"A SEGURANÇA PÚBLICA DE SANTA CATARINA (GESTÃO DO CORONEL DANILO KLAES), O 'DOPS' E A POLÍCIA CIVIL NO GOVERNO CELSO RAMOS - (1964-1966)".

Por Felipe Genovez | 22/11/2018 | História

O CORONEL DANILO SALGADO KLAES SERIA O SSP MAIS POLÊMICO DA HISTÓRIA DA SEGURANÇA PÚBLICA DO ESTADO DE SANTA CATARINA?

É provável que o Secretário de Segurança Pública mais polêmico da História do Estado de Santa Catarina talvez tenha sido o Coronel (Exército) Danilo  Klaes.

Estive com ele numa única oportunidade, isso ocorreu na posse do Deputado (e Coronel PM-RR)  Sidney Carlos Pacheco no cargo de SSP-SC (janeiro de 1991).

Depois disso tentei entrevistá-lo, mas ele já estava muito doente (teve um derrame), e em seguida veio a falecer.Lamentei muito esse fato porque ele poderia ter deixado uma importante contribuição à História da Segurança Pública do Estado de Santa Catarina, inclusive, fazendo esclarecimentos sobre fatos relevantes ocorridos durante e após a sua gestão. Assim, lá se foi mais uma parte relevante sobre a existência e transformações da SSP do Estado de Santa Catarina.

Danilo Klaes era um Coronel de Infantaria e  foi convocado para substituir o inesquecível Jade Saturnino Vieira Magalhães (advogado nascido nas Minas Gerais), ex- DRP de Caçador na década de cinquenta,  Presidente Estadual do "PRP" (Partido de Representação Popular, sob Presidência Nacional de Plínio Salgado, que existiu entre 1945 a 1965) e candidato ao senado nas eleições de 1960 (perdeu para Irineu Bornhausen), casado com uma caçadorense (Cecília Reichmenn, filha de conhecido empresário daquela região) que conheceu em Curitiba-PR quando ainda cursava Direito nas décadas de quarenta/cinquenta.

Pois bem, no ano de 1964 – com o regime militar em vigor – o Governador Celso Ramos (irmão de Nereu Ramos)  ficou em situação bastante vulnerável, tendo como causa  determinante a  instabilidade e desconfiança que despertou nos meios militares porque hesitou em se pronunciar a favor da revolução de 1964 (isso ocorreu especialmente porque seu irmão Joaquim Ramos (Deputado Federal) teria sido flagrado em um grampo telefônico pelo Comando do 5º Distrito Naval – repassando orientações para que Celso Ramos permanecesse neutro...).

Nesse cenário Jade Magalhães foi sacado da direção da SSP (nomeado Secretário do Interior e Justiça) e no seu lugar foi colocado o Coronel Danilo Klaes (1964 – 1966) que praticamente não tinha registros sobre sua vida no Estado catarinense.

Para se entender melhor a passagem do Coronel Danilo Klaes à frente da Secretaria dos Negócios da Segurança Pública, especialmente, naqueles tempos de regime militar (anos de 1964/1965/1966), vejamos alguns fatos sobre o seu contexto político, profissional e pessoal:

