A súmula impeditiva de apelação como mecanismo de efetivação do Direito a Integridade
Por Conceicao de Maria Miranda Pereira | 18/07/2017 | DireitoConceição de Maria Miranda Pereira[1]
Lorena de Viveiros Rios[2]
Sumário: 1 Introdução; 2 O Direito à integridade conforme a teoria proposta por Ronald Workin; 3 A incidência da teoria dos precedentes no âmbito jurídico brasileiro; 3.1 A aproximação dos sistemas civil law e common law a partir da atual globalização judicial; 3.2 Precedentes e suas técnicas de confronto; 3.3 A aplicação dos precedentes no direito brasileiro; 4 Súmula impeditiva de apelação como garantia ao direito à integridade; 4.1 Considerações acerca da Súmula Impeditiva de apelação; 4.2 A garabtia do direito à integridade a partir da Súmula Impeditiva de Apelação; 5 Considerações Finais; Referências.
RESUMO
A súmula impeditiva de apelação como mecanismo de efetivação do direito a integridade. Para tratarmos do tema no presente trabalho, de início, abordaremos o direito a integridade conforme a teoria proposta por Ronald Dworkin. Em seguida, trataremos acerca da incidência da teoria dos precedentes no âmbito jurídico brasileiro, de modo a apresentar a aproximação dos sistemas de precedentes no direito brasileiro. Por último, abordaremos a súmula impeditiva de apelação como garantia ao direito a integridade, fazendo considerações sobre súmula impeditiva de apelação e, ainda, a garantia do direito a integridade a partir da súmula impeditiva de apelação.
PALAVRAS-CHAVE: Sistemas de Precedentes. Súmula Impeditiva. Direito a Integridade.
1 INTRODUÇÃO
O atual ordenamento jurídico brasileiro é baseado no modelo jurídico de civil law, tendo assim a lei como principal fonte do direito. E, em meio a globalização judicial e sua veemente troca de informações, observa-se a influência do sistema common law no âmbito jurídico, implicando assim em um direito criado e aplicado pelas decisões judicias.
Porém, ainda não há uma verdadeira aplicação destes precedentes judiciais na realidade jurídica brasileira, de modo que é notória a incoerência dos pronunciamentos e decisões judicias no âmbito jurídico brasileiro.
Fato este que evidencia uma desconsideração ao Direito como integridade proposto por Dworkin, na medida em que cabe aos magistrados averiguarem os casos de problemáticas anteriores e afins decididos por seu tribunal ou por tribunais superiores, estruturando assim o Direito como um conjunto de princípios unívocos.
A contrariedade de decisões dentro deste sistema legal colabora para a morosidade da justiça e instabilidade jurídica, de tal forma que vai de encontro à logica do sistema rejeitar a posição de tribunal superior, atentando contra os princípios da celeridade e economia processual, motivo pelo qual o enlace aos precedentes é fundamental.
Frente a essa situação, é importante o aperfeiçoamento dos institutos jurídicos já existentes, na tentativa de assegurar a segurança jurídica na atual realidade do sistema. Nesse sentido, as jurisprudências e as decisões judiciais devem ser consideradas como instrumentos que possibilitem a conciliação entre a aplicação da lei, a justiça e a segurança jurídica.
Com isso, surge o interesse em aprofundarmos os estudos na matéria referente a aplicação da súmula impeditiva de apelação, conforme a interpretação construtiva do Direito como integridade proposta por Ronald Dworkin, já que a discussão acerca da possibilidade da aplicação das teorias dos precedentes no ordenamento jurídico brasileiro está em voga e os casos referentes ao âmbito recursal são cada vez mais recorrentes. Diante disso, propomo-nos a estudar o tema supracitado, com o suporte teórico do Recurso no Processo Civil, estudo este que nos proporcionará um satisfatório desempenho acadêmico e profissional, bem como na nossa formação e atuação enquanto cidadãos conscientes de nossos direitos
Diante disto, nos propomos a reconhecer a súmula impeditiva de apelação como mecanismo de efetivação do Direito a Integridade, ao apresentarmos o Direito a integridade e coerência conforme a teoria proposta por Ronald Dworkin, além de explicar a incidência da teoria dos precedentes no âmbito jurídico brasileiro e analisar a súmula impeditiva de apelação como garantia ao Direito a Integridade.
