A RESPONSABILIDADE CIVIL PELA INSCRIÇÃO INDEVIDA DE TÍTULO DE CRÉDITO...

Por Bruno Henrique Bernardo Fahd | 28/06/2016 | Direito

A RESPONSABILIDADE CIVIL PELA INSCRIÇÃO INDEVIDA DE TÍTULO DE CRÉDITO NOS SISTEMAS DE PROTEÇÃO DE CRÉDITO: A anotação indevida em cadastro de proteção ao crédito e suas consequências. 

Bruno Henrique Bernardo Fahd

Eric Abreu Caldas[1]

RESUMO

Mostra o que é o crédito, passando por uma abordagem dos títulos de crédito, instrumentos representativos do mesmo. Passando para uma análise breve de como funcionam os Sistemas de Proteção ao Crédito e seus princípios, para então entender como se efetiva o registro e como a partir dele pode surgir a anotação indevida e seus efeitos jurídicos. Buscando, portanto, uma solução para esse problema, visando uma harmonia entre os consumidores e tais sistemas, com uma devida asseguração dos direitos referentes aos consumidores.

Palavras-chave: Crédito. Títulos de Crédito. Responsabilidade Civil.

Introdução.

 

 O presente trabalho busca uma análise da responsabilidade civil na anotação indevida de títulos de crédito nos sistemas de proteção ao mesmo, com enfoque nas consequências dessa anotação indevida nesses sistemas. Podendo com a devida verificação desse procedimento observar como a responsabilidade civil pode ser aplicada nesses casos, podendo a partir de então examinar com maior clareza os seus efeitos.

Além disso, serão observadas a natureza dos títulos de crédito, suas características e as suas origens. Isso para que exista um correto entendimento de como os títulos de crédito são importantes para o consumidor, para os empresários e para toda a economia, sendo um instrumento de grande importância para ela. Portanto, podendo assim, posteriormente a isso, ocorrer o estudo das formas legais de restrição de crédito ao consumidor, com a análise dos efeitos dessa anotação e que medidas podem ser tomadas caso seja ilícita tal anotação.

  1. A Importância do Crédito na Atualidade

Para a correta compreensão do papel que os títulos de crédito exercem na atualidade como um instrumento do crédito em si, é preciso primeiramente uma análise da sua evolução por meio dos tempos, passando pelas características que constituem esse instrumento.

Assim, para Arnaldo Rizzado (2011, p. 4) "Com efeito, a origem etimológica do termo 'crédito' encontra a sua raiz no verbo latino credere, que significa acreditar". Tal afirmação do ilustre doutrinador sintetiza bem a ideia de crédito. A condição de acreditar, está baseada na confiança entre aquele que negocia um objeto e a pessoa que o adquire, seja por qualquer meio, a base está na confiança de que a obrigação acordada entre as partes será devidamente cumprida.

Esse critério da confiança, segundo lembra o mesmo doutrinador Rizzardo (2011), faz parte do elemento subjetivo do crédito, que trata exatamente do disposto no parágrafo anterior, sobre como essa confiança deu origem ao crédito. Também há o elemento objetivo, que consiste no valor do negócio, no bem, propiciando assim outra garantia à confiança. No mais, Arnaldo Rizzardo complementa:

"No curso da Idade Média surgiu o delineamento do crédito, estabelecendo-se algumas regras, e instrumentalizando-se em documentos. O desenvolvimento comercial na Europa e, depois, em outros continentes, causou ambiente propício para o fortalecimento do crédito". (RIZZARDO, Arnaldo. Títulos de Crédito. 3º ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011. p. 4.).

Portanto, observa-se com a afirmação que durante a Idade Média o crédito teve a sua moldagem. Ele surgiu a partir da confiança nas relações de troca e foi evoluindo passando para as relações monetárias. Essa evolução do crédito acompanhou a revolução industrial e todas as demais mudanças sociais ao longo do tempo, tendo o crédito ganhado uma importância tremenda para as relações comerciais e sendo parte integrante das mesmas. Após começar com a troca, passando pelo dinheiro, o evento do crédito proporcionou o surgimento dos títulos de crédito, que são nada mais do que títulos que representam o valor de uma relação creditória como ressalta Amador Paes de Almeida:

"Com a criação dos títulos de crédito o dinheiro em espécie é substituído. De início operavam como meros instrumentos do contrato de câmbio trajetício, isto é, operando a circulação do dinheiro. Mais adiante vamos encontrá-los representando valores que podem, desde logo, ser realizados, delineando de forma nítida a sua função essencial, qual seja a circulação do respectivo valor". (ALMEIDA, Amador Paes. Teoria e Prática dos Títulos de Crédito.  26° ed. São Paulo: Saraiva, 2007. p. 3).