  1. Por sorte, os “perrepistas” (ex- integralistas próceres da AIB – Ação Integralista Brasileira - década de trinta), liderados por Jade Magalhães (tendo o Delegado Regional de Polícia Jucélio Costa como um dos principais parceiros) que soube aproveitar os bons ventos do início do governo Celso Ramos e conseguiram aprovar a Lei n. 3.427, de 09.05.1964 que criou a Polícia Civil de carreira, a Escola de Polícia, a Diretoria da Polícia Civil (atual DGPC) e dispôs sobre as Delegacias Especializadas, dentre outras inovações, com o inestimável apoio dos Deputados Lecián Slovinscki (chegou à Presidência da Alesc), ex-Inspetor de Trânsito na antiga DVTP – Diretoria de Veículos e Trânsito Público (atual Detran) e Miro Costa, ambos ligados à SSP (antes de entrarem na vida política).
  2. Com isso, o Coronel Danilo Klaes teve que conviver com  os avanços dos Delegados “integralistas” durante toda a sua gestão (registre-se que o General Olímpio Mourão Filho –um dos principais líderes  da Revolução de 1964 – era um ex-integralista (dos tempos de AIB), inclusive,  esteve em Florianópolis desfilando com a camisa verde na Praça XV durante um movimento cívico dos partidários), entretanto privilegiou Oficiais da PM especialmente à frente das DRPs e Delegacias Especializadas, como foi o caso de Capitão Sidney Carlos Pacheco, 1º Ten. Guido Cardoso Zimermann, Major Maurílio Roberge, Capitão Luiz Gonzaga de Souza, Coronel Thezeu Domingues Muniz, Coronel Olavo Rech, Ten. Cel José Manoel Corrêa, Coronel Ayrton João de Sousa, 2º Ten. Ronaldo Américo Schmidt, 2º Ten. Vitor Cani, 1º Ten.. Moacir de Oliveira Corrêa, Major PM-RR João Severo de Lima, Coronel PM-RR Lauro Sami, dentre outros. 
  3. Apesar de constar do texto legal, a Escola de Polícia não foi instalada, tampouco, foi nomeado um Delegado à frente da nova Chefia de Polícia (Diretoria da Polícia Civil - DPC, depois Divisão de Polícia Judiciária - DPJ, Superintendência da Polícia Civil - SPC, Delegacia-Geral - DGPC, Chefia de Polícia  - CPC e, novamente, DGPC). O primeiro Chefe da Polícia Civil foi o Capitão Luiz Gonzaga de Souza (ex-DRP de Blumenau – 1964 que havia substituído Jucélio Costa), seguido pelo Coronel Thezeu Domingues Muniz (1965) que no ano de 1964 estava à frente da Delegacia Especializada de Furtos, Roubos e Defraudações. Nesse período   o Comando-Geral da PM estava nas mãos de um Coronel do Exército. O primeiro Delegado a ser nomeado Chefe de Polícia (DPC) foi o DRP de Timbó (Ulisses Marcílio Longo) que pegou a transição da “DPC” para “DPJ”, isso já na  gestão-SSP do General Vieira da Rosa – 1966 – 1970).
  4. As seguintes Delegacias Regionais – DRPs (centro regional de comando policial e expressão de peso política) chegaram a estar sob a direção de Delegados de Polícia que se revezavam conforme a política da SSP (para as principais DRPs geralmente eram designados Oficiais da PM): Porto União – Giorgio Salussóglia (exSecretário de Segurança Pública na década de cinquenta); Caçador - Zech João dos Anjos (no decorrer do ano de 1965 Zech veio para Florianópolis e se tornou o Delegado mais próximo do Coronel Danilo Klaes); Tubarão - José Ghizzo Genovez; Criciúma – Helvídio de Castro Velloso Filho; Joaçaba – Sílvio Dobrowolski (depois Juiz de Direito, Juiz Federal e Desembargador Federal); Itajaí – Arnaldo Xavier Martins; Mafra – Luiz Guimarães Dias; Chapecó – Tupy Barreto (ex-Deputado Estadual); Timbó – Ulisses Marcílio Longo (ex-Deputado Estadual); Lages – João Martins (depois Juiz de Direito, Desembargador e Presidente do TJSC); Joinville – Jucélio Costa; Florianópolis – Odorico Durieux.
  5. Nesses anos surgem alguns nomes como o Delegado Heitor Luiz Sché que enquanto cursava a Faculdade de Direito trabalhava como interino de Oficial Administrativo do antigo Departamento de Orientação e Racionalização dos Serviços Públicos – DORSP (Decreto de 30.05.1962). No ano de ano 1963, como estava no último ano do referido curso  (Florianópolis) e, apadrinhado por Jucélio Costa (atuando diretamente junto com Jade Magalhães na SSP, antes da sua ida para a DRP de Blumenau), na condição de estagiário (“Solicitador”) Heitor Sché conseguiu sua nomeação para o cargo de Delegado Adjunto da DFRD (primeiramente a título de interino, conforme Decreto de 13.03.1963, para depois de formado vier a ser confirmado no cargo (Jucélio Costa foi quem preparou toda a tramitação do requerimento à nomeação). Como relatou Jucélio Costa naqueles tempos Heitor Sché era ainda um “moço magro e alto”, filho de Luiz Santos Sché (Fiscal Regional de Armas e Munições – P-I-18 da 7ª DRP - Rio do Sul  que chegou a responder pela Delegacia da Comarca, inclusive, até pelo expediente da DRP, conforme Portaria de 05.02.1963. No no ano de 1965 Sché foi nomeado para o cargo de Delegado Regional de Polícia e assumiu a DRP de Rio do Sul, restringindo-se àquela região, sem se envolver em questões instituicionais.
  6. Os Oficiais da PM à frente das Delegacias Especializadas e de algumas DRPs (em especial a da Capital) eram as autoridades policiais com trânsito no gabinete do SSP Danilo Klaes. O Capitão Sidney Carlos Pacheco foi um dos principais destaques que esteve durante anos à frente da DFRD, chegando por vezes a acumular a  Delegacia Especializada de Segurança Pessoal e a DRP de Florianópolis. Em entrevista a este autor o ex-Capitão Sidney Pacheco relatou que numa determinada ocasião estava se sentindo incomodado com autoridades judiciais que – baseados em representações de advogados - estavam querendo denunciá-lo por prática de torturas (um deles foi o Juiz Ernani de Palma Ribeiro, depois Desembargador - TJSC). Sidney Pacheco Relatou que  procurou o Secretário Coronel Danilo Klaes que  de imediato convocou o Presidente do Tribunal de Justiça (Desembargador Ivo Guilhon Pereira de Mello, ex- membro do MP catarinense) a comparecer a sua presença, em cuja ocasião testemunhou  o titular da Pasta advertir o magistrado que não queria mais saber de Juízes de Direito rondando a Delegacia Especializada e incomodando o Capitão Pacheco que estava sentado ao seu lado... O Presidente do TJSC humildemente se desculpou e disse que determinaria que doravante os magistrados nominados se abstivessem daqueles tipos de diligências...