2 O DIREITO A INTEGRIDADE CONFORME A TEORIA PROPOSTA POR RONALD DWORKIN
Dworkin defende que as correntes filosófico-jurídicas como o convencionalismo, pragmatismo e, sobretudo, o positivismo, são insuficientes já que não oferecem a justificação necessária para o exercício da atividade jurisdicional. Nesse sentido, conforme ele defende, a atividade jurisdicional deve ser alicerçada na coerência e nos princípios como a equidade, justiça, legalidade e integridade, propondo uma interpretação construtiva por meio de sua teoria acerca do da estrutura do ordenamento jurídico e sua interpretação.
O direito como integridade [...] pede ao juiz que se considere como um autor na cadeia do direito consuetudinário. Ele sabe que os outros juízes decidiram casos que, apesar de não exatamente iguais ao seu, tratam de problemas afins; deve considerar as decisões deles como parte de uma longa história que ele tem de interpretar e continuar, de acordo com suas opiniões sobre o melhor andamento a ser dado à história em questão. (Sem dúvidas, para ele a melhor história será a melhor a melhor do ponto de vista da moral política, e não da estética.) [...] O veredito do juiz- suas conclusões pós-interpretativas-deve ser extraído de uma interpretação que ao mesmo tempo se adapte aos fatos anteriores e os justifique, até onde isso seja possível (DWORKIN, 2003, p. 286).
Para desenvolver tal teoria, Dworkin subsidia-se de um modelo ideal de sociedade democrática, a chamada comunidade de princípios conduzida pelo então princípio da integridade, na qual o direito será desenvolvido e interpretado com bases nos princípios, podendo também ser alterado (COSTA, 2011). Logo, o filósofo compreende a prática jurídica como uma atividade dinâmica, de modo que o Direito estará em contínuo desenvolvimento e os juízes devem buscar sempre a melhor interpretação construtiva da prática jurídica de uma comunidade.
Para decidir um caso novo, o juiz deve se colocar no papel de parceiro de um complexo empreendimento em cadeia, a partir do qual uma quantidade considerável de decisões, estruturas, convenções e práticas formam sua história; “e ao juiz cabe dar uma continuidade coerente a essa história no futuro, consciente de que deve interpretar o que aconteceu antes e levar adiante a incumbência que tem em mãos, e não partir em alguma nova direção” (DWORKIN, 1999, p. 238).
Nessa perspectiva, para que a atividade jurisdicional tenha coerência, torna-se necessário que haja respeito às decisões anteriores e uma devida justificação para elaboração da decisão seguinte. Não significa propriamente que a solução deve seguir uma direção rígida iniciada pelo primeiro intérprete, isso seria contrariar o caráter dinâmico da interpretação construtiva, mas sim que cada decisão elaborada, tenha coerência com as anteriores e demonstre uma justificativa pusível para os novos rumos a serem tomados. O aplicador disposto a abandonar soluções jurídicas adotadas no passado para consagrar novas diretrizes jurídicas (COSTA, 2011).
Para que se alcance a coerência na interpretação jurídica, Dworkin (1999) sugere que o juiz tem de construir um esquema de princípios abstratos e concretos que possam fornecer uma justificação coerente a todos os precedentes do direito costumeiro e, “na medida em que estes devem ser justificados por princípios, também um esquema que justifique as disposições constitucionais e legislativas” (p. 239).
Dessa forma, além das explicações acerca do rumo das decisões proferidas na comunidade, torna-se necessária uma justificação plausível. Para tanto a justificação tem de estabelecer distinções não arbitrárias e se valer de princípios convincentes, sob pena de não ser considerada como tal (DWORKIN, 1999).
