A Sociedade e a questão dos laços familiares
Por LEONICE SILVA FERREIRA | 28/10/2016 | EducaçãoLeonice Silva Ferreira
Este trabalho visa analisar o conto Feliz aniversário de Clarice Lispector que trata das desavenças familiares, ao mesmo tempo relata aspectos de uma sociedade egocêntrica e capitalista. O objetivo da reunião é alusivo ao aniversario da anciã da família – dona Anita- ironicamente não é o centro das atenções durante a festa. Seus filhos (as), noras, netos (as) são tomados pelo narrador como foco principal dos acontecimentos. Outro aspecto relevante, é o encontro do aniversário de 89 anos não com o aprendizado, mas com a morte.
Logo no início do conto, é perceptível no discurso do narrador que a família há muitas discórdias, mas em nenhum momento é revelado ao leitor tais motivos. Após apresentarem alguns dos familiares e suas grotescas atitudes, o narrador, enfim, apresenta a aniversariante, contudo, sem entusiasmo.
De todos os filhos Zilda é a única que se dispôs a preparar a festa da sua mãe. Entretanto, este gesto não a diferencia dos demais filhos. Pois em determinado trecho do conto, o narrador diz que Zilda “tinha espaço e tempo para alojar a aniversariante”. O verbo transitivo direto alojar empregado dá sentido de algo provisório, temporário. As outras atitudes da personagem em relação à mãe são modos pelos quais ela prepara a velha para a ocasião, “e para adiantar o expediente vestira aniversariante logo depois do almoço”(...) e desde das duas horas (...) estava sentada a cabeceira da longa mesa vazia, tava na sala silenciosa”.
Os parentes da anciã pertenciam a “diferentes classes sociais”/Gotlib, p.329/. Tanto é que, a nora de Ipanema leva os filhos acompanhados pela babá.
Enquanto que, o narrador narra o desapego familiar, a aniversariante não se manifesta. Mas uma vez, a velha de 89 anos é tida pelos convidados como um ser sem desejos, quando é mencionado os presentes mesquinhos que são dados a pobre idosa, “(...) nada que a dona da casa pudesse aproveitar para si mesma(...)”, durante toda a festa, a aniversariante permaneceu na cabeceira da mesa, mesmo após terem cantados os parabéns. Um dos pontos relevantes do conto se dá no apagar da vela. O aniversario é da velha que ate agora foi ignorada por todos, neste momento excluía-se definitivamente a sua própria festa ao colocar o bisneto para assoprar a vela.
Ao solicitara que a avó cortasse o bolo, este é o primeiro momento em que a velha tem as atenções voltadas para ela. É neste partis do bolo que o narrador vai dizer que cada talhada significa também o ritual de enterro. Segundo Gotlib, esta talhada significa “ao mesmo tempo um golpe assassino e uma cerimônia de enterro” (p.329).
No ímpeto da festa, o narrador volta à atenção a velha, todavia, não é de imediato demonstrado por ela. Derrepente, a velha demonstra seu rancor diante de todos os filhos “incoercível, virou a cabeça e com força insuspeita cuspiu no chão” a atitude de desprezo da velha causara verginha nos filhos. O desprezo dos filhos pela mãe é visível, quando é narrado que a ação da velha deveria ser corrigida, ensinar-lhes regras que ela em outrora os havia ensinado.
Ainda em sua cólera, a velha pede um copo de vinho. A família fica estagnada com o pedido amenizar o pedido, mas a velha responde com agressividade “que avozinha que nada (...) que o diabo os carregue”. Ao receber o vinho, a velha mantém-se em silêncio e não toma o vinho.
Ao final da festa o desconforto continua na despedida, indubitavelmente, se a velha resistisse mais um ano (...) seriam obrigados a se encontrar diante do bolo aceso.
Neste conto é possível identificarmos elementos da semiótica, na qual, segundo Fiorin, trata das relações do texto com aspectos do “estado da alma” (2007, p.25). Este elemento atua em Feliz aniversario quando o narrador tira a velha que deveria ser o centro das atenções durante a festa, e foca nas intrigas e ambições de seus descendentes.
Os sentidos predominantes no conto é de que a velha de 89 anos já não necessita da atenção dos filhos, durante a festa, ela esta sentada imóvel na cadeira á espera da morte que por sorte desta e azar daqueles não vem.
Ainda segundo Fiorin, as personagens estão inseridas no predicado de um ser, para o qual, incluem-se os sujeitos de estado focado nas dores. No conto é narrado certas condições financeiras de algumas personagens.
Raramente o narrador concede à palavra as personagens, entretanto, ele descreve todos os acontecimentos das cenas. Para Fiorin trata-se de um sujeito da enunciação denominado de interlocutor.
Portanto, o conto expõe, através do narrador, que age cruelmente, ao narrar o aniversario, não somente conflitos familiares, mas, sobretudo sociais. Com base em Fiorin, pode-se dizer que estas personagens são tidas como efeito do enunciado, ou especificamente o sujeito-efeito, pois domina o seu dia.
Referências Bibliográficas
LISPECTOR, Clarice. Feliz aniversário, texto extraído do livro “Laços de família”. Editora Rocco. Rio de janeiro, 1998, p.54.
GOTLIB, Nádia Battella. Os laços de família in Clarice: uma vida que se conta. 3ª.ed. Editora Ática, 1995.
FOIRIN, José Luiz. Fundamentos teóricos para o ensino da leitura. Universidade de São Paulo, 1990.