A RESPONSABILIDADE CIVIL DAS EMPRESAS DE COMPRA COLETIVA PELO INADIMPLEMENTO EXCLUSIVO DO FORNECEDOR AO CONSUMIDOR

Por Mauro André Damasceno Pereira | 15/02/2013 | Direito

A RESPONSABILIDADE CIVIL DAS EMPRESAS DE COMPRA COLETIVA PELO INADIMPLEMENTO EXCLUSIVO DO FORNECEDOR AO CONSUMIDOR[1] 

Mauro André Damasceno Pereira

Rômulo Frota de Araújo[2] 

RESUMO 

O presente trabalho trata da responsabilidade civil atribuída as empresas de compra coletiva, que exercem a função de intermediadoras entre os fabricantes e os consumidores, e desta forma estas são equiparadas aos comerciantes, pois aproximam os produtos dos destinatários finais. E com base nessa relação de intermediário na cadeia de consumo, é que elas devem receber a responsabilidade de forma subsidiária, e não solidária como entende parte da doutrina.

PALAVRAS-CHAVE 

Consumidor; CDC; Comerciante; Fornecedor; Responsabilidade Civil. 

INTRODUÇÃO

Com a evolução dos meios de informação, acarretando em uma circulação mais rápida de mercadorias e serviços, o mercado vem se desenvolvendo cada vez e fazendo com que consumidores de lugares mais longínquos do mundo tenham demandas por bens e serviços satisfeitos.

Os sítios eletrônicos onde grandes lojas disponibilizam produtos a baixo custo – ou mesmo isentam o consumidor do pagamento de frete – ou mesmo onde verdadeiros leilões são realizados pela rede mundial de computadores, facilitaram e muito que maior parcela da população – desde que, em verdade, tenha um computador ligado à internet – consuma produtos que jamais teriam acesso; uma verdadeira revolução logística que, alguns, erroneamente convencionaram chamar de terceira revolução industrial.

Dentre os chamados sítios de compras on line, destacam-se nos últimos anos os que praticam a chamada “Compra coletiva”. São páginas virtuais que atuam como intermediadores de produtos e serviços de seus reais fornecedores, ofertando promoções por meio da compra de cupons.

O objetivo deste trabalho é analisar a responsabilidade civil destas empresas de compra coletiva, mostrando como os operadores do direito vêm tratando do assunto frente ao inadimplemento exclusivo do fornecedor à luz do CDC; ainda, qual o tratamento concedido pela legislação a estas empresas.

Busca-se demonstrar que em que pese a lei disponha que a prática chamada Compra Coletiva assemelhe-se à responsabilização destinada ao comerciante. Tal entendimento afigura-se controvertido perante doutrina, sendo, em diversos casos, entendida a responsabilidade solidária.

Assim sendo, deve ser feita primeiramente a definição e em que termos se realizam a compra coletiva. Após, tem-se um apanhado geral do sistema responsabilidade praticado pelo Código de Defesa do Consumidor. Como terceiro tópico, fazer a devida diferenciação entre fornecedor e comerciante, bem como devem ser apresentadas os tipos de responsabilidade previstas a cada um, e o tipo de responsabilização que o CDC destinou para o fato de produto e serviço, com base na hipossuficiência de condições do consumidor.

1 A DEFINIÇÃO DE COMPRA COLETIVA 

O mercado consumidor brasileiro expandiu muitos nos últimos anos. Após a “estabilização” econômica e o respeito internacional alcançado pelo país, o poder aquisitivo de diversas classes sociais teve significativo acréscimo, criando importante nicho consumerista. Assim surge a chamada “classe C”. Nessa senda, mais pessoas possuem acesso maior a internet e consomem cada vez mais produtos e serviços por meio desta.

Com o fito de tirar proveito desse crescimento, os sítios de compras coletivas surgiram no cenário brasileiro em 2010, tendo seu crescimento e popularização em grande escala, sendo em média, aproximadamente, 100 empresas desse ramo espalhadas pelo país. Estas empresas atuam como intermediadores da relação dos fornecedores e consumidores. Divulgando produtos com descontos que variam de 40% a 90% dos preços convencionais, com o desígnio de promover os serviços/produtos de outrem. Trata-se de experiência de comércio eletrônico inaugurada nos Estados Unidos da América e que, trazida ao Brasil, angariou bastante sucesso (RIBEIRO; RUSSI, 2011, p. 2).

Feita a devida conceituação, demonstra-se agora a regra geral de responsabilidade civil presente no Código de Defesa do Consumidor, notadamente, a responsabilidade objetiva.