  7. Jucélio Costa relatou (em entrevista a este autor) que no ano de 1965 ocupava o cargo de Diretor de Polícia Civil Adjunto (o Coronel Thezeu era o Chefe da Polícia Civil - DPC) e foi convocado pelo SSP Danilo Klaes a comparecer na sua presença para prestar contas a respeito de denúncias que havia recebido (baseado em relatos de policiais civis que eram seus informantes). Segundo os comentários  o Diretor Adjunto da Polícia Civil  estaria fazendo criticas a sua administração. Logo que Jucélio Costa sentou o Secretario e Coronel Danilo Klaes retirou da gaveta uma pistola e colocou em cima da mesa, fazendo a seguinte pergunta com rispidez: “Jucélio você anda mesmo falando mal de mim por aí, é verdade, me responda?” Jucélio Costa percebendo a situação, não se amedrontou e com habilidade, imediatamente ponderou com o "dedo em riste": “Mas ‘Secretário Coronel Danilo Klaes’ eu não sou ‘vinho da mesma pipa como esses que andam por aqui no seu gabinete’. Primeiro, o senhor guarde essa pistola aí na sua gaveta. Por que Secretário Coronel o senhor precisa sempre atender as pessoas no seu gabinete com essa pistola em cima da sua mesa, prá que isso, Secretário?” Danilo Klaes surpreso com a postura de Jucélio Costa recolocou sua  pistola de volta na gaveta. Porém, feitos os esclarecimentos, com a altivez necessária para a ocasião, quando Jucélio se levantou para se retirar, ao se aproximar da porta, pôde ainda perceber  que o SSP apanhou o artefato da gaveta e o recolocou novamente sobre a sua mesa, sem lhe perder de mira já uma certa distância, próximo da porta de saída.
  8.  Existem outros fatos pitorescos, folclóricos... Jucélio Costa relatou que depois desse fato anterior, numa determinada madrugada foi surpreendido em sua residência com a presença do seu amigo Delegado Zech João dos Anjos (anteriormente era Delegado Regional de Caçador e veio atuar na grande Florianópolis ). Depois  que se recompôs da surpresa percebeu que o Secretário Coronel Danilo Klaes também estava na companhia do Delegado Zech, ambos trazendo  um saco de ostras de presente para ele (tinham vindo  de uma pescaria). Jucélio relatou que depois que teve aquele conversa com Danilo Klaes no seu gabinete, quando disse que não era “vinho da mesma pipa...” e recomendou que guardasse sua pistola na gaveta, o tratamento mudou e passou a respeitá-lo. Na verdade, além da habilidade nata de Jucélio Costa para lidar com esse tipo de situação, acredito que a escola “Jade Magalhães” deve ter influenciado muito na sua formação e experiência de gabinete, porque este sim era um Secretário integralista na essência da palavra, tipo que não levava desaforo para casa, destemido, com uma personalidade forte, marcante, defendia seus ideais acima de qualquer coisa, não importando quem fosse seu opositor, opressor... e, esse convívio certamente que o influenciou nas relações interpessoais para cima e para baixo. Na gestão anterior, Jucélio conviveu  diretamente com Jade Magalhães, gozou de sua amizade, dispendeu longas horas de conversas até à madrugada na sede da SSP para falarem sobre tudo, com destaque para a formatação do anteprojeto que resultou na Lei n. 3.427/64 (5º andar do Edifício das Secretarias, depois sede da Fazenda Estadual – Rua Tenente Silveira). 
  9. Noutra ocasião, sem citar nomes, policiais do DOPS, por volta das treze horas (intervalo para o almoço) foram até o gabinete do “Secretário Coronel Danilo Klaes” para levar uma informação... e, sem bater (já que tinham acesso direto),  abriram a porta que não estava chaveada, em cujo interior surpreenderam o Chefe da Segurança Pública deitado debaixo da mesa, sob o tapete... Imediatamente ouviram sua voz que ecoou do recinto e dava a impressão que procurava acalmar uma policial civil que estava próxima: “Não se preocupe, esses dois são de minha confiança...!” Refeitos do impacto, os policiais  pediram desculpas pela “gafe” e se retiraram rápida e discretamente para não incomodar aquilo que parecia uma “sesta”, depois de uma manhã intensa de despachos...
  10. Nessa mesma época dois policiais civis do DOPS (informantes que frequentavam a residência do então SSP) foram procurados por uma “senhora” (carioca), parecendo bastante abalada emocionalmente  que disse que pretendia contratá-los para que “(...) ” com uma Escrivã de Polícia (SSP), chegando a oferecer-lhes uma boa recompensa para que executassem essa missão, o que foi rejeitado.  
  11. Logo que iniciou o governo Ivo Silveira consta que o Coronel Danilo Klaes não queria deixar o comando da SSP, porém o novo Chefe do Executivo o surpreendeu dizendo que a determinação tinha vindo de cima, e que o General Vieira da Rosa (Paulo Weber Vieira da Rosa) já havia sido convidado e aceitou o cargo. Aliás, o General Rosinha marcou história, pois se empenhou em implantar a Escola de Polícia, conseguiu prédio para sediar o estabelecimento de ensino policial, foi responsável pelo início dos concursos públicos, prestigiou a direção do órgão, reestruturou as carreiras policiais, indicou um Delegado de Polícia para dirigir a Polícia Civil, dentre outras relevantes medidas. Podemos dizer que Jade Magalhães e Jucélio Costa (dentre outros mais chegadas do gabinete) prepararam as bases legais para uma Polícia Civil de carreira e valorização dos Delegados, mas coube ao General Rosinha – com seu prestígio, equilíbrio e inteligência, tornou isso tudo um sonho real (o Governador Ivo Silveira relatou que por diversas vezes acompanhou o General Rosinha nos almoços na Escola de Polícia, como forma de prestigiar a sua gestão).
  12. Mais tarde, já no ano de 1969, houve o sinistro caso do assassinato do ex-Deputado Estadual (PSD) Heitor de Alencar Guimarães Filho - Presidente do Ipesc (Instituto de Previdência do Estado de Santa Catarina). Nesse episódio um dos filhos do Coronel Danilo Klaes trabalhava nesse  órgão e teria sido acusado pelo presidente de ter praticado um desfalque. Os fatos vieram ao conhecimento dos membros da Comissão da Verdade – CEV (presidida por Anselmo Machado (Alesc), e durante os trabalhos foram ouvidos o filho da vítima (Heitor Alencar Guimarães Neto) e Milton Paulo Borges Leal, este  ex-servidor Ipesc que teria na época dos fatos ouvido uma discussão entre envolvendo diretamente  o Coronel Danilo Klaes  que teria ameaçado de morte Heitor de Alencar Guimarães Filho que passado algum tempo foi executado por arma de fogo no dia 20.07.1969, isso quando estava afastado das funções por determinação do Governador Ivo Silveira

