A superstição dos nomes

Por Germano Brandes | 24/11/2015 | Crônicas

                              Vacilo entre a filosofia e a superstição, chegando às vezes a transformar nes idéiasta última as ideias da filosofia linguística da Cabala. Particularmente na parte em que diz acreditar, e , pela experiência ... na qualidade fausta ou infausta dos nomes, crença essa que "a filosofia não alcança". Acredita que as pessoas designadas por certos nomes, como João, Afonso, são felizes, enquanto outras, designadas por nomes como Carlos, Henrique são mal-afortunadas. Do nome Duarte em Portugal, diz, poder-se-ia fazer um lamentável catálogo. Ele não menciona expressamente o maior exemplo disso "por alguns bons respeitos", mas muito é de presumir que teve em mente o célere  caso do rei D. Duarte, descrito nas crônicas de Portugal.

                              Falecido o rei D. João I, narra Rui de Pina no capítulo II de sua crônica, devia suceder-lhe no trono o infante D. Duarte. "E estando-se para isso [para a coroação] vestido de ricos panos e Reais, como para tal dignidade e ao auto seguinte convinha, chegou a ele Mestre Guedelha, judeu, seu físico, e grande astrólogo, e lhe disse:´Parece-me Senhor que vos os por aparelhais para logo entrardes na real sucessão que vos por direito pertence, peço-vos por mercê, que este auto dilateis até passar o meio-dia, e nisso prazendo a Deus areis vosso proveito, e será bem de vosso reino, porque estas horas em que fazeis fundamento ser novamente obedecido mostram ser mui perigosas, e mui triste constelação, cá Jupiter está retrógrado, e o sol em decaimento com outros sinais que no céu parecem assaz infelizes.´ O Infante lhe respondeu: ´Bem sei Mestre Guedelha, que do grande amor que me tendes vos nascem este cuidados de meu estado e serviço, eu não duvido que a astronomia seja boa, e uma das ciências entre as outras permetidas e aprovadas, e que os corpos inferiores são sujeitos aos sobrecelestes; porém o que principalmente creio, é ser Deus sobre todo, e que com sua mão e ordenança são todas as coisas. E portanto este cargo que eu com sua graça esperotomar, seu é, e em seu nome, e com esperança de sua ajuda o tomo, a ELe só me encomendo, e à Bem aventurada Virgem Maria Sua Madre Nossa Senhora, cujo dia hoje é, e com muita devoção e devida humildade peço a Deus que me ensine, favoreça, e ajude governar este seu povo, que me ora quer encomendar como sentir que seja mais seu serviço.´ E Mestre GUedelha tornou dizendo: ´Senhor, a ele praza que assim seja; como quer que não era grande inconveniente sobre serdes nisso um pouco para se tudo fazer properadamente e como devia.´ E o Infante lhe respondeu: ´Não falei, pois, não devo, ao menos por não parecer que míngua em mim a esperança de firmeza que em Deus e sua fé devo ter.´ E logo Mestre Guedelha afirmou que reinaria poucos anos, e esses seriam de grandes fadigas e trabalhos, como foram segundo ao diante se dirá."  

                         O astrólogo, como se vê, atribuiu a desgraça de D. Duarte aos astros, enquanto afirmo que a atribui ao nome de que o monarca era portador. Sabe também, diz, de sete pessoas de Lisboa, portadores de um certo nome, as quais viveram todas com desastres e morreram miseravelmente. E na parte positiva, relativa às virtudes dos nomes, enaltece o de Jesus "a cujo suavíssimo eco o Inferno, a terra e o céu se humilham".