Assim, o processo interpretativo de Dworkin passa pela fase de identificação do fato jurídico, a adequação do fato às normas e princípios cabíveis para a solução da lide, e então segue a fase da justificação da decisão, a busca pela melhor resposta ao caso apresentado. É indiscutível, então, que os valores e princípios são fundamentais na teoria de Dworkin. Ele defende que é de crucial importância que a atividade judiciária esteja norteada por princípios como, e sobretudo, a integridade, que vai possibilitar uma adequação esclarecedora das práticas jurídicas de uma comunidade.
3 A INCIDÊNCIA DA TEORIA DOS PRECEDENTES NO ÂMBITO JURÍDICO BRASILEIRO
3.1 A aproximação dos sistemas civil law e common law a partir da atual globalização judicial
Atualmente as tradições civil law e common law compõem os dois principais modelos jurídicos existentes, formando dois sistemas fortemente distintos, devido às circunstâncias políticas e culturais em que surgiram, mas que ao longo do tempo tendem a desenvolver pontos de convergência.
O sistema jurídico de civil law, adotado no Brasil, registra suas origens com base no direito romano, sendo posteriormente consagrado pela Revolução Francesa que procurou criar um novo modelo de direito, negando as instituições que antes existiam, calcando-se na rigorosa separação dos poderes, aliada à proibição do juiz interpretar a lei, como combinação indispensável à concretização da liberdade, igualdade e certeza jurídica. A igualdade no civil law foi diretamente associada à estrita aplicação da lei, o que deu origem a um intenso processo de codificação do direito, limitando o papel do juiz com a finalidade de garantir a tão sonhada igualdade entre todos (DONIZETTI, 2015).
Por sua vez, no sistema jurídico de common law, se desenvolveu a partir de um hábito das Cortes do reino inglês, que se reuniam para debater os casos mais complexos, que se tornavam referências para os julgamentos posteriores. Aos poucos as decisões assumiram papel vinculante e só depois foi estabelecida a obrigatoriedade de observância aos precedentes. Nesse sistema, aplica-se o “stare decisis et non quieta movere”, que significa “mantenha aquilo que já foi decidido e não altere aquilo que já foi estabelecido” (WOLKART, 2015).
A globalização é vista nas mais distintas áreas da sociedade, haja vista que a facilidade na troca de informações e a celeridade na comunicação interferem também nos costumes jurídicos contemporâneos, sendo assim compartilhado por todo o mundo, de modo que o Direito é parte desta integração. Isto é notado no movimento de convergência entre as tradições jurídicas: common law e civil law, ao promoverem uma circulação de soluções e propostas, havendo assim uma troca de informações mútua que se explica pela finalidade una que os movem: promover a previsibilidade e respeito a isonomia no sistema (MARINONI, 2009).
Em meio a tantas inovações judiciais no direito contemporâneo, é importante destacar os precedentes judiciais que foram importados do common law para o processo civil brasileiro. Desta forma, Didier Jr., Braga e Oliveira (2013, p. 381) entende como precedente “(...) a decisão judicial tomada à luz de um caso concreto, cujo núcleo essencial pode servir como diretriz para o julgamento posterior de casos análogos”. Logo, a finalidade do precedente é solucionar o caso concreto e quiçá influenciar em decisões porvindouras (STRECK, 2009).
3.2 Precedentes e suas técnicas de confronto
Os precedentes judicias não podem ser vistos como fórmulas abstratas e genéricas, se consideramos que os mesmos são relativos a casos concretos que deram ensejo àquele julgamento, logo a aplicação do mesmo em outros casos depende de análise cautelosa das semelhas e possíveis ponderações para a aplicação destes precedentes (STRECK, 2009).