Feitas essas considerações, como os Delegados poderiam se opor ao Secretário Coronel Danilo Klaes para reivindicar por exemplo a implantação da Escola de Polícia, a Polícia Civil de carreira, a nomeação de Delegados de Polícia para prover todas as lotações no Estado por meio de concurso público? No mesmo sentido, como poderiam defender que o Chefia da Polícia Civil (DPC) fosse ocupada por um Delegado de Polícia e não por Oficiais da PM, o mesmo ocorrendo com as Delegacias Especializadas e com todas as  DRPs?

Segundo relato de Jucélio Costa partes importantes da Lei 3.427/1964 não foram implantadas (Escola de Polícia, concursos para provimento de cargos, nomeação de Delegados para a direção da Polícia Civil...) porque eram poucos os Delegados e alguns deles faziam o “jogo” do Secretário-Coronel Danilo Klaes... No caso do Dr. Fogaça, nessa época ele já se destacava por sua inteligência e cultura, além de ser dotado de boa oratória, entretanto, como estava exercendo função de confiança, a exemplo de outros, ficava muito difícil reivindicar interesses institucionais... Quando o  Coronel Danilo Klaes assumiu SSP (1964) o Dr. Fogaça já estava na condição de Assessor junto ao gabinete/SSP (foi ocupar justamente a posição de Jucélio Costa que era o o principal Assessor de Jade Magalhães e havia sido designado DRP de Blumenau porque forças políticas locais exigiram saída do Dr. Fogaça no famoso caso da “Caixa D’Água”). Portando, com a mudança de SSP (1964) a presença do Dr. Fogaça no Gabinete do SSP acabou contribuindo para uma convivência direta, ensejando conhecimento, proximidade, laços  profissionais e mútuo respeito com o novo SSP. No ano de 1965 Danilo Klaes resolveu colocar o Dr. Fogaça à frente do  DOPS (nessa época ainda ocupava o cargo efetivo isolado de DRP e detinha função de confiança decorrente da assessoria), no lugar do Capitão PM José Fernandes considerando seus interesses nos serviços de informação e inteligência (digamos, foi uma espécie de “promoção”). Além disso,  naquele mesmo ano o Dr. Fogaça foi  “presenteado” com o seu primeiro curso nos EUA, passando uma boa temporada fora do país, o que certamente foi aceito de bom grado. No ano de 1966, já tendo retornado às suas antigas funções, Dr. Fogaça foi exonerado do cargo efetivo isolado de DRP e nomeado para o novo cargo criado de Delegado Titular do DOPS, considerando que anteriormente se tratava apenas de uma função gratificada e passou a se constituir cargo de provimento efetivo isolado superior ao padrão dos DRPs. Segundo Jucélio Costa os demais Delegados Regionais (com algumas exceções pontuais) procuraram se adstringir aos serviços nas suas respectivas regiões, preferindo não se envolver em assuntos institucionais, tão só de natureza operacional.