Assim, é possível observar que o crédito levou ao surgimento dos Títulos de Crédito, que se tornaram instrumentos representativos das relações creditórias. Porém, vale salientar as principais características dos Títulos de Crédito, que para Rizzardo (2011), são: Literalidade, Autonomia, Cartularidade, Abstração, Circulação e Formalismo. A literalidade versa que o que vale é o que está escrito no documento. Já a autonomia dispõe que o Título de Crédito é um instrumento independente da obrigação que lhe deu origem. A Cartularidade consiste na forma em que o Título de Crédito deve ser construído, devendo haver um padrão de acordo com o título. A Abstração é uma disposição parecida com a Literalidade, para ela não interessa o negócio jurídico que originou o Título de Crédito e sim apenas o que está disposto nele, valendo o seu conteúdo, a sua emissão. Enquanto a Circulação toca no referente a fácil transferência dos Títulos de Crédito, que foram instrumentos elaborados com o intuito de circularem pelo mercado, assim essa característica garante que o título pode ser transferido com rapidez e eficiência. O Formalismo refere-se à própria natureza dos Títulos de Crédito, eles devem seguir o que está disposto legalmente com o intuito de serem válidos, o correto preenchimento desses requisitos para tornar o título eficaz.

Após essas considerações a respeito das características dos Títulos de Créditos de acordo com o exposto na obra do grande doutrinador Rizzardo (2012), pode-se verificar com clareza os elementos balizadores desse instrumento tão importante para o crédito. Com isso observamos a importância que o Crédito tomou, começando lá com a confiança nas relações de trocas, passando pela economia monetária e chegando a uma economia creditória, como bem assinalado por Almeida (2007).

Essa economia creditória, que foi responsável pela criação e instituição dos Títulos de Crédito. Esses instrumentos possibilitam a rápida difusão do crédito na economia, fazendo com que a população possa estar sempre com possibilidade de ter acesso ao crédito e portanto ter acesso aos bens de consumo disponíveis, dispõe Arnaldo Rizzardo:

"Desde o momento em que se desenvolveram as relações comerciais, ou aumentou a circulação de riquezas, envolvendo uma amplidão de contratos e negócios, surgiu a necessidade de se documentarem os direitos e obrigações, imprimindo, assim, segurança nas transações. A organização da economia levou à implantação de regramentos, os quais se impuseram em formas simples, ditados pelo uso, que redundaram em costumes, até se generalizarem e virem a abranger regiões e povos diferentes". (RIZZARDO, Arnaldo. Títulos de Crédito. 3º ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011. p. 5.).

Tal afirmação do doutrinador aborda um pouco a respeito de como as evoluções econômicas ao longo do tempo fizeram com que surgissem os Títulos de Crédito. E assim, mostra como se dá a importância do crédito para a sociedade nos dias de hoje.

O crédito é um dos combustíveis da economia, se não o mais importante. Pois é por meio dele que a população tem acesso aos mais variados bens de consumos oferecidos pelo mercado. E é por meio dele que esses produtos se difundiram, pois apenas com o crédito a maioria da população pôde ter acesso aos produtos com um valor bem mais elevado.

Observando-se, portanto, que a importância do crédito na atualidade consiste no fato de que ele é um fio condutor para as relações de consumo, sendo vital para o comércio. Já que é por meio dele que os produtos puderam massificar-se, pois com o seu surgimento mais pessoas puderam comprar produtos mais caros ou então poder usufruir de vários bens de consumo. O que ocasionou um aumento de demanda e consequentemente um aumento da oferta. Sendo o crédito um elo entre maiores possibilidades de consumo por parte das pessoas que o usufruem, assim como maiores possibilidades de produção e lucros para aqueles que oferecem seus produtos com a ajuda da concessão de crédito. Sendo um elemento de importância fundamental para a economia, para o comércio e para a sociedade atualmente, estando presente no cotidiano de todos.

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  1. O Serviço de Proteção ao Crédito e a Noção Geral do Registro

No Brasil, os Serviços de Proteção ao Crédito nasceram com o objetivo de tornar as relações creditícias mais claras e seguras, tendo o intuito de organizar um banco de dados para que houvesse a anotação daquelas pessoas que por seu histórico, não estão aptas de receber a “confiança”, ou seja, o crédito. Dispõe Altair Rodrigues Lopes Filho (2006, p. 21) “Os cadastros e dados de consumidores devem ser objetivos, claros, verdadeiros e em linguagem de fácil compreensão, assim dispondo o art. 43 § 1° do CDC”.

Assim, com essa afirmação, podemos identificar algumas das características que norteiam os Serviços de Proteção ao Crédito no Brasil. Essas características têm o intuito de fazerem com que esses serviços atendam a sua função principal, que é servir como uma proteção ao crédito, impedindo que pessoas não “confiáveis” tenham acesso ao mesmo. Eles também exemplificam algumas dinâmicas próprias das relações comerciais, prezando pela objetividade, clareza, verdade e linguagem fácil. Tudo isso para dar maior velocidade à essas ações e tornar tudo muito claro para toda a população, já que o crédito faz parte do cotidiano de todos. Também relata Altair Rodrigues Lopes Filho:

“Uma outra característica trazida pelo CDC é que os bancos de dados e cadastros     relativos a consumidores, os serviços de proteção ao crédito e congênere são considerados entidades de caráter público (art. 43, §4º do CDC). Foi com o intuito de garantir ao consumidor a mais ampla proteção, em especial quanto à possibilidade de utilização do habeas data, que se atribuiu a estas entidades o caráter público. Por ser de caráter público que se garante aos fornecedores a pesquisa às informações ali constantes”. (LOPES FILHO, Altair Rodrigues. Responsabilidade Civil dos Sistemas de Proteção ao Crédito: enfoque doutrinário e jurisprudencial. Rio de Janeiro/RJ, 2006. p. 21).