Neste sentido, o precedente é uma decisão judicial baseada no caso concreto que poderá ser utilizada posteriormente naqueles casos semelhantes, tendo apenas seu núcleo essencial como diretriz para os julgamentos posteriores. De modo que, as teses, princípios jurídicos e controvérsias que embasaram a decisão judicial (ratio decidendi) irão compor este precedente, podendo haver também na argumentação aspectos que apenas tangenciam o aspecto central daquela decisão judicial que originou o precedente, ou seja, aspectos que não irão transformar-se em precedente são os obter dictum.(DIDIER JR.; BRAGA; OLIVEIRA, 2013)
Em contrapartida, a jurisprudência é a aplicação reiterada do mesmo precedente, podendo inclusive ser dominante, ou seja, o entendimento que prevalece. Definição esta largamente utilizada pelos artigos 557 e 557 § 1º do Código de Processo Civil para negar ou dar provimento ao recurso, além dos artigos 543-A § 3º, 543-C § 2º, 544 § 4[LR1] [LR2] [LR3] º, II, “b” c” do CPC. É importante mencionar que, naqueles sistemas baseados tradicionalmente nos precedentes há apenas uma decisão judicial que posteriormente é entendida como precedente diferentemente do sistema jurídico brasileiro que faz referência a inúmeras decisões (DIDIER JR.; BRAGA; OLIVEIRA, 2013).
Diante disto, uma jurisprudência pode adquirir um caráter extremamente dominante a ponto de adquirir o caráter de um enunciado na súmula da jurisprudência dominante de um tribunal, isto é comumente chamado de súmula. Esclarece-se que “ o enunciado da súmula deve reproduzir a ratio decidendi que está reiteradamente aplicada” (DIDIER JR.; BRAGA; OLIVEIRA, 2013, p. 404). Assim súmula é a compêndio daquele precedente que adquiriu o caráter de jurisprudência dominante.
Logo, os “ precedentes são formados para resolver casos concretos e eventualmente influenciam decisões futuras; as súmulas, ao contrário são enunciados gerais e abstratos (...) visando à solução de casos futuros” (STRECK, 2009, p. 4). A súmula assim objetiva findar com novas discursões acerca da matéria, ou seja, carregada de generalidade e abstração, diferentemente do precedente que objetiva inicialmente implementar um novo paradigma para atender as demandas estabelecida entre as partes determinadas.
Nesta perspectiva, a aplicação dos precedentes vinculantes pelos magistrados requer cautela, uma vez há uma necessidade de verificar se o casos em julgamento é análogo com o(s) precedente(s), ou seja, é importante haver uma comparação entre o caso em questão e a ratio decidendi da decisão que compõe o precedente, este método de comparação recebe a denominação dedistinguishing.
É importante esclarecer que a expressão distinguishing apresenta duas acepções: uma para determinar o método utilizado e outra para designar o resultado alcançado nesta comparação, resultado este que representa uma distinção entre o caso concreto a ser julgado e o paradigma estabelecido no precedente através da ratio decidendi ou em razão da existência de algum aspecto também impeditivo a aplicação deste precedente no caso concreto (DIDIER JR.; BRAGA; OLIVEIRA, 2013).
Isto posto, o magistrado diante da distinção entre o caso em julgamento e aquele ocasionou a existência do precedente poderá restringi-lo ou ampliar o campo de abrangência do mesmo. Desta forma Didier Jr., Braga e Oliveira (2013, p. 407) consolidam o entendimento ao mencionar que:
Notando , pois o magistradoque há distinção(distinguishing) entre o caso sub judice e aquele que ensejou o precedente, pode seguir um desses caminhos: (i) dar à ratio decidendi uma interpretação restritiva, por entenderque peculiaridades do caso concreto impedem a aplicação da mesma tese jurídica outrora firmada( restrictive distinguishing), caso em que julgará o processo livremente, sem vinculaçãoao precedente; (ii) ou estender ao caso a mesma solução conferida aos conferida aos casos anteriores, por entender que, a despeito das peculiares concretas, aquela tese jurídica lhe é aplicável (ampliative distinguishing).