Com o afastamento do Dr. Fogaça para seu curso nos EUA quem assumiu o seu lugar na titularidade do DOPS foi o Comissário Antonio Gomes de Miranda (o “Mirandão”), que era o Delegado Adjunto  (inclusive, conseguiu se aposentar nesse cargo que depois - a exemplo dos DRPs - passou a ser efetivo e isolado). Foi nessa época que o Escrivão de Polícia Luiz Henrique da Silveira (mais tarde ´um expoente na política catarinense, chegando ao cargo de governador do Estado de Santa Catarina) também foi preso na Rua Álvaro de Carvalho – centro de Florianópolis. Nesse episódio que ficou conhecido como a eleição de Ivo Eckert para o Diretório Acadêmico da Faculdade de Direito (Ufsc) que funcionava naquele local onde ocorreram diversas prisões de estudantes, cuja operação foi planejada e comandada por “Mirandão” (obviamente que recebendo determinações do SSP). “Mirandão relatou que ele e Luiz Henrique (que na época cursava a Faculdade de Direito e se formou em 1966) não se entendiam (era como misturar água e vinho, parodiando Jucélio Costa: “não bebiam vinho na mesma pipa...”). A convivência entre ambos era muito difícil, ainda mais com o afastamento do  Dr. Fogaça (curso nos EUA), considerando que já se destacava por ser  um profissional de peso intelectual, bem diferente do Comissário  e Adjunto/"Mirandão". De maneira que o ambiente interno de trabalho passou a ser bem diferente, especialmente com a ausência da liderança e intelectualidade do titular da repartição. Ainda, para ilustrar esses acontecimentos históricos, “Mirandão” relatou que Luiz Henrique (como Escrivão do DOPS e estudante de Direito) tinha lhe repassado as informações sobre as eleições no Diretório Acadêmico... Só não poderia supor que durante a operação policial que comandou iria se defrontar com o seu Escrivão  na companhia dos nomes que havia repassado. Registrou que ficou possesso de raiva, como poderia explicar a prisão de um policial da sua repartição junto com os presos e a repercussão dos fatos (ou não?). Mais, ainda, não teve outra alternativa, logo que se aproximou do Diretório, ainda na parte frontal, mandou seus policiais prenderem  a todos, incluindo  seu colega policial que foi trazido como preso comum, na mesma condição dos demais. Na sua leitura Luiz Henrique agiu daquela maneira em solidariedade aos seus colegas estudantes, para evitar retaliações posteriores, porque todos sabiam onde o mesmo trabalhava. Além disso, toda a operação policial foi de surpresa, imprevisível, mas não para Luiz Henrique que conhecia todos os detalhes. Na minha avaliação, seguindo o relato de “Mirandão”, mas  considerando o histórico posterior, Luiz Henrique foi quem realmente repassou as  informações para “Mirandão”, todavia, era um simpático da causa dos estudantes (porém, nunca foi comunista, mesmo quando passou a ter uma carreira política) e, talvez, desconhecesse as reais intenções de seu superior hierárquico com quem tinha divergências. Talvez, também não imaginasse as consequências  da operação policial, tanto que nunca quis falar ou mencionar em sua biografia, entrevistas ou memórias  os anos que passou na Polícia Civil do Estado, mormente no DOPS... Registre-se que o Secretário Coronel Danilo Klaes baixou a famosa Portaria n. 304 que interditou o referido Diretório Acadêmico tratando-o no documento como “pelego” e “vermelho (Portaria n. 304 de 16.08.1965). Obviamente que o Coronel Danilo Klaes não tinha preferência por Delegados com formação jurídica, especialmente nos postos chaves da SSP e da Polícia Civil, mas de Oficiais da PM ou agentes de polícia, alguns deles com acesso direto ao seu gabinete.