Essa disposição que o CDC deu aos Sistemas de Proteção ao Crédito, como entidades com “caráter público”, tem o objetivo de tornar mais fácil a fiscalização do Estado e fornecer à população a garantia que os seus direitos serão respeitados. Pois se tais instituições não tivessem esse quesito, os consumidores que são a parte mais fraca da relação seriam amplamente desrespeitados pelos empresários com um poderio econômico superior. Tal disposição busca realmente proteger o consumidor, fazendo-o ter uma garantia quanto a esses sistemas, mesmo a maioria sendo privado. Altair Rodrigues Lopes Filho novamente ressalta:

“Os arquivos de consumo, em regra, têm natureza jurídica privada. O Serviço de Proteção do Crédito – SPC, por exemplo, é entidade privada, que em quase todo o país é mantida pelos dirigentes lojistas e pelas associações comerciais, mas, para efeitos legais, é considerada entidade de caráter público no tocante às informações que guarda. Mas, também existem arquivos de consumo mantidos por entidades públicas, como o Cadastro informativo de créditos não quitados do setor público federal (CADIN), que é mantido pelo Banco Central do Brasil”. (LOPES FILHO, Altair Rodrigues. Responsabilidade Civil dos Sistemas de Proteção ao Crédito: enfoque doutrinário e jurisprudencial. Rio de Janeiro/RJ, 2006. p. 22).

Assim, conclui-se que esse “caráter público” dos Sistemas de Proteção ao Crédito também tem fundamento no grande interesse social nessa matéria. O que faz com que o Estado tenha que observar uma maior atenção a esses cadastros, visando proporcionar um correto e devido funcionamento para eles, para que a sua função seja a de ajudar nas relações comerciais que envolvem o Crédito, sem haja um abuso dessas informações o que pode prejudicar os direitos dos consumidores. Assim não interessa se o Sistema seja Privado ou Público, os Sistemas de Proteção ao Crédito sempre estarão dotados de tal requisito. Quanto ao Registro, dispõe Cláucio Coelho de Souza Júnior:

“Os registros de informações no SPC são efetuados por empresas associadas à CDL ou à AC; após 30 dias do vencimento do débito. Quando a empresa associada faz o registro, ela não apresenta o título ou documento comprobatório do mesmo ao SPC, sendo necessário apresentar somente o formulário de inclusão de registro preenchido com as informações necessárias. O qual será apresentado no caminhar desta análise. Uma vez liquidado o débito, o cancelamento do registro  deverá ser imediatamente solicitado pela empresa que efetuou o mesmo”. (SOUZA JÚNIOR, Cláucio Coelho. Registro Indevido de Pessoa Física Pelos Estabelecimentos Comerciais com Ênfase no SPC. Governador Valadares/MG, 2010, p. 15).

Portanto, observa-se que o registro é feito pelas empresas associadas às entidades que regulam os Sistemas de Proteção ao Crédito. O registro é feito um mês após o vencimento do débito não pago. Com a apresentação do formulário que para a inserção do consumidor nele, com a quitação da dívida deve o registro no sistema ser prontamente desfeito.

Porém, vale uma ressalva muito importante que é no tocante ao fato da não apresentação do documento que comprova o débito junto a esse formulário. Essa disposição inusitada é que permite a grande quantidade de anotações indevidas nesses sistemas, tornando assim o que foi criado com o intuito de facilitar a vida comercial e creditória em uma verdadeira complicação para a maioria dos consumidores.

REFERÊNCIAS:

ALMEIDA, Amador Paes. Teoria e Prática dos Títulos de Crédito.  26° ed. São Paulo: Saraiva, 2007.

BRASIL. Código de Defesa do Consumidor. Disponível em <http://www.planalto.gov.br>. Acesso em 05/11/2012.

LOPES FILHO, Altair Rodrigues. Responsabilidade Civil dos Sistemas de Proteção ao Crédito: enfoque doutrinário e jurisprudencial. Rio de Janeiro/RJ, 2006. Disponível em: <http://www.tjrj.jus.br/c/document_library/get_file?uuid=1fd97d63-2fe4-433e-9afd-eea90f877ee2&groupId=10136>. Acesso em: 05/11/2012.

RIZZARDO, Arnaldo. Títulos de Crédito. 3º ed. Rio de Janeiro: Forense, 2011.

SOUZA JÚNIOR, Cláucio Coelho. Registro Indevido de Pessoa Física Pelos Estabelecimentos Comerciais com Ênfase no SPC. Governador Valadares/MG, 2010. Disponível em: <http://www.pergamum.univale.br/pergamum/tcc/Registroindevidodepessoafisicapelosestabelecimentoscomerciaiscomenfasenospc.pdf>. Acesso: 05/11/2012.

[1] Alunos do 5° período do Curso de Direito, da UNDB.

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