 

2 REGRA GERAL DE RESPONSABILIDADE CIVIL DO CDC

 

 

3 A RESPONSABILIDADE SUBSIDIARIA DO COMERCIANTE – ADEQUAÇÃO AOS SÍTIOS DE COMPRA COLETIVA

As empresas de compra coletiva fazem publicidade e/ou propaganda de produtos de outrem, sendo mero intermediador da operação mercantil, facilitando o acesso aos produtos pelo consumidor. Assim sendo, essas empresas não podem responder por defeitos ou vícios causados exclusivamente pelos fornecedores e fabricantes, já que a mercadoria não é da compra coletiva, esta apenas presta um serviço de publicidade.

No caso de o fabricante lançar uma oferta por um preço bem inferior ao de mercado, através de uma empresa de compra coletiva, e posteriormente o produtor se arrepender da oferta, a empresa não pode ser responsabilizada também, pois falta o nexo causal, ela não deu causa ao dano, somente o fabricante agiu com o dolo que resultou na lesão. A inadimplência foi somente do fabricante, então não se pode cogitar a aplicação de responsabilidade solidária.

Bastante difícil é a determinação da responsabilidade civil do fabricante pelos produtos elaborados devido: `a dificuldade de se determinar o momento em que surge o defeito, ao fato  de ser possível que se pratique uma injustiça para com o vendedor, que , expondo o produto aos seus clientes, não tem meios de verificar a sua perfeição.(DINIZ, 2006,pg.438).

O fabricante deverá responder pelo prejuízo causado pelo produto/serviço inadequado ou defeituoso, por deficiência de informação ou por publicidade enganosa, assim se uma oferta é veiculada a um site, o produtor não pode mudar de ideia, pois o simples anuncio já o vincula, sendo possível a exigência de cumprimento da oferta pelo consumidor. Como preceitua o CDC:

O art.30 do CDC é expresso ao se referir a responsabilidade por uma oferta.Toda informação ou publicidade, suficiente precisa, veiculada por qualquer forma ou meio de comunicação com relação a produtos e serviços oferecidos ou apresentados, obrigará o fornecedor que a fizer veicular ou dela se utilizar e integrará o contrato que vier a ser celebrado.

Como percebemos, a legislação responsabiliza o fornecedor, este é quem deve reparar em caso de não cumprimento da obrigação divulgada, pois é ele que tem condições de realiza-la e foi ele quem deu causa, ao descumprir com o anuncio do site. O próprio CDC oferece soluções para o inadimplemento:

Art.35- Se o fornecedor de produtos ou serviço se recusar cumprimento à oferta, apresentação ou publicidade, o consumidor poderá, alternativamente e à sua livre escolha: exigir o cumprimento forçado, ou aceitar outro produto ou mesmo rescindir o contrato.

A responsabilidade pelo fato do produto é dada ao fabricante, produtor, importador, sendo indevido ampliar esse rol. As empresas de compra coletiva, não se enquadram nessa previsão, pois as mesmas são equiparadas ao comerciante, e este foi excluído do rol determinado pelo art.12, e dizer que tais empresas são fornecedores intermediários é uma afirmação equivocada, segue in verbis:

 

Art. 12 - O fabricante, o produtor, o construtor, nacional ou estrangeiro, e o importador respondem, independentemente da existência de culpa, pela reparação dos danos causados aos consumidores por defeitos decorrentes de projeto, fabricação, construção, montagem, fórmulas, manipulação, apresentação ou acondicionamento de seus produtos, bem como por informações insuficientes ou inadequadas sobre sua utilização e riscos.

O comerciante foi excluído propositalmente do artigo anterior para receber tratamento específico no artigo 13, assim o comerciante recebeu responsabilidade subsidiária, só devendo arcar com algum ônus pelo vício, se não for possível encontrar o fabricante, se o produto não der condições de localização do produtor, ou se o próprio comerciante gerou o dano ao produto, ou seja, deu causa com sua ação ou omissão.

