A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO E COMO SURGE O DEVER DE REPARAR
Por Elane Cristina Rodrigues Eleuterio | 04/07/2018 | DireitoO SURGIMENTO DA RESPONSABILIDADE CIVIL
Sabe-se que o Direito vem como instrumento para resolução de conflitos, e as normas que o regulamentam, como pacificação desses. Diante disso, não conseguimos mensurar acerca de quantos conflitos podem surgir ao logo dos tempos e o quanto se torna complexa a forma de solucioná-los mediante as normas que foram a nós impostas e que se transformam como passar do tempo, sempre buscando uma melhor forma de promover a melhoria de vida do individuo em sociedade, de acordo com seus direitos e deveres.
A responsabilidade civil surgiu através dos Franceses no século XVIII, estabelecido pelo Código Civil Francês, como um meio ou forma de reparação, para depois ser adotada pelo nosso sistema jurídico brasileiro que por um longo período se limitava ao Código Civil de 1916 pelo seu artigo 159 “Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano.” Logo essa responsabilidade assume uma maior proporção e é colocada como espécie de direito obrigacional. Diante dessa afirmação, podemos então dizer que a responsabilidade civil nasce do dever de se reparar algo que foi violado, e, por conseguinte, então surge o dever de indenizar, dever esse que tinha como finalidade recompor aquilo que foi lesado por um erro.
Toda atividade que acarreta prejuízo traz em seu bojo, como fato social o problema da responsabilidade. Destina-se ela a restaurar o equilíbrio moral e patrimonial provocado pelo autor do dano. Exatamente o interesse em restabelecer a harmonia e o equilíbrio violados pelo dano constitui a fonte geradora da responsabilidade civil. (GONÇALVES, 2015, p,19)
Em regra, o objetivo principal da responsabilidade civil seria a reparação integral do dano causado a terceiros, que consistia no intuito de devolver à pessoa que se sentisse lesada a condição atual em que ela se encontrava antes de ocorrer o ato ilícito que ocasionou o dano. No entanto, percebeu se diante desse intuito que em alguns casos era impossível devolver ao lesado sua condição anterior ao ato. Paulo de Tarso Vieira Sanseverino (2010, p.99) aborda essa reparação da seguinte forma:
O principio da reparação integral ou plena, também chamado de equivalência entre o dano e a indenização, como indicado por sua própria denominação, busca colocar o lesado em situação equivalente á que se encontrava antes de ocorrer o ato ilícito, ligando se diretamente à própria função da responsabilidade civil, que é fazer desaparecerem, na medida do possível, os efeitos do evento danoso. Esse ideal é na realidade uma utopia, pois dificilmente se alcançará a inteira reparação de todos os prejuízos sofridos pela vitima, o que é feito de forma apenas aproximativa.
O Código Civil Brasileiro de 2002 em seu art. 944, paragrafo único, prevê uma exceção à regra da reparação integral do dano “se houver excessiva desproporção entre a gravidade da culpa e o dano causado, poderá o juiz reduzir, equitativamente, a indenização”. Essa exceção veio com o intuito de que seja medido o grau de complexibilidade do ato ilícito que causou o dano e então analisar a possibilidade de diminuir o ônus dado à pessoa que o cometeu, como uma possível forma de proteger sua integridade humana, de modo que se o dano causado a um terceiro gerar uma grande indenização a esse, tal reparação não poderá interferir no mínimo existencial, ou seja, o essencial para sua vida, de forma que comprometa sua alimentação e moradia.
O mesmo Código Civil de 2002 trouxe em seus artigos 927 e 186 as como segue abaixo:
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar dano a outrem, fica obrigado a repará-lo. Parágrafo único. Haverá obrigação de reparar o dano, independentemente de culpa, nos casos especificados em lei, ou quando a atividade normalmente desenvolvida pelo autor do dano implicar, por sua natureza, risco para os direitos de outrem.
Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO
Sabe se que primordialmente quando se tratava de responsabilidade civil do Estado, adotava-se a irresponsabilidade absoluta, o que significa dizer que, o Estado era totalmente isento de responsabilidade por parte dos atos cometidos pelos agentes da administração pública, independente de comprovação de dolo ou culpa por parte deles. Com o passar do tempo, começaram então a perceber o quanto isso deixava desamparados àqueles que se sentiam lesados por meio de atos cometidos pelo Estado, pois mesmo que existisse uma ação reparatória, a responsabilidade era imputada a terceiros, que muitas vezes, por diversos fatores, não conseguiam reparar o dano causado. Com o passar dos anos, passou a ser adotada a teoria da responsabilidade subjetiva, essa onde aqueles que se sentiam lesados pela administração pública podiam por direito ingressar com ação, precisando comprovar a culpa ou dolo dos agentes estatais, para então receber a reparação do dano. Já na segunda metade do século XIX, de forma a expandir essa responsabilidade foi adotada a teoria da responsabilidade objetiva, nessa sem precisar que o ofendido comprove dolo ou culpa por parte do ofensor, deixando assim o Estado sempre responsável para indenizar os danos causados por ato ilícito.
A responsabilidade do Estado no direito Brasileiro foi preconizada pela Constituição do Império de 1824, que seu art. 178, n.29, dispunha: ‘’ Os empregados públicos são estritamente responsáveis pelos abusos e omissões praticados no exercício de suas funções e por fazerem efetivamente responsáveis aos seus subalternos. ’’ A constituição republicana em seu art., 82 trouxe disposição idêntica. (NANNI, 1999, p.99)
Diante desse dispositivo não nos cabe pensar que essas previsões queriam desresponsabilizar o Estado pelos danos causados, entende-se que há uma relação entre os dois. Assim dispôs o legislador, com a intenção de evitar uma oneração em excesso do erário público, ou seja, que o Estado seja responsabilizado de forma indevida, e assim gerando um desgaste maior para os usuários do serviço publico.
A responsabilidade civil do Estado teve sua primeira previsão legal trazida pelo código civil de 1916 de Clovis Bevilaquá, conforme segue:
O art. 15 do Código Civil: As pessoas jurídicas de direito público são civilmente responsáveis, pelos atos de seus representantes que nessa qualidade, causem dano a terceiros, procedendo de modo contrário ao direito ou faltando a dever prescrito por lei, salvo o direito regressivo contra os causadores do dano.
Nesse artigo se consolida a teoria de responsabilidade por parte do Estado de forma subjetiva, posteriormente se firmando, segundo entendimento unânime, a teoria da responsabilidade objetiva no art. 194 da Constituição Federal de 1946, conforme dispositivo abaixo:
Art. 194 - As pessoas jurídicas de direito público interno são civilmente responsáveis pelos danos que os seus funcionários, nessa qualidade, causem a terceiros.
Parágrafo único - Caber-lhes-á ação regressiva contra os funcionários causadores do dano, quando tiver havido culpa destes.
Atualmente a responsabilidade civil objetiva do Estado possui garantida constitucionalmente pelo art. 37, § 6, mantendo o que já dispunha na Constituição Federal de 1946, como segue dispositivo abaixo:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
§ 6º As pessoas jurídicas de direito público e as de direito privado prestadoras de serviços públicos responderão pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros, assegurado o direito de regresso contra o responsável nos casos de dolo ou culpa.
O fato gerador da responsabilidade civil do Estado é o desenvolver dos serviços prestados pela administração pública, serviço esse que é de suma importância para a vida em sociedade e que de certa forma nos tornou dependentes a usufruir deles em vários âmbitos da vida. Devido à constância na prática desses atos administrativos podemos observar o significável crescimento dos erros cometidos pelo Estado. Diante da consolidação da responsabilidade objetiva do Estado, começaram a surgir formulações de fundamentos a respeito dessas, são elas: Teoria da culpa administrativa; do risco administrativo e do risco integral. No entanto, ambas não divergem de que se há o dano sofrido e exista um nexo entre esse dano e a ação decorrente da administração pública, há a responsabilidade do Estado, porém nos casos em que o agente público não estiver no exercício das funções da administração pública, nem agindo em razão dessas, o Estado não poderá ser responsabilizado.
De forma que, mesmo para atos praticados conforme a lei, como para os praticados contra ela, poderá acarretar a eventuais danos para o ofendido. Entende-se então que, com a existência do ato cometido pelo agente da administração pública, seja este com culpa ou dolo, existe o direito de reparação do dano da parte lesada.