A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO E AS EXCLUDENTES DE...

Por Francine Fabrício dos Santos | 05/09/2016 | Direito

A RESPONSABILIDADE CIVIL DO ESTADO E AS EXCLUDENTES DE RESPONSABILIZAÇÃO FRENTE A NOVAS PERSPECTIVAS - REEXAME DO TEMA

RESUMO

O presente trabalho objetiva abordar o tema da responsabilidade civil do Estado e as hipóteses excludentes de responsabilização no ordenamento jurídico brasileiro. O tema apresenta profundas discussões doutrinárias e teorias que contribuíram à evolução do instituto. A relevância da matéria encontra-se no âmbito do direito administrativo que, em relação aos institutos jurídicos tradicionais, encontra-se em um processo acelerado de transformação. No âmbito da consagração do Estado de Direito e da máxima efetividade dos direitos fundamentais na esfera jurídica atual, surge ampla proteção ao direito de reparação à eventuais danos causados àqueles que tenham sofrido uma lesão material ou moral, em decorrência de uma conduta praticada por um terceiro. Contudo, quando o Estado foi quem praticou essa conduta, reforça-se sobremaneira a relevância da responsabilidade civil. Desta feita, pretende-se destacar as hipóteses excludentes de responsabilização em casos que envolvam a responsabilidade civil do Estado, embasando-se em casos recentes e importantes abordados pela jurisprudência.

  1. INTRODUÇÃO

Este trabalho tem por escopo abordar o estudo da Responsabilidade Objetiva do Estado e as hipóteses excludentes de responsabilização.

O tema desenvolvido versa na conceituação da responsabilidade civil e seu desenvolvimento no âmbito do direito público. Aborda a evolução históricado instituto que sofreu influência romana, bem como de um dos mais antigos conjuntos de leis escritas que se tem conhecimento, como o Código de Hamurabi.

Busca-se aprofundar o tema da responsabilidade civil do Estado no ordenamento jurídico brasileiro com análise do artigo 37, paragrafo 6ª da Constituição Federal que rege a matéria, bem como os requisitos necessários a caracterização da indenização devida pelo Estado.

Para imputar ao Estado a responsabilização objetiva, seja por ação ou omissão, a tarefa que o operador jurídico possui é em verificar se há o nexo entre a conduta estatal e o resultado danoso.

Em sede de responsabilidade estatal, o dano deve ser necessariamente ligado a uma ação ou omissão estatal, e essa tarefa é exercida pelo nexo causal. Este deve ser efetivamente demonstrado e, dependendo das premissas teóricas do nexo, pode-se chegar a resultados diametralmente opostos em matéria de responsabilidade extracontratual do Estado.

Entre os aspectos relevantes da Teoria da Responsabilidade é que ela não é absoluta. Podendo ser ilidida ante a falta do nexo causal entre os pressupostos e a aplicação de uma das excludentes de responsabilidade.

                   Verifica-se que a jurisprudência pátria se mostra rica e ao mesmo tempo contraditória em matéria de responsabilidade do Estado. Tais divergências encontram fundamento não apenas no modo de apreciar os fatos, mas na compreensão teórica do tema, nem sempre abordado com a profundidade desejável, e por vezes não tratadas com o rigor técnico.

Por isso, pretende-se abordar as hipóteses conhecidas pela doutrina que possibilitam o afastamento da responsabilidade estatal, bem como elencará jurisprudência selecionada sobre o tema, demonstrando o conhecimento nos Tribunais pátrios. 

  1. RESPONSABILIDADE CIVIL NO DIREITO BRASILEIRO

A responsabilidade civil é originária do verbo latino respondere, de spondeo, primitiva obrigação de natureza contratual do direito quiritário romano, pelo qual o devedor se vinculava ao credor nos contratos verbais, por meio do sistema de pergunta e resposta.

Deste modo, desde a sua origem, a responsabilidade é a obrigação de dar, fazer ou não fazer alguma coisa, de ressarcir ou reparar danos, de suportar sanções penais, exprimindo sempre a obrigação de responder por alguma coisa. É, portanto, o dever contraído pelo causador da ameaça de dano ou dano consubstanciado, de assumir perante a esfera pública, seja judicial ou extrajudicialmente, o prejuízo decorrente de seus atos, no campo penal ou civil.