De sorte que nessa época de inseguranças os Delegados Regionais que resolvessem se contrapor ao Titular da Pasta por não concordar com suas decisões monocráticas e autoritárias chegaram a responder procedimentos disciplinares, inclusive, foram punidos, como foram os casos de Helvídio de Castro Velloso Filho (DRP de Criciúma), chamado por seus colegas Delegados de "O Jaguatirica" por seu temperamento contestador e que recebeu 90 (noventa) dias de suspensão disciplinar porque se recusou a cumprir ordens do “Secretário Coronel Danilo Klaes” que segundo Jucélio Costa havia autorizado  o funcionamento de um cassino na cidade de Arroio Silva (próximo de Araranguá que ainda estava subordinada à DRP de Criciúma) por interesses políticos e pessoais (1965). Também, José Ghizzo Genovez (DRP de Tubarão - 1965) por conta de se negar a arquivar um inquérito policial...(havia interesses políticos no arquivamento de um caso de suicídio, quando havia provas que se tratava de um homicídio, cujo principal suspeito era um importante empresário da região e irmão de um Deputado Federal da antiga “Arena”..., no rumoroso caso "Nicolazzi" ocorrido naquela região), Odorico Durieux – DRP de Florianópolis (1964) que foi repreendido (motivos desconhecidos) e Arnaldo Xavier Martins – procedimento disciplinar presidido pelo Coronel – PM Iraci Francisco da Silva (1965), inclusive, designado para assumir a DRP. Um outro fato que pesou muito foi a diáspora de alguns DRPs notáveis, como o de Lages – Dr. João Martins que no ano de 1966 fez concurso para magistratura, o mesmo ocorrendo com Silvio Dobrowolski – DRPde Joaçaba, depois, Chapecó, São Miguel do Oeste e Joinville (que ingressou também na magistratura estadual, depois federal, chegando a Desembargador, Professor da Ufsc e escritor), e Odorico Durieux (DRP de Florianópolis - 1964) que foi para a iniciativa privada (também chegou a ser  punido e mais tarde abandonou a carreira de Delegado de Polícia. Tupy Barreto e Ulisses  Longo foram mandados para DRPs do interior do Estado.