Assim, se diante da comparação o magistrado observar que o caso concreto é análogo ao caso que deu ensejo àquele precedente poderá o mesmo decidir entre a aplicação deste precedente e sua superação por meio das técnicas de overruling e overriding. Uma vez que, a atividade interpretativa do magistrado não encontra fundamento apenas na lei, mas também nos princípios e entendimentos jurisprudenciais. Além que a atividade interpretativa tende a modificar-se no decorrer do tempo a fim de acompanhar a evolução da sociedade e a necessidade de sistematização dos princípios (DONIZETTI, 2015).
O overruling ocorre diante da hipótese de total superação do precedente, “ técnica através da qual um precedente perde a sua força vinculante e é substituído (overruled) por outro precedente” (DIDIER JR.; BRAGA; OLIVEIRA, 2013). Visto que, o precedente pode ser revisto a qualquer tempo, ao consideramos que é possível a revisão de um precedente sempre que houver novos argumentos, hipótese na qual estaremos diante da criação de novo precedente.
A superação do precedente poderá ser realizada pelo próprio tribunal que firmou o precedente ao adotar entendimento diferente em julgamento futuro. Assim, o overruling pode ser expresso (express overruling), quando o tribunal resolve expressamente adotar nova orientação, abandonando a anterior ou poderá ser tácito (implied overruling) quando uma orientação utilizada está em confronto com aquela adotada anteriormente, apesar de não haver uma expressa substituição desta última (DIDIER JR.; BRAGA; OLIVEIRA, 2013).
O overriding, por sua vez, ocorre quando um tribunal apenas limita o âmbito de incidência de um precedente, em razão da superveniência de uma regra ou princípio previsto em lei. Dessarte, notamos apenas uma superação parcial, como é observada na revogação parcial de uma lei (DONIZETTI, 2015). Portanto, o overrruling e o overriding são técnicas que almejam impedir a petrificação do Direito, ao manter o sistema jurídico brasileiro sempre atualizado, de modo que esta imprescindível flexibilidade do ordenamento jurídico é indispensável para a evolução do Direito.
< >A aplicação dos precedentes no direito brasileiro
Os precedentes judicias não podem ser vistos como fórmulas abstratas e genéricas, se consideramos que os mesmos são relativos a casos concretos que deram ensejo àquele julgamento, logo a aplicação do mesmo em outros casos depende de análise cautelosa das semelhas e possíveis ponderações para a aplicação destes precedentes (STRECK, 2009).
Destarte, o precedente não surge a partir de decisões reiteradas acerca de um tema, mas sim uma decisão que rescindi com uma situação anterior, alterando assim um posicionamento jurisprudencial da corte. Neste sentido, há aqui uma pretensão de mutabilidade do precedente, na medida em que o mesmo como fonte do direito não pode ser eterno ao produzir um Direito conforme a sociedade que rege (STRECK, 2009).
Assim, os precedentes judiciais não podem representar uma opção no atual âmbito processual brasileiro, tendo em vista que com o pós-positivismo há um uso cada vez maior dos termos jurídicos indeterminados e do poder de legislar através das cláusulas gerais. Porém isto afetou a segurança jurídica do ordenamento jurídico brasileiro, visto que “(...) o livre convencimento do juiz parece ser mais um direito subjetivo indisponível que um dever institucional decorrente da função exercida por ele (...)” (FREIRE, 2014, p. 3), observando-se assim uma ausência de coerência sistêmica.
Diante disto, o precedente judicial representa no cenário processual brasileiro uma solução às contradições e divergências advindas desta incoerência sistêmica, ainda que não haja uma completa extinção das contradições e divergências no sistema jurídico através dos precedentes. Diante disto, ressaltamos ainda que o sistema jurídico, seja qual for, será suscetível de decisões judiciais controversas, devendo serem louvadas as divergências entre pronunciamentos judiciais quando temporárias e resultarem na proximidade do direito a sociedade (FREIRE, 2014).