Conforme Conrado Rodrigues Segalla (2002, p. 401), a responsabilidade civil, por sua vez, é obrigação de compor o prejuízo ou dano, originado por ato próprio do agente, responsabilidade que o autor define como direta, ou, fato sob o qual tutelava, referindo-se a responsabilidade indireta, e ainda que a sua obrigação deva ser assumida diante do Poder Judiciário,

Os registros históricos retratam que a responsabilidade é objeto de estudo muito antes da civilização ocidental. O Código de Hamurabi, por exemplo, já contemplava a ideia de punir o culpado pelo dano, aplicando-lhe um sofrimento correspondente. Filosofia análoga também seguia a Lei das XII Tábuas, o Código de Manu e o antigo direito hebreu.

Como aspecto histórico, pode-se destacar artigos do Código de Hamurabi, um dos mais antigos conjuntos de leis escritas que se tem conhecimento, que traziam consigo a ideia de reparação ou compensação.

O artigo 3º desta legislação previa responsabilização à aquele que jurava falso diante do juízo babilônico: “Se alguém em um processo se apresenta como testemunho de acusação e não prova o que disse, se o processo importa perda de vida, ele deverá ser morto”.

Ainda, por seu turno, o artigo 5ª também punia, severamente, o juiz que pronunciasse sentença equivocada, devendo pagar 12 vezes o valor das custas, bem como ser publicamente expulso de sua cadeira, conforme ensina a melhor doutrina (RICCITELLI, 2010, p. 14).

O Código de Manu, por sua vez, de origem hindu, posterior ao Código de Hamurabi, foi a primeira codificação a substituir a ideia violenta de compensação dos danos caracterizada pela vingança pessoal, pelo pagamento de certa soma em dinheiro. Apesar de se tratar de direito de fundamento religioso à época, apresentava fundamento naideia de justiça.

No Código de Manu as compensações eram realizadas por meio de pagamento de multa ou indenização, demonstrando que o dano poderia ser compensando de outra forma que não aquela que prevê outra agressão.

A partir desse momento, iniciou-se a estabelecer uma nova maneira de reparação de dano, tendo como objetivo principal o restabelecimento das coisas ao seu estado anterior o mais breve possível.

Outro antecedente histórico, gerador de ideias de precedentes práticos de responsabilidade civil, dos quais não poderia deixar de se destacar, é o direito romano.

Estes foram responsáveis pela primeira lei a objurgar o culpado á reparação do dano causado a outrem, chamada de Lex Aquilia de damno, estabelecida no século III a.C., conforme ensina Moreira Alves (ALVES, 2002, p. 234-235), citado por RICCITELLI (2010, p. 20): 

Essa lei continha três capítulos, que estabeleciam:

  1. a) primeiro, que quem matou escravo ou animal alheio, que vive em rebanho, está obrigado a pagar ao dono o valor máximo alcançado pelo escravo ou pelo animal, no ano anterior ao da morte;
  2. b) o segundo, que o adstipulator, que me fraude contra o credor (o stipulator) extingue o crédito mediante a acceptilatio, fica obrigado a pagar o seu valor (quanti e ares est) a este; e
  3. c) o terceiro, que causa qualquer espécie de dano a coisa alheia animada (excerto a morte, caso a que se refere o Capítulo primeiro da Lei Aquilia) ou inanimada, está obrigado a indenizar seu proprietário do valor máximo alcançado pela coisa nos 30 dias anteriores ao em que ocorreu o dano.

Desses três capítulos, apenas o primeiro e o terceiro - que eram os que se referiam a danos causados em coisas - vigoram no direito Justiniano; o segundo de há muito caído em desuso.           

Referida lei, mais do que definir a responsabilidade dos agentes com maior clareza e determinar a compensação de danos, trouxe a concepção romana de responsabilidade civil, que é aquela considerada grandiosa por estabelecer a ideia de que a ilicitude da ação não se determina exclusivamente pela prática de uma ação contrária a lei, ou pela produção efetiva de algum dano, mas era determinada, especialmente, pela ação voluntária na produção desse dano ou desse ilícito.

Assim, a Lex Aquilia, também chamada de Lei Aquiliana, previa que poderia se responsabilizar alguém pelo dano mesmo sem a existência de um contrato anterior. Na doutrina atual, tal responsabilidade é conhecida como extracontratual.

Desta maneira, referidos códigos são antecedentes históricos que retratam o interesse na sistematização do conceito de responsabilidade civil, dividindo-se em responsabilidade e a codificação de um sistema de compensação.

No atual Código Civil Brasileiro, a responsabilidade civil está elencada no artigo 186 e 187, complementada pelo contido no artigo 927, do mesmo códex.

Para Antônio Riccitelli (2010, p. 16), “conceitualmente a recuperação total ou parcial do que se perdeu, em virtude de dano causado por terceiro, gera a concepção jurídica efetiva do dever de indenizar intitulada: responsabilidade civil”.

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