A década de sessenta foi um dos momentos mais difíceis e nebulosos para a história dos Delegados de Polícia que conseguiram sobreviver, sem que pudessem opor uma resistência de ordem institucional porque estavam sob o comando de um Coronel do Exército e de vários Oficiais da Polícia Militar que ocupavam espaços nas principais Delegacias de Polícia do Estado, à exceção de algumas DRPs e nas posições de comando dentro da nova Polícia Civil. Mas o fato é que o próprio Coronel Danilo Klaes, com o passar do tempo no cargo de SSP parece que passou a gostar da função e a conhecer melhor a realidade policial (casou  uma policial civil, na época Escrivã de Polícia, por quem acredito  piamente teve uma paixão tórrida, um amor de alta intensidade, respirando o poder e o amor em dualidade completa, o sentir-se regenerado, revigorado..., lembrando "Found Heaven" na interpretação clássica de "Take That"  (a impressão era que o Coronel Danilo Klaes não tinha limites quando defendia seus ideais e as pessoas que verdadeiramente amava) e  que foi responsável por uma  "revolução" de cunho pessoal e que determinou o resto da sua existência, inclusive, passou a flexibilizar suas relações com os Delegados  e a se adequar à realidade. Registre-se que o Capitão Sidney Carlos Pacheco permaneceu anos à frente da DFRD, deixando a função na década de setenta (chegou ao Comando-Geral da PM, elegeu-se Deputado Estadual e sua filha ingressou na carreira de Delegado de Polícia, atualmente aposentada), a exemplo de outros Oficiais, como o caso de Guido Cardoso Zimermann que chegou ao posto de Coronel, casou com uma policial civil e foi Comandante-Geral da PM.

  1. “agenciaal.alesc.gov.br/índex.php/noticia_single/comissaeo-estadual-da-verdade-ouve-medico-que-assinou-laudo-higino-pio”. 
  2. Antonio Gomes de Miranda –  Comissário de Polícia - ex Delegado Adjunto do DOPS - entrevista;
  3. Carlos Alberto Villela – Comissário de Polícia – ex-Agente do DOPS - entrevista; 
  4. Heitor Luiz Sché –  ex-Delegado Adjunto da DFRD e DRP de Rio do Sul - entrevista;
  5. Ivo Silveira –  ex-Governador do Estado de Santa Catarina – 1966/1970 - entrevista;
  6. Jucélio Costa – ex-Delegado do DOPS e diretor Adjunto da DPC - entrevista;
  7. Sidney Carlos Pacheco – Capitão/PM e ex-Delegado da DFRD - entrevista;
  8. Ulisses Marcelino Longo –  ex-Delegado Regional de Polícia – Timbó e Diretor da DPJ - entrevista.