Nesta perspectiva, entende-se que o precedente judicial tem uma importância indiscutível, considerando que o mesmo está presente em qualquer sistema jurídico ao oportunizar a renovação do direito, resguardando assim a estabilidade e sua previsibilidade ao Poder Judiciário (WOLKART, 2015).
Assim, em relação aos efeitos que a decisão pode produzir, destacaremos o precedente impeditivo de recurso, ou seja, a possibilidade do juiz a impedir o seguimento daqueles recursos em conflito com os precedentes judiciais, principalmente se os mesmos emanarem das cortes superiores, conforme previsto no artigo 518, § 1º do Código de Processo Civil, no qual o mesmo pode ser negado na fase de admissibilidade recursal (DIDIER JR; BRAGA, OLIVEIRA, 2013).
4 A SÚMULA IMPEDITIVA DE APELAÇÃO COMO GARANTIA AO DIREITO A INTEGRIDADE
< >Considerações acerca da Súmula Impeditiva de ApelaçãoA garantia do Direito à Integridade a partir da Súmula Impeditiva de ApelaçãoQualquer conjunto de leis e decisões pode ser explicado histórica, psicológica ou sociologicamente, mas a consistência exige uma justificação, e não uma explicação, e a justificação deve ser plausível, e não postiça. Se a justificação que [...] [o juiz] concebe estabelece distinções que são arbitrárias, e se vale de princípios que não são convincentes, então ela não pode, de modo algum, contar como uma justificação.
Assim, a aplicação da Súmula Impeditiva de Apelação a partir do Direito a integridade é vista como um mecanismo que visa evitar que os juízes de instância inferior proferiram sentenças em desacordo com o entendimento firmado pelo STF e STJ. Isto a fim de garantir a segurança jurídica do ordenamento brasileiro e maior previsibilidade das decisões, uma vez que não é admissível que casos iguais tenham interpretações distintas em razão de leis lacunosas, ambíguas ou contraditórias, estabilizando assim o Direito (BEZERRA, 2009).
Portanto, somente quando o Poder Judiciário estiver em total conformidade, ou seja, os Tribunais estiverem harmônicos entre si, e assim alcançada a estabilidade em toda a jurisdição é que as decisões de primeiro grau de fato serão aceitas e obedecidas, representando efetivamente as Cortes Superiores. Logo, o juiz decidirá os casos através dos precedentes dos Tribunais Superiores antes de decidir por seu próprio juízo (FREIRE, 2014). Logo, o Direito a integridade, defendido por Dworkin, a busca por soluções efetivas deveria vir sempre acompanhada de uma transformação do entendimento adotado por todo o Judiciário Nacional.
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
No presente trabalho abordamos a temática da súmula impeditiva de apelação como mecanismo de efetivação do Direito a Integridade a partir da teoria proposta por Ronald Dworkin. Na qual observamos que a integridade constitui um ponto fundamental para a melhor interpretação construtiva das práticas jurídicas, na medida em que possibilita ao magistrado decidir os casos concretos tendo em vista a integridade na lei e nas deliberações judicias.
Para isso, apresentamos de início o direito a integridade conforme a teoria de Dworkin que fornece subsidio para a compreensão da integridade como método de interpretação construtiva ao demonstrar a melhor maneira de buscar na lei e nos princípios a decisão mais justa para o caso apresentado sem para isso extrapolar os limites da atividade judiciária.
Partindo disto, entendemos que a súmula impeditiva de apelação é um mecanismo de efetivação deste direito a integridade na medida em que o magistrado deve prezar pela coerência e integridade nas decisões judiciais, na medida em que tem o dever legal de atingir uma adequação do Direito às transformações sociais sem que, com isso, haja um sacrifício absoluto do valor de previsibilidade das decisões judiciais. Na medida em que o juiz deverá ao proferir a sentença em conformidade com a súmula do STF ou do STJ, inadmitindo assim recurso apelação interposta contrária a esta decisão.