Art.13- comerciante é igualmente responsável, nos termos do artigo anterior, quando:

I - o fabricante, o construtor, o produtor ou o importador não puderem ser identificados;

II - o produto for fornecido sem identificação clara do seu fabricante, produtor, construtor ou importador

O artigo 6º do CDC prevê o direito de reparação integral pela lesão proveniente de relação consumeirista. Bem como, exonera o consumidor da obrigação de provar a culpa da empresa, tratando-se de responsabilidade objetiva, o legislador reconhece a condição inferior do consumidor na relação (hipossuficiente), nesse sentido: “A responsabilidade de pleno direito do fabricante ou produtor que deve prever os efeitos danosos que o produto defeituoso, ou serviço, acarretará, dispensando, assim, o lesado de produzir prova.” (DINIZ,2006, pg.440)

Todavia, não se pode confundir a reparação integral e a responsabilidade objetiva, com a responsabilidade solidária, pois elas nem sempre serão aplicadas em conjunto. A solidariedade é a regra, contudo, o art.13 do CDC, exclui o comerciante de tal obrigação, por isso a solidariedade não pode ser presumida, deve ser expressa em lei. Ficando claro que o comerciante responde de forma subsidiária, não podendo ser equiparado aos demais da cadeia de consumo.  Portanto a empresa de compra coletiva não deve responder por dano que não teve nenhum tipo de envolvimento.

O artigo 18 do CDC responsabiliza objetivamente e solidariamente pelos vícios do produto, de forma implícita, com o intuito de resguardar o consumidor, pela sua condição mais frágil. Não podendo ser estendido ao comerciante esse tipo de responsabilidade. Os tribunais entendem dessa forma:

CONSUMIDOR. VÍCIO DO PRODUTO. RESPONSABILIDADE SOLIDÁRIA. PERDAS E DANOS. 1. Todos aqueles considerados pelo CDC como fornecedores do produto respondem solidariamente pelos defeitos apresentados. Exegese do art. 3° c/c art. 18 daquele diploma legal. (TJCE, AC 2002.0000.3390-9/0, Rel. Des. José Arísio Lopes da Costa, 1ª Câmara Cível, julgado em 26/03/2003, DJU 30/04/2003)

O artigo 14 do CDC não concede subsidiariedade ao comerciante, quando este presta serviço diretamente, mas o comerciante nem sempre é o prestador direto dos serviços. A empresa de compra coletiva não presta o serviço diretamente, ela apenas faz a oferta e intermedia o serviço, divulgando-o. Não podendo se aplicar a responsabilidade pelo fato do serviço a ela, pois tal ônus só é previsto a quem fornece o serviço de forma direta. Por isso é cabível a aplicação do art.13 do CDC para excluir o comerciante.

 A atividade de comércio é uma intermediação entre o consumidor e o produtor com base em circulação de bens e serviços. Os sites de compras coletivas fazem circular bens e serviços ofertados pelos fornecedores. Sendo evidente sua caracterização como comerciante.

Entretanto, para alguns, as empresas de compra coletiva são tidas como fornecedores, e por isso devem responder pelo vício de serviço ou produto, já que todos os fornecedores tem responsabilidade solidária, independendo da posição na cadeia de consumo. “Importa esclarecer que no polo passivo dessa  relação de responsabilidade se encontram todas as espécies de fornecedores”. (DENARI,2011,pg.222). Segundo essa parte da doutrina,  eles seriam fornecedores intermediários, fazendo parte da cadeia da mesma forma, sendo assim, igualmente, fornecedor para efeito da aplicação da responsabilidade objetiva solidária.

Segundo Zelmo Denari, se aplica a responsabilidade solidária para facilitar e efetivar a pretensão do consumidor “por critério de comodidade e conveniência o consumidor, certamente, dirigirá sua pretensão contra o fornecedor imediato” (DENARI,2011,pg.170). Porém essa solidariedade não pode ser tida como absoluta, e nem pode ser imputada ao comerciante, pois este foi excluído por força de lei. A simplificação e efetivação dos direitos do consumidor não podem gerar distorções normativas e nem suprimir texto legal. 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

REFERÊNCIAS

DENARI, Zelmo. Código de Defesa do Consumidor Comentado pelos Autores do 

Anteprojeto. 10ª. Ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2011.

DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, V.7: Responsabilidade Civil. 20ª ed. São Paulo. Saraiva.2006

RIBEIRO, Leonardo Correa; RUSSI, Mattheus Borges. A responsabilidade civil dos sites de compra coletiva à luz do código de defesa do consumidor. Disponível em: < http://www.lfg.com.br/artigos/Blog/A_RESPONSABILIDADE_CIVIL_DOS_SITES_DE_COMPRAS_COLETIVAS_A_LUZ%20_DO_CODIGO_DE_DEFESA_DO_CONSUMIDOR.pdf> Acesso em: Novembro, 2012.


[1] Paper apresentado para obtenção da segunda nota da disciplina de Responsabilidade civil;

[2] Acadêmicos do 9° período do Curso de Direito Noturno da UNDB;