A REESCRITA NA SALA DE AULA COMO FERRAMENTA DE APRENDIZAGEM
Por Greici Cañete | 10/08/2009 | Educação1 INTRODUÇÃO
A expressão escrita possui a sua importância e finalidades sociais. Essa se faz imprescindível nas necessidades básicas atuais. O dever da escola é formar cidadãos conscientes e críticos. A missão da língua portuguesa aparece nesse contexto como a maior responsável nessa tarefa. A visão crítica e o pensamento sobre o mundo se irão inserir na vida intelectual do aluno através da comunicação escrita e oral, por meio de argumentações, exposições e leituras sobre a realidade. Quando levamos o ensino gramatical e de análises lingüísticas à sala de aula será por meio dessas modalidades. A atividade oportuna para o aperfeiçoamento da habilidade escrita é a reescrita, através de um planejamento didático que preveja o acompanhamento do professor, além disso, também são condicionantes a socialização de textos para a realização da análise lingüística e a auto-correção.
2 O ATO DE ESCREVER
A escrita acontece quando produzimos um texto que nos
servirá para um rascunho inicial. Uma boa redação vem de um rascunho, e nunca
de uma primeira versão, pois será por meio de sucessivas versões que o texto
será aperfeiçoado e assim obteremos um bom produto final. Com esse intuito os
Parâmetros Curriculares Nacionais nos indicam o planejamento e a coordenação
dos aspectos que regem uma boa redação e que o aluno provavelmente não o saberá
sozinho. Essa atividade primordial já será fruto de um trabalho anterior de
estudo do gênero de texto em questão. Como diz os Parâmetros Curriculares
Nacionais:
[...]a refacção faz parte do processo de escrita: durante a elaboração de
um texto, se relêem trechos para prosseguir a redação, se reformulam passagens.
Um texto pronto será quase sempre produto de sucessivas versões. Tais
procedimentos devem ser ensinados e podem ser aprendidos. (PCNS, 1998, p. 77).
Para que o alunado saiba produzir certo tipo de texto se faz necessário propiciar-lhes ferramentas para a sua elaboração. Devemos oportunizar um estudo prévio acerca da estrutura do texto. Também é importante usarmos textos que sirvam de parâmetros para confeccioná-lo. Como nos sugere os Parâmetros Curriculares Nacionais: "Para uma boa parte das crianças e jovens brasileiros, a escola é o único espaço que pode proporcionar acesso a textos escritos, textos estes que se converterão, inevitavelmente, em modelos para a produção." (PCNS, 1998, p. 25).
Esclarecer os objetivos didáticos da escrita é uma alternativa conveniente à prática pedagógica. Esses objetivos terão maior alcance se houver uma finalidade concreta, por exemplo, uma exposição dos trabalhos, elaboração de um livro, jornais etc. Isso facilita o interesse da classe em realizar a atividade. A missão do professor é incentivar e não inibir, como expôs Irandé Antunes: "O professor, normalmente, tem inibido o uso da rasura, deixando passar a falsa idéia de que a palavra certa já está na primeira tentativa." (ANTUNES, 2003, p.59). O ensino de português nos dias atuais está mais voltado para a aparência da escrita, do que ensinar a escrever. Para saber escrever é preciso ter motivação. O professor, no início, pode fazer um levantamento da situação lingüística do alunado, e o que representa escrever para eles. Manter o cuidado em propiciar um ambiente acolhedor, sem preconceitos e constrangimentos; e também ser responsável quanto à familiaridade dos alunos com os conteúdos.
3 A ANÁLISE LINGÜÍSTICA E A AUTO-CORREÇÃO
Após a entrega dos trabalhos, o professor faz o papel mediador da correção e não será o único a corrigir. Para tanto é interessante marcar nos textos dos alunos pistas para a análise e a organização das idéias, sugerir o uso do dicionário e rever a estrutura do texto. Não apenas destacar erros de desvios ortográficos, pois essa tarefa resulta esquecível na maior parte dos casos se o aluno não for levado a refletir sobre ela. A ortografia será revista em plano secundário quando seguida essa proposta pedagógica. O docente pode valer-se da ação de anotar os problemas de desencadeamento de idéias, mais freqüentes nos textos da classe. Sugere-se expô-las em lâminas de retro-projetor, cartazes e ou passadas no quadro. Dessa forma, a ação levará aos alunos a visualizar pendências da suas escritas. Cabe lembrar que aqui o conteúdo figura no plano principal do ato de escrever.
No momento seguinte, a classe discute como melhorar as passagens apresentadas, a fim de melhorar a estrutura dos seus textos, visto que já existiu um estudo anterior sobre isto. A autora Irandé Antunes na sua recente obra nos comprova:
Reescrita [...] corresponde ao momento de análise do que foi escrito, para aquele que escreve confirmar se os objetivos foram cumpridos, se conseguiu a concentração temática desejada, se há coerência e clareza no desenvolvimento das idéias, se há encadeamento entre os vários segmentos do texto (ANTUNES, 2003, p.56).
