Sandro Mabel, que tramita na Câmara dos deputados desde 2004. Serão apresentadas as consequências negativas oriundas de sua aprovação, considerando que, viria a precarizar e fragilizar ainda mais as relações trabalhistas, vindo de encontro às necessidades dos empregados que se submetem a este tipo de contratação. A fragilização surge quando admite que a Administração Pública invoque a Lei das Licitações para se eximir da responsabilidade subsidiária nos contratos, prossegue quando permite que haja a terceirização nas atividades fim em serviços públicos essenciais como educação e saúde, além enfraquecer a representatividade sindical dos terceirizados, tendo em vista que os mesmos são filiados aos sindicatos oferecidos pela prestadora de serviços e não aos da categoria de atuação, entre outros prejuízos que certamente significariam um retrocesso nas conquistas trabalhistas.

Diante do exposto, acredita-se que a ampliação do debate proposto, encontra alguma relevância sob a ótica da necessária democratização das discussões diante de uma mudança tão significativa e que afeta grande parcela de trabalhadores. Cumpre ressaltar a importância de um estudo legislativo e democrático sobre o tema, onde as discussões sejam abertas, respeitando-se o posicionamento de todos os interessados, de modo a equilibrar as decisões tendo como norte os princípios e direitos assegurados pela Constituição da República.

1 FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA

O modelo da contratualização social da modernidade capitalista o trabalho foi a via de acesso à cidadania, quer pela extensão aos trabalhadores dos direitos cívicos e políticos, quer pela conquista de direitos novos específicos ou tendencialmente específicos do coletivo de trabalhadores, como o direito do trabalho e os direitos econômicos e sociais. A erosão crescente desses direitos, combinada com o aumento do desemprego estrutural, conduz à passagem dos trabalhadores de um estatuto de cidadania para um estatuto de “lumpencidadania.”

A licitude da terceirização envolve as seguintes situações fático-jurídicas: a) relação de trabalho temporário –Lei 6.019/74 (Enunciado de Súmula TST 331 - I); b) contratação de atividades de vigilância – Lei 7.102/83 (Enunciado TST 331 – III); c) contratação de atividades de conservação e limpeza (Enunciado TST 331 – III); d) contratação de serviços especializados, ligados a atividade-meio do tomador do serviço (Enunciado TST 331 – III), o que erá destrinchado no trabalho final .

Via de regra, o trabalhador presta seus serviços diretamente em benefício da empresa que o contratou e através dela se insere em determinado meio ambiente de trabalho. Se em algum momento tiver direitos lesados, pode cobrar do empregador o que lhe é devido.Instituto desenvolvido originalmente dentre as ciências da administração, a terceirização qualifica-se pela possibilidade de uma empresa ou Ente Público delegar para outra empresa a execução de parte das suas atividades. Desse modo, a prestadora de serviços terceirizados disponibiliza mão de obra para a tomadora.

O que ocorre, então, é que os empregados terceirizados, a despeito do local onde trabalham, não são empregados da empresa ou servidores do Ente Público em que atuam.A finalidade maior da opção pela contratação de uma empresa terceirizada é a de maximização de resultados, leia-se, redução de custos, o que na prática tem implicado cortes de despesas com direitos trabalhistas. A realidade demonstra, então, que a terceirização de serviços funciona como mecanismo de diminuição de garantias e de direitos para boa parte dos empregados terceirizados, os quais recebem salários mais baixos e tem menos benefíciosquando comparados com trabalhadores da mesma função que não sejam terceirizados[1].

A terceirização comprovadamente também diminui a disponibilidade de postos de empregos e paralelamente aumenta a rotatividade de mão de obra, pontos que são absolutamente prejudiciais não só à classe trabalhadora, mas também à toda a sociedade, pois quanto mais vezes o trabalhador for demitido, para, poucos meses depois, ser novamente contratado, maior será o tempo em que ficará recebendo seguro-desemprego, benefício concedido a partir de aportes feitos por toda a sociedade ao FAT (fundo de amparo ao trabalhador).

Daí porque o PL 4.330/2004 sofre tanta resistência dentre os estudiosos e aplicadores do Direito do Trabalho.A despeito da realidade exposta, o projeto de Lei 4.330/2004, com a intenção de aparentemente preencher uma lacuna da Lei, já que nosso ordenamento jurídico não dispõe de uma regulamentação - especialmente, quanto à responsabilidade trabalhista do tomador e à especificação das atividades em que a terceirização seria lícita – simplesmente ignora toda a experiência acumulada pela Justiça do Trabalho, que só a admite em situações excepcionais: quando se trata de serviço especializado e no desenvolvimento de atividades acessórias da empresa.

Em sentido diverso ao consolidado perante a maioria dos que lidam diretamente com as questões trabalhistas, a ideia que norteia o referido projeto é estender de forma indiscriminada a terceirização de serviços a quaisquer atividades, inclusive, para aquelas essenciais ou principais das empresas (atividades fim). Ou seja, a contratante/tomadora entregando a outrem o cumprimento direto da atividade que justifica a existência dela, poderia terceirizar a si mesma às custas do sacrifício de direitos trabalhistas.

E se no contexto atual em que não há uma regulamentação da questão e em que prevalece o entendimento restritivo a respeito das hipóteses de terceirização de serviços perante a Justiça do Trabalho do País, ainda assim, esta já se encontra atulhada de processos movidos por trabalhadores contra empresas terceirizadas que, muitas vezes, simplesmente encerraram suas atividades sem quitar qualquer parcela rescisória, imagine-se como será se efetivamente houver uma Lei ampliando a possibilidade de terceirização para todas e quaisquer atividades das empresas.

Vê-se, então, que na contramão da realidade, o PL 4.330/2004 permite expandir o que necessita ser restringido, representando séria ameaça aos direitos e garantias fundamentais do cidadão trabalhador, com reflexos danosos para toda a sociedade[2].

2 PROJETO DE LEI 4.330/2004

2.1 Aspectos negativos

A falta de legislação específica sobre a terceirização afeta de maneiranefasta o direito do trabalho, precarizando direitos, suprimindo conquistas, excluindo o trabalhador em suas categorias enfraquecidas e que, sem opção, se submete a salários baixos, benefícios sociais inferiores e jornada de trabalho extensa.

A polêmica gerada pelo PL 4330/04 deve-se ao fato do legislativo ser omisso acerca da terceirização, não estabelecendo de maneira concisa quais procedimentos devem ser praticados pelas empresas ao optarem pela utilização deste instituto. A divergência doutrinária reside em estabelecer objetivamente o que é atividade-meio e atividade-fim de uma empresa. Diante do impasse e da lacuna legislativa, o Poder Judiciário vai coibindo os abusos de empresas criadas com o propósito de fraudar[3].

É certo que nem todas as prestadoras de serviços tem o objetivo de fraudar, entretanto é praticamente impossível oferecer serviços de qualidade por um preço pequeno, necessariamente estará havendo a exploração da mão-de-obra terceirizada, do contrário a terceirização não seria viável.

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