Portanto, considerando os princípios da igualdade e da segurança jurídica valores constitucionais fundamentais a serem observados no Estado Democrático de Direito, faz-se inadmissível decisões contrárias a tais princípios. Diante disto, a súmula impeditiva de apelação objetiva evitar que o tribunal profira decisões de maneira diferenciada para casos iguais, ou mesmo a discordância entre as decisões em primeira instância e o entendimento dos tribunais superiores, assegurando assim o direito a integridade no ordenamento jurídico brasileiro.
REFERÊNCIAS
COSTA, Carlos Henrique Generoso. A interpretação em Ronald Dworkin. Revista CEJ: Brasília. Ano XV, n. 55. Out/dez. 2011. Disponível em < https://www.google.com.br/url?sa=t&rct=j&q=&esrc=s&source=web&cd=1&cad=rja&uact=8&ved=0CB0QFjAAahUKEwiQlv7XpfTHAhWK1x4KHa1vAQE&url=http%3A%2F%2Fwww.jf.jus.br%2Fojs2%2Findex.php%2Frevcej%2Farticle%2FviewFile%2F1504%2F1527&usg=AFQjCNFhB1P8J0P9boPyWNPNNyL_BNCx1Q&bvm=bv.102537793,d.dmo> Acesso em 07 fev 2015.
DIDIER JR., Fredie; BRAGA, Paula Sarno; OLIVEIRA, Rafael Alexandria. Curso de Direito Processual Civil: teoria da prova, direito probatório, ações probatórias, decisão, precedente, coisa julgada e antecipação de tutela. vol 2. Salvador: Editora JusPodivm, 2013.
DIDIER JR., Fredie; CUNHA, Leonardo Carneiro da. Curso de Direito Processual Civil: meios de impugnação às decisões judiciais e processo nos Tribunais. vol 3. Salvador: Editora JusPodivm, 2014.
DONIZETTI, Elpídio. A força dos Precedentes no Novo Código de Processo Civil., n. 175, 2015. Disponível em: < http://revistas.unifacs.br/index.php/redu/article/view/3446 > Acesso em 05 set 2015.
DWORKIN, Ronald. O Império do Direito. São Paulo: Martins Fontes, 1999.
FREIRE, Alexandre; FREIRE, Alonso. Elementos normativos para a compreensão do sistema de precedentes judiciais no Processo Civil brasileiro.Revista dos Tribunais. Vol. 950/2014. Dez/2014. Disponível em < http://bdjur.stj.jus.br/dspace/handle/2011/83299 > Acesso em 07 fev 2015.
MARINONI, Luiz Guilherme. Aproximação crítica entre as jurisdições de civil law e de common law e a necessidade de respeito aos precedentes no Brasil., 2009. Disponível em < http://bdjur.stj.jus.br/dspace/handle/2011/31725 >. Acesso em 05 fev 2015.
STRECK, Lenio Luiz. Súmulas vinculantes em terrae brasilis: necessitamos de uma “teoria para a elaboração de precedentes”?. Revista Brasileira de Ciências Criminais. Vol. 78/2009. Mai.Jun/ 2009. Disponível em < http://bdjur.stj.jus.br/dspace/handle/2011/83421> Acesso em 06 set 2015.
WOLKART, Erik Navarro. Precedentes no Brasil e cultura: um caminho tortuoso, mas, ainda assim, um caminho. Precedents in Brazil and culture, a tortuous path, but a path nevertheless. Vol. 243/2015. Maio/2015. Disponível em: < http://bdjur.stj.jus.br/dspace/handle/2011/92708 > Acesso em: 02 set. 2015.
BEZERRA, Flávia Regina Cardoso Mendes. Súmula impeditiva de recursos e a força dos precedentes judiciais. 2009. Disponível em < http://portais.tjce.jus.br/esmec/wp-content/uploads/2014/12/Fl%C3%A1via-Regina-Cardoso-Mendes-Bezerra.pdf> Acesso em 25 set. 2015.