Para que a prática de produção de textos escritos nessa nova perspectiva obtenha bons frutos, é imprescindível que o professor liberte-se da maneira tradicional de avaliar um texto. Marcos Bagno nos aponta em sua obra Preconceito Lingüístico (2003) uma reflexão sobre o olhar avaliativo do professor de português em relação ao texto: "É uma preocupação quase exclusiva com a forma, pouco importando o que haja ali de conteúdo" (BAGNO, 2003, p.131). Isto ocorre em atividades escolares de redação em que o aluno é inibido de expressar-se com criatividade, sem perceber que está lhe sendo tirado o poder da palavra, da argumentação e da criticidade, pois as normas da escrita se sobressaem acima do conteúdo, enquanto deveriam servir de apoio à boa escrita. Um texto impecável na forma não quer dizer que seja excelente em conteúdo e desencadeamento de idéias que são a espinha dorsal da redação. Esse autor nos conclui: "Isso que é educar: dar voz ao outro, encorajá-lo a manifestar-se... Sem isso, não é de admirar que a atividade de redação seja tão problemática na escola." (BAGNO, 2003, p.139).
4 A REESCRITA
A reescrita é o momento final do trabalho. Após todas as etapas anteriores cumpridas finalmente o texto é passado a limpo. A auto-correção deve ser observada nessa etapa, isto é, reescrever com as devidas correções e aperfeiçoamentos, por meio da elaboração de atividades que ofereçam instrumentos lingüísticos (questões lingüísticas e discursivas) para o aluno revisar o texto. Aqui entrarão os conteúdos metalingüísticos que devem ser estudados na respectiva série, mostrando as suas finalidades, e de que eles são um meio para a qualificação e não o todo descontextualizado, como ocorre tradicionalmente através de frases soltas, as quais só possuem finalidades didáticas e não comunicativas e sociais.
Como afirmam os autores Guedes e Souza no seu artigo:
Finalmente, é preciso que o professor seja professor e examine esses textos
para orientar minuciosamente as reescritas que vão qualificá-los. Orientar a
reescrita não é apenas adequar o conteúdo às verdades estabelecidas da ciência
nem a forma do texto ao modo consagrado de escrever [...], é principalmente
levar o autor a repensar a pertinência dos dados com que está lidando [...]
perguntar-se para que vai servir o que está escrevendo. (GUEDES E SOUZA, 2001,
p. 149).
Os objetivos que foram prometidos no início da tarefa, nesse
momento devem ser concretizados, isto é, o livro de autoria dos alunos, a feira
do livro, o jornal da turma etc. Nesse instante podemos afirmar que a
disciplina de língua portuguesa cumpriu a sua missão social. Como escreveu
Paulo Freire um importante referencial pedagógico brasileiro:
[...] somos os únicos seres que, social e historicamente, nos tornamos capazes
de aprender. [...] Aprender para nós é construir, reconstruir, constatar para
mudar, o que não se faz sem abertura ao risco e à aventura do espírito.
(FREIRE, 2002, 77)
5 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Após na reflexão proporcionada pela presente pesquisa, constatamos que há muito a ser feito em prol da autonomia intelectual dos nossos alunos, os quais não estão acostumados a interpretarem e criticarem sozinhos. Isso se deve ao fato de passarem uma vida escolar afora aprendendo disciplinas e conteúdos descontextualizados. A língua portuguesa perpassa por todos os campos do conhecimento das nossas escolas. Saber argumentar na disciplina de português é a chave do raciocínio para argumentar nas demais leituras necessárias na vida. A reescrita é uma proposta que pretende auxiliar na busca dessa autonomia. Através da análise do seu próprio texto, separação dos objetos a serem questionados, resolução desses problemas, registros dos resultados e a socialização dos mesmos.
Vivemos em uma sociedade, na qual as informações são dinâmicas. Portanto devemos adequar o perfil da classe a essa perspectiva. Os alunos não podem ser mais meros agentes passivos dos conhecimentos, devem contestar, auto-avaliar, e ler sobre o mundo com compreensão autônoma.
REFERÊNCIAS
ANTUNES, Irandé. Aulas de Português: encontros & interação. São Paulo: Parábola, 2003.
BAGNO, Marcos. Preconceito lingüístico: o que é, como se faz. 27 ed. São Paulo: Loyola, 2003.
FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia: saberes necessários à prática educativa. São Paulo: Paz e Terra, 2002.
GUEDES, Paulo Coimbra, SOUZA, Jane Mari de. Não apenas o texto mas o diálogo em língua escrita é o conteúdo da aula de português. In: NEVES, Iara Conceição Bitencourt. (org) et ali. Ler e escrever: compromisso de todas as áreas. Porto Alegre: UFRGS, 2001
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO E DO DESPORTO; SECRETARIA DE EDUCAÇÃO FUNDAMENTAL. Parâmetros Curriculares Nacionais: terceiro e quarto ciclos do ensino fundamental – Língua Portuguesa. Brasília: MEC/SEF, 1998.